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TEORIAS DA ADMINISTRAÇÃO Fernanda da Luz Ferrari Teoria da burocracia Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Explicar a visão de Weber sobre a burocracia. Descrever o fenômeno burocrático sob a óptica da autoridade e do poder. Avaliar as críticas à teoria da burocracia. Introdução A teoria da burocracia tem como base o pensamento racional, que almeja a excelência. Weber apresenta a burocracia como a forma esmiuçada e detalhada de desenvolver as atividades. Neste capítulo, você vai estudar a perspectiva weberiana sobre a buro- cracia. Assim, vai ver o fenômeno burocrático sob a óptica da autoridade e do poder. Além disso, vai conhecer as críticas à teoria da burocracia. A visão de Weber sobre a burocracia O sociólogo alemão Max Weber foi o fundador da teoria sociológica clássica e desenvolveu um conceito de burocracia baseado em elementos jurídicos do século XIX. Weber defi nia a burocracia como um aparato técnico-administra- tivo organizado por normas e atribuições específi cas e utilizado para dirigir um sistema social denominado “empresa”. Para o autor, com racionalidade e efi ciência, as organizações atingiriam seu grau mais elevado de excelência por meio de um sistema produtivo, capitalista e dotado de um conjunto de normas morais como embrião. Weber pregava o culto ao trabalho duro, bem como a aplicação de excedentes de produção e poupança. Do ponto de vista da burocracia, as características ideais de uma organi- zação são a formalização, a divisão do trabalho, o princípio da hierarquia, a impessoalidade, a competência técnica e a profissionalização do funcionário. A teoria da burocracia é posterior à teoria clássica e à teoria das relações humanas. Ela tem como origem uma necessidade não considerada pelas teorias anteriores: a necessidade de uma abordagem generalista e integrada a ser implantada nas organizações. Devido ao grande crescimento das organizações, a teoria clássica e a teoria das relações humanas não supriram mais suas necessidades. Assim, foi necessário construir ferramentas mais formais, impessoais e que apresentassem eficiência no desenvolvimento dos processos. Weber percebe a burocracia como um trabalho racional que tem o objetivo de obter lucro (MARTINS, 2017). Para ele, o capitalismo é a forma mais racional de organização. Ao se livrar das ingerências religiosas e éticas (como questões sobre “preço justo”) e da imoralidade da usura, o capitalismo permite calcular tudo em termos de dinheiro, conforme os mecanismos do mercado. Weber também apontou os danos da burocracia ao indivíduo. Entre esses danos está a fragmentação, que ele chama de “loteamento da alma” ou de “jaula de ferro da modernidade”. Para Weber, pode haver um grande esvaziamento de significados se o mundo for resumido a questões racionais, excluindo-se as crenças religiosas e os valores morais. Nesse sentido, os elementos da teoria burocrática estão pautados na autoridade, no poder, na hierarquia, na disciplina, na ordem e no controle. Segundo Weber, a burocracia é uma máquina racional e possui 15 dimensões principais (CLEGG; KORNBERGER; PITSIS, 2011). Veja a seguir. 1. O poder pertence ao escritório e não é uma função do chefe do escritório. 2. As relações de poder dentro da estrutura organizacional possuem uma con- figuração de autoridade distinta, especificada pelas regras da organização. 3. Como o poder é exercido em termos de regras departamentais, em vez de regras pessoais, a ação organizacional é impessoal. 4. Os sistemas disciplinares de conhecimento, formulados organizacional ou profissionalmente, e não crenças idiossincrásticas, embasam a ação organizacional. 5. As regras tendem a ser formalmente codificadas. 6. Essas regras particularizam as tarefas, que são específicas, distintas e executadas por categorias formais diferentes de pessoal especializado. Essas tarefas oficiais seriam organizadas de forma regulada e contínua, a fim de garantir o bom fluxo de trabalho entre elementos descontínuos em sua organização. Há nisso, portanto, uma forte tendência à especialização. Teoria da burocracia2 7. Há uma distância dramática entre ação burocrática e ação particula- rizada em recursos humanos, definindo os limites da legitimidade. 