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Apostila Linguística Geral

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Apostila: Linguística Geral 
 
1. Fundamentos da ciência da linguagem 
 
 
1.1 Um pouco da história do estudo da linguagem 
 
Comecemos por considerar que a linguagem humana – como e por que 
falamos – é um fenômeno misterioso que tem encantado os seres humanos há 
muito tempo, produzindo os mais diversos tipos de estudos, trabalhos, pesquisas, 
teorias, métodos de investigação. Tem possibilitado também grandes criações da 
mente humana, como belíssimos poemas, romances, tratados científicos, teses 
acadêmicas. Para entender um pouco sobre o estudo dessa capacidade humana 
que é a linguagem, vejamos um breve histórico com base no que foi apresentado 
por Petter (2008, p. 12 e 13). 
Os primeiros estudos sobre a linguagem ocorreram no século IV a.C. 
motivados por razões religiosas, que fizeram com que os hindus estudassem a sua 
língua, no intuito de que os textos sagrados não fossem modificados aos serem 
proferidos. Em seguida, ainda no século IV a.C. os gramáticos hindus se ocuparam 
da descrição detalhada de sua língua e elaboraram modelos de análise descobertos 
no final do século XVIII pelo Ocidente. 
A preocupação dos gregos foi, sobretudo, determinar as relações entre o 
conceito e a palavra que o nomeia, isto é, eles investigaram a existência de uma 
relação entre a palavra e o seu significado; Platão, por exemplo, foi um dos 
estudiosos que discutiu essa questão. Já Aristóteles direcionou seus estudos para 
uma análise detalhada da estrutura linguística, contribuindo com a elaboração de 
uma teoria da frase, a identificação das partes do discurso e a enumeração das 
categorias gramaticais. Houve também o teórico Varrão que se destacou entre os 
latinos, dedicando-se à gramática e à sua concepção de ciência e arte. 
Na Idade Média, houve os modistas que conceberam a estrutura gramatical 
como algo único e universal, considerando as regras gramaticais independentes das 
línguas em que são realizadas. 
No século XVI, a Reforma ativou a religiosidade e, ainda que o latim tivesse 
prestígio e fosse considerado como língua universal, houve a prática de tradução 
dos livros considerados sagrados para diversas línguas até então desconhecidas, 
que eram trazidas pelos viajantes, comerciantes e diplomatas de suas experiências 
e vivências no exterior. Assim, em 1502 é criado, pelo italiano Ambrosio Calepino, o 
dicionário poliglota mais antigo. 
As preocupações dos estudiosos antigos são mantidas nos séculos XVII e 
XVIII; em 1660 a Gramática de Port Royal, de Lancelot e Arnaud, que serve de 
modelo para muitas gramáticas do século XVII, apresenta a ideia de que a 
linguagem é fundada pela razão, sendo uma imagem do pensamento. Para eles, os 
princípios de análise definidos servem para toda e qualquer língua, de modo que 
não se referem a uma língua específica e particular. 
No século XIX, com o conhecimento de uma quantidade maior de línguas, há 
o interesse pelas línguas vivas, ou seja, pelos falares existentes, ocorrendo um 
estudo comparativo entre eles, que vai de encontro ao estudo mais abstrato da 
língua predominante no século anterior. Sendo assim, nesse período é elaborado 
um método histórico, que teve importante papel no desenvolvimento das gramáticas 
comparadas e da Linguística Histórica. De acordo com a metodologia dessa época, 
o pensamento linguístico tem como base a observação e análise de fatos. Esse 
estudo comparado das línguas destaca que “as línguas se transformam com o 
tempo, independentemente da vontade dos homens, seguindo uma necessidade 
própria da língua e manifestando-se de forma regular” (Petter, 2008, p.12). 
Nesse período, o estudioso Franz Bopp se sobressai, principalmente com a 
publicação em 1816 de sua obra referente ao sistema de conjugação do sânscrito, 
em comparação ao grego, ao latim, ao persa e ao germânico, o que marca o 
surgimento da Linguística Histórica. Esse estudo possibilitou a observação de 
semelhanças entre essas línguas e grande parte das línguas europeias, 
evidenciando que há um grau ou vínculo de parentesco entre elas. Assim, Bopp 
descobriu que existe uma família de línguas indo-europeia, advindas do indo-
europeu, sendo possível chegar a essa origem através do método histórico-
comparativo. 
Essa investigação do desenvolvimento histórico das línguas que aconteceu 
no século XIX foi um grande progresso nos estudos linguísticos. Os estudiosos da 
linguagem perceberam também que as mudanças verificadas nos textos escritos 
equivalentes aos diversos períodos poderiam ser justificadas pelas mudanças que 
teriam sido realizadas na língua falada, ocasionando e explicando, por exemplo, o 
fato de a língua latina ter se transformado e originado, após alguns séculos, as 
línguas português, espanhol, italiano e francês, ou seja, o latim falado possibilitou a 
criação de outras línguas. Houve, portanto, uma alteração no objeto de análise dos 
estudos sobre a linguagem, que até então se interessavam pela língua literária, e a 
Linguística moderna, apesar de também estudar a língua escrita, tem como 
prioridade e princípio fundamental o estudo e a investigação da língua falada. 
No início do século XX, a investigação sobre a linguagem feita pela 
Linguística é reconhecida como estudo científico e isso ocorre em especial com a 
divulgação das pesquisas de Ferdinand de Saussure, professor da Universidade de 
Genebra. Isso ocorreu em 1916, quando dois de seus alunos, com base em 
anotações feitas durantes suas aulas, publicaram a obra Curso de Linguística Geral, 
considerada como fundadora dessa ciência. 
Até então, a Linguística estava submetida a exigências e princípios de outros 
estudos como a lógica, a filosofia, a retórica, a história e a crítica literária, ou seja, 
não possuía um caráter autônomo até a exposição dos estudos de Saussure. O 
século XX, portanto, marcou uma mudança significativa na consideração da 
Linguística e das pesquisas linguísticas, justamente por reconhecer o caráter 
científico desses novos estudos, cujo foco está na observação dos fatos de 
linguagem. Essa observação dos fatos conforme o método científico deve ocorrer 
antes do estabelecimento de uma hipótese, mediante uma análise sistemática. O 
trabalho e a pesquisa científica consistem na observação e descrição dos fatos, 
tendo como base pressupostos teóricos específicos. Dessa maneira, analisam-se os 
fatos de acordo com um quadro teórico, sendo possível que um mesmo fenômeno 
tenha diferentes descrições e explicações, pois o pesquisador pode optar por 
diferentes referenciais teóricos, porém é fundamental a verificação de fatos de 
linguagem, para que um estudo seja caracterizado científico, tal como faz a 
Linguística. 
Para entender melhor o que é a Linguística, vejamos a definição do seu 
objeto de estudo – a linguagem. 
 
1.2 O que é a linguagem? 
 
Nós, seres humanos, somos os únicos capazes de falar (ou escrever) sobre 
fatos que já aconteceram ou que ainda acontecerão; podemos também falar de 
coisas que não estão presentes no momento da comunicação. Podemos falar sobre 
uma festa, um acidente ou qualquer evento importante ocorrido há algum tempo; 
sobre qualquer pessoa ou objeto, sem que eles estejam presentes ou próximos a 
nós; sobre sentimentos e sensações passadas ou presentes; enfim, podemos falar 
sobre tudo o que quisermos. Para isso, ou seja, para comunicarmos essas coisas, 
nós usamos palavras, gestos ou desenhos. 
Essa capacidade humana de utilizar, na comunicação, “representantes” ao 
invés das coisas reais é chamada capacidade simbólica, ou seja, em lugar de 
mostrarmos o objeto, a pessoa ou o fato sobre o qual estamos falando, usamos 
palavras, gestos ou desenhos para fazer a referência desejada. Na verdade, toda a 
comunicação humana é simbólica, isto é, é feita através de sinais (ou signos), que 
representam as coisas sobre as quais queremos falar. É a nossa capacidade 
simbólica que nos permite imaginar situações, relembraracontecimentos, planejar o 
futuro. 
Quando desenhamos uma casa, estamos simbolizando a casa; quando 
fazemos o gesto de mão fechada com o polegar levantado, estamos simbolizando 
mensagens como “tudo bem”, “eu concordo” ou “positivo”; quando a luz verde do 
semáforo se acende, simboliza “pode avançar, ir em frente”; quando empregamos 
qualquer palavra como “cachorro”, “jacaré”, “pato”, “amor”, “ódio”, por exemplo, 
estamos simbolizando os animais e os sentimentos em questão. Os seres humanos 
criaram vários sistemas de significação (isto é, conjuntos estruturados de elementos 
possuidores de sentido) para poderem se comunicar e expressar o que desejam. 
Vejamos alguns deles: 
 
