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FARMACOCINÉTICA/FARMACOLOGIA CLÍNICA Prezado aluno, Neste momento você deverá realizar a leitura deste texto e complementar a leitura utilizando-se de recursos disponibilizados na plataforma. Neste caso, estaremos realizando uma breve revisão de alguns conceitos básicos que deverão ser aplicados no módulo, porém de forma mais aprofundada. É muito importante a leitura do material complementar disponibilizado na plataforma. Pois este nos dará um bom suporte para entendimento dos assuntos a serem abordados na aula presencial. Desejo um ótimo estudo a todos. Introdução No homem, o instinto de sobrevivência geralmente é guiado pelo pensamento abstrato. Desta forma, a espécie humana utiliza-se – além das respostas reflexas de autoproteção comuns aos seres vivos – de formas elaboradas de preservação e restauração da saúde. Ao se observar a história da raça humana, verifica-se a existência de inúmeros registros ações que objetivam o benefício, entre estas, pode-se destacar as mudanças de comportamento, ritos religiosos, atos cirúrgicos, utilização de substâncias que presumivelmente possuem alguma ação terapêutica, entre outras. Em muitas destas ações ocorreu alívio do sofrimento por razões diversas de qualquer efeito intrínseco. Algumas intervenções terapêuticas apresentaram nítido efeito intrínseco, como por exemplo, a contenção de uma hemorragia por meio de uma simples compressão local, o alinhamento de ossos fraturados, a retirada de tumores e membros em situação gangrenosa certamente contribuíram para o alívio de sofrimento e até para o prolongamento da vida. Alguns dos medicamentos utilizados também apresentavam poder intrínseco, como opióides e álcool, mas a maioria dos supostos remédios eram certamente desprovidos de qualquer ação. Demonstrou-se que grande parte dos resultados obtidos com tratamentos antigos provinha de fatores diversos do efeito intrínseco, sendo muitos deles, deletérios ao homem e animais. Atualmente descreve-se que a quantificação do efeito intrínseco de medicamentos é feito por métodos farmacológicos e farmacológico- clínico. Um fato importante e que não se pode negar é que o início do tratamento de doenças por meio de drogas é de certa forma muito antigo. As primeiras drogas empregadas como medicamento foram as de origem natural, extraídas principalmente de plantas, e destinavam-se à terapia de doenças infecciosas. Por exemplo, o imperador chinês Sheng Nung (há mais de 3000 anos), em seus escritos sobre ervas medicinais, recomendava o uso da planta Ch’ang shang para o tratamento da malária. Atualmente sabe-se que esta planta contém o alcaloide febrifugina, que possui forte ação antimalárica. Índios brasileiros empregavam a raiz da ipeca para disenteria e diarreia; esta planta, contem a emetina, que é eficaz para o tratamento daquelas moléstias. Já os índios peruanos, utilizavam para o tratamento da malária, cascas da quina, de onde se extrai a quinina. Conceitos ➢ Droga: a palavra droga origina do holandês antigo droog que significa folha seca, pois, antigamente quase todos os medicamentos eram feitos à base de vegetais. Atualmente, droga é definida como sendo qualquer substância capaz de modificar a função dos organismos vivos, resultando em mudanças fisiológicas ou de comportamento. Assim, droga consiste em qualquer substância química que possui a capacidade de produzir efeito farmacológico, ou seja, que provoque alterações funcionais ou somáticas. Se estas alterações forem benéficas, podemos denominar de fármaco ou droga-medicamento ou apenas medicamento, e se forem maléficas denominamos de tóxico ou droga-tóxico. ➢ Princípio ativo: corresponde à substância (ou grupo destas), responsável pela ação terapêutica, com composição química e ação farmacológica conhecida. ➢ Fármaco: substância química, estruturalmente definida, utilizada para o fornecimento de elementos essenciais ao organismo, na prevenção, no tratamento e no diagnóstico de doenças, infecções ou de situações de desconforto e na correção de funções orgânicas desajustadas. ➢ Medicamento: é o mesmo que fármaco, especialmente quando este se encontra em uma formulação farmacêutica. Corresponde ao fármaco na especialidade farmacêutica (comprimidos, drágeas, cápsulas, soluções, pomadas, etc.). Em algumas situações, determinado medicamento é constituído de dois ou mais fármacos, nas chamadas associações