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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo FÁBIO BLAS MASUELA ESTUDO DA ÁGUA NÃO EVAPORÁVEL NA HIDRATAÇÃO DO CIMENTO PORTLAND COM ESCÓRIA DE ALTO FORNO POR MEIO DE ANÁLISE TÉRMICA CAMPINAS 2016 FÁBIO BLAS MASUELA ESTUDO DA ÁGUA NÃO EVAPORÁVEL NA HIDRATAÇÃO DO CIMENTO PORTLAND COM ESCÓRIA DE ALTO FORNO POR MEIO DE ANÁLISE TÉRMICA Dissertação de mestrado apresentada a Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de Mestre em Engenharia Civil, na área de Construção. Orientadora: Profª. Drª. Gladis Camarini ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELO ALUNO FÁBIO BLAS MASUELA E ORIENTADA PELA PROFª. DRª. GLADIS CAMARINI. ASSINATURA DA ORIENTADORA CAMPINAS 2016 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE ENGENHARIA CIVIL, ARQUITETURA E URBANISMO ESTUDO DA ÁGUA NÃO EVAPORÁVEL NA HIDRATAÇÃO DO CIMENTO PORTLAND COM ESCÓRIA DE ALTO FORNO POR MEIO DE ANÁLISE TÉRMICA Fábio Blas Masuela Dissertação de Mestrado aprovada pela Banca Examinadora, constituída por: Profa. Dra. Gladis Camarini Presidente e Orientadora/FEC-UNICAMP Prof. Dr. Paulo José Rocha de Albuquerque FEC-UNICAMP Profa. Dra. Mônica Pinto Barbosa PUC-Campinas A Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno. Campinas, 29 de Setembro de 2016 AGRADECIMENTOS A Deus, por mais esta oportunidade de aprendizado e crescimento pessoal. À minha orientadora Profa. Dra. Gladis Camarini, pela oportunidade de crescimento e aprendizado dados a mim, ampliando meu conhecimento e por ter contribuído muito pela ampliação do meu conhecimento. À Faculdade de Engenharia de Sorocaba, FACENS, ao Laboratório de Ensaios de Materiais (LEMAT) e aos alunos e funcionários, à Engª Karina Leonetti Lopes, à Engª Aline Heloá de Souza que contribuíram para a realização de diversas etapas deste trabalho. Ao Prof. Dr. José Antônio de Milito, Coordenador do curso de Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia de Sorocaba, pelo apoio e incentivo, e por ser importante mediador para a realização deste trabalho. Ao Laboratório de Materiais de Construção (LMC), da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) e ao Laboratório de Recursos Analíticos e de Calibração (LRAC) da Faculdade de Engenharia Química (FEQ), ambos da UNICAMP. A toda minha família, em especial aos meus pais, Ari e Sandra, pelo apoio, incentivo, amor e exemplo. À minha namorada Daiana, pelo apoio e força. Aos meus amigos e colegas pelo apoio, pelas conversas e risadas. RESUMO O concreto de cimento Portland é um dos materiais mais utilizado no mundo. Neste aspecto é de interesse técnico conhecer os mecanismos da cinética de hidratação do cimento Portland, uma vez que, atualmente, o mercado consome cada vez mais cimento Portland com adições minerais. O presente trabalho teve por objetivo investigar a água não evaporável e o grau de hidratação do cimento Portland com adição de escória de alto forno em temperaturas de cura de 20 °C, 40 °C e 60°C em pastas e argamassas com relações água/cimento 0,3 e 0,5. Os cimentos utilizados foram CP II E, CP III e CP V ARI de dois fabricantes, avaliados nas idades de 7, 28 e 90 dias. Para as pastas de cimento, foram realizados os ensaios de perda ao fogo a 600 °C e a 1000 °C, e análise termogravimetrica, ambos para obtenção da água não evaporável do cimento Portland. Para as argamassas foram ensaiadas a resistência à compressão e permeabilidade ao ar. De acordo com os resultados obtidos, os cimentos Portland com adições de escória de alto-forno apresentaram velocidade de reação inferior aos demais cimentos; entretanto, quando submetidos à cura térmica, apresentaram maior resistência à compressão. A análise estatística mostrou que há pouca divergência entre os dois fabricantes e conclui-se que é possível determinar o grau de hidratação por meio do ensaio de perda ao fogo a 600 °C e a 1000 °C. Palavras-chave: Grau de hidratação, Cimento Portland, Escória de Alto-forno, Cura Térmica, Água não Evaporável. ABSTRACT The Portland cement concrete is one of the most commonly used material worldwide. In this sense, it is of technical interest to learn about the mechanisms of hydration kinetics of Portland cement, since the market is currently consuming more and more Portland cement with mineral additions. The purpose of this work was to investigate the contents of non-evaporable water and the degree of hydration of Portland cement with addition of blast furnace slag at curing temperatures of 20°C, 40°C and 60°C for pastes and mortars with water/cement ratios of 0.3 and 0.5. The CP II E, CP III and CP V ARI cements from two manufacturers were studied at the ages of 7, 28 and 90 days. For cement pastes, the tests of loss on ignition were analyzed at 600°C and at 1,000°C, as well as thermogravimetric analysis to get the non-evaporable water contents in Portland cement. For mortars, it were made compressive strength and air permeability tests. According to the obtained results, the speed of reaction of Portland cements with blast furnace slag additions was lower than that the ones without slag. However, when exposed to thermal curing, these cements have higher values of compressive strength. The statistical analysis has shown that there is little divergence between both manufacturers, and the conclusion is that it is possible to determine the degree of hydration by means of loss on ignition test at 600°C and at 1,000°C. Keywords: Degree of hydration, Portland Cement, Blast Furnace Slag, Thermal Curing, Non-evaporable water. LISTA DE FIGURA Figura 2.1 – Ensaio de Calorimetria do C3S .............................................................. 25 Figura 2.2 – Comparação do grau de hidratação entre o C3S e C2S em função do tempo..........................................................................................................................27 Figura 2.3 – Desenvolvimento da microestrutura durante a hidratação do cimento Portland .................................................................................................................... 31 Figura 2.4 – A) CaO-Al2O3-SiO2 diagrama ternário de materiais do cimento. B) As fases dos hidratos do sistema CaO-Al2O3-SiO2 ........................................................ 33 Figura 4.1 – Influência das condições de cura na resistência à compressão do concreto .................................................................................................................... 51 Figura 5.1 – Abordagem experimental ...................................................................... 55 Figura 5.2 – Aparelho de Vicat e as pastas em moldes com tampa .......................... 58 Figura 5.3 – Esquema do tamanho das amostras ..................................................... 60 Figura 5.4 – Esquema do aparelho de permeabilidade ao ar .................................... 61 Figura 5.5 – Amostras de pasta na mufla .................................................................. 63 Figura 5.6 – Analisador termogravimétrico ................................................................ 64 Figura 6.1 – Resultados de Wn de F1 aos 7 e 28 dias com cura a 20 °C para PF a 600 °C e 1000 °C ...................................................................................................... 67 Figura 6.2 - Resultados de Wn de F1 aos 7 e 28 dias com cura a 40 °C para PF a 600 °C e1000 °C ...................................................................................................... 68 Figura 6.3 – Resultados de Wn de F1 aos 7 e 28 dias com cura a 60 °C para PF a 600 °C e a 1000 °C ................................................................................................... 69 Figura 6.4 – Resultados de Wn de F2 aos 7 e 28 dias com cura a 20 °C para PF a 600 °C e a 1000 °C ................................................................................................... 71 Figura 6.5 – Resultados de Wn de F2 aos 7 e 28 dias com cura a 40 °C para PF a 600 °C e a 1000 °C ................................................................................................... 72 Figura 6.6 – Resultados de Wn de F2 aos 7 e 28 dias com cura a 60 °C para PF a 600 °C e a 1000 °C ................................................................................................... 73 Figura 6.7 – Gráfico de quantidade de F1=F2 x resultados dos ensaios de PF ........ 76 Figura 6.8 – Resultados de TG aos 28 dias com cura a 40 °C ................................. 77 Figura 6.9 – Comparação das técnicas de ensaio de TG e PF para os cimentos ..... 78 Figura 6.10 – Resultados de "x" em função de Wn ................................................... 79 Figura 6.11 – Resultado de resistência a compressão dos cimentos do Fabricante 1 com relação a/c 0,3 ................................................................................................... 81 Figura 6.12 – Resultado de resistência à compressão dos cimentos do Fabricante 1 com relação a/c 0,5 ................................................................................................... 83 Figura 6.13 – Resultado de resistência à compressão dos cimentos do Fabricante 2 com relação a/c 0,3 ................................................................................................... 85 Figura 6.14 – Resultado de resistência à compressão dos cimentos do Fabricante 2 com relação a/c 0,5 ................................................................................................... 