• Sistema gestual: os gestos diferem de cultura para cultura; balançar a 
cabeça verticalmente aqui no Brasil significa “sim” e horizontalmente quer 
dizer “não”, contudo, em outros lugares, esses gestos podem significar outra 
coisa. Alguns gestos que traduzem xingamento podem significar algo 
diferente em outro lugar, como, por exemplo, no Brasil, o gesto de unir o 
polegar e o indicador, mantendo os outros dedos esticados significa um 
xingamento, uma ofensa; já, nos Estados Unidos, significa “ok”, “tudo certo”; 
 
• Sistema pictórico (de pintura, desenho): desenhar ou pintar é representar, 
simbolicamente, alguma coisa. Não podemos comer um alimento desenhado, 
nem pegá-lo, mas essas imagens são usadas para transmitir algum tipo de 
mensagem; 
 
• Sistema da música: as melodias, os sons, as notas musicais traduzem 
mensagens criadas pelos autores, podendo ser usadas para comunicações 
diversas como a campainha e o toque do telefone; 
 
• Sistema da escultura: as esculturas representam (portanto, simbolizam) 
objetos, pessoas, mensagens, como monumentos que homenageiam 
pessoas consideradas personalidades marcantes e importantes ou que 
representam dados religiosos; 
 
• Sistema linguístico: é composto pelos signos (sinais) da língua, ou seja, as 
palavras. O sistema linguístico ou verbal nos possibilita expressarmos tudo o 
que quisermos. 
 
As línguas naturais são, portanto, manifestações de algo mais geral que é a 
linguagem. É importante entender e diferenciar essas duas noções – língua e 
linguagem – e para tal levaremos em consideração o que foi proposto por Saussure 
e Chomsky, referente a uma teoria geral da linguagem e da análise linguística. 
Saussure considerou que a linguagem é complexa e multifacetada, e em sua 
abrangência há vários domínios, podendo ser, simultaneamente, física, fisiológica e 
psíquica; segundo ele a linguagem tem caráter individual e social, não sendo 
possível classificá-la em alguma categoria de fatos humanos. Para o teórico, a 
linguagem não pode ser objeto de estudo da Linguística, porque ela envolve, além 
da investigação linguística, outros aspectos analisados por outras ciências, como a 
antropologia e a psicologia, por exemplo. Sendo assim, Saussure seleciona uma 
parte essencial do todo linguagem, que é a língua, considerada um objeto uno e 
passível de classificação. Segundo o autor, a língua “é um produto social da 
faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo 
corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos” (Saussure, 
1969, p. 17). 
De acordo com Saussure, a língua é um sistema ou conjunto de signos ou 
unidades que se relacionam de maneira organizada dentro de um todo. Seria a parte 
social da linguagem, fora do indivíduo, que obedece a leis sociais estabelecidas por 
determinada comunidade e que não pode ser alterada pelos falantes. E juntamente 
aos conceitos de linguagem e língua, o autor destaca ainda a fala, que é um ato 
individual, é resultado das combinações que o falante faz usando o código da língua, 
e essas combinações são produzidas através de atos de fonação. 
Para Saussure, o objeto de estudo da Linguística é determinado com a 
distinção de linguagem, língua e fala, haja vista que o autor divide o estudo da 
linguagem em duas partes: investigação da língua e investigação da fala. Não é 
possível separar essas duas partes, pois uma depende da outra, isto é, a língua 
condiciona a produção da fala, porém, não há língua se não houver a fala. 
Entretanto, percebe-se a necessidade da existência de duas linguísticas, a 
linguística da língua e a linguística da fala. Saussure concentra os seus estudos na 
linguística da língua, considerando esse produto social imposto ao falante e 
constituído de elementos condicionados por regras de funcionamento. 
Para finalizar a contribuição desse estudioso à concepção de linguagem e 
língua, é relevante destacar que para ele a Linguística considera a língua por ela 
própria, analisando os elementos linguísticos, suas relações dentro do discurso e o 
valor funcional dessas relações identificadas. A teoria de análise linguística sugerida 
por Saussure resultou no estruturalismo, uma ciência que estuda a estrutura da 
língua e não o seu uso ou a fala propriamente dita. 
Conforme mencionado, veremos também a proposta de Chomsky para definir 
linguagem e língua. Na metade do século XX, o norte-americano Noam Chomsky 
inovou os estudos linguísticos, dizendo que todas as línguas naturais, nas formas 
falada e escrita, são linguagens conforme a sua definição. No livro Syntactic 
Structures, ele define linguagem como “um conjunto (finito ou infinito) de sentenças, 
cada uma finita em comprimento e construída a partir de um conjunto finito de 
elementos” (Chomsky, 1957, p. 13). Isso quer dizer que toda e qualquer língua 
natural é constituída por um número finito de sons e de sinais gráficos que os 
representam na escrita. E ainda, mesmo que haja um número infinito de possíveis 
sentenças, cada uma delas só pode ser representada por uma sequência finita 
desses sons e letras existentes. Em outras palavras, há em toda língua natural uma 
quantidade finita de sons e letras que possibilitam a criação de um número infinito de 
sentenças, cabendo ao linguista determinar e reconhecer o que é considerado ou 
não sentença pertencente à língua analisada, conforme suas regras de 
funcionamento. Por exemplo, na língua portuguesa, os artigos sempre antecedem o 
substantivo, logo se houver a troca dessa posição, tal sequência não será aceita 
como sentença, ou seja, a construção “Menina a quer boneca uma” não é aceita, 
não pode ser usada em nossa língua; o correto é “A menina quer uma boneca”. 
Para Chomsky, a análise das línguas naturais precisa definir as propriedades 
estruturais que diferenciam uma língua natural de outras línguas. Para ele, tais 
propriedades possuem um grau tão alto de abstração, complexidade e 
especificidade que não poderiam ser aprendidas do nada por uma criança no 
processo de aquisição da língua, sem nenhuma base, conhecimento ou capacidade 
pré-existente. O teórico considera, portanto, que a linguagem é uma capacidade 
inata e específica do ser humano, transmitida geneticamente, ou seja, a criança já 
nasce com conhecimento sobre essas propriedades estruturais antes de ter contato 
com a língua natural e esse conhecimento é acionado durante a aquisição 
linguística. De acordo com seus estudos, há propriedades universais da linguagem, 
que possibilitam a constituição de uma teoria geral da linguagem, essa teoria foi 
chamada de gerativismo. 
Enquanto Saussure separa língua e fala, Chomsky diferencia os conceitos 
competência e desempenho. A competência linguística é o conjunto de regras que o 
falante possui em sua mente, construído pela aplicação de sua capacidade inata 
para a aquisição da linguagem aos dados linguísticos que teve contato na infância 
durante essa aquisição propriamente dita, isto é, diz respeito ao conhecimento 
linguístico que o falante possui e que lhe permite produzir sentenças em sua língua. 
Já o desempenho consiste no comportamento linguístico do falante, resultante da 
sua competência linguística e de fatores não linguísticosenvolvidos na produção de 
enunciados, como convenções sociais, crenças, valores, sentimentos, atitudes do 
interlocutor, entre outros. O desempenho depende da competência, todavia a 
competência não depende do desempenho, sendo exclusivamente linguística e 
também passível de descrição e implícita no desempenho. 
Para finalizar vale destacar que Saussure ressalta a língua enquanto sistema 
linguístico socializado e Chomsky enfatiza a competência linguística, que é o 
conhecimento linguístico internalizado. 
 