medicamentosas. ➢ Farmacodinâmica: embora dependa da Farmacocinética, estuda o local de ação, mecanismo de ação, e os efeitos que as drogas promovem no organismo. ➢ Farmacocinética: estuda o movimento da droga através do organismo, envolvendo os processos de absorção, distribuição, biotransformação (metabolismo), e eliminação ou excreção. ➢ Dose de ataque: consiste na dose única que é suficiente para elevar rapidamente a concentração plasmática terapêutica do fármaco no organismo. A palavra dose é derivada do grego dosis o que significa ação de dar ou o que pode ser dado. ➢ Dose eficaz mediana: corresponde a dose necessária para produzir determinada intensidade de um efeito em 50% dos indivíduos. ➢ Dose letal: consiste no efeito observado da morte dos animais de experiência com drogas. ➢ Efeito adverso ou indesejado: consiste na ação provocada pelo fármaco diferente do efeito planejado. Alguns autores denominam de efeito colateral, e que não está relacionado à principal ação do medicamento. ➢ Medicamentos bioequivalentes: são medicamentos que contém o mesmo fármaco ou princípio ativo, na mesma quantidade e forma farmacêutica, podendo ou não conter excipientes idênticos e de mesma biodisponibilidade. Devem cumprir com as mesmas especificações atualizadas da Farmacopéia Brasileira e, na ausência destas, com as de outros códigos autorizados pela legislação vigente, ou com outros padrões aplicáveis de qualidade, relacionados à identidade, dosagem, pureza, potência, uniformidade de conteúdo, tempo de desintegração e velocidade de dissolução, quando for o caso. ➢ Biodisponibilidade: é a fração de um dado princípio ativo liberada por uma formulação farmacêutica em um intervalo de tempo, disponível para absorção e que atingiu a corrente sanguínea sistêmica na forma inalterada (não biotransformada). Farmacocinética X Farmacodinâmica Nos dias atuais, tanto os médicos como os pacientes reconhecem a importância fundamental do tratamento com fármacos como um dos meios primordiais para a prevenção e alívio da doença. O médico tem a tarefa nada invejável de selecionar a(as) droga(s) de melhor propriedade dentro de um vasto acervo terapêutico. O grau de dificuldade na escolha da droga apropriada varia de médico para médico, dependendo de sua especialidade e da natureza da população de pacientes. Para tentar amenizar os erros, estes profissionais dentro de sua especialidade, geralmente usa um número limitado de drogas, e detém uma experiência ampla em relação à seleção da droga, posologia e reações adversas. Ao contrário, médicos que tratam de populações diversas, e que necessitam de adentrarem em diferentes especialidades, são continuamente desafiados, pois necessitam de trabalhar com um acervo terapêutico ainda maior. Assim, estes profissionais correm um grande risco de em determinada situação realizar uma prescrição com medicamentos diferentes que podem interagir entre si, e desencadear no paciente uma reação adversa. A farmacologia dentro de um enfoque aplicado fundamenta o ato de prescrever, permitindo que se faça uma terapêutica medicamentosa mais científica e racional. Esta se caracteriza pela seleção do medicamento adequado para prevenir, reverter ou atenuar um processo patológico. Entretanto, isto pode não ser o suficiente para se obter sucesso na terapêutica medicamentosa, pois é necessário garantir que o medicamento escolhido, atinja em concentrações adequadas,o órgão ou sistema alvo. Escolha inadequada do fármaco ou esquemas posológicos inapropriados podem produzir efeitos indesejáveis. Para que isto não ocorra, é necessário escolher doses, vias de administração e intervalo entre doses que garantam a chegada e a manutenção da concentração plasmática e concentração no local de ação do fármaco. Esquemas inadequados podem proporcionar concentrações insuficientes ou subterapêuticas que falseiam a interpretação sobre a eficácia do fármaco escolhido, ou em outra hipótese, pode ocorrer a disponibilização de concentrações muito acima da concentração tida como terapêutica, desencadeando inúmeros efeitos adversos oriundos das ações farmacológicas do medicamento, por este motivo, deve-se sempre objetivar doses e esquemas terapêuticos que proporcionem concentrações plasmáticas tidas como terapêutica (faixa terapêutica; Figura 1). A disponibilidade para o sistema biológico de um determinado fármaco contido em uma forma farmacêutica é essencial para o propósito