87 Figura 6.15 – Resultado de Permeabilidade ao ar para os cimentos do Fabricante 1 com relação a/c 0,5 ................................................................................................... 88 LISTA DE TABELAS Tabela 2.1 – Teores dos compostos do cimento Portland de alto-forno....................35 Tabela 5.1 – Composição química dos cimentos Portland ....................................... .56 Tabela 5.2 – Propriedades físicas dos cimentos Portland ........................................ .56 Tabela 5.3 – Composição dos cimentos Portland conforme ABNT .......................... .57 LISTA DE QUADROS Quadro 2.1 – Reações no processo de produção do clínquer .................................. 22 Quadro 2.2 – Limites usuais de óxidos do Cimento Portland .................................... 22 Quadro 2.3 – Compostos potenciais do Cimento Portland ....................................... 23 Quadro 2.4 – Sequência da hidratação do C3S ......................................................... 26 Quadro 3.1 – Transformação da pasta de cimento submetida a elevadas temperaturas ............................................................................................................. 44 Quadro 3.2 – Comparativo entre região de transformação da pasta de cimento submetidos a elevadas temperaturas ........................................................................ 45 Quadro 4.1 – Períodos mínimos de cura recomendados para concretos de cimento Portland ..................................................................................................................... 52 Quadro 4.2 – Fatores de correção para os períodos mínimos de cura dos concretos ................................................................................................................... 52 Quadro 5.1 – Pastas e temperatura de cura ............................................................. 58 Quadro 5.2 – Corpos de prova do ensaio de permeabilidade ao ar .......................... 62 Quadro 6.1 – Comparação das temperaturas de PF ................................................. 74 Quadro 6.2 – Comparação entre os fabricantes ........................................................ 75 LISTA DE SIMBOLOS ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas água/cimento Relação água/cimento em massa Al2O3 Óxido de alumínio A Óxido de alumínio AFt Fase Etringita AFm Fase Monosulfato a/c Relação água/cimento (em massa) CO2 Dióxido de carbono (gás carbônico) CaO Óxido de cálcio C Óxido de cálcio CaCO3 Carbonato de Cálcio (Calcário) Ca(OH)2 Hidróxido de cálcio (portlandita) CH Hidróxido de cálcio (portlandita) Ca/Si Relação cálcio/silício CaSO4.2H2O Sulfato de cálcio di-hidratado (gipsita) C-S-H Silicato de cálcio hidratado C-A-S-H Silicato de cálcio hidratado com alumínio incorporado CP Cimento Portland CP II E Cimento Portland composto com escória de alto-forno CP III Cimento Portland com escória de alto-forno CP V ARI Cimento Portland de alta resistência inicial Fe2O3 Óxido de ferro F Óxido de ferro Fss Fase Ferrita F1 Fabricante 1 F2 Fabricante 2 LDH Região de desidratação LDX Região de desidroxilação LDC Região de descarbonatação MgO Óxido de magnésio M Óxido de magnésio PF Perda ao fogo SiO2 Óxido de silício S Óxido de silício SO3 Trióxido de enxofre S Enxofre H2O Água H Água TG Termogravimétrica t Tempo em dias UR Umidade relativa do ar 3CaO.SiO2 Silicato tricálcico 2CaO.SiO2 Silicato dicálcico 3CaO.Al2O3 Aluminato tricálcio 4CaO.Al2O3.Fe2O3 Ferroaluminatotetracálcico C3S Silicato tricálcico C2S Silicato dicálcico C3A Aluminato tricálcio C4AF Ferroaluminatotetracálcico Ca3Al2O6.3CaSO4.32H2O Etringita C6AS3H32 Etringita C4ASH18 Monosulfato Wn Água não evaporável obtida por ensaio Wn7 Água não evaporável obtida por ensaio na idade de 7 dias Wn28 Água não evaporável obtida por ensaio na idade de 28 dias Wn90 Água não evaporável obtida por ensaio na idade de 90 dias x Valor teórico de água não evaporável α Grau de hidratação ϴ Temperatura de cura SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 16 1.1 Justificativa ....................................................................................................... 17 1.2 Objetivo Geral .................................................................................................... 18 1.3 Objetivos Específicos ...................................................................................... 18 1.4 Delimitação ....................................................................................................... 19 1.5 Estrutura do Trabalho ...................................................................................... 20 2. CIMENTO PORTLAND ......................................................................................... 21 2.1 Matérias-Primas, Produção e Compostos Potenciais .................................... 21 2.2 Hidratação do Cimento Portland ...................................................................... 24 2.2.1 Hidratação dos silicatos .................................................................................... 24 2.2.2 Hidratação dos aluminatos ............................................................................... 28 2.2.3 Desenvolvimento da microestrutura ................................................................. 29 2.3 Cimento Portland com Adição Mineral ............................................................ 32 2.3.1 Cimento Portland com escóriade alto-forno .................................................... 34 3. GRAU DE HIDRATAÇÃO ..................................................................................... 37 3.1 Influência da Composição Química do Cimento e Presença de Adições Minerais .................................................................................................................... 38 3.2 Influência da Finura do Cimento ...................................................................... 39 3.3 Influência da Relação Água/Cimento............................................................... 40 3.4 Influência da Temperatura de Cura ................................................................. 42 3.5 Determinação do Grau de Hidratação Por Meio de Técnicas Para Determinação da Água Não Evaporável ................................................................ 43 4. CURA .................................................................................................................... 49 4.1 Cura Úmida ........................................................................................................ 50 4.2 Cura Térmica ..................................................................................................... 53 5. MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................... 55 5.1 Materiais ............................................................................................................. 56 5.1.1 Misturas experimentais e cura .......................................................................... 57 5.2 Métodos de Ensaios .......................................................................................... 59 5.2.1 Resistência à compressão ............................................................................... 59 5.2.2 Permeabilidade ao ar ....................................................................................... 59 5.2.3 Perda ao fogo ................................................................................................... 62 5.2.4 Análise termogravimétrica ................................................................................ 63 5.2.5 Determinação da água não evaporável teórica ("x") ........................................ 64 5.3 Análise Estatística ............................................................................................. 65 6. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 66 6.1 Análise da Água Não Evaporável no Ensaio de Perda ao Fogo .................... 66 6.1.1 Fabricante 1 ..................................................................................................... 66 6.1.2 Fabricante 2 ..................................................................................................... 70 6.1.3 Comparação entre as temperaturas de perda ao fogo a 600 °C a 1000 °C ..... 74 6.1.4 Comparação entre os fabricantes .................................................................... 75 6.2 Análise da Água Não Evaporável no Ensaio de Termogravimetria .............. 77 6.3 Água Não Evaporável Teórica ("x") / Grau de Hidratação ............................. 79 6.4 Resistência à Compressão ............................................................................... 80 6.4.1 Fabricante 1 - a/c 0,3........................................................................................ 80 6.4.2 Fabricante 1 - a/c 0,5........................................................................................ 82 6.4.3 Fabricante 2 - a/c 0,3........................................................................................ 84 6.4.4 Fabricante 2 - a/c 0,5........................................................................................ 86 6.5 Permeabilidade ao Ar da Argamassa .............................................................. 88 7. CONCLUSÕES ..................................................................................................... 90 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 93 APÊNDICE ............................................................................................................. 