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A consciência e suas alterações Livro: Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais - Paulo Dalgalarrondo Definições de consciência: - Neuropsicológica: O estado de estar desperto, acordado, vígil, lúcido. Trata-se especificamente do nível de consciência. - Psicológica: A soma total das experiências conscientes de um indivíduo em determinado momento. É a dimensão subjetiva da atividade psíquica do sujeito que se volta para a realidade. Na relação do Eu com o meio ambiente, a consciência é a capacidade de o indivíduo entrar em contato com a realidade, perceber e conhecer os seus objetos. - Ético-filosófica: O termo consciência refere-se à capacidade de tomar ciência dos deveres éticos e assumir as responsabilidades, os direitos e os deveres concernentes a essa ética. Trata-se da consciência moral ou ética. A psicologia clássica, com base na teoria sensualista-empirista, compreendia a consciência como algo passivo, uma tábula rasa ou papel em branco. Husserl propõe inverter essa visão meramente passiva da consciência; para ele, o fundamental da consciência é ser profundamente “ativa”, visando o mundo e produzindo sentido para os objetos que se lhe apresentam. Não existiria, então, uma consciência pura, pois ela é necessariamente “consciência de algo”. - A intencionalidade, isto é, o visar algo, o dirigir- se aos objetos, de modo ativo e produtivo, é próprio da consciência na visão fenomenológica. John Searle: - Ele ressalta a importância de articular conceitualmente a consciência com a busca das neurociências contemporâneas de correlatos neuronais dos estados de consciência (CNEC). - O aspecto fundamental da consciência: Seu caráter de unidade qualitativa subjetiva. Mas o que vem a ser isso? - Todo estado de consciência vem acompanhado de um sentimento qualitativo especial. - Experimentar os estados de consciência é também algo essencialmente subjetivo. - Por fim, os estados de consciência são experimentados como um campo de consciência unificado. Assim, unidade, subjetividade e caráter qualitativo são as marcas da experiência dos estados de consciência. Outras características aos estados de consciência: - Esses estados são sempre vivenciados com caráter prazeroso ou desprazível, como experiências totais e globalizantes (caráter gestáltico) - Com um senso de familiaridade que impregna todas as experiências conscientes (mesmo quando vejo uma casa que nunca vi antes, ainda reconheço que é uma casa, sua forma e estrutura me são familiares). Os pintores surrealistas tentaram quebrar tal senso de familiaridade. Sistema reticular ativador ascendente: (SRAA) - Desenvolvido por Moruzzi e Magoun (1949), afirma que a capacidade de estar desperto e agir conscientemente depende da atividade do tronco cerebral e do diencéfalo, os quais exercem poderosa influência sobre os hemisférios cerebrais, ativando-os e mantendo o tônus necessário para seu funcionamento normal. - Se origina no tronco cerebral e sua ação se estende até o córtex, por meio de projeções talâmicas. - Elementos importantes para a ativação cortical: ○ Neurônios da parte superior da ponte - recebem impulsos da maioria das vias ascendentes, as quais trazem estímulos intrínsecos (proprioceptivos e viscerais) e extrínsecos (órgãos dos sentidos: visão, audição, tato, paladar e olfato) - e o mesencéfalo - Lesões ou disfunções no SRAA produzem alterações do nível de consciência e prejuízo a todas as funções psíquicas. Lobo parietal direito: Está intimamente relacionado ao reconhecimento do próprio corpo, dos objetos e do mundo, assim como da apreensão daquilo que, convencionalmente, se denomina realidade. Áreas pré-frontais: São fundamentais na organização da atividade mental consciente. - Finalmente, reconhece-se a importância das interações talamocorticais na ativação e na integração da atividade neuronal cortical relacionada à consciência. - Estão relacionados a alterações do nível da consciência na síndrome denominada delirium (que veremos adiante) as regiões do córtex parietal posterior direito superficial, o córtex pré- frontal bilateral, o córtex fusiforme (ventromedial