1.3 O que é Linguística? 
 
Vimos que há vários tipos de linguagens – verbais e não verbais –, que 
correspondem a sistemas de signos utilizados para a comunicação, como a música, 
a dança, a pintura, os gestos, as palavras, entre outros. De acordo com Saussure há 
uma ciência mais geral que estuda todo e qualquer tipo de sistema de signos, 
chamada Semiologia. 
A Linguística é uma parte dessa ciência mais geral, é a ciência que estuda 
especificamente a linguagem verbal humana, sua estrutura e seus usos. Em outras 
palavras, é o estudo científico da linguagem verbal. Orlandi (1986, p. 9) diz da 
seguinte maneira: “Linguística definiu-se, com bastante sucesso entre as Ciências 
Humanas, como o estudo científico que visa descrever ou explicar a linguagem 
verbal humana.” E por que a Linguística é uma ciência? Porque ela estuda as 
línguas naturais com o objetivo de conhecer os seus princípios de funcionamento, 
bem como as diferenças e semelhanças entre elas, sem fazer julgamentos de valor 
sobre as formas linguísticas, sem classificar tal uso em certo ou errado, bonito ou 
feio. A Linguística apenas descreve e explica essas formas, esses usos, os fatos tal 
como se apresentam numa determinada sociedade, abrangendo os padrões 
sonoros, gramaticais, lexicais e sintáticos. Petter (2008, p. 17) enfatiza que o 
linguista não leva em consideração julgamentos, pois sua função consiste em 
“estudar toda e qualquer expressão linguística como um fato merecedor de 
descrição e explicação dentro de um quadro científico adequado”. 
A Linguística, portanto, é uma ciência e toda ciência é descritiva e não 
prescritiva (de prescrever, receitar), não se compara ao estudo tradicional da 
gramática ou às gramáticas tradicionais, nas quais se baseia a maioria das 
gramáticas escolares e dos livros didáticos de Língua Portuguesa, que têm caráter 
prescritivo. Gramáticas tradicionais se baseiam num tipo só de língua – a norma 
culta, que é o falar das elites –, normalmente usando como exemplos dessa norma 
culta a língua escrita, ou seja, a obra dos escritores consagrados, a língua literária. A 
gramática tradicional, portanto, descreve, mas apenas uma parte da língua (a norma 
culta), e prescreve, ou seja, “receita” a maneira “correta” de se utilizar a língua (como 
escrever tal palavra, como fazer a concordância verbal e nominal, como efetuar 
colocação pronominal, etc.), ignorando as outras variedades da língua, os usos que 
divergem da norma culta, até mesmo condenando-os. A gramática tradicional não é 
científica, pois faz julgamentos de valor sobre as formas e os usos linguísticos que 
não se “enquadram em suas regras”. 
Devemos, portanto, fazer uma distinção bem clara entre a gramática 
normativa, prescritiva, e a Linguística, descritiva, científica. Lembrando que a 
gramática normativa preocupa-se com o emprego correto das regras gramaticais e a 
Linguística é uma ciência que tem por objeto a linguagem verbal humana em todas 
as suas possibilidades e variedades. 
A metodologia de análise linguística tem como foco principal a fala das 
comunidades e como foco secundário a língua escrita. Essa prioridade para o 
estudo da língua falada e os critérios usados para a coleta, organização, seleção, 
análise dos dados linguísticos e resultados são justificados pelo fato de ser preciso 
corrigir os procedimentos de análise apresentados pela gramática tradicional e 
elaborar uma teoria geral da linguagem através da correlação de informações sobre 
outras línguas. 
Dessa maneira, há duas áreas de estudo, chamadas Linguística Geral e 
Linguística Descritiva. A Linguística Geral trabalha com conceitos e modelos que 
servem de fundamentos para a análise das línguas, enquanto a Linguística 
Descritiva disponibiliza os dados necessários para confirmar ou contestar as teorias 
que a Linguística Geral propõe. As duas são interdependentes, porém é possível 
que uma descrição linguística, além de conceder recursos para a investigação da 
Linguística Geral, tenha outros objetivos, como elaborar uma gramática ou um 
dicionário no intuito de difundir a forma escrita de línguas que ainda não circulam 
nessa modalidade, a exemplo de línguas indígenas e africanas. 
No breve histórico sobre o estudo da linguagem, vimos que no século XIX 
houve uma preocupação por parte dos linguistas em estudar as transformações que 
as línguas apresentam ao longo tempo, no esforço de desvendar as mudanças 
linguísticas; nesse contexto a Linguística era histórica ou diacrônica. Contudo, no 
começo do século XX, Saussure apresentou uma nova perspectiva de estudo da 
língua, chamada sincrônica, em que a análise e a descrição das línguas são feitas 
em um determinado momento histórico ou recorte temporal, observando elementos 
coexistentes. Saussure, apesar de defender o ponto de vista sincrônico do estudo 
das línguas, reconhecia que as abordagens sincrônica e diacrônica são relevantes e 
se complementam. A diferença é que na sincronia os fatos linguísticos e seu 
funcionamento são examinados em um dado momento, e na diacronia os fatos são 
observados com relação às suas transformações e às relações estabelecidas com 
os fatos e momentos históricos anteriores e posteriores. Em outras palavras, uma 
descrição sincrônica leva em consideração os fatos linguísticos e suas relações em 
um determinado estado da língua, e as pesquisas diacrônicas analisam fatos 
linguísticos em estados sucessivos da língua, como, por exemplo, o estudo sobre as 
transformações que aconteceram com o pronome de tratamento “Vossa Mercê” ao 
longo tempo, resultando na forma atual “Você”, de pronome pessoal, que na 
oralidade é empregado como “Cê”; para explicar essas mudanças é preciso 
comparar diferentes estados e momentos da língua. 
Essa distinção entre sincronia e diacronia – e suas metodologias – ocasionou 
dois ramos da Linguística: a Linguística Sincrônica que investiga um estado da 
língua, e que atualmente é chamada de Linguística Teórica, por se ocupar mais da 
elaboração de modelos teóricos do que da descrição de estados da língua; e a 
Linguística Histórica, que estuda a história da língua. 
Para finalizar a concepção de Linguística, é relevante destacar que diversas 
áreas de estudo se interessam pela linguagem e, por isso, ao relacionar o estudo da 
língua com outras disciplinas, houve a criação de alguns campos de estudo 
interdisciplinares, como a Etnolinguística, que investiga a relação existente entre a 
língua e a cultura; a Sociolinguística, que estuda a relação observada entre a língua 
e a sociedade; e a Psicolinguística, que examina o processo de aquisição da 
linguagem, a aprendizagem de uma segunda língua e o comportamento do indivíduo 
nesses dois eventos. 
 
1.4 Gramática: o ponto de vista normativo/ descritivo 
 
Como já mencionado anteriormente, a gramática tradicional possui um ponto 
de vista normativo e prescritivo da língua, fundamentando a sua análise na língua 
escrita. Por não reconhecer a diferença existente entre língua falada e língua escrita, 
considera a forma escrita como um modelo de correção que deve ser aplicado e 
seguido em todos os tipos de expressão linguística, propagando dessa maneira 
falsos conceitos concernentes à natureza da linguagem. 
Conforme citado por Petter (2008, p. 19), é importante recordar que o primeiro 
registro de descrição linguística é a do sânscrito – no século IV a.C. – realizada pelogramático hindu Panini, cujo objetivo foi justamente garantir que os textos sagrados 
e a pronúncia correta das preces fossem conservados, num momento em que a 
língua sânscrita culta, chamada blasha, necessitava de consolidação e 
fortalecimento para resistir às influências dos falares populares, denominados 
prácritos, ou seja, essa obra surgiu em um momento histórico em que uma 
determinada variedade linguística precisava, no entender desse gramático, de 
valorização e divulgação. 
Há registros de outras gramáticas antigas prescritivas e pedagógicas, cujo 
propósito era descrever a língua, contudo também prescrever o que consideravam o 
uso correto, como por exemplo, gramáticas do árabe, do grego e do latim. 
Atualmente, essa tradição normativa ainda é predominante, sobretudo em países 
que se preocupam com o desenvolvimento e consolidação da língua padrão, 
divulgada como uma norma de correção, uma forma correta de utilização da língua, 
prescrita por fontes de autoridade como gramáticos e representantes da língua 
literária. Além de prescrever uma norma de correção e considerar outras variedades 
inferiores e incorretas, a norma culta ou padrão também é valorizada por ser 
associada às classes sociais mais altas, instruídas e dominantes. 
Embora os gramáticos tradicionais trabalhem para descrever a língua, eles 
priorizam alguns usos em detrimento de outros. Dessa forma, esse estudo descritivo 
e normativo feito por eles limita o objeto de análise, justamente por privilegiar a 
variedade padrão. E é essa “forma correta” de uso da língua que geralmente é o 
foco do estudo nas escolas, que deixam de oportunizar um conhecimento mais 
amplo e abrangente da diversidade linguística. 
Na sociedade brasileira, durante muito tempo, e isso ainda ocorre na 
contemporaneidade, os estudos acerca da linguagem – especialmente nos ensinos 
fundamental e médio – restringiram-se ao estudo prescritivo da Língua Portuguesa, 
embasado na gramática tradicional. Esses estudos preocupam-se com a gramática 
normativa, isto é, com o ensino de regras gramaticais, como acentuação, ortografia, 
conjugação de verbos, concordância verbal e nominal, entre outros; e deixam de 
lado a língua propriamente dita, bem como sua variedade de usos e possibilidades. 
Não se pode negar, obviamente, a importância e a utilidade do estudo normativo, 
contudo este não pode ser separado do contexto e de uma visão mais completa da 
língua, nem impedir que o aluno aumente a sua competência linguística, usando-a 
para se comunicar, compreender mensagens e produzir textos para diversos fins. 
Todavia, felizmente, essa priorização pelo estudo normativo começou a 
mudar, pois alguns documentos oficiais, que orientam o trabalho nas escolas, já têm 
enfatizado e sugerido uma postura mais moderna sobre os estudos da nossa língua. 
Nas universidades, a disciplina de Linguística – que é obrigatória no curso de Letras 
– não só tem procurado cumprir seu papel de subsidiar o aluno com os conceitos 
que a compõem, como também tem auxiliado e servido como base para outras 
disciplinas, como Língua Portuguesa e Literaturas. 
É relevante, portanto, enfatizar que abordar a língua somente sob a 
perspectiva normativa corrobora para que falsos conceitos e preconceitos sejam 
difundidos, e a Linguística contribui para que essas ideias sejam discutidas e 
revertidas, haja vista que a língua escrita não pode servir de modelo para a língua 
falada e que não existem línguas e variedades melhores ou piores, mas sim 
diferentes. 
 
