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23 03 - FILOSOFIA - Racionalismo

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Filosofia moderna: nova ciência e racionalismo 1
Filosofia moderna: nova ciência e racionalismo 
 
IDADE MODERNA 
 
A revalorização do ser humano e da natureza 
Inicialmente iremos considerar alguns aspectos sociais, 
políticos, econômicos e culturais relevantes desse período histórico 
que se convencionou chamar de Idade Moderna (século XV ao 
século XVIII). Eles nos ajudarão a compreender as mudanças na 
produção filosófica dessa fase. A partir do século XV, uma série de 
acontecimentos deflagrou diversos processos que levaram a 
grandes transformações nas sociedades europeias. Entre eles, 
podemos destacar: 
- A passagem do feudalismo para o capitalismo, que se 
vinculou ao florescimento do comércio, ao estabelecimento das 
grandes rotas comerciais, ao predomínio do capital comercial e à 
emergencia da burguesia; 
- A formação dos Estados nacionais, que fez surgir novas 
concepções político-econômicas, como a discussão sobre as 
formas do poder político (ocorreu então a centralização do poder 
através da monarquia absoluta) e a questão comercial 
(desenvolveu-se nesse período o mercantilismo e o fortalecimento 
econômico de alguns Estados, levando ao impulso das grandes 
navegações marítimas, à descoberta do Novo Mundo e ao 
estabelecimento das colônias); 
- O movimento da Reforma, que provocou a quebra da 
unidade religiosa europeia e rompeu com a concepção passiva do 
ser humano, entregue unicamente aos desígnios divinos, 
reconhecendo o trabalho humano como fonte da graça divina e 
origem legítima da riqueza e da felicidade. Também concebeu a 
razão humana como extensão do poder divino, o que colocava o 
indivíduo em condições de pensar livremente e responsabilizar-se 
por seus atos de forma mais autônoma; 
- O desenvolvimento da ciência natural, que criou novos 
métodos científicos de investigação, impulsionados pela confiança 
na razão humana e pelo questionamento de sua submissão aos 
dogmas do cristianismo. A Igreja Católica, por sua vez, perdia 
nesse momento parte de seu poder de influência sobre os Estados 
e de dominação sobre o pensamento; 
- A invenção da imprensa, que possibilitou a impressão dos 
textos clássicos gregos e romanos, contribuindo para a formação 
do humanismo (movimento que estudaremos adiante). A 
divulgação de obras científicas, filosóficas e artísticas, que se 
tornaram a partir de então acessíveis a um número maior de 
pessoas, propiciou maior grau de consciência e liberdade de 
expressão. 
Todos esses acontecimentos modificaram, em muitas regiões, 
o modo de ser, viver e perceber a realidade de grande número de 
europeus. Nas artes, nas ciências e na filosofia surgiram novas 
ideias, concepções e valores. 
Um exemplo importante dessas mudanças foi o desabrochar de 
uma tendência social antropocêntrica (que tem o ser humano como 
centro), de valorização da obra e compreensão humanas, em lugar 
da supervalorização da fé cristã e da visão teocêntrica (que tem 
Deus como centro) da realidade. 
Isso levou ao desenvolvimento do racionalismo e de uma 
filosofia laica (não religiosa) que se mostrarão, de modo geral, 
otimistas em relação à capacidade da razão de intervir no mundo, 
organizar a sociedade e aperfeiçoar a vida humana. 
 
Renascimento 
O movimento cultural que contribuiu para essas transformações 
é conhecido como Renascimento (séculos XV XVI). Tendo por 
berço a península Itálica, criaria as bases conceituais e de valores 
que permitiriam o impulso da razão e da ciência no século XVII. 
Inspirado no humanismo - movimento de intelectuais que 
defendiam o estudo da cultura greco-romana e o retomo a seus 
ideais de exaltação do ser humano e de seus atributos, como a 
razão e a liberdade -, o Renascimento propiciou o 
desenvolvimento de uma mentalidade racionalista. Revelando 
maior disposição para investigar os problemas do mundo, o 
indivíduo moderno aguçou seu espírito de observação sobre a 
natureza, dedicou mais tempo à pesquisa e às experimentações, 
abriu a mente ao livre exame do mundo. 
Esse conjunto de atitudes contrapunha-se, em grande medida, 
à mentalidade medieval típica, influenciada pelo pensamento 
contemplativo e mais submissa às chamadas verdades 
inquestionáveis da fé. O pensador moderno buscaria não somente 
conhecer a realidade, descobrir as leis que regem os fenômenos 
naturais, mas também exercer controle sobre ela. O objetivo era 
prever para prover, como se diria mais tarde. 
Isso não significou, porém, um completo abandono das 
questões cristãs medievais, o que se torna claro se observamos o 
fundo religioso que persiste nas obras intelectuais e artísticas 
desse período. O que ocorreu foi uma renovação no tratamento 
dessas questões, a partir de uma nova perspectiva humana, de 
uma “humanização” do divino. 
 