101 Apêndice A ............................................................................................................ 102 Apêndice B ............................................................................................................. 105 Apêndice C ............................................................................................................. 107 Apêndice D ............................................................................................................. 109 Apêndice E ............................................................................................................. 111 Apêndice F ............................................................................................................. 113 Apêndice G ............................................................................................................ 116 Apêndice H ............................................................................................................. 118 Apêndice I .............................................................................................................. 123 16 1. INTRODUÇÃO O conhecimento das propriedades do cimento é de fundamental importância para compreender os mecanismos de hidratação, a fim de que se desenvolvam novos produtos que proporcionem redução do impacto ambiental e melhor qualidade (SCRIVENER; NONAT, 2011). A construção civil consome grande quantidade de recursos naturais, sendo o concreto o maior responsável desta indústria por isso. O cimento utilizado no concreto libera aproximadamente 1t de CO2 por tonelada de clínquer produzido, assim contribui em torno de 6% do total de CO2 emitido anualmente na atmosfera (ISAIA; GASTALDINI, 2004). O gás CO2 é o principal causador do efeito estufa que contribui para o aquecimento do planeta. Para amenizar a emissão desse gás é crescente o estudo de adição mineral em cimentos para concreto e argamassa. Estes materiais proporcionam uma redução de emissão de CO2 por tonelada de material cimentício por se tratar de um processo que gasta menos energia, além de ser um meio de utilizar subprodutos de outros processos industriais (LOTHENBACH et al., 2011). O uso de adições minerais em cimentos é grande, em especial a escória de alto-forno. A escória de alto-forno no passado já representou um custo para a indústria siderúrgica, uma vez que era necessário realizar o descarte desse material. No entanto, com o avanço dos estudos (CAMARINI; CINCOTTO, 1995; CAMARINI, 1995; CHEN, 2007; LOTHENBACH et al., 2011; SAJEDI; RAZAK, 2011; KOLANI et al., 2012), a escória se tornou um importante insumo na indústria cimenteira, utilizado como adição ao cimento Portland proporcionando resultados satisfatórios de resistência mecânica e durabilidade. Apesar de a escória de alto-forno melhorar as propriedades mecânicas e a durabilidade do cimento, seu uso deve ser criterioso pois tais características são desenvolvidas lentamente. Para isso, o emprego da cura térmica vem se consolidando para acelerar a reação de hidratação para cimento Portland com escória de alto forno (CAMARINI; CINCOTTO, 1995; BARBOSA et al., 2005; CAMARINI, 2011). 17 A escória de alto forno não pode interferir na qualidade do cimento Portland em diferentes fabricantes a fim de não apresentar divergências nos produtos finais. Tais divergências dos resultados podem ocorrer por influência da composição química, finura, relação a/c e temperatura de cura. Uma forma eficiente de analisar às influências do grau de hidratação do cimento Portland é estudar a quantidadede água não evaporável por meio de análises térmicas (HUANHAI, 1993; LAM; WONG; POON, 2000; AMEN, 2011; NARMLUK; NAWA, 2011). É importante que as técnicas para controle da qualidade dos produtos hidratados sejam rápidas e eficientes para que o andamento das obras não dependa desses resultados. O respeito às normas de projetos, execução e manutenção das estruturas de concreto devem ser levadas em conta (HANAI, 2005). Desta forma, o mercado consumidor espera novas tecnologias do cimento e que as construções apresentem desempenho durável com longo período de vida útil (SCRIVENER; KIRKPATRICK, 2008). 1.1 Justificativa O interesse em estudar a hidratação do cimento abrange tanto o campo acadêmico como o prático. Do ponto de vista acadêmico há uma busca pelo entendimento de fenômenos químicos e microestruturais que influenciam na hidratação do cimento, pois estas características são complexas e interdependentes. O prático é pelo crescente consumo de cimentos com adições minerais motivados pela busca de materiais sustentáveis, econômicos e principalmente duráveis. A escolha do tema foi motivada pela importância que o cimento Portland com escória de alto-forno proporciona na durabilidade das construções, além de estar associado aos aspectos de sustentabilidade. A suspeita de divergência da qualidade de cimento Portland de diferentes fabricantes também motivou este estudo. Divergência entre fabricantes que podem ser influenciada pela composição química dos cimentos, finura, relação a/c e temperatura de cura. Para este trabalho foram selecionados três cimentos, de dois fabricantes, foi para verificar a influência da quantidade de escória de alto forno no cimento Portland. Assim, foram utilizados cimentos com diferentes quantidades de escória: o 18 cimento CP V é o cimento sem adição, o CP II E é o cimento com quantidade intermediária e o CP III o cimento com maior teor de escória de alto forno. A relação a/c 0,3 refere-se aos valores mínimos necessários para hidratação da pasta de consistência normal e a relação a/c 0,5 representa o valor comum utilizado na produção do concreto. Além das relações a/c, a escolha de três temperaturas de cura para simular ambientes distintos de utilização. Temperatura de cura a 20 °C como temperatura ambiente normal, 40 °C para simular temperatura presente em dias de sol nas obras brasileiras e 60 °C a fim de verificar a técnica de cura térmica, além de ser possível tais temperaturas atingirem os materiais em sua execução. As influências no desenvolvimento da hidratação podem ser comparadas e identificadas na determinação do grau de hidratação. Para isto, foi escolhida a técnica de perda ao fogo a 600 °C e a 1000 °C para obtenção da água não evaporável e consequentemente o grau de hidratação. 1.2 Objetivo Geral O objetivo deste trabalho experimental foi comparar as influências na água não evaporável para determinar o grau de hidratação do cimento Portland com escória de alto forno por meio de análises térmicas. 1.3 Objetivos Específicos a) Avaliar as propriedades físicas e mecânicas das pastas e argamassas, para as relações água/cimento de 0,3 e 0,5; b) Analisar os valores de água não evaporável por meio de ensaios de determinação de perda ao fogo a 600 °C e a 1000 °C, e também com ensaios de termogravimetria; 19 c) Comparar os resultados de água não evaporável entre as idades, as temperaturas de perda ao fogo, as relações a/c, as temperaturas de cura e os diferentes cimentos de dois fabricantes; d) Avaliar a eficiência do ensaio de perda ao fogo a 600 °C em relação a perda ao fogo a 1000 °C e a termogravimetria; e) Avaliar as diferenças do grau de hidratação existentes entre os mesmos tipos de cimento produzidos por diferentes fabricantes. 1.4 Delimitação Para a realização do trabalho, escolheu-se três tipos de cimento de dois fabricantes. O cimento CP V - ARI (CP V) como cimento de referência, ou seja, sem adição de escória de alto-forno. O cimento CP II - E 40 (CP II E) por limitar sua adição de escória em 34% de sua massa, e o cimento CP III 40 RS (CP III) por ter até 70% de escória de alto-forno. Todos estes cimentos são usualmente utilizados nas construções. Avaliou-se a água não evaporável por meio dos ensaios de perda ao fogo para pastas de cimento nas idades de 7 e 28 dias. Para corroborar com este ensaio, foi realizado o ensaio de termogravimetria para um tipo de pasta para os três cimentos na idade de 28 dias. O trabalho limitou-se às relações a/c de 0,3 e 0,5 para as pastas e argamassas para os três cimentos dos dois fabricantes. As pastas foram utilizadas para os ensaios de perda ao fogo e termogravimetria, e as argamassas de resistência à compressão e permeabilidade. Para todos os casos, pastas e argamassas foram ensaiadas em recipientes fechados e expostos em temperatura de cura de 20 °C, 40 °C e 60 °C por vinte e quatro horas, após inicio da pega. Passado este processo, as amostras permaneceram em câmera úmida até a data dos ensaios. 20 1.5 Estrutura do Trabalho Este trabalho inicia-se com a Introdução (Capítulo 1), onde foram apresentadas as considerações iniciais, a justificativa, os objetivos e a delimitação para realização do trabalho. No Capítulo 2, é feita uma revisão sobre o Cimento Portland, a matéria prima para sua produção, o processo de produção, seus compostos potenciais e seu mecanismo de hidratação. Também é apresentado o desenvolvimento da hidratação para o Cimento Portland com escória de alto-forno. O Capítulo 3 aborda os aspectos do grau de hidratação do Cimento Portland, desde fatores que influenciam o grau de hidratação até as técnicas para determinação do mesmo. No Capítulo 4, encerram-se os capítulos da revisão da literatura descrevendo sobre o processo de cura para hidratação do Cimento Portland. São apresentados os tipos de cura e a importância de se conhecer as técnicas de cura úmida e térmica. No Capítulo 5, apresenta-se a metodologia empregada para avaliação das propriedades dos diferentes tipos de Cimento Portland, descrição dos métodos de ensaio, procedimentos e equipamentos que foram utilizados durante a realização desta pesquisa. No Capítulo 6, são discutidos e analisados os resultados experimentais dos ensaios realizados de PF, TG, resistência à compressão e permeabilidade ao ar. Essas propriedades são avaliadas em função da relação a/c, temperatura de cura, teor de escória e idade de hidratação, para os dois fabricantes, F1 e F2, além de serem realizadas comparações entre elas. Por meio de análise estatística é feita a comparação entre os cimentos dos dois fabricantes, e também a relação entre as técnicas de PF e TG para determinar o grau de hidratação. No Capítulo 7, são apresentadas as conclusões. 