do desenvolvimento de formas de dosagem e possui fundamental importância para a eficácia do medicamento. Portanto, antes de ser absorvido por um sistema biológico, o fármaco deverá ser liberado de sua forma farmacêutica (comprimido, solução, drágea, etc) ou de um sistema de liberação de fármaco (adesivo transdérmico, implante) e solubilizar-se nos fluidos biológicos. Curvas concentração plasmática em função do tempo demonstrando na primeira figura um perfil normal de um medicamento administrado por via oral e, na segunda figura, curvas que saíram da faixa terapêutica (Lüllmann et al. 2008) Farmacocinética. A administração de um determinado fármaco contido em uma forma farmacêutica, por uma via de administração, em uma única dose ou em doses múltiplas (repetidas), tem por finalidade a obtenção de um efeito farmacoterapêutico à um indivíduo em situação patológica. O efeito terapêutico desejado, como alívio da dor, diminuição da ansiedade, regularização da pressão arterial, controle da taxa glicêmica entre outras, depende da concentração do princípio ativo no local de ação ,e também da velocidade com que o princípio ativo consegue chegar no local (esquema abaixo). A intensidade da resposta farmacodinâmica, é geralmente, proporcional à concentração do princípio ativo no local de ação. Se o principio ativo se difundir rapidamente do plasma para seu local de ação, a sua concentração plasmática pode refletir sua concentração no local de ação. Objetivos da farmacocinética clínica. A farmacocinética clínica é uma ciência de caráter multidisciplinar e de grande interesse sanitário, que possui como principal objetivo na prática assistencial a individualização posológica, e a otimização do tratamento farmacoterapêutico, a fim de alcançar a máxima eficácia terapêutica com a mínima incidência de problemas relacionados aos medicamentos. Habitualmente os medicamentos são utilizados partindo de critérios pré- estabelecidos que contribuam com a estratégia do “acerto e erro”. Este empirismo está embasado na resposta clínica ou bioquímica em relação aos efeitos farmacológicos do medicamento prescrito. Entretanto, este método não é passível de ser aplicado a todos os casos, sendo necessárias adequações à farmacoterapia em função da situação encontrada para cada paciente. Portanto, os estudos de farmacocinética clínica permitem: ➢ Avaliar o sucesso ou insucesso de uma terapêutica ➢ Um meio de avaliar a extensão e velocidade de chegada do fármaco ao seu local de ação ➢ Previsão e compreensão de efeitos secundários dos fármacos ➢ Prever condições não testadas experimentalmente, tais como dosagens, intervalos de administração, etc. ➢ Prever níveis teciduais, mesmo sem amostras dos mesmos ➢ Comparar resultados entre diferentes indivíduos da mesma espécie ou entre espécies diferentes. ➢ Descrever matematicamente o organismo Revisão de farmacocinética básica. Conforme LaMattina e Golan (2009), até mesmo a mais promissora das terapias farmacológicas irá fracassar em estudos clínicos se o fármaco for incapaz de alcançar o seu órgão- alvo numa concentração suficiente para exercer um efeito terapêutico. Muitas das características que tornam o corpo humano resistente a danos causados por invasores estranhos e substâncias tóxicas também limitam a capacidade dos fármacos modernos de combater os processos patológicos no paciente. O reconhecimento dos numerosos fatores que afetam a capacidade de um fármaco de atuar em determinado paciente, bem como da natureza dinâmica desses fatores com o transcorrer do tempo, é de suma importância para a prática clínica da medicina. Vários fatores podem contribuir para a liberação de um fármaco, estes incluem as características físico-químicas do princípio ativo (tamanho de suas partículas, solubilidade em água ou gordura, pKa) e as características das formas de dosagem ou do sistema de liberação, como a natureza dos adjuvantes farmacotécnicos empregados na formulação e o método utilizado para o desenvolvimento da forma farmacêutica. O estabelecimento de esquemas posológicos padrões, e de seus ajustes em presença de situações fisiológicas (idade, sexo, peso, gestação), hábitos do paciente (tabagismo, ingestão de álcool) e algumas doenças (insuficiência renal, hepática, cardíaca) é orientado por informações provenientes da farmacocinética. Desta forma, amenos que um determinado fármaco promova seu efeito topicamente, isto é, no seu local