Ameaças à nova mentalidade 
A transição para a mentalidade científica moderna não foi um 
processo súbito e sem resistências. Forças ligadas ao passado 
medieval lutaram duramente contra as transformações que se 
desenvolviam, punindo, por exemplo, muitos pensadores da época 
e organizando listas de livros proibidos (o Index). 
Foi nesse contexto que vários pioneiros da ciência moderna 
sofreram perseguição da Inquisição, tribunal instituído pela Igreja 
Católica com o fim de descobrir e julgar os responsáveis pela 
propagação de heresias, isto é, concepções contrárias aos dogmas 
dos católicos. 
Exemplo marcante dessas perseguições é o julgamento do 
pensador italiano Giordano Bruno (1548-1600), condenado à 
morte na fogueira por contestar o pensamento católico, que se 
apoiava na ideia de que o planeta Terra era o centro imóvel do 
universo. Essa noção geocêntrica estava fundamentada na 
astronomia do grego Ptolomeu, na física de Aristóteles e em certas 
interpretações da Bíblia. 
Contra essa concepção, Giordano Bruno defendeu a teoria 
heliocêntrica, formulada por Nicolau Copérnico, e afirmou que o 
universo é um todo infinito, cujo centro não está em parte alguma. 
As perseguições que sofreu por isso são denunciadas nestas 
palavras: 
 
Por ser eu delineador do campo da natureza, por estar 
preocupado com o alimento da alma, interessado pela 
cultura do espírito e dedicado à atividade do intelecto, eis 
que os visados me ameaçam, os observados me 
assaltam, os atingidos me mordem, os desmascarados me 
devoram. (BRUNO, Sobre o infinito, o universo e os 
mundos, p. 3). 
 
Nicolau Copérnico 
O sacerdote e astrônomo polonês Nicolau Copérnico (1473-
1543) escreveu o livro Da revolução das esferas celestes, em que 
combatia a teoria geocêntrica (a Terra vista como centro do 
universo) e propunha a teoria heliocêntrica, demonstrando que a 
Terra girava em torno do Sol e que este era o centro do nosso 
sistema planetário. 
O revolucionário livro de Copérnico foi publicado no ano de sua 
Filosofia moderna: nova ciência e racionalismo 2
morte (1543) e escapou, de início, à condenação católica, que viria 
com a reativação da Inquisição, após o Concílio de Trento (1545-
1563). 
A formulação de Copérnico de que é o Sol, e não a Terra, o 
centro do universo atingia a concepção medieval cristã de que o 
ser humano é o ser supremo da criação e que, por isso, seu 
hábitat, a Terra, deveria ter o privilégio de ser o centro em relação 
aos outros astros. Compreende-se assim o mal-estar causado pela 
tese copernicana. 
Outro aspecto que incomodou as autoridades católicas foi que 
a natureza e o universo passaram a ser concebidos a partir de um 
novo paradigma, baseado tanto na observação direta como na 
representação matemática. Essa mudança de atitude e seus 
resultados foram entendidos como uma ameaça aos dogmas da 
Igreja, e poderiam afastar as pessoas da fé cristã. 
 