1.5 A Linguística: o ponto de vista descritivo/ explicativo 
 
Já estudamos anteriormente que o campo de pesquisa da Linguística, tal 
como apresentada por Saussure, tem como foco principal a investigação da língua 
enquanto conjunto de regras e propriedades formais e que essa ciência não 
privilegia determinada variedade linguística, considerando todos os usos e fatos 
linguísticos, e realizando sua descrição. Além disso, há várias áreas de estudo 
dentro da Linguística, que podem considerar, por exemplo, o fator histórico ou não. 
No século XIX, os estudos desenvolvidos pela Linguística Histórica, que 
estuda as mudanças da linguagem, fortaleceu o conhecimento científico da língua, 
indo de encontro à divulgação de uma norma e mostrando que as transformações 
linguísticas geralmente são originadas na fala popular, ou seja, é comum que formas 
consideradas erradas em um dado momento histórico passem a ser consideradas 
corretas no momento seguinte. 
Além disso, ao analisar os fatos, observa-se que algumas formas 
consideradas erradas são recorrentes também na fala de pessoas cultas, 
confirmando que a língua tem realmente um caráter bastante variável e que a escrita 
não pode servir de padrão para a fala. Como exemplo, podemos citar o verbo “ir”, no 
sentido de ir a algum lugar, cuja regência verbal culta pede o uso da preposição “a”, 
como dizer “Vou ao cinema”; todavia, é muito comum que na fala as pessoas 
utilizem a preposição “em”, enunciando “Vou no cinema”. Isso quer dizer que existe 
a variante do padrão culto, mas há também uma variante que não atende a essa 
regra, porém é utilizada com frequência e inclusive, embora estigmatizada, é 
encontrada em textos arcaicos e do século XIX, comprovando que essas mudanças 
e variações ocorrem no decorrer do tempo. 
Enquanto a visão prescritiva admite apenas uma forma correta com base na 
língua escrita, a visão descritiva da Linguística reconhece que há a possibilidade de 
escolha de usos linguísticos que sejam mais apropriados à língua escrita, à língua 
falada, a situações coloquiais e a situações formais, uma vez que, conforme essa 
abordagem descritiva, as variedades não padrão da língua também consistem em 
um conjunto de regras gramaticais, embora diferentes das regras do português 
padrão. Isso se justifica porque o termo “gramatical” é utilizado com um valor 
descritivo, isto é, a gramática de uma língua ou de um dialeto corresponde à 
descrição das regularidades que constituem a sua estrutura. Sendo assim, o 
exemplo coloquial do verbo “ir” acompanhado pela preposição “em” é uma sentença 
gramatical na variedade coloquial, compreendida por todos, sem prejuízo à 
comunicação. E é isso que a Linguística, enquanto ciência faz – não trata a língua 
como deveria ser, mas sim a descreve como realmente é. 
Levando em consideração esse objetivo de descrever a língua, a Linguística 
trabalha com uma metodologia de análise de sentenças que são efetivamente 
produzidas, formando assim um corpus representativo. Um corpus é um conjunto de 
dados que são organizados para uma pesquisa específica, sendo que esses dados 
são reais e empregados na fala dos indivíduos, ou seja, o corpus inclui expressões 
linguísticas de todos os tipos, pertencentes à variedade padrão e à variedade não 
padrão, e sua descrição não possui caráter normativo ou histórico, pois o intuito é 
perceber a estrutura dos elementos linguísticos (frases, morfemas, fonemas) e as 
regras que possibilitam a sua combinação. 
De acordo com essa metodologia adotada e a cientificidade da Linguística, há 
dois princípios que a fundamentam – e o empirismo e objetividade. Assim, a 
Linguística é empírica porque analisa dados verificáveis através da observação e 
objetiva por investigar a língua de maneira independente, ou seja, sem levar em 
consideração preconceitos sociais e culturais. 
Até os anos 1950, as análises linguísticas, que tinham como base as teorias 
de descrição de Saussure, trabalhavam apenas com a explicação dos fatos por meio 
de sua descrição. Entretanto, a partir do final dos anos 1950, Chomsky sugeriu que 
a análise linguística se prendesse menos aos dados e mais à teoria, isto é, para o 
teórico, além de observar e categorizar dados, é preciso haver uma teoria explicativa 
que anteceda esses dados e que seja capaz de explicar as frases produzidas e as 
que possivelmente podem ser realizadas pelosfalantes, pois para Chomsky um 
fenômeno linguístico só pode ser explicitado, quando pode ser relacionado a leis 
gerais, e é essa teoria que é definida por ele como gramática. 
Conforme essa teoria da gramática, todas as frases gramaticais devem ser 
estudadas, ou seja, todas as frases que pertencem à língua em análise. Novamente, 
não dita regras como a gramática normativa, mas explica as sentenças produzidas e 
as que têm potencial de serem realizadas na língua. O critério utilizado para a 
gramaticalidade ou agramaticalidade dessas frases é a intuição ou a competência do 
falante, que vai organizar os componentes linguísticos em uma frase, garantindo 
essa gramaticalidade ou respeitando as regras gramaticais do sistema linguístico, 
conforme o conhecimento que o falante tem internalizado. Caso contrário, se essa 
sequência de palavras não respeitar tais regras, teremos uma sequência 
agramatical, como no exemplo “Minha copo cheia está muito quase”, que não 
atende às regras estruturais fundamentais da língua. 
Essa nova proposta de análise dos fatos linguísticos pertence ao que é 
chamado de gramática gerativa, pois uma quantidade limitada de regras possibilita a 
elaboração e a compreensão de uma quantidade infinita de sentenças novas. A 
preocupação dos gerativistas é captar propriedades comuns e universais da 
linguagem, que compõem a gramática universal (GU). Como afirma Petter (2008, p. 
22), na perspectiva gerativa “as propriedades formais das línguas e a natureza das 
regras exigidas para descrevê-las são consideradas mais importantes do que a 
investigação das relações entre a linguagem e o mundo.” 
Há ainda a gramática funcional, que apresenta outra proposta para explicação 
dos fatos linguísticos, com base nos fundamentos do funcionalismo. A gramática 
funcional não separa os elementos linguísticos das funções que eles exercem nas 
sentenças, considerando o uso desses elementos na interação verbal. Ademais, 
abrange toda a situação comunicativa na análise da estrutura gramatical, como a 
intenção comunicativa, os falantes envolvidos e o contexto de comunicação. 
Essa teoria funcionalista se desenvolveu especialmente na Escola Linguística 
de Praga, originada no Círculo Linguístico de Praga, criado em 1926. Os linguistas 
da Escola de Praga elaboraram a definição da perspectiva funcional da sentença, 
afirmando que pode haver diferentes versões da mesma sentença e que sua 
estrutura é determinada pelo uso, pela situação de comunicação em que os 
enunciados são emitidos e pelo fato de envolver informações conhecidas ou novas 
para o ouvinte. Para exemplificar podemos considerar as sentenças “Maria trabalhou 
ontem à tarde” e “Ontem à tarde Maria trabalhou”, que, na verdade, são versões 
diferentes de uma mesma sentença e que serão empregadas conforme os critérios 
mencionados. Uma grande contribuição do funcionalismo nos dias de hoje é a 
afirmação de que a língua é, antes de qualquer coisa, uma ferramenta de interação, 
utilizada para firmar relações comunicativas entre os indivíduos. 
Vimos algumas propostas para descrição e explicação da linguagem, que não 
são exclusivas, são diferentes abordagens e corroboram para a compreensão de 
que a linguagem pode ser estudada de diversas perspectivas. Há o estudo de 
aspectos internos da língua, mas há também pesquisas que levam em consideração 
fatores externos como a sociedade, a história e o contexto de comunicação. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2. Língua e Cultura 
 