de administração, o mesmo deverá alcançar a corrente sanguínea sistêmica e, chegar até seu local de ação. Porém, o simples fato do fármaco estar na corrente sanguínea não garante uma resposta farmacológica efetiva. Para que isto ocorra de forma eficaz, o fármaco deverá sair do plasma e alcançar o sistema de líquido intersticial (líquido que banha as células), ou até mesmo o meio intracelular, podendo ser este simplesmente o citoplasma e/ou o núcleo da célula. Como visto anteriormente, o efeito farmacológico é dependente da velocidade com que o fármaco consegue atingir seu sítio de ação, e este fenômeno é totalmente dependente de dois processos: absorção e distribuição. No entanto, para que uma determinada droga possa ser absorvida e distribuída, a mesma deverá possuir a capacidade de transpor diversas barreiras biológicas, as quais são classificadas como se segue: 1) Membranas celulares; 2) Barreira hematoencefálica; 3) Barreira placentária. Além destes fatores, a característica físico-química do fármaco (pKa, lipossolubilidade/hidrosolubilidade, peso molecular, estabilidade química, concentração no local de administração, forma farmacêutica), e os fatores relacionados ao paciente (via de administração, fluxo sanguíneo no local de administração, velocidade de esvaziamento gástrico, pH do local de administração, patologias presentes no local de administração), além de fatores como a administração simultânea de dois ou mais fármacos (interações físico-químicas no local de administração) ou ainda a administração de fármacos simultaneamente com determinados alimentos, são de grande importância para o processo de absorção. Estes fatores principalmente estão relacionados com as seguintes questões: 1) O fármaco consegue penetrar no organismo do paciente? (administração, liberação do princípio ativo, forma farmacêutica, via de administração, característica físico- química, características do paciente, barreiras biológicas). 2) O fármaco consegue alcançar seu local de ação? (absorção, distribuição). Absorção O termo absorção significa que a droga saiu do seu local de administração e chegou até a corrente sanguínea, ou seja, “é a passagem da droga ou fármaco, do seu local de administração para a corrente sanguínea e/ou linfática” (figura ); com exceção da via intravenosa, todas as demais vias de administração podem propiciarabsorção de fármacos, isto porque no caso daquela via, o fármaco está sendo administrado diretamente na corrente sanguínea e, portanto, será pulada a etapa de absorção. Para que o fármaco possa transpor a membrana celular que compõem as células epiteliais da pele, do intestino, dos alvéolos pulmonares, das córneas, das mucosas e até mesmo dos vasos sanguíneos, será necessário um ou mais dos seguintes processos: a) Difusão passiva; b) Filtração; c) Fluxo de massa; d) Transporte ativo; e) Transporte facilitado; f) Endocitose; Representação de processos utilizados para a absorção dos medicamentos. Fatores que afetam a absorção de um fármaco. Além do coeficiente de partição lipídio-água, diversos outros fatores podem influenciar de forma positiva ou negativa a absorção de um determinado fármaco. A absorção poderá ser influenciada por fatores físico-químicos do fármaco, fatores relacionados à forma farmacêutica e via de administração, bem como por condições fisiológicas e patológicas do paciente. ➢ Propriedades físico-químicas do fármaco ➢ Estabilidade ➢ Lipossolubilidade ➢ Concentração da droga no local de administração ➢ Forma farmacêutica ➢ Influencia do pH e pKa ➢ Biodisponibilidade Fatores fisiológicos que podem influenciar na absorção. Além dos fatores relacionados às características físico-químicas dos fármacos, as condições fisiológias do indivíduo pode ou favorecer ou desfavorecer o processo de absorção de um fármaco. Asseguir serão relaciodados alguns destes fatores. ➢ Presença da P-glicoproteína: ➢ Fluxo sanguíneo e vascularização no local de administração ➢ Motilidade gastrintestinal ➢ Patologias gastrintestinais ➢ Volume de líquido (água) ao se administrar uma formulação sólida ➢ Alimentação ➢ Metabolismo de primeira passagem Distribuição de fármacos. Embora a absorção do fármaco seja considerada um pré-requisito para atingir níveis plasmáticos adequados desse fármaco, este também necessita alcançar seu órgão ou órgãos-alvo em concentrações terapeuticamente ideais para exercer o efeito desejado. A distribuição de um