8. A separação funcional de tarefas significa que o pessoal deve ter au- toridade e autonomia para cumprir suas obrigações. As organizações exibem, portanto, uma estrutura de autoridade. 9. Como as tarefas são separadas funcionalmente, e como o pessoal im- buído de cada função possui poderes precisamente delegados, há uma tendência à hierarquia. 10. A delegação de poderes é expressa em termos de atribuições, direitos, obrigações e responsabilidades. Os relacionamentos organizacionais, portanto, tendem a possuir uma base contratual bem definida. 11. As qualidades exigidas para as posições organizacionais são cada vez mais mensuradas em termos de credenciais formais. 12. Diferentes posições na hierarquia dos escritórios exigem diferentes credenciais para admissão. Há uma estrutura de carreira em que a pro- moção é possível por antiguidade ou por mérito de serviços prestados, para indivíduos com credenciais semelhantes. 13. Diferentes posições na hierarquia são diferentemente remuneradas e, portanto, estratificadas. 14. A comunicação, a coordenação e o controle são centralizados na organização. De acordo com Weber, a burocracia opera sem uma preocupação com as pessoas. A burocracia pode ser conceituada como insensível e cruel, na medida em que transforma pessoas em números quantificáveis. As pessoas são julgadas de acordo com um código normativo e de forma igualitária, independentemente de cor, credo, gênero ou classe social. Porém, são garantidas a eficiência e a eficácia das organizações por meio de racionalidade, rapidez, padronização da liderança e alcance de objetivos. Para aprender mais sobre a trajetória do conceito de democracia nos escritos políticos e sociológicos de Weber, leia o artigo Democracia com liderança: Max Weber e o conceito de democracia plebiscitária (SELL, 2011), disponível no link a seguir. https://goo.gl/quAv4n 3Teoria da burocracia Fenômeno burocrático sob a óptica da autoridade e do poder Para Weber, cada tipo de sociedade corresponde a um tipo de autoridade, pois a autoridade signifi ca a probabilidade de que um comando específi co seja obedecido. Segundo Chiavenato (2004), a autoridade signifi ca poder institucionalizado e ofi cializado. Poder implica potencial para exercer infl u- ência sobre outras pessoas. Assim, para Weber, o poder é a vontade de impor a própria vontade em uma relação social, ou seja, é a imposição de arbítrio sobre a conduta de outras pessoas. Assim, ter autoridade é ter poder, uma vez que a autoridade proporciona poder. De acordo com Weber, existem três tipos de autoridade legítima: a autoridade tradicional, a carismática e racional e a legal ou burocrática. A seguir, você vai conhecer cada uma delas. Autoridade tradicional A autoridade tradicional é baseada em tradições e na continuidade. É encon- trada na sucessão das fi guras dos patriarcas. A autoridade tradicional é legítima a partir do momento em que é assegurada por costumes sociais, crenças e até mesmo pelas tradições religiosas, mas não é considerada racional. Segundo Chiavenato (2004), a dominação tradicional — típica da sociedade patriarcal —, quando envolve grande número de pessoas e um vasto território, pode assumir duas formas, como você pode ver a seguir. Patrimonial: os funcionários que preservam a dominação tradicional são os servidores pessoais do senhor — parentes, favoritos, empregados, etc. — e são geralmente dependentes economicamente dele. Feudal: o aparato administrativo apresenta maior grau de autonomia em relação ao senhor. Os funcionários — vassalos ou suseranos — são aliados do senhor e lhe prestam juramento de fidelidade. Em virtude desse contrato, os vassalosexercem jurisdição independente, dispõem de seus próprios domínios administrativos e não dependem do senhor no que tange à remuneração e à subsistência. Teoria da burocracia4 Autoridade carismática e racional A autoridade carismática e racional se baseia nas principais características da personalidade do líder. Os líderes carismáticos, segundo Weber, possuem o ca- risma como um dom de encantamento extraordinário e pessoal. Eles são vistos como detentores de capacidade acima da média, como confi áveis e dotados de grande capacidade de liderar. Por ser confi ável, o líder é que escolhe o pessoal administrativo, que, aliás, é composto por um grande número de seguidores. Como exemplos desse tipo de liderança, você pode considerar: Steve Jobs, Martin