temporoparietal), o giro lingual, o tálamo anterior direito e os núcleos basais. Também têm sido reconhecidas as conexões talamofrontais e temporolímbicas frontais, em nível subcortical, como importantes na gênese dos quadros de delirium. - Assim, pode-se concluir que, além do SRAA, também o tálamo e as regiões do córtex parietal direito e pré-frontal direito têm importância estratégica para o funcionamento da consciência sobretudo no seu aspecto de nível de consciência. Tálamo: É uma estrutura posicionada singularmente no centro do cérebro para filtrar, integrar e regular as informações que chegam ao cérebro, dados que partem do tronco cerebral e se dirigem ao córtex e ao subcórtex. extensiva e reciprocamente interligado a todas as áreas do córtex cerebral, de forma que uma pequena lesão talâmica pode produzir graves alterações do nível de consciência. - Finalmente, deve-se ressaltar a importância das estruturas encefálicas do lado direito (parietais, frontais e mesmo talâmicas) na origem dos transtornos da consciência. - A consciência demarca um campo, no qual se pode delimitar um foco, ou parte central mais iluminada da consciência, e uma margem (franja ou umbral), que seria a periferia menos iluminada, mais nebulosa, da consciência. - Segundo a psicopatologia clássica, é na margem da consciência que surgem os chamados automatismos mentais e os estados ditos subliminares. - Freud e Breuer (1895), pesquisando com a hipnose os conteúdos esquecidos, reprimidos, de seus pacientes, verificaram que certas ideias que surgiam em estado hipnótico eram intensas, mas isoladas da comunicação associativa com o restante do conteúdo da consciência, organizando-se, então, como uma segunda consciência. Classes do inconsciente (Freud): - Inconsciente verdadeiro: É fundamentalmente incapaz de consciência. Inacessível à evocação voluntária, só tem acesso à via pré-consciente e apenas por meio de uma técnica especial (hipnose, psicanálise, etc.) pode tornar-se consciente. Só se revela por meio de subprodutos que surgem na consciência, as chamadas formações do inconsciente: os sonhos, os atos falhos, os chistes e os sintomas neuróticos. - Pré-consciente: É composto por representações, ideias e sentimentos suscetíveis de serem recuperados por meio de esforço voluntário - Ele é, embora obscuro, a estrutura mental mais importante do psiquismo humano. - Funciona regido pelo princípio do prazer por meio do processo primário em forma de condensação e deslocamento. Atemporalidade: Os processos inconscientes não são ordenados temporalmente, não se alteram com a passagem do tempo, não têm qualquer referência ao tempo. Não existe, aqui, passado, presente ou futuro. Isenção de contradição: No sistema inconsciente, não há lugar para negação ou Embora a importância do SRAA para o nível de consciência seja aceita até hoje, sabe-se agora que várias estruturas mais altas, do telencéfalo, têm participação crítica na gênese da consciência. Verificou-se, por exemplo, que a ação sincrônica de numerosas áreas corticais visuais, que contêm amplas redes neuronais bidirecionais, é uma pré-condição para a visão consciente. dúvida, nem graus diversos de certeza ou incerteza. Princípio do prazer: O funcionamento do inconsciente não segue as ordens da realidade, submete-se apenas ao princípio do prazer. Toda a atividade inconsciente visa evitar o desprazer e proporcionar o prazer, independentemente de exigências éticas ou realistas. A busca do prazer se dá por meio da descarga das excitações,diminuindo-se ao máximo a carga de excitações no aparelho psíquico. Processo primário: As cargas energéticas (catexias) acopladas às representações psíquicas, às ideias, são totalmente móveis. Uma ideia pode ceder à outra toda a sua cota de energia (processo de deslocamento) ou apropriar-se de toda a energia de várias outras ideias (processo de condensação). - O sentido dinâmico não designa apenas o inconsciente como sede de ideias latentes em geral, mas especialmente como sede de ideias que possuem certo caráter dinâmico e atuante. O inconsciente é dinâmico. O sono normal: O sono é um estado especial da consciência, que ocorre de forma recorrente