fármaco ocorre através do sistema circulatório, enquanto o sistema linfático contribui em menor grau. Após ser absorvido ou administrado diretamente na corrente sanguínea, o fármaco se distribui por todos os sistemas incluido o líquido intersticial, líquido intracelular, tecido muscular, tecido ósseo, SNC, tecido adiposo além de unhas e pêlos, dependendo dos fatores fisiológicos e características físico-químicas, cada fármaco terá um perfil próprio em termos de distribuição, ou seja, tecidos mais vascularizados deverão receber em menos tempo uma concentração maior quando comparado a tecidos menos ou não vascularisados como tecido adiposo e pêlos; outro fator relacionado à circulação sanguínea é o débito cardíaco, pois se compara a um paciente normal, portadores de insuficiência cardíaca possuem um prejuizo considerável na velocidade de distribuição. Ainda, fármacos altamente lipossolúveis quando comparados a fármacos hidrossolúveis irão se difundir com maior afinidade para o tecido adiposo. Veja diagrama abaixo. Representação esquemática da distribuição de fármacos de acordo com a vascularização dos sitemas (Raffa et al., 2006). ➢ Ligação às proteínas plasmáticas e tecidos ➢ Volume aparente de distribuição ➢ Área Sobre a Curva (AUC) Eliminação e Metabolismo de fármacos (excreção e biotransformação). A menos que se fixe em estruturas orgânicas, qualquer substância estranha (xenobiótico) introduzida no organismo será eventualmente eliminada, algumas mais rapidamente, e outras de uma forma mais lenta. O mesmo princípio é utilizado para os medicamentos, que deverão se submeter ao processo de eliminação, que é constituido pelos processos de biotransformação ou metabolismo e excreção. Alguns fármacos são excretados em sua forma inalterada, porém a maioria das substâncias medicamentosas necessitam de sofrer um processo de biotransformação para que seja melhor excretado pelo sistema. Conforme Taniguchi e Guengerich (2009), embora as reações bioquímicas que modificam as drogas, convertendo-as em formas passíveis de excreção renal, constituam uma parte essencial do metabolismo dos fármacos, esse metabolismo abrange mais do que essa simples função. A biotransformação dos fármacos pode alterá-los de quatro maneiras importantes: ➢ Um fármaco ativo pode ser convertido em fármaco inativo ➢ Um fármaco ativo pode ser convertido em um metabólito ativo ou tóxico. ➢ Um pró-fármaco inativo pode ser convertido em fármaco ativo. ➢ Um fármaco não-excretável pode ser convertido em metabólito passível de excreção (por exemplo, aumentando a depuração renal ou biliar). Para melhor ilustrar, veja o quadro abaixo. A figura mostra exemplos de biotransformação de fármacos, alguns estão em estado ativo e são convertidos a substâncias ainda ativas e posteriormente a compostos inativos, e ainda, exemplos de drogas inativas (pró-droga) que são metabolizadas a fármacos ativos. Fases da biotransformação. O processo de biotransformação pode ser subdividido em duas fases distintas, sendo elas: ➢ Reações de fase I: são conhecidas também como reações não-sintéticas ou catabólicas. Esta fase tem por objetivo modificar a estrutura molecular do fármaco e, envolvem os processos de oxidação, redução, hidrólise, hidroxilação, desaminação, ciclização, desciclização entre outras. ➢ Reações de fase II: também denominada de reação sintética ou anabólica ou ainda de fase de conjugação. Nesta fase, será conjugada uma molécula endógena de característica hidrossolúvel à molécula do fármaco que passou pelo processo de fase I. As principais moléculas endógenas envolvidas neste processo são: ácido glicurônico, metil, sulfato, glutationa e acetato. ➢ Principais enzimas envolvidas com o processo de fase I. O principal grupo de enzimas relacionadas com a metabolização de fase I é o complexo microssomal de função oxidativa mista Citocromo P-450 ou também denominada de complexo microssomal CYP. Atualmente são descritas mais de 95 subtipos de CYP, entretanto, com função oxidativa para fármacos as subunidades de principal função são: CYP2 (CYP2D6) e CYP3 (CYP3A4). Além destas enzimas, outras classes enzimáticas também possuem grande importância no processo de biotransformação, entre as diversas outras destacam-se as: monoxigenase com flavina, monoamina oxidades, desidrogenases, hidrolases e outras. A figura abaixo exemplifica a distribuição das principais CYPs. ➢ Reações de fase II As principais enzimas