Ética, educação e política 
Além do desenvolvimento do pensamento científico, com 
implicações evidentes no campo filosófico, outras questões 
importantes desse período dizem respeito à essência humana, à 
moral e à política. Nesse âmbito destacam-se, por exemplo, o 
francês Michel de Montaigne (1523-1592) e o italiano Nicolau 
Maquiavel(1469-1527). 
Montaigne desenvolveu um pensamento de fundo ceticista, 
inspirado em parte no ceticismo da Antiguidade, mas também no 
epicurismo e no estoicismo. Ele afirmava não ser possível 
estabelecer os mesmos preceitos para todos os seres humanos, 
sendo necessário que cada um construa um conhecimento e uma 
consciência moral de acordo com as suas possibilidades e 
disposições individuais, mas tendo como regra geral, para alcançar 
a sabedoria, “o dizer sim à vida”. 
Na educação, por exemplo, recomendava que todos os 
conteúdos fossem submetidos à reflexão do aluno. Nada deveria 
ser imposto ao estudante por simples autoridade da tradição. 
Todas as diversas doutrinas deveriam ser-lhe apresentadas, 
cabendo a cada um a decisão de qual é a melhor. E quando não 
pudesse decidir entre elas, que ficasse na dúvida, “pois só os 
loucos têm certeza absoluta em sua opinião”. 
Maquiavel iniciou uma nova fase do pensamento político ao 
abandonar o enfoque ético e religioso e procurar uma abordagem 
mais realista da política. Ou seja, buscou descrever o fenômeno 
político em si mesmo, de modo autônomo. O centro de suas 
reflexões é o exercício do poder político pelo Estado. 
Em seu livro mais célebre, O príncipe, o filósofo desenvolve um 
realismo político em que busca identificar as causas do sucesso e 
do fracasso na manutenção do poder pelo governante. Nessa 
análise, desvincula totalmente as razões políticas das razões 
morais. 
De forma geral, as considerações acerca do poder político em 
Maquiavel estão ligadas a uma visão pessimista do ser humano. 
Para ele: 
 
A propensão para o bem, para a construção da boa 
sociedade, não está inscrita na natureza humana. Esta, ao 
contrário, é má, fazendo-se necessária a existência do 
Estado para coibir os maus instintos do homem. Isto, para 
Maquiavel, deve ser levado em conta por todo aquele que 
está no exercício do poder. 
 
Assim, o recurso à força para conter a maldade humana faz 
parte da lógica do poder político. 
 
 
 
 
RAZÃO E EXPERIÊNCIA 
 
As bases da ciência moderna 
Foi com os filósofos gregos jônicos que as crenças mitológicas 
começaram a ceder lugar ao saber racional. E a ideia de caos 
começou a ser dissolvida, nascendo, para substituí-la, o conceito 
de cosmo. Dentro desse novo e revolucionário conceito, o universo 
passou a ser encarado como algo ordenado, harmônico, previsível, 
capaz de ser compreendido racionalmente pelo ser humano. 
O conceito grego de cosmo desenvolveu-se com os pré-
socráticos, encontrando novas formulações com os filósofos do 
período clássico, entre eles Platão e Aristóteles. Estes legaram ao 
Ocidente medieval a ideia de um cosmo ordenado, no qual a Terra 
tinha lugar privilegiado. Era um cosmo finito, fechado, dividido em 
dois planos básicos: o céu e a Terra. 
Podemos imaginar a revolução espiritual que representaram, 
portanto, as novas concepções da ciência nascente. As conquistas 
e realizações renascentistas deixaram a maioria das pessoas 
desorientadas e desconfiadas. O mundo racionalmente ordenado 
da Antiguidade foi questionado e, aos poucos, dissolvido. O que 
representariam a cidade, o Império ou a Igreja diante de um 
universo infinito? A respeito desse processo, vejamos o que nos 
diz o historiador da ciência Alexandre Koyré: 
 
O homem perdeu seu lugar no mundo, ou, mais exatamente, 
perdeu o próprio mundo que formava o quadro de sua existência e 
o objeto de seu saber, e precisou transformar e substituir não 
somente suas concepções fundamentais, mas as próprias 
estruturas de seu pensamento. 
Podemos dizer que esse quadro conceitual deu origem a 
algumas questões ou inovações que caracterizam a filosofia 
moderna. Vejamos em seguida quais são elas. 
 