Luther King, John F. Kennedy, entre outros. As principais caracterís- ticas dos líderes carismáticos são a visão e a articulação, o risco pessoal, a sensibilidade ao ambiente, a sensibilidade para as necessidades dos liderados e os comportamentos não convencionais. Autoridade legal ou burocrática A autoridade legal ou burocrática não é inerente ao indivíduo, mas ocorre em função da posição que ele ocupa, do seu cargo e dos níveis hierárquicos estabelecidos pelas organizações. De acordo com Weber, a autoridade legal ou burocrática é a mais adequada para o ambiente empresarial, por não ser personalista como as demais formas. Para Weber, com o passar do tempo, todas as sociedades desenvolvem de forma sequencial os três tipos de autoridade. Esse processo se inicia pela autoridade carismática (em função do carisma de determinado profissional), evoluindo para a autoridade tradicional e culminando na autoridade legal ou burocrática. Dessa forma, existem dois tipos de líderes nas empresas: os líderes tran- sacionais e os líderes transformacionais. Os líderes transacionais são os tradi- cionais, enquanto os líderes transformacionais são caracterizados por romper com o passado — caso esse rompimento seja considerado melhor para o grupo. Observe, no Quadro 1, as tipologias de sociedade e autoridade e suas características, segundo Weber. 5Teoria da burocracia Fo nt e: A da pt ad o de C hi av en at o (2 00 4, p . 2 62 ). Ti po s d e so ci ed ad e Ca ra ct er ís ti ca s Ex em pl os Ti po s d e au to ri da de Ca ra ct er ís ti ca s Le gi ti m aç ão A pa ra to ad m in is tr at iv o Tr ad ic io na l Pa tri ar ca l e pa tri m on ia lis ta Co ns er va do ra Cl ã, tri bo , f am ília e so ci ed ad e m ed ie va l Tr ad ic io na l N ão ra ci on al Po de r h er da do ou d el eg ad o Ba se ad a no “s en ho r” Tr ad iç ão , h áb ito s, us os e c os tu m es Fo rm a pa tri m on ia l e fo rm a fe ud al Ca ris m át ic a Pe rs on al ist a, m íst ic a e ar bi trá ria Re vo lu ci on ár ia G ru po s re vo lu ci on ár io s, pa rt id os p ol íti co s, na çõ es e m re vo lu çã o Ca ris m át ic a N ão ra ci on al , ne m h er da da , ne m d el eg áv el Ba se ad a no c ar ism a Ca ra ct er íst ic as pe ss oa is ca ris m át ic as d o líd er (h er oí sm o, m ag ia e po de r m en ta l) In co ns ta nt e e in st áv el Es co lh id o pe la le al da de e p el a de vo çã o ao líd er , n ão p or qu al ifi ca çõ es té cn ic as Le ga l, ra ci on al o u bu ro cr át ic a Ra ci on al c om re la çã o ao s m ei os e ao s o bj et iv os Es ta do s m od er no s, gr an de s e m pr es as e ex ér ci to s Le ga l, ra ci on al o u bu ro cr át ic a Le ga l, r ac io na l, im pe ss oa l e fo rm al M er ito cr át ic a Ju st iç a da le i Pr om ul ga çã o e re gu la m en ta çã o de n or m as le ga is pr ev ia m en te de fin id as Bu ro cr ac ia Q ua dr o 1. T ip ol og ia s d e so ci ed ad e e au to rid ad e e su as c ar ac te rís tic as , s eg un do W eb er Teoria da burocracia6 Conheça mais sobre carisma e racionalismo na sociologia de Max Weber lendo o artigo Carisma e racionalismo na sociologia de Max Weber (BACH, 2011), disponível no link a seguir. https://goo.gl/bB2Nef Críticas à teoria da burocracia Para Weber, a burocracia funciona como uma organização que alcança os objetivos desejados sem levar em conta o elemento humano. Ela se realiza, por exemplo, por meio da efi ciência, da precisão e da uniformidade de rotinas e procedimentos. Porém, o modelo burocrático pode ser criticado por não corresponder às diferentes relações que existem em uma organização e por basear-se na dife- rença entre os conceitos teóricos e as aplicações. Chiavenato (2004) enumera oito críticas à teoria da burocracia, como você pode ver a seguir. 1. Excessivo racionalismo para alcançar eficientemente seus objetivos. 2. Mecanicismo e limitações típicas da teoria da máquina, causadas pelo arranjo rígido e estático de órgãos, que devem cumprir tarefas utilizando especialização e padronização do desempenho, além de centralização (para obter unidade de comando). 3. Abordagem de sistema fechado, visualizando as organizações como entidades absolutas que existem no vácuo, com pouco intercâmbio com o ambiente externo e entre as partes internas. 4. Total omissão da organização informal. 5. Conservadorismo e falta de flexibilidade, além de conformismo das pessoas, que se tornam obtusas e condicionadas. 