2.1 Língua como instrumento de comunicação 
 
Atualmente, é um consenso o reconhecimento da relevância da comunicação 
para os dias de hoje e para toda a história da humanidade, podendo-se dizer que a 
mesma fundou a sociedade, afinal de contas a comunicação é a ferramenta que 
utilizamos para interagir, para representar ideias, para transmitir conhecimento, para 
compartilhar informações, para conviver uns com os outros, para propagar a cultura, 
entre outros, podendo fazê-la por diversos tipos de linguagem, por diferentes 
conjuntos de signos verbais e não verbais. 
Nos estudos sobre a linguagem, a comunicação também é considerada 
fundamental, contudo essa função essencial da linguagem enquanto objeto de 
comunicação nem sempre foi reconhecida, pois nos estudos gramaticais do século 
XIX a língua era vista apenas como uma representação de uma estrutura de 
pensamento, que não necessitava da formalização linguística para existir. Para os 
estudiosos dessa época a comunicação, caracterizada pela “lei do menor esforço”, 
era a responsável pela desorganização gramatical das línguas, causando o seu 
declínio e as transformações linguísticas julgadas como ruínas linguísticas. Barros 
(2008, p. 26), para exemplificar esse pensamento, diz que “o português e o italiano 
(...) seriam ‘restos’ em decadência do latim”. Isso quer dizer que se não houvesse 
comunicação, a língua teria a sua estrutura conservada e não haveria mudanças 
linguísticas, vistas por esses gramáticos como algo prejudicial ao que era 
considerado o padrão correto das línguas. 
Entretanto, no início do século XX, Saussure afirmou que a língua é 
essencialmente um instrumento de comunicação, ocasionando uma ruptura com 
essas concepções anteriores. Assim, um dos grandes efeitos da linguística 
saussureana foi incluir o estudo da comunicação nas investigações e pesquisas 
linguísticas. 
Como vimos, através da comunicação podemos aprender e transmitir novas 
informações, conhecimentos, valores, costumes e crenças tradicionais existentes em 
nossa sociedade e constituintes de nossa cultura. Vejamos a seguir um pouco mais 
sobre a concepção de cultura e sua relação com a língua. 
 
2.2 As línguas e a cultura 
 
O conceito de cultura pode ser definido como o conjunto de todas as criações 
humana ou como o resultado da ação do homem sobre a natureza, modificando-a. 
Com as modificações genéticas que foram ocorrendo no processo de 
evolução humana, o homem foi se diferenciando dos outros animais ao adquirir a 
capacidade simbólica e a capacidade de utilizar instrumentos para conseguir o que 
queria. Os nossos ancestrais não tinham uma vida fácil, pois não eram muito fortes – 
comparando-os com os outros animais da época – nem especializados, já que não 
podiam voar como os pássaros, não podiam viver na água como os peixes, não 
tinham a visão aguçada como a da águia, não possuíam veneno como o das cobras 
para se defender, nem a velocidade de animais como os leões, enfim, os seres 
humanos eram totalmente primitivos. 
Como será, então, que um animal tão indefeso e sem “recursos” conseguiu se 
tornar o “dono do mundo”? A resposta está justamente no desenvolvimento da 
capacidade simbólica – em que pôde desenvolver a linguagem – e na capacidade de 
usar instrumentos – que lhe permitiu a invenção de variados objetos que lhe 
auxiliassem. Não é à toa que, hoje, o ser humano é capaz de voar por meio dos 
aviões, ir ao fundo do mar com os submarinos, enxergar a longas distâncias através 
dos telescópios, enxergar coisas minúsculas usando o microscópio e até ir a outros 
planetas. Todos esses conhecimentos e invenções humanos constituem a sua 
cultura. Entre todas as suas criações, talvez a mais impressionante tenha sido a 
linguagem simbólica, mais especificamente, a linguagem verbal, a língua. 
É a língua que expressa a cultura dos povos e, ao mesmo tempo, a língua faz 
parte da cultura, ou seja, para falar de nossa cultura usamos a língua, que faz parte 
da cultura e não pode ser considerada isoladamente, mas sim com uma parcela de 
todo o contexto cultural. 
Em geral, as pessoas acreditam que, para se aprender uma segunda língua, 
basta decorar uma lista de palavras desse idioma. Nessa concepção, a língua é 
vista como um simples repertório, um conjunto de palavras que se diferenciam das 
palavras de outras línguas pela diferença dos nomes dados a cada coisa.Esse 
pensamento não é verdadeiro, pois, como já dissemos, as línguas expressam a 
cultura e as experiências de cada povo, e sabe-se que as culturas não são iguais. 
Conclui-se então que, para se dominar outra língua, não basta traduzir cada palavra, 
é preciso se conscientizar de que há culturas diferentes e mudar a visão de mundo 
de acordo com a cultura referente à nova língua que se quer aprender. Sendo assim, 
o sinônimo de língua como lista de palavras não é correto. 
Um exemplo bastante citado para explicar a noção de “língua como visão de 
mundo”, ou seja, para explicar a ideia de que cada língua “enxerga” a realidade de 
uma determinada forma é relativo às cores do arco-íris (resultado da refração da luz 
solar). Em português, utilizamos sete palavras que nomeiam as cores do arco-íris – 
vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e violeta (ou roxo); em inglês, utilizamos 
seis palavras, porque a língua inglesa não faz distinção entre roxo e anil, como nós 
fazemos. Há outras línguas que dividem de várias outras formas o espectro das 
cores, como a língua bassa, uma língua indígena da Libéria, na África, que as divide 
em dois grandes grupos: cores quentes (chamadas ziza) e cores frias (chamadas 
hui). Na realidade, o que vemos no arco-íris não está dividido com nitidez, não há 
um traço indicando onde termina o azul e começa o verde, consequentemente, cada 
cultura divide as cores do arco-íris de uma forma peculiar e cada língua “recorta a 
realidade de um modo particular” (Lopes, 2001, p. 21), expressando as experiências 
de cada povo ou comunidade, que podem não coincidir de um local para o outro. 
Outro exemplo da representação variada da realidade pelas línguas naturais é 
a denominação relacionada ao indivíduo que guia um automóvel. Em francês essa 
pessoa é chamada de chauffeur, em inglês de driver, em espanhol de conductor e 
em português chamamos de motorista. Observando tais nomenclaturas, é possível 
constatar que os franceses associam esse indivíduo à atividade de aquecer o motor 
para que o automóvel entre em movimento; os ingleses e os espanhóis fazem uma 
associação com o ato de dirigir ou conduzir o veículo; e nós, falantes da língua 
portuguesa, associamos tal indivíduo diretamente ao motor do carro. A atividade é a 
mesma, mas cada comunidade e cada língua a analisa sob um aspecto particular, 
resultando numa representação que difere de uma comunidade de falantes para 
outra. 
As línguas, além de analisar a realidade de maneira diferente, também 
possuem sons típicos ou fonemas que reforçam essa especificidade de cada língua, 
ou seja, os fonemas que são utilizados por falantes de diferentes idiomas para sua 
expressão apresentam semelhanças, porém não são exatamente iguais. Essas 
diferenças são percebidas quando observamos o inglês, o francês e o espanhol, por 
exemplo, e quando tentamos aprendê-las. No inglês há o som representado pelas 
letras “th” (como em “thanks”, que significa obrigado), cujo fonema usado em sua 
expressão oral não existe na língua portuguesa, podendo causar certa dificuldade no 
aprendizado de sua pronúncia, pois na realidade, os fonemas de duas línguas são 
tão distintos, que quando um indivíduo escuta uma língua que desconhece, é 
comum ele ter dificuldades para reproduzir tais fonemas com precisão. 
Enfim, cada língua expressa a cultura ligada a ela, não podendo traduzir com 
exatidão a língua e a cultura de outras sociedades, e isso reforça o fato de que a 
língua e a cultura se relacionam, a língua expressa a cultura e também faz parte 
dela. Como a Linguística é uma disciplina interdisciplinar, o estudo dessa relação 
entre língua e cultura também faz parte de seu campo de pesquisa e quadro teórico. 
 