Busca de um novo centro 
Uma das concepções fundamentais até então - a noção 
aristotélica de espaço hierarquizado, isto é, em que cada lugar 
apresenta uma qualidade diferente da de outro lugar - foi 
substituída pelo conceito de espaço homogêneo, ou seja, em que 
os lugares são equivalentes, sem um ponto fixo referencial, sem 
uma hierarquia. 
O Sol não se converteria no novo ponto fixo, pois o 
heliocentrismo de Copérnico representava apenas o primeiro passo 
de um processo de descentralização exterior do mundo. 
Como ficará mais claro adiante, o ser humano só encontraria 
um novo centro em si mesmo, isto é, na razão, entendida como a 
capacidade humana de avaliar a realidade e distinguir o verdadeiro 
do falso. 
 
Mundo representado 
Até a Idade Média, havia prevalecido a noção de que a 
realidade do mundo se apresenta diretamente às pessoas, isto é, 
mostra-se por si mesma à mente (realismo). Os pensadores da 
modernidade, por sua vez, tenderam a abordar o mundo com base 
na ideia de que a realidade é representada pela mente. Desse 
modo, boa parte deles procurou ultrapassar a percepção imediata 
e sensível da realidade, que passou a ser interpretada como 
representação. A Representação é uma operação da mente que 
re(a)presenta o real e produz uma imagem do mundo, ou um outro 
mundo. 
Assim, uma das principais características do pensamento 
moderno foi tentar explicar a realidade a partir de novas 
formulações racionais. Galileu, por exemplo, explicaria o mundo 
concreto, sensível, por meio de relações matemáticas, 
geométricas, o que não se havia feito até então, embora hoje esse 
seja um procedimento bastante comum. 
Filosofia moderna: nova ciência e racionalismo 3
 
Procura-se um método 
Outra pergunta que surgiu foi: Qual é a garantia de que um 
pensamento é verdadeiro? A ruptura com toda a autoridade 
preestabelecida de conhecimento fez com que os pensadores 
modernos buscassem uma base segura, algo que garantisse a 
verdade de um raciocínio. Procurava-se, portanto, um método. 
 
Por método eu entendo regras certas e fáceis que, 
observadas corretamente, levarão quem as seguirem a 
atingir o conhecimento verdadeiro de tudo o que for 
possível. O método consiste na ordem e na disposição 
das coisas para as quais devemos voltar o olhar do 
espírito, para descobrir a verdade. 
 
A razão estava em alta. O método escolhido foi o matemático, 
pois a matemática é o exemplo de conhecimento integralmente 
racional. Ela se tornaria, por isso, o modelo seguido pelo 
racionalismo do século XVII. Aprofundaremos a temática do 
desenvolvimento do método científico no estudo específico das 
concepções de Francis Bacon e Galileu Galilei, em seguida, e de 
Descartes, mais adiante neste capítulo. 
 
Francis Bacon 
Nascido em Londres, Francis Bacon (1561-1626) pertencia a 
uma família de nobres. Depois de concluir seus estudos em 
Cambridge, iniciou, em 1577, sua carreira política, através da qual 
conquistaria os mais importantes postos do reino británico. 
Bacon realizou uma obra científica de inegável valor. É 
considerado um dos fundadores do método indutivo de 
investigação científica. Atribui-se a ele, também, a criação do 
lema “saber é poder”, que revela sua firme disposição de fazer dos 
conhecimentos científicos um instrumento prático de controle da 
realidade. 
Preocupado com a utilização dos conhecimentos científicos na 
vida prática, Bacon manifestava grande entusiasmo pelas 
conquistas técnicas que se difundiam em seu tempo: a bússola, a 
pólvora e a imprensa. Revelava igualmente sua aversão ao 
pensamento meramente abstrato, característico da escolástica 
medieval. 
 
Teoria dos ídolos 
Para Bacon, a ciência deveria valorizar a pesquisa 
experimental, tendo em vista proporcionar resultados objetivos 
para o ser humano. Mas, para isso, era necessário que os 
cientistas se libertassem daquilo que denominava ídolos, isto é, 
falsas noções, preconceitos e maus hábitos mentais. 
Em sua obra Novum organum, o filósofo destaca quatro 
gêneros de ídolos que bloqueiam a mente humana e prejudicam a 
ciência: 
- Ídolos da tribo - as falsas noções provenientes das próprias 
limitações da natureza da espécie humana; 
- Ídolos da caverna - as falsas noções do ser humano como 
indivíduo (alusão ao mito da cavernade Platão); 
- Ídolos do mercado ou do foro - as falsas noções provenientes 
da linguagem e da comunicação; 
- Ídolos do teatro - as falsas noções provenientes das 
concepções filosóficas, científicas e culturais vigentes. 
 