e cíclica nos organismos superiores. - Fases do sono: - Sono sincronizado não-REM: Caracteriza-se por atividade elétrica cerebral síncrona, com elementos eletroencefalográficos próprios, tais como os fusos do sono, os complexos K e ondas lentas de grande amplitude. - Há, nesse tipo de sono, diminuição da atividade do sistema nervoso autônomo simpático e aumento relativo do tônus do parassimpático, permanecendo vários parâmetros fisiológicos estáveis em um nível de funcionamento mínimo, tais como as frequências cardíaca e respiratória. - Estágios do sono não-REM: - Estágio 1: mais leve e superficial, com atividade regular do eletrencefalograma (EEG) de baixa voltagem, de 4 a 6 ciclos por segundo (2 a 5% do tempo total de sono). 2. Estágio 2: um pouco menos superficial, com traçado do EEG revelando aspecto fusiforme de 13 a 15 ciclos por segundo (fusos do sono) e algumas espículas de alta voltagem, denominadas complexos K (45 a 55% do tempo total de sono). - Estágio 3: sono mais profundo, com traçado do EEG mais lentificado, com ondas delta, atividade de 0,5 a 2,5 ciclos por segundo, ondas de alta voltagem (3 a 8% do tempo total de sono). - Estágio 4: estágio de sono mais profundo, com predomínio de ondas delta e traçado bem- lentificado. É mais difícil de despertar alguém nos estágios 3 e 4, podendo o indivíduo apresentar-se confuso ao ser despertado (10 a 15% do tempo total de sono). - O sono REM: - Não se encaixa em nenhuma dessas quatro fases. Sua duração total em uma noite perfaz de 20 a 25% do tempo total de sono. - É um estágio peculiar, cujo padrão do EEG é semelhante ao do Estágio 1 do NREM. - O sono REM não é, entretanto, um sono leve, tampouco profundo, mas um tipo de sono qualitativamente diferente. Caracteriza-se por instabilidade no sistema nervoso autônomo simpático, com variações das frequências cardíaca e respiratória, da pressão arterial, do débito cardíaco e do fluxo sanguíneo cerebral. - Há um padrão de movimentos oculares rápidos e conjugados (movimentos oculares sacádicos), bem como um relaxamento muscular profundo e generalizado (atonia muscular), interrompido esporadicamente por contrações de pequenos grupos musculares, como os músculos dos olhos. - É durante o sono REM que ocorre a maior parte dos sonhos. - Ondas ponto-genículo-occipitais: Se dá a ativação das vias neuronais que ligam o tronco cerebral ao córtex occipital (i.e., a área da visão); são as chamadas ondas ponto-genículo- occipitais. Em uma noite normal de sono, as fases NREM e REM se repetem de forma cíclica a cada 70 a 110 minutos, com 4 a 6 ciclos completos por noite. O sono se inicia com o tipo NREM. Pessoas com depressão grave e narcolepsia podem ter a latência – adormecimento-primeiro sono REM – bastante diminuída, implicando geralmente uma inversão da arquitetura do sono. Fundamental importância na regulação fisiológica do sono: - O núcleo supraquiasmático, localizado no hipotálamo anterior. - A glândula pineal: Que secreta melatonina e funciona como oscilador que controla o ritmo sono-vigília no período de 24 horas. - Os sistemas reticulares mesencefálicos e bulbares e os geradores de sono REM localizados na ponte. - Quimicamente, neurônios aminérgicos, colinérgicos e histaminérgicos estão envolvidos de forma mais estreita nos mecanismos neuronais do sono. O sonho: - Pode ser considerado uma alteração normal da consciência. - No século XIX, tomou-se o sonho como modelo da loucura, pois, para o francês Moreau de Tours (1804-1884), “a loucura é o sonho do homem acordado”. - Também o antropólogo inglês Edward Burnett Tylor (1832-1917) formulou a hipótese de que o sonho, com suas visões arrebatadoras, seria a experiência humana que teria dado origem à crença em seres espirituais e, posteriormente, às religiões. - A maioria das pessoas sonha várias vezes durante uma noite, apenas não lembra da maior parte dos seus sonhos, pois se acordarem (ou forem despertadas) após mais de oito minutos de um sono REM (durante o qual sonharam), não lembrarão mais do conteúdo do sonho. - Os sonhos são vivências predominantemente visuais, sendo rara a ocorrência de percepções auditivas, olfativas ou táteis. Isso se