6. Sistema rígido e ultrapassado de autoridade e controle. 7. Cerceamento da criatividade e da inovação necessárias às mudanças atuais (apesar de ter sido uma excelente invenção para o século XIX). 8. Validade apenas para atividades rotineiras e repetitivas, em que a efi- ciência e a produtividade são mais importantes. Um dos maiores críticos da burocracia, Warren Benin, em 1966 apresentou algumas razões para o declínio desse modelo: 7Teoria da burocracia O “modelo-máquina” burocrático foi desenvolvido como uma reação contra a subjugação pessoal, nepotismo, crueldade e julgamentos caprichosos e subjetivos que passaram pelas práticas gerenciais durante os primeiros anos da Revolução Industrial. A burocracia originou-se das necessidades organizacionais de ordem e pre- cisão, e da demanda de tratamento imparcial aos trabalhadores. Ela foi uma organização idealmente criada para os valores da era vitoriana. Hoje, novas formas organizacionais estão surgindo diante de nosso moderno mundo industrializado [...] (SILVA, 2013, p. 161). Corroborando as críticas ao modelo de Weber, Roberto Merton considerou várias consequências da teoria da burocracia, tais como o apego aos resultados, a exibição de sinais de autoridade, a dificuldade crescente com os clientes, a rigidez do comportamento e a defesa contra pressões externas. Nessa lista de resultados rigorosos, a dificuldade crescente com os clientes pode ser consi- derada a consequência mais grave da utilização da teoria, uma vez que acaba bloqueando a inovação e a mudança. Assim, ocasiona a perda do cliente, que deveria ser sempre o principal alvo das organizações. Para ver as principais características da teoria burocrática e, principalmente, as críticas a ela, acompanhe, no Quadro 2, uma comparação entre as teorias clássicas. Taylor Administração científica Fayol Teoria administrativa Weber Modelo burocrático Características Treinamento em re- gras e rotinas Busca da “melhor ma- neira de fazer” Motivação financeira Divisão do trabalho Definição das funções administrativas Divisão do trabalho Hierarquia Autoridade Equidade Regras Impessoalidade Divisão do trabalho Hierarquia Estrutura da autoridade Racionalidade Foco Empregado Estrutura da administração Organização toda Quadro 2. Teorias clássicas (Continua) Teoria da burocracia8 Depois de analisar o Quadro 2, você podenotar o quanto a teoria da burocracia e a teoria administrativa enfatizam a estrutura organizacional e os processos da organização humana. Já a escola da administração científica foca a análise de atividades físicas relacionadas com o trabalho. Saiba mais sobre as críticas à teoria da burocracia no livro Introdução à administração (MAXIMIANO, 2011). Fonte: Adaptado de Silva (2013, p. 163). Benefícios Produtividade Eficiência Estrutura definida Profissionalização dos papéis gerenciais Consistência Eficiência Inconvenientes Não consideração das necessidades sociais Foco interno Superenfatização do comporta- mento racional dos administradores Rigidez Lentidão Quadro 2. Teorias clássicas (Continuação) 9Teoria da burocracia CHIAVENATO, I. Iniciação a teoria geral da administração. Rio de Janeiro: Campus, 2004. CLEGG, S. R.; KORNBERGER, M.; PITSIS, T. Administração e organizações: uma introdução à teoria e à prática. 2. ed. Porto Alegre: Bookman. 2011 MARTINS, J. R. Introdução à sociologia do trabalho. Curitiba: InterSaberes, 2017. SILVA, R. O. Teorias da administração. 3. ed. São Paulo: Pearson, 2013. Leituras recomendadas BACH, M. Carisma e racionalismo na sociologia de Max Weber. Sociologia & Antropologia, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 51-70, jan./jul. 2011. Disponível em: <http://www.scielo.br/ pdf/sant/v1n1/2238-3875-sant-01-01-0051.pdf>. Acesso em: 6 set. 2018. CHIAVENATO, I. Iniciação a teoria das organizações. Barueri: Manole, 2010. CHIAVENATO, I. Administração geral e pública. 4. ed. Barueri: Manole, 2016. MAXIMIANO, A. C. A. Introdução à administração. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2011. SELL, C. E. Democracia com liderança: Max Weber e o conceito de democracia plebis- citária. Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, n. 5, p. 139-166, jan./jul. 2011. Teoria da burocracia10 Conteúdo:
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