Método indutivo 
Para combater os erros provocados pelos ídolos, Francis Bacon 
propôs o método indutivo de investigação, baseado na observação 
rigorosa dos fenômenos naturais, que cumpriria as seguintes 
etapas: 
- Observação da natureza para a coleta de informações; 
- Organização racional dos dados recolhidos empiricamente; 
- Formulação de explicações gerais (hipóteses) destinadas à 
compreensão do fenômeno estudado; 
- Comprovação da hipótese formulada mediante 
experimentações repetidas, em novas circunstâncias. 
Bacon dizia que aquele que inicia uma investigação com muitas 
certezas acaba cheio de dúvidas, mas aquele que começa com 
dúvidas pode terminar com algumas certezas. 
Assim, a grande contribuição de Francis Bacon para a história 
da ciência moderna foi apresentar o conhecimento científico como 
resultado de um método de investigação capaz de conciliar a 
observação dos fenômenos, a elaboração racional das hipóteses e 
a experimentação controlada para comprovar as conclusões. 
 
Galileu Galilei 
Nascido na cidade italiana de Pisa, Galileu Galilei (1564-1642) 
é considerado um dos fundadores da física moderna. Foi um 
entusiasta defensor da cosmologia que desenvolveu a partir da 
teoria heliocêntrica de Copérnico. Rejeitava, portanto, a astronomia 
de Ptolomeu e a física de Aristóteles, que, incorporadas pelo 
cristianismo católico, reinaram durante o período medieval. 
Por contrariar a visão tradicional do mundo, foi advertido pelas 
autoridades católicas, que o julgavam herege. Suas ideias eram 
consideradas contrárias às Sagradas Escrituras. Galileu teria 
comentado então que a Bíblia, em se tratando de temas científicos, 
não era um manual a ser obedecido cegamente. 
Esse pioneirismo rebelde de Galileu atraiu a fúria da Inquisição. 
Em 1633, foi condenado por seus inquisidores, que lhe impuseram 
a dramática alternativa: ser queimado vivo em uma fogueira ou 
retratar-se publicamente, renegando suas concepções científicas. 
Galileu optou por viver e retratou-se perante o tribunal. 
Permaneceu, entretanto, fiel às suas ideias e, em 1638, quatro 
anos antes de morrer, publicou clandestinamente mais uma obra 
que contrariava os dogmas oficiais de sua época. 
 
Método matemático-experimental 
Na tradição grega aristotélica, para entender uma coisa não era 
preciso estudá-la experimentalmente. Bastava esforçar-se por 
compreender como essa coisa existe e funciona e, depois, elaborar 
uma teoria sobre isso. Assim, para grande parte dos pensadores 
antigos e medievais, observar as coisas, agir sobre a natureza e 
pensar como matemático eram práticas incompatíveis. Já Galileu - 
professor de matemática da Universidade de Pisa - decidiu, de 
forma inovadora, aplicar a matemática ao estudo experimental da 
natureza. 
Desse modo, alcançou grandes realizações, entre as quais 
podemos destacar: 
- A elaboração da lei da queda livre dos corpos, segundo a qual 
a aceleração de um corpo em queda é constante, 
independentemente de o corpo ser leve ou pesado, grande ou 
pequeno. A demonstração dessa lei exige condições ideais 
(vácuo); 
- A construção e o aperfeiçoamento de um telescópio, com o 
qual efetuou observações astronômicas que o levaram a descobrir 
o relevo montanhoso da Lua, quatro satélites de Júpiter, as formas 
diferentes de Saturno, as fases de Vênus e a existência das 
manchas solares. 
Mas não é apenas por suas descobertas específicas que 
Galileu merece especial destaque na história das ciências. Uma de 
suas mais extraordinárias contribuições foi ter assumido uma nova 
postura de investigação científica, cuja metodologia tinha como 
bases: 
- A observação paciente e minuciosa dos fenômenos naturais; 
- A realização de experimentações para comprovar uma tese; 
- A valorização da matemática como instrumento capaz de 
Filosofia moderna: nova ciência e racionalismo 4
enunciar as regularidades observadas nos fenômenos. 
 