21 2. CIMENTO PORTLAND A indústria cimenteira no Brasil inicia-se no começo do século XX com uma pequena produção que com o passar do tempo foi se consolidando e tornou-se importante para a economia do pais. Nos anos 70 a indústria foi impulsionada ao crescimento em um cenário conhecido como “milagre econômico”, na qual triplicou a produção do cimento neste período. Um novo ciclo de crescimento é registrado a partir do ano de 2004 até 2013, tornando o Brasil o sexto maior produtor e o quarto maior consumidor de cimento no mundo (KIHARA; VISEDO, 2014). 2.1 Matérias-Primas, Produção e Compostos Potenciais O cimento Portland é um aglomerante hidráulico produzido por meio da calcinação da mistura do calcário e argila, ou outros materiais similares e suficientemente reativos, a uma temperatura de 1450 °C (TAYLOR, 1990). O Calcário (CaCO3) é a fonte de óxido de cálcio do cimento. A argila é a fonte de sílica (SiO2), óxido de alumínio (Al2O3) e óxidos ferrosos (Fe2O3), sendo estas as principaismatérias primas do cimento (RAMACHANDRAN, 2002). Esses materiais moídos e calcinados sofrem uma fusão incipiente formando um novo material conhecido como clínquer (NEVILLE, 1997). Na produção do clínquer ocorrem as seguintes reações e transformações conforme Quadro 2.1. 22 Quadro 2.1 - Reações no processo de produção do clínquer Temperatura Reações / Transformações 100 °C Liberação de água livre 750 °C Zona de pré-aquecimento: Liberação de água fortemente ligada a argila 750 °C -1000 °C Zona de calcinação: Dissociação do carbonato de cálcio 1000 °C - 1450 °C Fusão parcial da mistura: Formação do silicato tricálcico e silicato dicálcico do clínquer 1450 °C - 1300 °C Zona de esfriamento: Formação do aluminato tricálcico e ferroaluminato tetracálcico Fonte: Adaptado de Ramachandran, 2002. No final do processo de produção do cimento Portland, após o resfriamento, ocorre a moagem do clínquer em partículas menores que 75 μm misturado com até 5% de gipsita com a finalidade de controle inicial da pega do cimento Portland (MEHTA; MONTEIRO, 2008). Um fator tão importante quanto as proporções dos compostos presentes no clínquer é a finura do cimento Portland. Normalmente, quanto mais fino o cimento, mais rápidas as reações. Admite-se que partículas maiores que 45μm são difíceis de hidratar e partículas maiores que 75μm nunca se hidratam completamente (MEHTA; MONTEIRO, 2008). As abreviações apresentadas no Quadro 2.2 são de uso particular no estudo da química do cimento. Conhecida a porcentagem dos óxidos do cimento (Quadro 2.2), é possível estimar a quantidade de compostos do cimento Portland através das equações de Bogue (MEHTA; MONTEIRO, 2008). O Quadro 2.2 a seguir apresenta os limites usuais de óxidos do cimento Portland. Quadro 2.2 - Limites usuais de óxidos do Cimentos Portland Óxidos Abreviação Teor (%) CaO C 60 – 67 SiO2 S 17 - 25 Al2O3 A 3 - 8 Fe2O3 F 0,5 – 0,6 MgO M 0,5 – 4,0 SO3 S 2,0 – 3,5 Fonte: Neville,1997. 23 O clínquer é formado por novos compostos denominados de compostos potenciais. são eles: Silicato tricálcico (C3S), silicato dicálcico (C2S), aluminato tricálcico (C3A) e o ferroaluminato tetracálcico (C4AF) (Quadro 2.3) (LEA, 2004). Há no clínquer outros compostos (óxidos de magnésio, óxidos de cálcio, compostos alcalinos e sulfatos), mas em menor quantidade. Essa ocorrência, muitas vezes, se dá devido à presença de impurezas dos principais constituintes ou pela transformação indevida em alguma etapa da produção do clínquer (RAMACHANDRAN, 2002). Quadro 2.3 - Compostos Potenciais do Cimento Portland Nome do Composto Composição em óxidos Abreviação Massa cimento (%) Silicato tricálcico 3CaO.SiO2 C3S 50 - 70 Silicato dicálcico 2CaO.SiO2 C2S 15 - 30 Aluminato tricálcico 3CaO.Al2O3 C3A 5 - 10 Ferroaluminatotetracálcico 4CaO.Al2O3.Fe2O3 C4AF 5 - 15 Fonte: Lea, 2004. O C3S, também conhecido como Alita, é o composto mais importante de todos no clínquer do cimento Portland. Este reage relativamente rápido com a água e é o principal responsável pela resistência durante as quatro primeiras semanas (NEVILLE; BROOKS, 2013). O C2S, conhecido como Belita, reage lentamente com a água, contribuindo pouco para o desenvolvimento da resistência durante os primeiros 28 dias, mas contribui consideravelmente para o aumento da resistência em idades mais avançadas. Após um ano, as resistências obtidas pela Alita e Belita podem ser comparáveis (TAYLOR, 1990). O Aluminato tricálcico (C3A) reage rapidamente com a água e pode causar características indesejáveis ao produto hidratado. Para que isso não ocorra é adicionado a gipsita para manter o controle da pega (LEA, 2004). O Ferroaluminatotetracálcico (C4AF) reage com a água e apresenta característica variável, devido às diferenças de composições (TAYLOR, 1990). 24 2.2 Hidratação do Cimento Portland A hidratação do cimento Portland ocorre quando um composto anidro é misturado com água. Os produtos hidratados deverão atender às necessidades de engenharia, tais como resistência mecânica e estabilidade de volume (JUILLAND, 2009). A reação dos constituintes do cimento Portland com a água (hidratação) está associada com mudanças químicas, físicas e mecânicas do material em estágios de início da pega e endurecimento (LEA, 2004). Os principais produtos provenientes da hidratação são os silicatos de cálcio e aluminato hidratados. Os aluminatos hidratam mais rapidamente em vista dos silicatos (MEHTA; MONTEIRO, 2008). Segundo Mehta e Monteiro (2008), devido à rápida reação dos aluminatos, os mesmos são responsáveis pelo enrijecimento e pela pega. Já os silicatos, que correspondem a 75% do clínquer, influenciam na característica de resistência mecânica do cimento. Em contato com ar úmido, o cimento Portland pode iniciar sua hidratação parcial, enquanto que, para sua completa hidratação, é necessária uma quantidade suficiente de água (LEA, 2004). Esta quantidade de água misturada ao cimento forma a pasta, onde ocorre a pega e o endurecimento (TAYLOR, 1990). A pega refere-se a uma perda súbita de plasticidade original em poucas horas sem o desenvolvimento expressivo de resistência mecânica (LEA, 2004), enquanto que o endurecimento trata-se do ganho de resistência à compressão do material em um processo lento e continuo até quando houver material anidro e água para as reações (TAYLOR, 1990). 2.2.1 Hidratação dos Silicatos Os silicatos do cimento Portland, C3S e C2S produzem, na hidratação, silicatos de cálcio hidratados estruturalmente semelhantes. Porém, as relações cálcio/sílica e o teor de água quimicamente combinadas são desproporcionais entre as reações dos silicatos com a água. Assim, apresentarão diferenças pós-hidratação quanto à suas características físicas (MEHTA; MONTEIRO, 2008). 25 A reação do C3S é bem complexa, mas pode ser resumida (Equação 2.1) e sua melhor compreensão pode ocorrer por meio da análise do ensaio de calorimetria (Figura 2.1). (2.1) A hidratação do C3S é exclusivamente exotérmica, sua curva de calorimetria (Figura 2.1) é dividida em cinco fases, que representam as etapas da velocidade de reação (GARTNER et al., 2002). A duração de cada etapa varia em função das características físicas e químicas do composto. Figura 2.1 – Ensaio de Calorimetria do C3S Fonte: Adaptado de GARTNER et al., 2002. As fases 0 e I são conhecidas como o período de pré indução, ou fase inicial, ocorrem imediatamente quando há o contato do C3S com a água, havendo uma intensa liberação de calor com duração de poucos minutos (LEA, 2004). A elevada atividade é atribuída à dissolução do C3S na água (BISHNOI; SCRIVENER, 2009). Esta rápida evolução pode durar entre 15 a 20 minutos (RAMACHANDRAN, 2002). A fase II, chamada de período de indução, apresenta o mínimo da curva de calor, com início do crescimento do C-S-H (GARTNER et al., 2002). Este período é conhecido como período de dormência e pode levar algumas horas, nesta fase o cimento permanece plástico com boa trabalhabilidade (RAMACHANDRAN, 2002). 