envolvidas com os processos de biotransformação de fase II são: uridinodifosfato glicuroniltransferase, que responsável pela transferência do ácido glicurônico; sulfotransferase, transfere radicais de sulfato; glutationa S-transferase, transfere uma molécula de glutationa para o radical S do fármaco; N-acetiltransferase, que transfere radicais de acetato. Nos esquemas abaixo é possível ter uma ideia de como estes processos ocorrem. Excreção de fármacos A principal via de excreção de fármacos é constituída pelo sistema renal, entretanto há outras vias de grande importância, como por exemplo, a via pulmonar (muito importante para fármacos voláteis como o álcool e anestésicos gasosos), leite materno, sistema biliar (é uma via muito importante para fármacos que dependem do ciclo entero-hepático como os contraceptivos hormonais, cloranfenicol, tetraciclinas, rifampicina e digoxina), lágrimas, saliva (atualmente muitos fármacos e substâncias endógenas tem sido monitorados por meio de sua concentração salivar), suor, fecal entre outras. Para que um fármaco possa ser excretado pelo sistema renal, o mesmo poderá passar por um ou mais dos seguintes processos: filtração glomerular, reabsorção tubular passiva e, secreção tubularativa. ➢ Filtração glomerular ➢ Reabsorção tubular passiva ➢ Secreção tubular ativa Mecanismos de ação de drogas Conforme Cairo, Simon e Golan (2009), embora os fármacos possam, teoricamente, se ligar a quase todo tipo de alvo tridimensional, a maioria dos fármacos produz seus efeitos desejados (terapêuticos) através de uma interação seletiva com moléculas-alvo, que desempenham importantes papéis na função fisiológica e fisiopatológica. Em muitos casos, a seletividade da ligação do fármaco a determinados receptores também estabelece os efeitos indesejáveis (adversos) de um fármaco. Em geral, os fármacos são moléculas químicas que interagem com componentes moleculares específicos de um organismo, produzindo alterações bioquímicas e fisiológicas dentro deste. Estas estruturas são classificadas como canais iônicos, enzimas, proteínas estruturais e/ou transportadoras ou ainda a receptores. É importante dizer que todas estas estruturas podem ser chamadas de receptor de droga ou fármaco, porém, para que não haja confusão entre uma determinada enzima (ou qualquer outra estrutura) e um receptor propriamente dito, é aconselhável a tratar outras estruturas diferentes de receptor como um sítio alvo ou de ação de drogas ou fármacos, e deixar o termo receptor para as estruturas realmente definidas como tal. Portanto, os estudos de farmacodinâmica baseiam-se no conceito da ligação do fármaco a sua estrutura alvo. Quando um fármaco ou um ligante endógeno (por exemplo, um hormônio ou um neurotransmissor) se liga a seu receptor, por exemplo, pode ocorrer uma alteração da conformação estrutural desta estrutura, e esta modificação seria a responsável pela ativação do receptor e indução da resposta. Quando já existir um número suficiente de receptores ligados (ou “ocupados”) sobre uma célula ou no seu interior, o efeito cumulativo dessa “ocupação” dos receptores pode se tornar evidente nessa célula; quando a resposta for desencadeada em muitas células, o efeito pode ser observado em nível do órgão ou até mesmo no paciente. Assim, a equação abaixo descreve que toda substância química possui uma constante de afinidade por sua estrutura alvo: Ka D + R DR Kb onde D é a droga ou o fármaco, R o receptor, DR é o complexo droga-receptor e Ka a constante de afinidade ou ligação droga-receptor e Kb a constante de dissociação droga- receptor. A capacidade de um fármaco em promover a ativação do receptor está relacionada à sua atividade intrínseca, isto é, à sua afinidade e também qualidade de ligação da molécula à estrutura alvo. Esta ação está relacionada à estrutura e nas propriedades químicas das duas estruturas. Muitos autores chamam estas propriedades de sistema chave fechadura. Esta denominação se dá ao fato de cada fármaco (chave) possui um “código” que será reconhecido pela estrutura alvo (fechadura) que possui um “segredo” que responderá apenas com o tipo de ligação da estrutura do fármaco (veja figura abaixo). Analogia ao sistema chave fechadura (A) e afinidade eletroquímica entre uma molécula de um dado fármaco e um receptor (B). (fonte: Francisco Junior, Ciências & Cognição 2009; Vol 14 (1): 121- 143). O local onde o fármaco se liga ao receptor