2.3 O modelo de comunicação da teoria da informação 
 
 Como a comunicação é uma função essencial da língua e está diretamente 
ligada à cultura, veremos aqui um modelo de comunicação elaborado não 
especificamente pelos estudos linguísticos, mas por estudos que constituíram a 
teoria da informação e da comunicação, que influenciou os estudos da Linguística, 
especialmente nos anos 1950. 
 É relevante saber que a teoria da informação investiga a comunicação de um 
ponto de vista diferente dos estudos linguísticos e com objetivos voltados, segundo 
Barros (2008), para a medida da informação, que é a quantidade de informação 
transmitida durante uma comunicação, e para a economia da mensagem, que 
aborda questões referentes a uma codificação eficaz, à habilidade de transmissão 
do canal de comunicação e também à eliminação de ruídos que podem causar 
resultados indesejáveis. 
 O modelo apresentado a seguir diz respeito a uma das propostas mais 
conhecidas entre os linguistas. Foi elaborado por C. F. Shannon, que apresentou o 
seguinte esquema para a comunicação (in Barros, 2008, p. 26): 
 
 
 
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Shannon_Weaver_-
_Modelo_de_Comunica%C3%A7%C3%A3o.png 
 
 De acordo com esse esquema da comunicação, há um emissor e um 
receptor, com divisão em duas ou mais caixas, que separam o processo de 
codificação e decodificação da emissão e da recepção da mensagem. Há um canal, 
que consiste num suporte material ou sensorial, cuja função é transmitir a 
mensagem de um local a outro; e há também uma mensagem, que é o resultado da 
codificação, sendo compreendida durante a transmissão por meio de uma sequência 
de sinais. Antes da transmissão da mensagem, há os procedimentos de codificação, 
utilizadas para elaborar a mensagem, e entre a recepção e o destino há os 
procedimentos de decodificação, que possibilitam o reconhecimento e a 
identificação dos elementos que constituem a mensagem. Os ruídos, elementos 
diversos que interferem na comunicação, podem causar tal interferência durante 
todo o trajeto da informação e prejudicar a eficiência da comunicação. Há vários 
tipos de ruídos: 
 
• Ruídos físicos: barulhos, ruídos, problemas no canal de comunicação, entre 
outros; 
 
• Ruídos psicológicos: desinteresse, desatenção, etc. 
 
 
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Shannon_Weaver_-_Modelo_de_Comunica%C3%A7%C3%A3o.png
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Shannon_Weaver_-_Modelo_de_Comunica%C3%A7%C3%A3o.png
• Ruídos culturais: falta de conhecimento dos códigos, falta de conhecimento 
de crenças e valores em comum, etc. 
 
Para resumir, nesse esquema a comunicação é apresentada como um 
mecanismo de transmissão de mensagens de um emissor para um receptor, 
organizadas de acordo com um código e através de sequência de sinais. A 
preocupação principal desse modelo de comunicação da teoria da informação é 
aprimorar a transmissão da mensagem, no que diz respeito aos significantes usados 
na expressão sensorial. 
Ainda com relação a esse modelo de comunicação, Barros (2008, p. 27) 
afirma que quando levamos em consideração a comunicação entre os seres 
humanos, especialmente na comunicação verbal oral ou escrita, é constatado que a 
comunicação possui outros fins e são identificadas algumas dificuldades nas ideias 
da teoria da informação, apontando três dessas dificuldades, com críticas e soluções 
possíveis: 
 
1) Simplificação excessiva da comunicação: esses esquemas da 
comunicação acabam simplificando demais a comunicação verbal; 
 
2) Modelo linear da comunicação: na teoria da informação a comunicação 
é contemplada linearmente e trata somente, ou preferencialmente, do 
plano de expressão, dos significantes (sequência de sinais das 
mensagens); 
 
3) Caráter mecanicista do modelo: nas concepções da teoria da 
informação, as questões extralinguísticas, culturais e sócio históricas não 
são levadas em consideração. 
 
Diante dessas dificuldades apresentadas, os estudos da linguagem 
pretenderam sanar as limitações presentes nos esquemas e modelos propostos pela 
teoria da informação, complementando as informações muito simplificadas sobre a 
comunicação e rever a questão dacomunicação sob outra perspectiva, atentando 
para os tópicos criticados concernentes ao caráter linear e mecanicista. 
Um dos linguistas que mais contribuíram para complementar e ampliar as 
propostas e modelos da teoria da informação, de maneira a abranger a comunicação 
verbal, foi Roman Jakobson (1969). Para ele, os estudos sobre a informação devem 
considerar que na comunicação há um remetente ou emissor que envia uma 
mensagem a um destinatário ou receptor. Para que essa mensagem seja eficiente é 
necessário que haja um contexto a que se refere (ou um referente) decifrável pelo 
remetente e pelo destinatário, um código (linguagem verbal ou não verbal) que seja 
comum e conhecido por eles e um contato ou um canal entre o emissor e o receptor, 
que possibilite essa comunicação. 
O estudioso Ignácio Assis Silva (1972) propõe mais alguns detalhes ao 
modelo de Jakobson incluindo, por exemplo, os subcódigos junto aos códigos, que 
abordam a questão da variação linguística, investigada mais detalhadamente pela 
sociolinguística, dialetologia ou geografia linguística (ou geolinguística). 
Além de contribuir com a ampliação do modelo da teoria da informação, 
especialmente referente aos códigos e subcódigos, Jakobson sugeriu a existência 
de uma variedade das funções da linguagem, um estudo que também se refere à 
comunicação e que é considerado a sua contribuição mais conhecida. O teórico 
constatou que a língua deve ser estudada levando em consideração essa variedade 
de funções e não apenas a função informativa (também chamada de referencial) 
como faziam os teóricos da informação. 
Dessa forma, Jakobson apresentou seis funções da linguagem e explicou que 
um mesmo texto ou uma mesma mensagem pode apresentar várias funções 
simultaneamente, contudo em geral há uma função predominante. São elas: 
 
• Função emotiva: é centrada no remetente, faz uso da 1ª pessoa, apresenta 
aspectos ou características subjetivas, utiliza modalizadores referentes ao 
saber (eu acho, eu considero, eu acredito, etc.), utiliza recursos prosódicos 
como pausas, hesitações, exclamações e interjeições. Há efeitos de 
subjetividade, emotividade e proximidade do sujeito, que relata o seu ponto 
de vista, sentimento e emoções. Um exemplo de texto que contém essa 
função são poemas em 1ª pessoa ou uma carta de amor. 
 
• Função referencial: é centrada no contexto ou no referente, faz uso da 3ª 
pessoa, apresenta aspectos ou características objetivas e concretas, há uma 
relação de afastamento do sujeito. Sua função é transmitir objetivamente uma 
informação, como textos científicos ou jornalísticos, por exemplo. 
 
• Função poética: é centrada na mensagem, faz uso de procedimentos no 
plano da expressão, como formas de utilização dos sons (ritmos, entoações, 
rimas, entre outros) e figuras de linguagem, com efeito de sentido que rompe 
o discurso comum e busca a perfeição no funcionamento da linguagem e na 
aproximação entre expressão e conteúdo. O exemplo mais citado é a poesia, 
a literatura, mas pode ocorrer também em textos publicitários, jornalísticos ou 
religiosos. 
 
• Função fática: é centrada no contato ou no canal, faz uso de procedimentos 
prosódicos da fala ou expressões prontas para iniciar (bom dia, oi, tudo 
bem?), manter (ahã, sei, entendo), verificar (está ouvindo?, está 
entendendo?) e encerrar (tchau, até mais) o contato entre os interlocutores. 
Os efeitos de sentidos consistem em aproximação e interesse entre 
remetente e destinatário, de maneira a garantir a interação de ambos. É a 
função da conversa, do diálogo, do contato com o outro. 
 
• Função metalinguística: é centrada no código, faz uso de verbos de 
existência e significação (ser, significar), é comum o emprego do presente do 
indicativo, em orações predicativas de definição (X é ou significa Y). O efeito 
de sentido é referente à definição, é a linguagem que fala de linguagem, 
como definições presentes em dicionários, gramáticas, entre outros. 
 
• Função conativa: é centrada no destinatário, faz uso da 2ª pessoa, do 
imperativo, do vocativo, de perguntas e respostas, entre outros. Está presente 
em textos que produzem efeitos de sentido de interação com o destinatário, 
objetivando convencê-lo ou persuadi-lo a fazer ou falar algo. Um exemplo 
bastante representativo são os textos publicitários, que em geral pretendem 
convencer o destinatário a adquirir algo ou adotar determinado 
comportamento. 
 