Newton: a ordem do universo 
Algumas décadas após a morte de Galileu, o físico, 
matemático, astrônomo inglês Isaac Newton (1642-1727) levaria a 
termo a revolução científica iniciada pelo cientista italiano, dando 
origem à física clássica. 
Newton criou no âmbito da ciência o que seria a base de 
inspiração para a investigação sobre o conhecimento da filosofia 
do século XVIII. 
Em sua obra principal, Princípios matemáticos da filosofia 
natural (denominava-se então filosofia natural o que hoje 
consideramos ciências naturais), Newton estabelece regras que se 
baseiam na noção de simplicidade e uniformidade da natureza. 
Decorre também do pensamento de Newton a concepção do 
mundo como uma grande máquina, cujas partes podem ser 
conhecidas através da observação e da experimentação. 
Esse mundo ou grande mecanismo seria, por sua vez, obra de 
um ser inteligente e “regente universal”: Deus. Essa compreensão 
deu origem à metáfora do “Grande Relojoeiro”, criada por Voltaire 
em referência a Deus. 
Para Newton, porém, não podemos conhecer Deus, porque só 
nos é possível conhecer através de nossos sentidos. 
Portanto, sobre Deus, só é possível afirmar sua existência a 
partir da ordem presente no universo. 
 
GRANDE RACIONALISMO 
 
O conhecimento parte da razão 
Durante o século XVII, a confiança no papel da razão no 
processo de conhecimento chega a seu auge no contexto da 
filosofia (que se mantinha ainda aliada à ciência). Por isso a 
produção filosófica dessa época é chamada de grande 
racionalismo. 
No campo das teorias do conhecimento, racionalismo designa a 
doutrina que privilegia a razão no processo de conhecer a verdade. 
Abordaremos em seguida dois dos principais filósofos racionalistas 
desse período: René Descartes e Baruch Espinosa. 
 
René Descartes 
René Descartes (1596-1650) nasceu em La Haye, França, em 
uma família de prósperos burgueses. Decepcionado com a 
formação jesuíta (tomista-aristotélica) que recebera, decidiu buscar 
a ciência por conta própria, esforçando-se por decifrar o “grande 
livro do mundo”. Em suas inúmeras viagens pela Europa, 
estabeleceu contatos com vários sábios de seu tempo, entre eles 
Blaise Pascal (1623-1662). 
Temendo perseguições religiosas e tendo em mente a 
condenação de Galileu, tomou uma série de cautelas na exposição 
de suas ideias. Autocensurou vários trechos de suas obras para 
evitar tanto a repressão da Igreja Católica como a reação fanática 
dos protestantes. Apesar disso, o que publicou é suficientemente 
vasto e valioso para situá-lo como um dos pais da filosofia 
moderna. 
Vejamos algumas concepções básicas de seu pensamento com 
alguns conceitos elementares para que você tenha um quadro 
mais completo do pensamento cartesiano. 
 
Dúvida metódica 
Vimos antes que Descartes afirmava que, para conhecer a 
verdade, é preciso, de início, colocar todos os nossos 
conhecimentos em dúvida. É necessário questionar tudo e analisar 
criteriosamente se existe algo na realidade de que possamos ter 
plena certeza. 
Fazendo uma aplicação metódica da dúvida, o filósofo 
percebeu que a única verdade totalmente livre de dúvida era que 
ele pensava. Deduziu então que, se pensava, existia (“Penso, logo 
existo”). Para Descartes, essa seria uma verdade absolutamente 
firme, certa e segura, que, por isso mesmo, deveria ser adotada 
como princípio básico de toda a sua filosofia. Era sua base, seu 
novo centro, seu ponto fixo. 
É preciso ressaltar que o termo pensamento é utilizado por 
Descartes em um sentido bastante amplo, abrangendo tudo o que 
afirmamos, negamos, sentimos, imaginamos, cremos e sonhamos. 
Assim, o ser humano era, para ele, uma substância 
essencialmente pensante. 
 