26 Este período é de extrema importância prática nos canteiros de obra, pois proporciona um tempo para que o concreto ou argamassa sejam transportados e lançados antes de endurecer (SCRIVENER; NONAT, 2011). Na fase III, a reação de hidratação acontece de forma ativa, chegando ao ápice da curva de calor, este período é definido de aceleração (RAMACHANDRAN, 2002). Ocorrem a nucleação e o crescimento do C-S-H (BULLARD et al., 2011). Após atingir a velocidade máxima de hidratação, inicia-se um período de desaceleração (fase IV) de forma gradual, desta maneira, o C3S que não reagiu passa a ser consumido gradualmente (LEA, 2004). A transição da fase IV e V representa a redução da taxa do grau de hidratação, este declínioé constante e lento, e pode levar anos (GARTNER et al., 2002). A sequência de hidratação do C3S pode ser verificada no Quadro 2.4 a seguir: Quadro 2.4 - Sequência da hidratação do C3S Fases das reações Correspondentes fases na produção do concreto Processo químico 0. Reação rápida inicial Primeiro contato com a água Hidrólise de superfície e liberação de íons em solução I. Primeira desaceleração Mistura Formação de C3S, retardando a dissolução II. Período de indução Transporte e lançamento Retardo da Nucleação dos hidratos finais; consumo lento de "retardadores" III. Período de aceleração Pega, início da cura Crescimento acelerado dos principais produtos de hidratação IV. Segunda desaceleração Cura, desforma Crescimento contínuo dos produtos de hidratação em grandes espaços vazios V Reação final lenta Endurecimento lento e contínuo, enquanto a cura úmida continua Densificação gradual da microestrutura em torno do C3S residual não hidratado; recristalização do CH Fonte: Adaptado de GARTNER et al., 2002. O C3S hidrata a uma velocidade maior que o C2S. Na presença da gipsita, o C3S começa a hidratar após uma hora da adição de água ao cimento. Este contribui para o final da pega e início da resistência da pasta. A gipsita tem o 27 objetivo de retardar a hidratação dos aluminatos e, em contrapartida, há uma aceleração na hidratação do C3S (MEHTA; MONTEIRO, 2008). Da mesma forma que no processo de hidratação do C3S, existem incertezas envolvidas na determinação da estequiometria da fase C-S-H encontrada na hidratação do C2S (Equação 2.2) (RAMACHANDRAN, 2002; MEHTA; MONTEIRO, 2008). (2.2) A quantidade de CH formado nesta reação é menor do que a produzida na hidratação do C3S (Equação 2.1). O C2S reage mais lentamente do que o C3S, a diferença no grau de hidratação entre os dois compostos podem ser visto na Figura 2.2, nota-se que o C3S é muito mais reativo que o C2S (RAMACHANDRAN, 2002). Figura 2.2 – Comparação do grau de hidratação entre C3S e C2S em função do tempo Fonte: Adaptado de RAMACHANDRAN, 2002. Continuando a comparação entre os dois silicatos, é possível dividir as mesmas seis fases do C3S (Figura 2.1) para o C2S. As Fases 0 e I são semelhantes, 28 sugerindo que o processo de liberação de calor ocorre ao primeiro contato com a água, e início do primeiro período de desaceleração (GARTNER et al., 2002). O período de indução do C2S é maior, começando na fase II e estendendo-se até a III, podendo durar de 9h a 20 dias. Esta extensa fase III faz com que os períodos das fases III a V sejam diferentes entre os silicatos, com formação do C-S-H em idades mais avançadas (GARTNER et al., 2002). 2.2.2 Hidratação dos Aluminatos Na maioria dos cimentos, os aluminatos tricálcicos (C3A) presentes se encontram em menor quantidade em vista de outros compostos, cerca de 4 a 11% (RAMACHANDRAN, 2002). Porém, sua estrutura e comportamento no cimento são aspectos importantes a serem estudados (NEVILLE, 1997). A reação do C3A puro com a água é rápida. Com grande liberação de calor, formam-se imediatamente hidratos cristalinos, tais como C3AH6, C4AH9 e C2AH8 (LEA, 2004). Para que se tenha utilidade na construção civil, essa reação rápida precisa ser desacelerada de alguma forma. Normalmente, tem-se esse retardo com a presença de gipsita (CaSO4.2H2O) e, desta maneira, as reações de hidratação do C3A individual não têm a mesma importância quanto a desse material junto à gipsita (RAMACHANDRAN, 2002). O C3A tem pouca influência na resistência do cimento Portland e a sua presença pode ser considerada indesejável. Entretanto, esse composto é importante na fabricação do cimento Portland, uma vez que ele atua no forno como fundente, reduzindo a temperatura de calcinação do clínquer e facilitando a combinação da cal com a sílica (NEVILLE, 1997). Os produtos da hidratação do C3A são o trissulfoaluminato de cálcio hidratado ou o monossulfoaluminato de cálcio hidratado (RAMACHANDRAN, 2002). O primeiro a se cristalizar é a etringita (C6AS3H32), em forma de agulhas prismáticas. Em seguida, forma-se o monossulfaluminato de cálcio (C4ASH18), cristaliza-se como placas hexagonais delgadas (LEA, 2004). Nas reações do cimento Portland, é conveniente verificar o C3A em conjunto com o C4AF, pois os produtos formados pelos dois, quando reagem com a água e na presença de sulfatos, são estruturalmente semelhantes. Um exemplo da 29 reação do C4AF com sulfato na hidratação são os produtos C6A(F)S3H32 ou C4A(F)SH18, que têm estrutura similar à etringita e ao monossulfoaluminato, respectivamente, apesar de terem composições químicas diferentes (MEHTA; MONTEIRO, 2008). 2.2.3 Desenvolvimento da Microestrutura As características da microestrutura das pastas de cimento têm muitas semelhanças com as pastas de C3S. Assim, é conveniente considerar o processo em início, meio e final do período de hidratação (TAYLOR, 1990). A razão de se estudar o C3S está no fato de que esse constituinte representa a maior parte do cimento Portland, como visto anteriormente (RAMACHANDRAN et al., 2002). O C3S tende a dominar o período de hidratação inicial que corresponde ao desenvolvimento de resistência, pois é o principal componente pela formação de silicato de cálcio hidratado (C-S-H), o principal produto da hidratação (BULLARD et al., 2011). A Figura 2.3 representa o desenvolvimento da microestrutura de um grão de cimento elaborado por Scrivener (1984 apud Juilland, 2009). Nos instantes iniciais (Figura 2.3 a), os aluminatos (C3A) reagem com a gipsita, assim formando um gel amorfo na superfície do grão do cimento, e então começam a formar os cristais de etringita (TAYLOR, 1990). Neste período, acontece uma rápida reação exotérmica do C3S com a água, e o calor é liberado pela dissolução do C3S (BULLARD et al., 2011). Em seguida ao instante inicial (Figura 2.3 b), a hidratação desacelera e começa o período de indução (TAYLOR, 1990). Esta desaceleração é causada pela rápida formação de uma camada fina, porém contínua e metaestável de uma fase de silicato de cálcio hidratado chamado de C-S-H(m), que bloqueia a superfície restringindo o seu acesso à água ou limitando a difusão ao separar os íons internos com a superfície (JENNINGS; PRATT, 1979). A hipótese de barreira metaestável implica que o hidrato metaestável isola a alita subjacente a partir da solução que, em seguida, entra em equilíbrio com o hidrato. Há outro ponto de vista, no qual se forma uma camada de íons hidroxila na superfície do C3S em contato com a água. Desta forma, a dissolução dos íons a partir desta camada ocorre mais lentamente em vista do esperado para um mineral 30 com solução altamente subsaturada (BARRET; MÉNÉTRIER, 1980; BARRET et al., 1983). Garrault-Gauffinet e Nonat (1999) acrescentam que as reações iniciais são baseadas em um equilíbrio de estado estacionário entre dissolução lenta de C3S e crescimento inicialmente lento do C-S-H. De acordo com estes autores, a superfície do C3S tem uma solubilidade aparente menor do que a esperada para o mesmo, e a taxa de dissolução decresce muito rapidamente quando aumenta a concentração do hidróxido de cálcio. Quando forma uma solução de supersaturação, o C-S-H nucleia-se rapidamente em superfície de C3S e começa a crescer lentamente devido a pequena área de superfície inicial. O crescimento de C-S-H diminui a concentração de silicato na solução e, assim, aumenta a razão Ca/Si na solução. Dentro de minutos é estabelecida uma solução supersaturada para o C-S-H e subsaturada para o C3S. 31 Figura 2.3 – Desenvolvimento da microestrutura durante a hidratação do cimento Portland Fonte: Adaptado de Scrivener, 1984 apud Juilland, 2009. 32 Bullard et al. (2011) complementam afirmandoque a desaceleração na superfície do C3S encontra-se coberto de forma significativa com C-S-H precipitado, de modo que a taxa de dissolução por unidade de área pode ser rápida, porém, no geral, a taxa de dissolução é baixa. Após o período indução, da ordem de três horas, inicia-se uma nova reação acelerada (Figura 2.3 c), com o desenvolvimento do C-S-H (ALLEN et al., 1987; TAYLOR, 1990; JENNINGS et al., 2007). Ao final do período de aceleração (Figura 2.3 d), o C3S produz um gel externo de C-S-H, crescendo a partir das hastes de etringita e não diretamente das partículas de C3S. Portanto, na fase inicial da reação, os íons de silicato devem migrar através dos aluminatos e compostos ricos em ferro para formar o C-S-H (TAYLOR, 1990). No período de desaceleração (Figura 2.3 e), o C3A continua a reagir com a gipsita, formando os bastões de etringita. A malha de etringita e o C-S-H formam uma camada hidratante a 1μm da superfície do C3S anidro. Dentro desta camada, forma-se uma pequena quantidade de “C3S interno”, próximo à superfície dos grãos de C3S, diminuindo a distância de 1μm entre a camada hidratante e o C3S anidro (TAYLOR, 1990). Após 15 dias de hidratação (Figura 2.3 f), a distância entre a camada hidratante e o grão de C3S é completamente preenchida com C-S-H, e o “C-S-H externo” torna-se mais fibroso (TAYLOR,1990). 