 Barros (2008) resume que a principal colaboração de Jakobson para o estudo 
da comunicação diz respeito à inclusão das questões sobre variação linguística no 
modelo de comunicação através dos códigos e subcódigos, e de como ocorrem na 
relação entre remetente e destinatário. Além disso, o estudioso destaca que os 
falantes se comunicam de diversas maneiras e com diferentes objetivos, haja vista a 
variedade de funções da linguagem existentes no processo de comunicação, que 
não são exclusivas nem excludentes, mas são empregadas conforme o critério de 
predominância. As críticas feitas aos estudos propostos por Jakobson apontam que 
ele não analisa de maneira adequada as relações sócio históricas e ideológicas da 
comunicação e também não aborda claramente a reciprocidade ou circularidade que 
são características da comunicação humana, ou seja, seu modelo ainda possui o 
caráter mecanicista da teoria da informação. Apesar de ampliar e complementar 
significativamente esse modelo da teoria da informação, a comunicação continuou a 
ser considerada apenas como um fazer-saber, ou seja, vista como a transmissão de 
saberes acerca do mundo, das emoções do remetente, do código, do plano da 
expressão da mensagem e do funcionamento do contato; apenas na função conativa 
há um fazer-fazer ou um fazer o outro fazer, já que trabalha com o efeito de 
persuasão. 
Contudo, esses aspectos criticados foram tratados posteriormente por outras 
áreas de estudo como a Análise do Discurso, por exemplo, que retoma as questões 
sócio históricas e ideológicas; já a reciprocidade ou a circularidade são estudadas 
por linguistas e teóricos da comunicação, como veremos a seguir. 
 
2.4 A interação verbal: modelo linear e circular da comunicação 
 
Vimos que os modelos da teoria da informação retratados anteriormente são 
basicamente lineares, pois abordam a transmissão da mensagem de um emissor a 
um receptor, sem tratar da reciprocidade ou da circularidade que caracterizam a 
comunicação humana, uma vez que é possível que o receptor se torne emissor e 
assim manter ou dar continuidade à comunicação. Em resposta a esses modelos 
lineares de comunicação, a partir dos anos 1950, nos Estados Unidos, foram 
desenvolvidos estudos que sugeriram um modelo circular para a comunicação, 
resultando numa teoria da nova comunicação, abordando as concepções de 
feedback e realimentação. 
De acordo com essa nova teoria, a comunicação deve ser relacionada ao 
emissor e ao receptor, considerando-a um sistema interacional, em que importam 
tanto os efeitos da comunicação sobre o receptor, como os efeitos que a reação do 
receptor causam sobre o emissor. 
Benveniste (1966) tratou em seus estudos sobre a reciprocidade da 
comunicação, afirmando que o “eu”, ao dizer “eu” situa o “tu” como seu destinatário 
ou receptor, todavia esse destinatário pode tomar a palavra e dizer “eu”, instalando 
agora o outro como “tu”. De acordo com o teórico o diálogo consiste na condição da 
linguagem humana, marcada pela reciprocidade ou reversibilidade. 
Assim, especialmente os linguistas norte-americanos desenvolveram estudos 
sobre a interação entre sujeitos durante a comunicação. Bakhtin (1981) foi o primeiro 
a desenvolver estudos sobre a interação e o diálogo entre interlocutores, buscando 
demonstrar que a interação verbal é a realidade essencial da linguagem. Ao lado 
dos estudos sobre dialogismo, surgiram outros dois estudos da interação – a 
sociologia da comunicação,que tem Goffman como um importante representante, e 
a análise da conversação, de linha etnometodológica. 
Na sociologia da comunicação, o linguista Goffman (1967 e 1973) investigou 
formas de preservação da face na comunicação, isto é, a face é a expressão social 
do eu individual (ou a autoimagem pública construída) e a interação pode colocá-la 
em risco. Sendo assim, o teórico em questão apresenta estratégias que servem para 
ameaçar e atingir a face do outro, mas também para preservar e proteger a mesma; 
essas estratégias variam de língua para língua, de cultura para cultura. 
Barros (2008, p. 43) exemplifica a proteção de face através das sentenças: 
 
a) Saia já daqui! 
b) Saia daqui, por favor. 
c) Você poderia sair daqui? 
d) Será que você poderia sair daqui, por favor? 
 
A sentença (a) exemplifica um efeito de ordem categórica, que é uma ameaça 
à face do destinatário, indicado pelo imperativo “saia” e pelo advérbio “já”. Os 
demais exemplos apresentam graus diferentes de atenuação do discurso, que 
protegem a face do destinatário, como o uso de “por favor”, do verbo “poder” e da 
interrogação, elementos característicos de um pedido. 
Já a Etnometodologia analisa a interação social no comportamento diário e 
cotidiano, considerando a conversação ou a interação verbal como uma maneira 
privilegiada de interação. Dessa forma, a análise da conversação pretende 
descrever as estruturas e os mecanismos organizadores da conversação, e fazer 
uma relação dessas estruturas com as funções interacionais. 
No estudo da comunicação enquanto interação destacam-se cinco questões: 
 
1) A questão de que os falantes se constroem e constroem em conjunto o 
texto no processo de comunicação, ou seja, os sujeitos se modificam, se 
transformam e se constroem na comunicação. Para Bakhtin, no diálogo 
são construídas relações intersubjetivas e a subjetividade, pois os sujeitos 
são influenciados e substituídos por diversas vozes que os constituem 
sujeitos históricos e ideológicos. 
 
2) A questão das imagens ou dos simulacros construídos pelos interlocutores 
na interação, pois para Pêcheux na análise do discurso o remetente e o 
destinatário definem um jogo de imagens do qual dependem a 
comunicação e a interação, abrangendo a imagem que o emissor faz de si 
mesmo, a imagem que o emissor faz do receptor, a imagem que o 
receptor faz dele mesmo e a imagem que o receptor faz do emissor. Para 
exemplificar Barros (2008, p. 44) cita uma situação em que a mãe diz para 
a filha que determinada forma de se vestir é inadequada para uma 
cerimônia de casamento; a filha, por sua vez, pode não acreditar na 
afirmação da mãe, pois a associa com uma imagem de conservadorismo, 
contudo se uma amiga expuser a mesma opinião, é mais provável que ela 
troque de roupa. 
 
3) A questão do caráter polêmico ou contratual da comunicação, em que é 
possível situar os estudos de Goffman sobre a preservação e a ameaça à 
face, e estudos da análise da conversação sobre o lado contratual e a 
polêmica conversacional, levando em consideração a abordagem de um 
tema em que os interlocutores concordam ou discordam; assim há 
estratégias de discordância, como correção do outro, sobreposição de 
vozes, assalto ao turno do outro, entre outros. 
4) A questão de que não é mais possível colocar a mensagem somente no 
plano dos significantes ou da expressão quando se considera a relação 
entre comunicação e interação, pois a mensagem comunicada além de ser 
a expressão de significantes que circula como um sinal entre emissor e 
receptor, é também um discurso, conforme definido por Pêcheux, pois está 
carregada de conteúdos e significados. 
 
5) A questão do aumento da circulação do dizer na sociedade, pois muitas 
vezes a comunicação deixa de ser intimista e apenas um diálogo entre o 
“eu” e o “tu”, aqui e agora, tendo sua circulação alargada socialmente, 
como uma entrevista na televisão ou na imprensa escrita, e um júri. 
 
Vimos, portanto, a contribuição dos estudos interacionais da comunicação, 
sobretudo a característica da reciprocidade da comunicação, que é dialógica. 
 