Dualismo 
Também estudamos anteriormente que Descartes, aplicando a 
dúvida metódica, chegou à conclusão de que no mundo haveria 
apenas duas substâncias, essencialmente distintase separadas: 
- A substância pensante (res cogitans), correspondente à esfera 
do eu ou da consciência; e 
- A substância extensa (res extensa), correspondente ao mundo 
corpóreo, material. 
 
O ser humano seria composto dessas duas substâncias, 
enquanto a natureza seria apenas substância extensa. Essa era 
uma concepção que se chocava com a noção tomista-aristotélica 
predominante, segundo a qual haveria tantas substâncias quantos 
seres existissem. 
A metafísica cartesiana também incluía uma substância infinita 
(res infinita), relativa a Deus, o ser que teria criado todas as coisas. 
Mas essa substância não seria parte deste mundo, pois o Deus 
cartesiano é transcendente, está separado de sua criação. 
 
Idealismo 
Descartes concluiu, porém, que o pensamento (ou consciência) 
é algo mais certo que qualquer corpo, pois ele considerava a 
matéria “algo apenas conhecível, se é que o é, por dedução do que 
se sabe da mente”. 
Essa é uma concepção idealista, tanto em termos ontológicos 
como epistemológicos, pois prioriza o ser pensante em 
contraposição à matéria, bem como a atividade do sujeito pensante 
em relação ao objeto pensado. 
 
Racionalismo 
Descartes era um racionalista convicto. Recomendava que 
desconfiássemos das percepções sensoriais, responsabilizando-as 
pelos frequentes erros do conhecimento humano. Dizia que o 
verdadeiro conhecimento das coisas externas devia ser 
conseguido através do trabalho lógico da mente. Nesse sentido, 
considerava que, no passado, dentre todos os indivíduos que 
buscaram a verdade nas ciências, “só os matemáticos puderam 
encontrar algumas demonstrações, isto é, algumas razões certas e 
evidentes” 
Descartes atribuía, portanto, grande valor à matemática como 
instrumento de compreensão da realidade. Ele próprio foi um 
grande matemático, sendo considerado um dos criadores da 
geometria analítica, sistema que tornou possível a determinação 
de um ponto em um plano mediante duas linhas perpendiculares 
fixadas graficamente (as coordenadas cartesianas). 
 
Método cartesiano 
Da sua obra Discurso do método, podemos destacar quatro 
regras básicas, consideradas por Descartes capazes de conduzir o 
espírito na busca da verdade: 
- Regra da evidência - só aceitar algo como verdadeiro desde 
que seja absolutamente evidente por sua clareza e distinção. As 
ideias claras e distintas seriam encontradas em sua própria 
Filosofia moderna: nova ciência e racionalismo 5
atividade mental, independentemente das percepções sensoriais 
externas. Devido a elas, Descartes propôs a existência das ideias 
inatas (com as quais nascemos), que são plenamente racionais. 
Exemplos: as ideias matemáticas, as noções gerais de extensão e 
movimento, a ideia de infinito etc. 
- Regra da análise - dividir cada uma das dificuldades surgidas 
em tantas partes quantas forem necessárias para resolvê-las 
melhor. 
- Regra da síntese - reordenar o raciocínio indo dos problemas 
mais simples para os mais complexos. 
- Regra da enumeração - realizar verificações completas e 
gerais para ter absoluta segurança de que nenhum aspecto do 
problema foi omitido. 
 
Herança cartesiana 
O pensamento de Descartes influi profundamente no 
pensamento posterior. Sua concepção dualista do ser humano 
ainda é sentida em diversos campos do conhecimento. E seu 
método contribuiu grandemente para uma visão reducionista da 
realidade. 
Sua tentativa, porém, de reconstruir o edifício do conhecimento 
talvez não tenha sido uma obra tão fecunda quanto o efeito 
demolidor que provocou. Por isso, podemos dizer que Descartes 
celebrizou-se não propriamente pelas questões que resolveu, mas, 
sobretudo, pelos problemas que formulou, problemas esses que 
foram herdados pelos filósofos posteriores. 
 
Por fim, as filosofias de Espinosa, de Leibniz, de 
Malebranche, atestam a importância da revolução 
cartesiana: elas constroem-se na meditação dos 
problemas postos por Descartes, e seguindo estruturas 
provindas do seu pensamento. 
 