é denominado de sítio de ligação. Cada sítio de ligação de fármacos possui características químicas singulares, que são determinadas pelas propriedades específicas dos aminoácidos que compõem esta região do receptor. A estrutura tridimensional, a forma e a reatividade do sítio, bem como a estrutura inerente, a forma e a reatividade do fármaco, determinam a orientação do fármaco em relação ao receptor e estabelecem a intensidade de ligação entre essas moléculas (Figura a seguir). Esquematização da ligação entre a molécula do hormônio adrenalina com um receptor adrenérgico. Observe que há uma interação entre os radicais hidroxilas da molécula do fármaco com os aminoácidos asparagina (Asp) e serina (Ser) das subunidades protéicas III e V, respectivamente, do receptor. Propriedades farmacológicas dos fármacos. Os fármacos são classificados em conformidade ao tipo de ação que promove sobre os receptores. Assim, o simples fato de saber se determinado fármaco ativa ou inibe o seu alvo, e com que intensidade ele o faz, fornece valiosas informações sobre a interação entre as duas estruturas. Muitos alvos de fármacos podem ser caracterizados em dois estados de conformação, que estão em equilíbrio reversível entre si. Esses dois estados são denominados de estado ativo e estado inativo, ou R* e R, respectivamente. Muitos fármacos podem promover sua ação farmacológica ativando o estado inativo ou bloqueando/inibindo o estado ativo de sua estrutura alvo. Assim, os fármacos podem ser classificados como agonistas e antagonistas, onde: • Agonistas: são moléculas que se ligam a um receptor promovendo alteração de sua estrutura conformacional de forma a estabilizá-la no seu estado ativo. • Antagonistas: são moléculas que podem se ligar ao sítio ativo de um receptor impedindo a ligação do agonista a este, ou ainda, podem ser moléculas que se ligam alostéricamente à estrutura do receptor, impedindo que este seja ativado pelo agonista. Além desta classificação, os agonistas podem ser divididos como se segue: • Agonistas não seletivos: são drogas que não selecionam em qual receptor estará se ligando dentro de um grupo (ex: a adrenalina é um agonista não seletivo para receptores adrenérgicos, pois promove ativação de qualquer um dos tipos e/ou subtipos de receptores (1, 2, 1, 2 e 3). • Agonistas seletivos: são drogas que podem selecionar um grupo de receptores (ex: a adrenalina é um agonista seletivo para receptores adrenérgicos, pois não promove ativação de qualquer outro tipo de receptor) ou selecionar apenas um tipo de receptor dentro de um grupo (ex: nafazolina é um agonista seletivo para receptores do tipo 1-adrenérgico, pois não promove efeito em 2 ou em qualquer um dos receptores ). Entretanto, há agonistas seletivos que quando em concentrações maiores do que as recomendadas terapeuticamente, podem se portar como agonistas não seletivos, como por exemplo, o salbutamol. Este é um agonista seletivo para receptores 2, no entanto, dependendo de sua dose poderá promover ativação de receptores 1. • Agonistas plenos: são drogas que se ligam ao seu respectivo receptor promovendo resposta máxima. Para desencadearem esta resposta, estas substâncias necessitam de pequenas doses, e não é necessário que haja estímulo de todos os receptores presentes na célula. • Agonistas parciais: são agonistas que mesmo em altas concentrações e ocupando 100% da população de receptores (todos os receptores) não promovem resposta máxima. Assim como foi visto anteriormente, os antagonistas podem ser classificados como: • Antagonista competitivo reversível: são fármacos que competem com o agonista pelo mesmo sítio de ligação na estrutura alvo, entretanto, quando a concentração do agonista aumenta, há um deslocamento do antagonista do sítio de ligação e a resposta volta a ser 100%. • Antagonista competitivo irreversível: estes fármacos se ligam de forma covalente (muito forte) ao sítio ativo do receptor, e mesmo ao elevar a concentração do agonista, este não consegue deslocar aquele do sítio de ligação e, portanto, a resposta não atinge os 100%. • Antagonismo alostérico: são moléculas que se ligam alostéricamente ao receptor (fora do sítio ativo), geralmente em uma região lateral ao receptor, impedindo que o agonista possa alterar a conformação estrutural do receptor. Mecanismo de ação de fármacos. Para a maioria dos fármacos, o local de ação é uma macromolécula específica, geralmente