relaciona às ondas ponto-genículo-occipitais que ativam as áreas corticais visuais do lobo occipital durante o sonho. Pessoas cegas de nascença geralmente relatam sonhos com sensações corporais e de movimento, mas obviamente sem o caráter visual das pessoas que enxergam. - A interpretação do sonho - Freud (1900): - Nessa obra, ele busca demonstrar que o sonho não é nem um “produto aleatório e sem sentido de um cérebro em condições alteradas de funcionamento”, nem um “mensageiro de recados do além”. O sonho é um fenômeno psicológico extremamente rico e revelador de desejos e temores, ainda que de forma indireta e disfarçada. Enfim, para ele, o conteúdo do sonho tem um sentido. - “Trabalho do sonho”: Freud afirma que tal trabalho transforma os conteúdos latentes (inconscientes) do sonho original em conteúdos manifestos (conscientes) do sonho lembrado. Isso se dá por meio da: Condensação: Fusão de duas ou mais representações. Deslocamento: Passagem da energia de uma representação à outra representação. Figurabilidade: Desejos transformam-se em imagens visuais). Esses três mecanismos servem para disfarçar o desejo reprimido (inconsciente), possibilitando o seu acesso à consciência, ainda que com deformações e restrições, pois existe a censura entre as duas instâncias. - Para Freud, o sonho é uma solução de compromisso, o resultado de uma intensa negociação entre o inconsciente (que visa expulsar, forçar os desejos para a consciência) e o consciente (que visa impedir que tais desejos inconscientes emerjam). (Rebaixamento do nível de consciência) Graus de rebaixamento da consciência: - Obnubilação ou turvação da consciência: Trata-se do rebaixamento da consciência em grau leve a moderado. À inspeção inicial, o paciente pode já estar claramente sonolento ou parecer desperto, o que dificulta o diagnóstico. De qualquer forma, há sempre diminuição do grau de clareza do sensório, com lentidão da compreensão e dificuldade de concentração. O paciente encontra-se um tanto perplexo, com a compreensão dificultada, podendo o pensamento estar já ligeiramente confuso. - Sopor: É um estado de marcante turvação da consciência, no qual o paciente pode ser despertado apenas por estímulo enérgico, sobretudo de natureza dolorosa. Aqui, o paciente sempre se mostra evidentemente sonolento. Embora ainda possa apresentar reações de defesa, ele é incapaz de qualquer ação espontânea. A psicomotricidade encontra-se A consciência pode se alterar tanto por processos fisiológicos, normais, como por processos patológicos. mais inibida do que nos estados de obnubilação. O traçado eletrencefalográfico acha-se globalmente lentificado, podendo surgir as ondas mais lentas, do tipo delta e teta. - Coma: É o grau mais profundo de rebaixamento do nível de consciência. No estado de coma, não é possível qualqueratividade voluntária consciente. Os seguintes sinais neurológicos podem ser verificados: movimentos oculares errantes com desvios lentos e aleatórios, nistagmo, transtornos do olhar conjugado, anormalidades dos reflexos oculocefálicos (cabeça de boneca) e oculovestibular (calórico) e ausência do reflexo de acomodação. - Além disso, dependendo da topografia e da natureza da lesão neuronal, podem ser observadas rigidez de decorticação ou de decerebração, anormalidades difusas ou focais do EEG com lentificações importantes e presença de ondas patológicas. - Os graus de intensidade de coma são classificados de I a IV: grau I (semicoma), grau II (coma superficial), grau III (coma profundo) e grau IV (coma dépassé). : Delirium: - É o termo atual mais adequado para designar a maior parte das síndromes confusionais agudas. - Cabe ressaltar que esses termos (síndrome confusional e paciente confuso) dão ênfase ao aspecto confuso do pensamento e do discurso do paciente (fala incongruente, com conteúdos absurdos e sem articulação lógica), um dos traços do delirium, mas não necessariamente o mais importante ou mais frequente. - O delirium é uma das síndromes mais frequentes na prática clínica diária, principalmente em pacientes com doenças somáticas. - Diz respeito, portanto, aos vários quadros com rebaixamento leve a moderado do nível de