Baruch Espinosa 
Baruch Espinosa (1632-1677) nasceu na Holanda, filho de 
imigrantes judeus de origem hispano-portuguesa. Em sua filosofia, 
desenvolveu um nacionalismo radical, que se caracterizou pela 
crítica às superstições religiosa, política e filosófica. 
De acordo com o filósofo, a fonte de toda superstição é a 
imaginação. Incapaz de compreender a verdadeira ordem do 
universo, a imaginação credita a realidade a um Deus 
transcendente e voluntarioso, nas mãos de quem os seres 
humanos não passam de joguetes. A partir da superstição 
religiosa, desenvolvem-se as superstições políticas e filosóficas. 
 
Deus imanente 
Para combater essas superstições em sua origem, Espinosa 
escreveu a Ética, texto no qual busca provar, como em uma 
demonstração geométrica, a natureza racional de Deus, que se 
manifesta em todas as coisas (Deus imanente). Desse modo, Deus 
não está fora nem dentro do universo: ele é o próprio universo. 
No interior desse entendimento racionalista, não há lugar para 
tragédia nem mistérios: tudo se torna compreensível à luz da 
razão. A filosofia seria o conhecimento racional de Deus, e a 
liberdade humana consistiria na consciência da necessidade. Ou 
seja, não haveria livre-arbítrio, uma vez que Deus se identifica com 
a natureza universal e, portanto, tudo o que existe é necessário, 
não pode ser transgredido, pois faz parte da natureza divina. 
Por isso, Espinosa propunha a equação Deus = Natureza, que 
significa: tudo existe em Deus, e mantém-se em seu Ser. 
 
Blaise Pascal 
Vejamos, por último, um filósofo que viveu na época do grande 
racionalismo, mas que foi um pensador contra a corrente, isto é, 
um crítico de seus contemporâneos e da confiança excessiva na 
razão. Trata-se de Blaise Pascal (1623-1662), nascido em 
Clermont-Ferrand, na França. 
Apesar de ter sido um grande matemático e físico e de ter 
inventado a primeira calculadora, não aceitava o reducionismo 
matemático nas questões humanas. Exemplo disso é sua frase 
lapidar: “O coração tem razões que a razão desconhece”. Pascal 
preferiu refletir sobre a condição trágica do ser humano, ao mesmo 
tempo magnífico e miserável, capaz de alcançar grandes verdades 
e gerar grandes erros. 
Em sua obra Pensamentos (da qual transcrevemos os diversos 
fragmentos que seguem), escrita sob a forma de aforismos, 
questiona a situação paradoxal do ser humano em meio a toda a 
realidade existente: “No fundo, o que é o homem na natureza? É 
nada em relação ao infinito, é tudo em relação ao nada, algo de 
intermediário entre o nada e o tudo”. Diante das novas teorias 
astronômicas de seu tempo, confessa: “O silêncio eterno dos 
espaços infinitos apavora”. 
 
Limites da razão 
Assim, em vez de mostrar a mesma confiança na razão que 
caracterizava os pensadores de seu tempo, Pascal defendeu a 
ideia de que o ser humano não pode conhecer o princípio e o fim 
das realidades que busca compreender. Estaria limitado apenas às 
aparências, já que, em suas palavras, “só o autor dessas 
maravilhas as compreende; ninguém mais pode faze-lo”. 
Afirmava que a razão humana seria impotente para provar a 
existência de Deus. Dependeria da 'fé a crença em um Deus, cuja 
existência jamais poderá ser provada. De acordo com seu 
pensamento, “o supremo passo da razão está em reconhecer que 
há uma infinidade de coisas que a ultrapassam”. Dessa forma ele 
dirá: “O coração - e não a razão - é que sente Deus. E isto é a fé: 
Deus sensível ao coração e não à razão”. 
Pascal polemizou contra o Deus dos filósofos e dos sábios, um 
deus transformado em engenheiro do mundo, que, uma vez criado, 
seguiria seu rumo em cego mecanicismo. Nessa polêmica, seu 
alvo era Descartes e sua concepção de um Deus das verdades 
geométricas. O que Pascal buscava recuperar era o “Deus de amor 
e consolação, é um Deus que faz cada qual sentir interiormente a 
sua propria miséria e a misericórdia infinita de Deus”.

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