denominada estrutura alvo ou receptor, que pode ser uma proteína de membrana, uma enzimacitoplasmática ou extracelular, ou ainda um ácido nucléico. Um fármaco pode ser seletivo a um tecido ou órgão devido à expressão tecidual do seu sítio alvo. Por exemplo, a ação do inibidor da bomba de H+ omeprazol ocorre especificamente nas células parietais que revestem a mucosa gástrica, isto porque é nesta região que ocorre a expressão da K+/H+-ATPase. Por outro lado, fármacos como o manitol (diurético osmótico) não necessita de uma estrutura alvo para se ligar e promover seu efeito farmacológico. Na verdade, como dito anteriormente, moléculas biológicas como canais iônicos, proteínas de membrana, ácidos nucleicos, transportadores de membrana ou plasmáticos, enzimas intra- e extracelulares, são chamadas de alvos de fármacos, ao contrário de receptores. O termo receptor foi proposta pela primeira vez por um químico alemão chamado Paul Ehrlich, há mais de um século quando estava buscando moléculas para serem empregadas especificamente como agentes antiparasitários. Este pesquisador propôs que uma droga se ligaria a um receptor da mesma forma que uma chave se encaixa a uma fechadura, esta teoria ainda é utilizada em diversos estudos até hoje. Sítios de ligação de fármacos: mecanismo de ação de fármacos. No que concerne ao mecanismo de ação, os fármacos podem ser classificados em dois grandes grupos. • Fármacos estruturalmente inespecíficos • Fármacos estruturalmente específicos Mas de forma generalizada, os fármacos devem agir modulando a resposta de componentes estruturais importantes para os diversos mecanismos celulares, entre estas as estruturas alvo podem ser: • Canais iônicos • Transportadores de membranas • Enzimas • Receptores Por outro lado, há situações em que para de obter a resposta desejada, é necessário apenas alterar o contexto fisiológico do tecido ou local de ação. Por exemplo, os antiácidos são utilizados para neutralizar o HCl em excesso na luz gástrica, não necessita de interagir com nenhuma estrutura física celular para aliviar o desconforto estomacal em crise de gastrite ou úlcera, ao contrário de drogas como os bloqueadores da bomba de prótons, que dependem de inibir a atividade deste sistema (transportador de H+). Referências 1) CRAIG, C. R.; STITZEL, R. E. Farmacologia Moderna com Aplicações Clínicas. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2005. 832 p. 2) FUCHS, F. D.; WANNMACHER, L. E FERREIRA, M. B. C.. Farmacologia Clínica: Fundamentos da Terapêutica Racional. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2004. 1096 p. 3) GOLAN, D. E. et al. Princípios de Farmacologia: a Base Fisiopatológica da Farmacoterapia. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2009. 922 p. 4) GRAHAME-SMITH, D. G; ARONSON, J. K. Tratado de Farmacologia Clínica e Farmacoterapia. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 640 p. 5) HARDMAN, J. G; LIMBIRD, L. E; MOLINOFF, P. B. GOODMAN & GILMAN: As Bases Farmacológicas da Terapêutica. 10 ed. Rio de Janeiro: Mac Graw Hill, 2003. 1647 p. 6) KATZUNG, B. G.; Farmacologia Básica & Clínica. 9 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. 1068 p. 7) LAMATTINA, J. C., GOLAN, D. E. Farmacocinética. In: GOLAN, D. E. Princípios de farmacologia: a base fisiopatológica da farmacoterapia. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009, pp. 28–45. 8) LAUBANE, J.P. Farmacocinética. São Paulo: Editora Andrei, 1993. 193p. 9) LEBLANC, P.P. Tratado de Biofarmácia e Farmacocinética. Lisboa: Instituto Piaget, 1997. 419p. 10) MINNEMAN, K. P.; WECKER, L. Brody: Farmacologia Humana. 4 ed. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda, 2005, 724p. 11) RANG, H. P.; DALE, M. M.; RITTER, J. M.; Farmacologia. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. 904 p. 12) SILVA, P.; Farmacologia. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. 1400 p. 13) RAFFA, R. B.; RAWLS, S. M.; BEYZAROV, E. P. Atlas de farmacologia de Netter. Porto Alegre: Artmed editora SA. 2005. 410p. 14) TANIGUCHI, C; GUENGERICH, P. Metabolismo dos fármacos. In: GOLAN, D. E. et al. Princípios de farmacologia: a base fisiopatológica da farmacoterapia. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. 15) LÜLLMANN, H.; MOHR, K.; HEIN, L.; BIEGER, D. Farmacologia: texto e atlas. 5 ed. Porto Alegre: Artmed editora SA., 2005. 416 p.
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