2.3 Cimento Portland com Adição Mineral O uso de adições minerais em cimentos para concreto e argamassa é amplamente utilizado atualmente. O uso de tais materiais leva a uma redução de emissão de CO2 por tonelada de material cimentício por se tratar de um processo que gasta menos energia, além de ser um meio de utilizar subprodutos de outros processos industriais (LOTHENBACH et al., 2011). A Figura 2.4 A apresenta um diagrama dos compostos do cimento. Nesta Figura os diferentes tipos de cimento dentro do diagrama ficam posicionados em função do percentual de massa dos principais composto que representa o ternário de CaO-Al2O3-SiO2. Nela pode-se constatar que os cimentos com adições minerais geralmente apresentam uma característica química com teor de cálcio (vértice 33 inferior esquerdo do triângulo) menor que o cimento Portland sem adições. A resistência e a durabilidade do produto hidratado sofrerão influência por parte dessas adições (SCRIVENER; NONAT, 2011). A Figura 2.4 B mostra esquematicamente as fases dos hidratos formados no sistema CaO-SiO2-Al2O3. Uma característica importante desse diagrama apresenta às possibilidades de formação de C-S-H no cimento, sendo a fase mais importante do cimento hidratado (LOTHENBACH et al., 2011). Figura 2.4 – A) CaO-Al2O3-SiO2 diagrama ternário de materiais do cimento. B) As fases dos hidratos do sistema CaO-Al2O3-SiO2 Fonte: Adaptado de Lothenbach et al., 2011. O silicato de cálcio hidratado de cimentos Portland com adições é diferente quando comparado com o cimento Portland comum (LOTHENBACH et al., 2011). Em estruturas de C-S-H que incorporam o alumínio (C-A-S-H), uma estrutura semelhante à tobermorita é mantida. Os limites apresentados na Figura 2.4 são uma 34 aproximação das possíveis soluções, principalmente a incorporação de alumina, sendo que estas não são muito bem conhecidas (LOTHENBACH et al., 2011). Os cimentos Portland com adições minerais têm a hidratação mais lenta comparada ao cimento convencional, isto porque as adições minerais reagem com o hidróxido de cálcio (reação pozolânica) (METHA; MONTEIRO, 2008). Inicialmente, essa reação é lenta, pois a falta de disponibilidade de hidróxido de cálcio reduz a velocidade de hidratação, uma vez que a reação da adição mineral depende da concentração de hidróxido de cálcio (MOSTAFA; BROWN, 2005). A reação consome os óxidos de cálcio ao invés de produzi-los, colaborando com a durabilidade (DITTRICH et al., 2014). Além disso, a finura das adições realiza o preenchimento dos poros (efeito fíler) contribuindo com a resistência e a impermeabilidade do produto hidratado (METHA; MONTEIRO, 2008). 2.3.1 Cimento Portland com Escória de Alto-Forno A escória de alto-forno é um resíduo não metálico proveniente da produção do ferro-gusa. O ferro-gusa é produzido em altos-fornos de unidades industriais, nas quais se separam as impurezas dos óxidos contidos nos minerais de ferro. As escórias se formam pela fusão das impurezas do minério de ferro, juntamente com a adição de fundentes (calcário e dolomita) e as cinzas do coque. Em seguida, as impurezas são resfriadas e irão formar o que é conhecido como escória de alto-forno (KIHARA; CENTURIONI, 2005). O resfriamento das escórias de alto forno pode ser brusco ou lento. O resfriamento lento irá formar fases cristalinas nas escórias e, assim, perderão suas propriedades cimentantes (MARTINS, 2001). Quando o resfriamento ocorre bruscamente, com água fria ao sair do alto-forno, não há tempo suficiente para a formação dos cristais, resultando em um material predominantemente amorfo e potencialmente reativo. Assim, são moídos para aumentar a reatividade e ser utilizado como adição mineral em substituição do clínquer, uma vez que apresentam propriedades hidráulicas latentes (KOLANI et al., 2012). A utilização de escória na fabricação do cimento Portland traz vários benefícios socioeconômicos e ecológicos, visto que a produção de escória gasta 90% menos de energia comparado com a fabricação do clínquer (COSTA JR, 2010). 35 O cimento Portand com escória de alto-forno pode obter maior impermeabilidade e durabilidade em vista do cimento Portland comum por adquirir uma matriz com menores espaços capilares (MEHTA; MONTEIRO, 2008). A produção de cimento de escória de alto-forno, no Brasil, segue as exigências da norma NBR 5435 (ABNT, 1991), a qual tem como sigla CP III e variação dos componentes conforme Tabela 2.1. Tabela 2.1 - Teores dos compostos do cimento Portland de alto-forno Sigla Classe de Resistência (MPa) Componentes (% em massa) Clínquer + gipsita Escória granulada de alto forno Massa carbonática CP III 25 65-25 35-70 0-5 32 40 Fonte: Adaptado da NBR 5735 (ABNT,1991). Os principais componentes da escória de alto-forno são os mesmos encontrados no cimento Portland (Figura 2.4) (SCRIVENER; NONAT, 2011). As escórias de alto forno podem ser classificadas de acordo com a relação Ca/Si, e sua reatividade é influenciada pelo grau de vitrificação, finura, composição química e mineralógica (CHEN, 2007). Estas influências juntamente com a proporção de escória adicionada ao cimento Portland e a temperatura de cura interfere no grau de hidratação do cimento Portland com escória de alto-forno (LIN; MEYER, 2009). A finura pode proporcionar uma reação mais rápida. Entretanto para o cimento Portland com escória de alto forno, a finura contribui para formação de um produto hidratado com microestrutura mais densa, contribuindo para resistência a compressão em longo prazo (MEHTA; MONTEIRO, 2008). O aumento da proporção de escória adicionada no cimento faz com que o calor de hidratação e a resistência à compressão inicial diminuam, pois a escória hidrata lentamente; por outro lado, eleva a resistência a sulfatos e agentes químicos. A lenta reação de hidratação prolonga o tempo de cura necessário para o cimento Portland (NEVILLE; BROOKS, 2013). Para suprir essa hidratação lenta inicial, é necessário acelerar as reações que podem ocorrer por métodos de ativação mecânica, química e térmica (SAJEDI; RAZAK, 2011). 36 A ativação mecânica se refere à finura da escória de alto-forno ser maior que a do cimento, e a ativação química a alguns produtos químicos com finalidade de ativar o potencial de reatividade dos compostos presentes na escória (SAJEDI; RAZAK, 2011). Na escória de alto forno, o clínquer atua como um ativador químico e a cura térmica como ativador térmico (CAMARINI;CINCOTTO, 1995; CAMARINI, 1995). A ativação térmica é um dos melhores métodos aplicáveis para acelerar as reações de hidratação do cimento Portland, sendo geralmente utilizado em fábricas de pré-moldados, e a aplicação das temperaturas de cura até 80 °C não afetam a microestrutura (SAJEDI; RAZAK, 2010). Este processo acelera as reações aumentando a velocidade de dissolução dos constituintes anidros do clínquer, favorecendo a formação dos compostos hidratados e acelerando o processo de endurecimento das pastas (CAMARINI; CINCOTTO, 1995; BARBOSA et al., 2005; CAMARINI, 2011). O cimento Portland com escória de alto-forno é recomendado para obras de concreto com grande volume de concreto-massa por causa do seu baixo calor de hidratação. Podem ser utilizados em concreto ou argamassas que necessitem de resistência ao sulfato ou água do mar (NEVILLE; BROOKS, 2013). Normalmente, as fábricas desse cimento são em locais onde há grande disponibilidade da escória como matéria prima. Neste capítulo foram abordados os temas relevantes para o estudo do cimento Portland, sua hidratação e características do aglomerante com adições minerais. Tais aspectos são de fundamental importância para o estudo do cimento Portland. A seguir serão abordados o conceito do grau de hidratação do cimento Portland e suas principais influências, que complementam o entendimento do estudo da hidratação do cimento Portland. 37 3. GRAU DE HIDRATAÇÃO O mecanismo de hidratação é um fenômeno complexo que ocorre pelas reações dos compostos do cimento anidro (C3S, C2S, C3A C4AF) com a água (BULLARD et al., 2011), ocorrendo de forma interdependente (SCRIVENER; NONAT, 2011). Em modelos simplificados é comum definir os processos de hidratação em um grau global de hidratação (DARQUENNES et al., 2013). Este grau de hidratação global é a razão entre o teor de cimento hidratado pelo teor de cimento anidro inicial (SHAFIQ, 2011). É um parâmetro que permite acompanhar os processos físicos e químicos da hidratação do cimento e é representado por “α“ (DARQUENNES et al., 2013). A determinação do grau de hidratação auxilia no estudo e controle de qualidade dos produtos a base de cimento. É possível compreender o desenvolvimento da resistência mecânica por meio do grau de hidratação, pois ambos estão associados à idade dos materiais do cimento (LAM et al., 2000). Os fenômenos que ocorrem na hidratação do cimento, tais como desenvolvimento de resistência, geração de calor, estabilidade dimensional são resultados de processos mecânicos, físicos e químicos (LIN; MEYER, 2009). O conhecimento desses processos é fundamental para o estudo do grau de hidratação do cimento Portland, sendo influenciado pelos seguintes fatores (LEA, 2004): - composição química do cimento e presença de aditivos químicos e adições minerais; - finura do cimento, principalmente, pela sua distribuição de tamanho de partículas e superfície específica; - relação a/c utilizada na pasta; - temperatura de cura; Esses fatores serão discutidos a seguir. 