consciência, acompanhados de desorientação temporoespacial, dificuldade de concentração, perplexidade, ansiedade em graus variáveis, agitação ou lentificação psicomotora, discurso ilógico e confuso e ilusões e/ou alucinações, quase sempre visuais. - Trata-se de um quadro que oscila muito ao longo do dia. Estado onírico: - É o termo da psicopatologia clássica para designar uma alteração da consciência na qual, paralelamente à turvação da consciência, o indivíduo entra em estado semelhante a um sonho muito vívido. - Predomina a atividade alucinatória visual intensa com caráter cênico e fantástico. - Há geralmente amnésia consecutiva ao período em que o doente permaneceu nesse estado onírico. - Tal estado ocorre devido a psicoses tóxicas, síndromes de abstinência a substâncias (com maior freqüência no delirium tremens) e quadros febris tóxicoinfecciosos. - Alguns autores descrevem estados oníricos em pacientes psicóticos (esquizofrenia, mania e depressão psicóticas), mas, nessa acepção, eles não têm sido mais utilizados. Amência: - Era utilizado na psiquiatria clássica para designar quadros mais ou menos intensos de confusão mental por rebaixamento do nível de consciência, com excitação psicomotora, marcada incoerência do pensamento, perplexidade e sintomas alucinatórios com aspecto de sonho. - Assim como para o estado onírico, atualmente se tende a designar a amência com o termo delirium. - Uma parte do campo da consciência está preservada, normal, e outra parte, alterada. - De modo geral, há quase sempre, nas alterações qualitativas da consciência, algum grau de rebaixamento (mesmo que mínimo) do nível de consciência. - Os neurologistas tendem a denominar tais alterações de distúrbios focais ou do conteúdo da consciência, enquanto os psiquiatras as definem como alterações qualitativas da consciência. Não se deve confundir delirium (quadro sindrômico causado por alteração do nível de consciência, em pacientes com distúrbios cerebrais agudos) com o termo delírio (idéia delirante; alteração do juízo de realidade encontrada principalmente em psicóticos esquizofrênicos). Estados crepusculares: - É um estado patológico transitório no qual uma obnubilação da consciência (mais ou menos perceptível) é acompanhada de relativa conservação da atividade motora coordenada. - Nos estados crepusculares, há, portanto, estreitamento transitório do campo da consciência, afunilamento da consciência (que se restringe a um círculo de idéias, sentimentos ou representações de importância particular para o sujeito acometido), com a conservação de uma atividade psicomotora global mais ou menos coordenada, permitindo a ocorrência dos chamados atos automáticos. - Caracteriza-se por surgir e desaparecer de forma abrupta e ter duração variável, de poucos minutos ou horas a algumas semanas. - Durante esse estado, ocorrem, com certa freqüência, atos explosivos violentos e episódios de descontrole emocional (podendo haver implicações legais de interesse à psicologia e à psiquiatria forense). - Geralmente ocorre amnésia lacunar para o episódio inteiro, podendo o indivíduo se lembrar de alguns fragmentos isolados. - Os estados crepusculares foram descritos classicamente como associados à epilepsia (relacionados à turvação da consciência após uma crise ou a alterações pré-ictais ou ictais), mas também podem ocorrer em intoxicações por álcool ou outras substâncias, após traumatismo craniano, em quadros dissociativos histéricos agudos e, eventualmente, após choques emocionais intensos. Estado segundo: - Estado patológico transitório semelhante ao estado crepuscular. - Caracterizado por uma atividade psicomotora coordenada, a qual, entretanto, permanece estranha à personalidade do sujeito acometido e não se integra a ela. - Com certa freqüência, alguns autores utilizam os termos “estado segundo” e “estado crepuscular” de forma indistinta ou intercambiável. - Em geral, atribui-se, ao estado segundo uma natureza mais psicogenética, sendo produzido por fatores emocionais (choques emocionais intensos). Já ao estado crepuscular, são conferidas causas mais frequentemente orgânicas (confusão pós-ictal, intoxicações, traumatismo