38 3.1 Influência da Composição Química do Cimento e Presença de Adições Minerais A composição química do cimento Portland é o fator mais importante e complexo para o estudo da hidratação do cimento, pois as fases constituintes individuais podem ter taxas de reações diferentes, devido à variedade dos compostos e tipos de cimento. Para isto, é determinado o grau de hidratação com o objetivo de identificar e simular essas interações complexas (LIN; MEYER, 2009). Em cimentos compostos, as adições podem participar nas reações de hidratação e contribuir para produtos hidratados. Há dois grupos que normalmente são utilizados para adições: os materiais pozolânicos e potencialmente hidráulicos (ESCALANTE-GARCIA; SHARP, 2004). Os materiais pozolânicos reagem com os hidróxidos de cálcio que são produzidos na hidratação do cimento e os materiais hidráulicos possuem características semelhantes às reações de hidratação do cimento, entretanto necessitam de um ativador mecânico, químico ou térmico para sua reação (SAJEDI; RAZAK, 2011). O interesse na utilização desses materiais está nas vantagens econômica, ambiental e tecnológica que esses produtos podem proporcionar (ESCALANTE-GARCÍA; SHARP, 1998). As principais influências na cinética de hidratação do cimento com adições minerais é o efeito de diluição e o de nucleação heterogênea (LAWRENCE; CYR; RINGOT, 2003). Há um aumento da relação água/aglomerante no efeito de diluição, por causa da diminuição da quantidade de cimento e menor quantidade de cimento hidratado (MONTEAGUDO et al., 2014). A nucleação heterogênea está relacionada às novas partículas que favorecem a reação química; assim, aspectos como distribuição do tamanho de partículas e da composição mineralógica das adições tem influência na hidratação (LAWRENCE; CYR; RINGOT, 2003). Cimento Portland com adição de calcário pode influenciar na aceleração das reações iniciais de hidratação e permitir a formação de monocarbonato, estabilizando a etringita (LOTHENBACH et al., 2008). O efeito estabilizador do calcário na etringita é observado em sistemas a base de gipsita e calcita (KUZEL; PÖLLMANN, 1991), e em cimento Portland contendo apenas calcita (BONAVETTI et al., 2001). A utilidade de uma escória para o cimento Portland depende principalmente de sua reatividade, sendo as principais influências a composição 39 química e a estrutura vítrea (GRUSKOVNJAK et al., 2008). O conhecimento dos efeitos físicos e químicos das composições químicas das escórias e dos ativadores sobre o mecanismo de hidratação proporciona concretos com melhor desempenho mecânico e durabilidade (HAHA et al., 2012). Os cimentos supersulfatados têm uma resistência ao ataque de sulfato e um menor calor de hidratação em relação ao cimento Portland comum (GRUSKOVNJAK et al., 2008). Escórias altamente básicas reagem apenas na presença da gipsita e, para escória com baixo teor de CaO é necessário um ativador adicional, como a portlandita (GRUSKOVNJAK et al., 2008). 3.2 Influência da Finura do Cimento A finura do cimento é outro fator que influencia no grau de hidratação pois melhora a reatividade do aglomerante. Uma elevada finura proporciona maior superfície de contato com a água. Portanto haverá uma maior taxa de hidratação (LIN; MEYER, 2009). Como a hidratação se inicia na superfície do cimento, uma finura elevada terá consequência na velocidade da hidratação. Desta forma, para uma evolução rápida da resistência é preciso um cimento fino; porém, a longo prazo as resistências se igualam (TERMKHAJORNKIT; BARBARULO, 2012). Os cimentos de alta resistência inicial se diferem principalmente pela finura maior em relação aos demais cimentos (METHA; MONTEIRO, 2008). Com maior finura tem-se um aumento significativo da resistência entre os períodos de 10h a 20h, mantendo essa diferença até o 28º dia (NEVILLE, 1997). Na idade de 2 a 3 meses, na mesma condição de cura úmida, as resistências dos cimentos se igualam. Mas ao longo do tempo tem-se o aumento da resistência do cimento com menor finura ultrapassando o de maior finura (NEVILLE, 1997). Os cimentos compostos com filler, uma moagem fina de calcário, contribuem com propriedades físicas do cimento, uma vez que o filler precisa ter aproximadamente a mesma finura do cimento Portland (NEVILLE, 1997). As influências nas pastas são principalmente na trabalhabilidade, densidade, permeabilidade, capilaridade, exsudação ou tendência à fissuração (LOTHENBACH et al., 2008). Quando utilizada uma adição mineral com uma elevada finura no cimento Portland, a adição atua como micro enchimento nas partículas do cimento, 40 podendo reduzir a quantidade de água nos vazios preenchidos pelo material (QING et al., 2007). O grau de hidratação inicial é fortemente afetado pelotamanho das partículas de cimento (MASOERO et al., 2014). Com o aumento da finura, o fim do período de indução e o tempo do segundo pico de liberação de calor são reduzidos (LIU et al., 2015). Apesar de ser esperada uma aceleração devido a maior quantidade de pontos de nucleação, o grau de hidratação inicial não deve alterar o volume disponível para a precipitação (MASOERO et al., 2014). E para partículas que não hidrataram, a taxa de dissolução da superfície é independente do tamanho inicial da mesma (TERMKHAJORNKIT; BARBARULO, 2012). 3.3 Influência da Relação Água/Cimento Na hidratação do cimento Portland, a relação a/c tem uma influência direta no desempenho dos produtos cimentícios (BENTZ, 2006). É comum nos canteiros de obras a adição de água no concreto sem respeitar os parâmetros da NBR 6118 (ANBT, 2014), o que acarreta em uma relação a/c acima do especificado para melhorar a trabalhabilidade do material. Entretanto, essa adição de água pode ocasionar a segregação dos agregados e reduzir o desempenho, tanto da resistência mecânica quanto da durabilidade (KIM et al., 2014). Neste aspecto, há mudança no grau de hidratação por conta da alteração da relação a/c (BENTZ, 2006). A proporção elevada da relação a/c aumenta a velocidade de hidratação no período médio de hidratação. Entretanto, retarda a hidratação em períodos iniciais (LIN; MEYER, 2009). Maior relação a/c resulta em menor resistência à compressão (ZHANG et al., 2015), pois a água que não é consumida na reação de hidratação produz maior quantidade de poros, o que leva à redução desta propriedade (KIM et al., 2014). O aumento da relação a/c proporciona um enfraquecimento da matriz da pasta de cimento devido ao aumento da porosidade e consequente redução da resistência (METHA; MONTEIRO, 2008). A influência da relação a/c na resistência do concreto é expressa na lei de Abrams onde a relação a/c é inversamente proporcional à resistência do concreto (METHA; MONTEIRO, 2008; NEVILLE, 1997). 41 Otimizar a quantidade de água a ser misturada no cimento é uma das principais medidas de resistência e durabilidade do concreto (RAY et al., 2015). Em um processo onde há aumento da relação a/c, pode ocorrer um aumento de permeabilidade, uma vez que essas adições podem aumentar a quantidade de poros no cimento (WANG et al., 2015). A porosidade desempenha um papel importante no transporte de massa e é considerado um índice de durabilidade (KIM et al., 2014). Apesar da relação a/c ser uma das principais causas que influencia na resistência do concreto, ela também afeta a cinética de hidratação do cimento (HU et al., 2014; MASOERO et al.; 2014). Considerando um ponto de equilíbrio entre desempenho e trabalhabilidade, tem-se a relação a/c de 0,4 que satisfaz estes requisitos, segundo Zhang et al. (2015). Teoricamente, o cimento Portland com relação a/c entre 0,35 - 0,40 irá hidratar-se completamente. Contudo, essas relações não são suficientes quando o cimento apresenta em seu interior baixa umidade relativa (LIN; MEYER, 2009; RAMACHANDRAN et al., 2002). Os produtos de hidratação ao redor das partículas de cimento anidro evitam a hidratação se não houver água livre suficiente nos macroporos (JESEN, 1995). Ray et al. (2015) trabalharam com pastas de cimento Portland com relação a/c de 0,3, 0,4, 0,5 e 0,6, assim definiram que as relações a/c 0,4 e 0,5 apresentam reações de hidratação mais controladas que formam um nível de otimização de produtos de hidratação desejado. Kim et al. (2014) trabalharam com argamassa de cimento com relação a/c 0,45 e 0,60, e notaram que a relação a/c 0,45 apresentou melhores resultados de durabilidade em vista da relação a/c 0,6. Estudos experimentais permitem definir o grau de hidratação último (αu) do cimento em função da relação a/c (Equação 3.1) (MILLS, 1966 apud LIN; MEYER, 2009, p. 256). O grau de hidratação último é o valor máximo obtido para o grau de hidratação de um cimento Portland, o que corresponde à máxima combinação entre os compostos anidros com a água. (3.1) 42 3.4 Influência da Temperatura de Cura As temperaturas de cura influenciam na cinética de hidratação do cimento com efeitos benéficos e maléficos, dependendo do procedimento adotado. Temperaturas mais elevadas proporcionam aumento de resistências iniciais. Por outro lado, podem proporcionar estruturas mais porosas com maior permeabilidade e, consequentemente, uma menor durabilidade (CAMARINI; CINCOTTO, 1995; NEVILLE, 1997; LIN; MEYER, 2009; CECCONELLO; TUTIKIAN, 2012). A causa para o aumento da velocidade da hidratação do cimento em função do aumento de temperatura de cura está na influência da temperatura na cinética das reações químicas, proporcionando dissolução e taxas de nucleação ou precipitação e difusão dos hidratos em torno de grãos de cimento anidros mais rápidas (TERMKHAJORNKIT; BARBARULO, 2012). A influência da temperatura está presente desde o lançamento do concreto, por isso a importância da manutenção da temperatura do concreto fresco em concretagens em dias de temperaturas elevadas (CECCONELLO; TUTIKIAN 2012). A rápida hidratação inicial, causada pelas elevadas temperaturas, forma um material mais poroso, pois ocorre uma distribuição não uniforme no gel de cimento modificando sua microestrutura (ESCALANTE-GARCÍA; SHARP, 1998). Com uma temperatura inicial alta, os produtos de hidratação não têm tempo de se afastarem dos grãos de cimento para uma precipitação uniforme nos espaços intersticiais (NEVILLE; BROOKS, 2013). Desta forma, há proximidade dos grãos de cimento com os produtos hidratados, um processo que retarda a hidratação subsequente, e, consequentemente, um ganho de resistência em longo prazo (NEVILLE; BROOKS, 2013). Em baixas temperaturas de cura no concreto, o material adquire resistência mecânica lentamente. Cecconello e Tutikian (2012) compararam temperaturas de cura entre 0 °C a 25°C por 7 dias e verificaram que temperaturas superiores a 20 °C adquirem maior resistência até o 7º dia de cura, entretanto o concreto com cura a 0 °C obteve a maior resistência em 28 dias. A energia de ativação não exerce tanta influência após o 7º dia de cura. O desempenho superior para peças curadas em baixa temperatura justifica-se pelo atraso do início das reações de hidratação, colaborando com a boa formação da matriz do cimento (NEVILLE, 1997; MEHTA; MONTEIRO, 2008). 43 As reações de hidratação dos compostos do cimento Portland, por serem lentas, necessitam da manutenção suficiente da temperatura de cura para proporcionar a energia de ativação necessária para as reações, permitindo que o processo de desenvolvimento de resistência ocorra naturalmente (MEHTA; MONTEIRO, 2008). As temperaturas de cura mais elevadas favorecem a reação pozolânica, resultando em menores quantidades de formação de portlandita (ESCALANTE- GARCIA; SHARP, 2004). Quando a temperatura aumenta de 20 °C para 50 °C, acelera as reações pozolânicas, e a 50 °C a portlandita não tem tempo para se formar devido à rápida formação do C-S-H (DE WINDT et al., 2014). Escalante-Garcia e Sharp (2004) verificaram que na microestrutura das pastas de cimento pozolânicos curados a 60 °C, a quantidade de hidróxido de cálcio foi inferior do que argamassas curadas a 10 °C. Nos casos das temperaturas mais elevadas, a dissolução mais rápida da cristobalita e montmorilonita produz um fornecimento rápido de sílica na solução disponível para formação do C-S-H (DE WINDT et al., 2014). Camarini e Cincotto (1995) estudaram o efeito da cura térmica na resistência de argamassas de cimentos Portland comum e de alto forno, nas quais submeteram as amostras em ciclos de cura térmica a 60 °C, 80 °C e 95 °C. Verificaram que um cimento com escória de alto forno submetido a cura térmica apresenta resultados mais vantajosos que o cimentoPortland comum. E concluíram que a temperatura de cura se faz necessária apenas na fase inicial das reações, após esse período o aquecimento das amostras é desnecessário. 3.5 Determinação do Grau de Hidratação Por Meio de Técnicas Para Determinação da Água Não Evaporável A cinética de hidratação do cimento Portland está relacionada com a idade do cimento ou com o grau de hidratação, ou com ambos (TAYLOR, 1990). Pode-se determinar a evolução da hidratação do cimento das seguintes formas (NEVILLE, 1997): - quantidade de Ca(OH)2 na pasta; - calor desenvolvido na hidratação; 44 - quantidade de água não evaporável (Wn); - quantidade de cimento não hidratado. Foram realizados vários estudos para definir hidratação, por meio de modelos teóricos e ensaios experimentais (HUANHAI, 1993; LAM; WONG; POON, 2000; SCRIVENER et al., 2004; CHEN et al., 2007; WANG; LEE, 2010; WANG; LEE, 2012; NARMLUK; NAWA, 2011; AMEN, 2011; WANG et al., 2012;). Dentre os ensaios experimentais para a determinação do grau de hidratação, o ensaio de determinação da Wn pela técnica da termogravimetria (TG) e perda ao fogo (PF) são amplamente utilizados. A TG é uma técnica que mede a perda progressiva de massa de uma amostra à medida que é aquecida a uma velocidade controlada (RAMACHANDRAN et al., 2002). Desta maneira, pode-se analisar as perdas de massas que ocorrem nas pastas e concretos de cimentos submetidas a elevadas temperaturas (Quadro 3.1) Quadro 3.1 - Transformação da pasta de cimento submetida a elevadas temperaturas Faixa de temperatura Transformações na pasta de cimento 30 °C e 105 °C Liberação da água evaporável. Toda a água evaporável é eliminada até 120 °C 110 °C e 170 °C Decomposição da gipsita e da etringita (perda de água). Perda de água de parte do aluminato hidratado. 180 °C e 300 °C Perda de água da decomposição do C-S-H e do carboaluminato hidratado. 450 °C e 550 °C Perda de água da portlandita (CH = CaOH). 700 °C e 900 °C Descarbonatação do CaCO3, liberando CO2 (fíler, carbonatação da pasta ou do agregado). Fonte: Adaptado de Alarcon-Ruiz et al., 2005. Pane e Hanses (2005) e Bhatty (1986) definiram a perda de massa em três partes: a região de desidratação (LDH), desidroxilação (LDX) e descarbonatação (LDC). Nas duas primeiras ocorre a perda de praticamente toda água quimicamente combinada (água não evaporável) e na LDC ocorre a perda de CO2 do calcário presente no cimento. As temperaturas nessas regiões podem ser vistas no Quadro 3.2. 45 Quadro 3.2 - Comparativo entre região de transformação da pasta de cimento submetidos a elevadas temperaturas Região de transformação Bhatty (1986) Pane e Hanses (2005) Alarcon-Ruiz et al. (2005) Taylor (1990) LDH 105 °C a 440 °C 140 °C a 440 °C 105 °C a 450 °C 105 °C a 370 °C LDX 440 °C a 580 °C 440 °C a 520 °C 450 °C a 550 °C 370 °C a 580 °C LDC 580 °C a 1000 °C 520 °C a 1100 °C 550 °C a 900 °C 580 °C a 1000 °C Fonte: Elaborado pelo autor, 2015. Apesar de serem conhecidas e classificadas as faixas de temperatura, há na literatura trabalhos que determinam a água não evaporável pelo ensaio de perda ao fogo submetendo pastas de cimento Portland a temperaturas de 900 °C a 1000 °C para obtenção do grau de hidratação (HUANHAI, 1993; LAM; WONG; POON, 2000; AMEN, 2011; NARMLUK; NAWA, 2011). Monteagudo et al. (2014) trabalharam com cimentos com adições e analisaram as perdas de massa para medir a quantidade de água não evaporável nas regiões de temperatura descritas por Pane e Hanses (2005) (Equação 3.2) e Bhatty (1986) (Equação 3.3): (3.2) Sendo: - LDH – Perda de massa da região de desidratação, faixa de temperatura de 140 °C a 440 °C. - LDX – Perda de massa da região de desidroxilação, faixa de temperatura de 440 °C a 520 °C. - LDC – Perda de massa da região de descarbonatação, faixa de temperatura de 520 °C a 1100 °C. - LDCa – Perda de massa para o cimento anidro na faixa de temperatura de 520 °C a 1100 °C. (3.3) 46 Sendo: - LDH – Perda de massa da região de desidratação, faixa de temperatura de 105 °C a 440 °C. - LDX – Perda de massa da região de desidroxilação, faixa de temperatura de 440 °C a 580 °C. - LDC – Perda de massa da região de descarbonatação, faixa de temperatura de 580 °C a 1000 °C. Na Equação 3.3, o método relata que 0,41 é o fator de conversão para calcular a água quimicamente combinada derivada da portlandita calcinada. As Equações 3.4 e 3.5 apresentam as reações que ocorrem durante a carbonatação do hidróxido de cálcio (CH) e depois a decomposição de carbonatos. O valor de 0,41 é equivalente a dividir os pesos moleculares de H2O e CO2 (Equação 3.6) (MONTEAGUDO et al., 2014) (3.4) (3.5) (3.6) Outra forma de se definir a Wn é pelo ensaio de PF. Neste caso, calcula- se primeiramente a PF na faixa de temperatura que ocorre a perda da água quimicamente combinada (Equação 3.7) (ABNT, 2012). Assim, tem-se que Wn=PF (AMEN, 2011). (3.7) 47 Sendo: - m1 – massa inicial da amostra, em gramas; - m2 – massa final da amostra após calcinação, em gramas. A NBR NM 18 (ABNT, 2012) acrescenta outro método para determinação da perda ao fogo para cimento com adição de escória granulada de alto-forno na faixa de temperatura de 900 °C a 1000 °C . Há duas equações, uma considerando a correção do sulfeto (Equação 3.8) e a outra considerando a variação do teor de anidrido sulfúrico (Equação 3.9). No entanto, para esse cálculo faz-se necessário o conhecimento da composição química do cimento. (3.8) Sendo: - D, é a porcentagem de SO3, na amostra calcinada; - C, é a porcentagem de SO3, na amostra original; - 0,8, é a relação molar para transformar a diferença de SO3 (D-C) em oxigênio equivalente na oxidação do enxofre; (3.9) Sendo: - E, é a porcentagem de sulfeto na amostra original; - F, é a porcentagem de sulfeto na amostra calcinada; - 2, é a relação molar para transformar a diferença de sulfeto (E-F) em oxigênio equivalente na oxidação do enxofre. Para determinar o grau de hidratação (α) calcula-se a relação entre a água não evaporável (Wn), obtida por meio de ensaio, pelo valor teórico de água não evaporável (“x”) (Equação 3.10). 48 (3.10) O valor teórico “x” para um cimento Portland comum completamente hidratado, em condições ideais, é de 32% (TAYLOR, 1990). Entretanto, para condições usuais, com uma relação a/c superior, e com diferentes tipos de cimento Portland com adições existentes, o valor teórico apresenta variações. Segundo Neville (1997), este valor pode estar entre 18% e 23%, em massa do material anidro. Outros trabalhos utilizaram 23% (AMEN, 2011; HUANHAI, 1993; LAM; WONG; POON, 2000; NARMLUK; NAWA, 2011). Monteagudo et al. (2014) utilizaram 24%, afirmando que variam entre 23% e 25%. Escalante-Garcia (2003) apresentou resultados de 23% para “x” em um cimento puro, afirmando que em cimentos com adições há diferenças nesses valores, pois dependendo das características das adições é necessária água adicional. Neste trabalho, o grau de hidratação do cimento Portland foi calculado com base no modelo de Amen (2011), prevendo também diferentes condições de cura (20 °C, 40 °C e 60 °C). 49 4. CURA A cura do cimento é um procedimento para promover sua hidratação, com objetivo de obter um material de boa qualidade, durável e resistente, devendo ser realizada adequadamente (NEVILLE; BROOKS, 2013). A cura nada mais é do que a manutenção de um teor de umidade e temperatura adequados no produto cimentício desde o início de sua hidratação até o período final em que as propriedades
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