craniano, etc.). - Os atos cometidos durante o estado segundo são geralmente incongruentes, extravagantes, em contradição com a educação, as opiniões ou a conduta habitual do sujeito acometido, mas quase nunca são realmente graves ou perigosos, como no caso dos estados crepusculares - Do ponto de vista do mecanismo produtor da alteração, o estado segundo se aproxima mais à dissociação da consciência do que ao estado crepuscular. Dissociação da consciência: - Tal expressão designa a fragmentação ou a divisão do campo da consciência, ocorrendo perda da unidade psíquica comum do ser humano. - Ocorre com certa frequência nos quadros histéricos (crises histéricas de tipo dissociativo). Nessas situações, observa-se uma dissociação da consciência, um estado semelhante ao sonho (ganhando o caráter de estado onírico), geralmente desencadeada por acontecimentos psicologicamente significativos que geram grande ansiedade para o paciente. - Essas crises duram de minutos a horas, raramente permanecendo por dias. - Alguns pacientes têm crises ou estados dissociativos agudos que se iniciam devido a quedas, abalos musculares e movimentação do corpo semelhante à crise convulsiva (da epilepsia). Nesses casos, designa-se tal crise como crise pseudo-epiléptica (em relação à crise epiléptica verdadeira). - A dissociação da consciência pode ocorrer também em quadros de ansiedade intensa, independentemente de se tratar de paciente com personalidade ou traços histéricos, sendo a dissociação, então, vista como uma estratégia defensiva inconsciente para lidar com a ansiedade muito intensa; o indivíduo desliga da realidade para parar de sofrer. Transe: - Estado de dissociação da consciência que se assemelha a sonhar acordado, diferindo disso, porém, pela presença de atividade motora automática e estereotipada acompanhada de suspensão parcial dos movimentos voluntários. - O estado de transe ocorre em contextos religiosos e culturais. - O transe dito extático pode ser induzido por treinamento místico-religioso, ocorrendo geralmente a sensação de fusão do eu com o universo. - Não se deve confundir o transereligioso, culturalmente contextualizado e sancionado, com o transe histérico, que é um estado dissociativo da consciência relacionado frequentemente a conflitos interpessoais e alterações psicopatológicas. Estado hipnótico: - É um estado de consciência reduzida e estreitada e de atenção concentrada, que pode ser induzido por outra pessoa (hipnotizador). - Trata-se de um estado de consciência semelhante ao transe, no qual a sugestionabilidade do indivíduo está aumentada, e a sua atenção, concentrada no hipnotizador. - Nesse estado, podem ser lembradas cenas e fatos esquecidos e podem ser induzidos fenômenos como anestesia, paralisias, rigidez muscular, alterações vasomotoras. Experiência de quase-morte: (EQM) - Um estado especial de consciência é verificado em situações críticas de ameaça grave à vida, como parada cardíaca, hipoxia grave, isquemias, acidente automobilístico grave, entre outros, quando alguns sobreviventes afirmam ter vivenciado as chamadas experiências de quase- morte (EQM). - São experiências muito rápidas (de segundos a minutos) em que um estado de consciência particular é vivenciado e registrado por essas pessoas Estudos recentes (Nelson et al., 2006) têm mostrado que as características mais frequentes desses estados são as seguintes (em 55 casos revisados a partir da literatura científica internacional): sensação de paz (87%), de estar fora do próprio corpo (80%), de estar rodeado por uma luz intensa (78%), de estar em “outro mundo” (75%), sensações de “união cósmica” (67%), de ter atingido um “ponto de não-retorno” (67%), de alegria intensa (64%), de “compreensão imediata” (60%) e de contato com uma “entidade mística” (55%). - Em estudo recente, Nelson e colaboradores (2006) buscaram demonstrar que a EQM seria a consequência de uma invasão maciça de atividade cerebral do tipo sono REM nas pessoas enquanto passavam por tais experiências. Entretanto, há também consistentes hipóteses socioculturais e históricas para tal experiência (Kellehear, 1993).
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