2.5 Linguagem falada e linguagem escrita 
 
Para concluir essa abordagem sobre a comunicação, língua e expressão da 
cultura, é relevante considerarmos a linguagem falada, a linguagem escrita e suas 
especificidades. 
Como sabemos, a linguagem escrita é um dos meios visíveis de expressão 
mais comuns. Em algumas situações, inclusive, o linguista precisa utilizar esse meio 
para realizar suas análises, como, por exemplo, quando investiga uma “língua 
morta”, por meio de documentos antigos, como o latim e o grego clássico. 
Entretanto, é preciso considerar as duas modalidades da expressão linguística, pois 
fala e escrita possuem uma função relevante na comunicação. 
Em nossa sociedade, durante muito tempo (e esse pensamento ainda perdura 
nos tempos atuais), a escrita foi priorizada nos estudos linguísticos por representar 
um padrão da língua, sendo-lhe atribuído um papel superestimado em nossa cultura. 
Essa importância da linguagem escrita deve ser assinalada, haja vista que ela está 
diretamente ligada à expressão e conservação das conquistas e dos avanços das 
ciências e das artes, todavia ao relacionar as duas modalidades da expressão 
linguística – fala e escrita – constata-se que a invenção da escrita é algo recente, se 
comparada com a antiguidade da fala. Lopes (2001, p. 33) diz que a fala “se 
confunde com a própria origem do homem”. 
Os primeiros registros a serem considerados tipos de escrita são inscrições 
sumérias, egípcias e indianas, que não possuem mais que cinco ou seis mil anos; e 
o que aconteceu na história da humanidade ainda ocorre na contemporaneidade, ou 
seja, nós seres humanos ainda aprendemos primeiro a falar para depois 
aprendermos a escrever. Além disso, segundo os linguistas, a fala tem mais 
possibilidade de sobreviver do que a escrita, pois a modalidade escrita poderia ser 
substituída por outro tipo de modalidade de expressão e registro, porém seria 
praticamente impossível imaginar outro sistema ocupando o lugar da fala e 
inutilizando-a. 
Outro aspecto importante é que, diferentemente da escrita, a fala é universal, 
independente do grau de desenvolvimento de um povo ou comunidade. Não existe 
um só povo que não se comunique através da linguagem falada; entretanto, há 
muitos povos que não possuem e que desconhecem qualquer sistema de escrita. 
Ademais, todos os sistemas de escrita existentes têm como base a linguagem 
falada, sendo secundários a ela. Por essa razão, Saussure concluiu que a principal 
função da escrita é representar a fala. 
Observando essa relevância da fala, ao analisar a linguagem escrita sem 
considerar também a análise da linguagem falada, o pesquisador em questão pode 
acabar cometendo equívocos interpretativos, como a não percepção da existência 
de mais morfemas do que fonemas, por exemplos, ou seja, um mesmo morfema ou 
uma mesma palavra podem ser pronunciados da mesma maneira ou pode haver 
omissão de alguns morfemas na fala, uma vez que a fala tende a ser menos 
redundante e mais econômica do que a escrita. Isso pode ser exemplificado, por 
exemplo, quando na escrita registramos “está”, mas na fala dizemos simplesmente 
“tá”, ou quando, em uma sentença que está no plural, marcamos o fonema /s/ 
apenas no primeiro elemento da sentença para indicar o plural, mas os demais 
permanecem sem essa sinalização, por ser desnecessário e tornar a fala mais 
prática, como “Os menino estuda aqui perto.”. 
Assim, quando uma pesquisa linguística se baseia somente no levantamento 
de traços da modalidade escrita apresenta resultados diferentes de pesquisas que 
consideram também as peculiaridades da modalidade falada. Por conta disso, os 
linguistas procuram investigar os fatos linguísticos enquanto fenômenos que 
constituem um sistema convencional de signos orais, tendo como objeto de estudoespecialmente a língua falada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3. O Estruturalismo de Saussure e a dupla articulação da linguagem 
 
3.1 Saussure e o Estruturalismo 
 
A Linguística moderna teve início com a publicação, em 1916, do livro Curso 
de Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure. Essa publicação marca uma 
reviravolta nos estudos linguísticos, até então voltados para a Filologia e para os 
estudos comparativistas entre as línguas. A obra traz uma nova visão sobre as 
questões linguísticas, afirmando, entre outras coisas, que as línguas são sistemas 
cujas estruturas e funcionamento devem ser estudados internamente, não sendo 
dependentes de fatores externos, como a história. Saussure fez uma separação 
entre a linguística interna (fora do contexto sócio histórico) e a linguística externa (a 
que considera os fatores exteriores que condicionam os fenômenos linguísticos). 
O curioso é que Saussure, fundador da ciência Linguística moderna, faleceu 
sem ter ideia do papel que representaria para os estudos da linguagem. Ele faleceu 
em 1913 e três anos após a sua morte houve a publicação do Curso de Linguística 
Geral (conhecido como CLG), organizado por dois de seus discípulos (alunos), Ch. 
Bally e A. Sechehaye, que utilizaram as anotações feitas durante as aulas, já que 
não puderam contar com os manuscritos do mestre para auxiliá-los. 
Ferdinand de Saussure nasceu em Genebra, em 26 de novembro de 1857. 
Em 1880, foi para Paris assistir a cursos na Escola de Altos Estudos, universidade 
francesa. Um ano depois, Michel Bréal, seu professor, cedeu-lhe seu curso na 
escola e, assim, com apenas vinte e quatro anos, Saussure foi nomeado “mestre de 
conferências de gótico e de velho alto-alemão”. Era a primeira vez que se ensinava 
Linguística em uma universidade francesa e seus cursos ficaram famosos. Em 1891, 
transferiu-se para Genebra, onde lecionou na cadeira de Linguística, criada 
especialmente para ele, até sua morte em 1913. 
Por muitos anos, Saussure estudou a versificação indo-europeia arcaica, 
elaborando a hipótese dos anagramas (palavras formadas por letras transpostas de 
outras palavras, por exemplo, da palavra “Maria” podemos formar “Airam”, de 
“Iracema” podemos formar “América”, de “Roma” pode-se formar “amor”) e se 
devotou a uma série de interesses no campo da Literatura. Mas o Saussure que 
passou à história, que teve sua imagem realmente reconhecida, é o do monumental 
Curso de Linguística Geral. 
A noção de sistema (conjunto de partes interdependentes) foi depois 
denominada estrutura pelos sucessores do mestre. Saussure tinha uma visão 
estruturalista, estudou a estrutura (a forma) da língua e, por isso, é considerado o 
“pai” do estruturalismo (na Linguística). O primeiro professor de Linguística ilustra a 
noção de sistema usando o jogo de xadrez como exemplo. Nesse jogo, o valor 
atribuído a cada peça não tem a ver com o material de que é feita (pode ser de 
plástico, de madeira, de cristal, de metal), nem mesmo com a sua aparência 
(podemos usar botões coloridos, ao invés das peças), mas tem a ver com a relação 
de oposição que cada peça tem com as outras peças e com a posição que tem no 
conjunto total. Por exemplo, um cavalo pode ser feito de qualquer material, pode ser 
até um botão colorido, mas o seu valor advém da sua oposição às demais peças (se 
opusermos cavalo e peão, o cavalo vale mais, mas vale menos que a dama, por 
exemplo) e da sua posição no jogo (pode movimentar-se em “L”). A identidade de 
cada peça no jogo de xadrez depende do seu lugar no tabuleiro, das regras de sua 
movimentação, do seu valor no jogo. Diríamos então que a estrutura do jogo de 
xadrez é composta do valor de cada peça, do número delas, e das regras para o 
jogo. 
De maneira similar, qualquer unidade da língua se define em relação às 
outras entidades e pela posição que ocupa no todo, no sistema. Um fonema, como o 
/t/, só pode ser analisado e adquirir um valor com relação a todos os outros fonemas 
do português, opondo-se a cada um deles – é diferente de /d/, de /f/, de /n/, etc. Um 
fonema sozinho não seria um fonema, mas apenas um som, já que não sabemos a 
que língua pertence e que relações de oposição mantém com o sistema linguístico. 
E é seguindo o mesmo raciocínio que podemos analisar palavras, prefixos, sufixos, 
etc. Por exemplo, {-izar} é um sufixo do português, que forma verbos como 
imortalizar, radicalizar, mas não o é do Inglês. Já {-ing} pertence ao inglês e não ao 
português, como em running. 
Essas concepções sobre a estrutura das línguas, a visão da língua como 
sistema, fazem de Saussure o “pai” do estruturalismo, corrente de pensamento que, 
a partir da Linguística, vai atingir vários outros campos das chamadas Ciências 
Humanas. Em suma, o estruturalismo procura explicar um sistema a partir de suas 
próprias leis, sem considerar outras explicações ideológicas ou históricas. 
São exemplos de outros campos em que essa corrente de pensamento foi/é 
utilizada: 
 
- A Semiologia (que analisa os vários sistemas de significação) de Roland Barthes; 
 
- A Antropologia (que estuda o homem e suas características) de Lévi-Strauss; 
 
- A Psicanálise (método de investigação psicológica) de Lacan; 
 
- A marxologia (estudo das ideias de Karl Marx) de Althusser; 
 
- Michel Foucault, com contribuições em várias áreas; 
 
- E a área de Teoria Literária, com vários trabalhos e autores que estudam ou 
estudaram a forma, a estrutura do texto, e não a história, a época ou a vida do autor, 
que seriam fenômenos externos à obra. 
 
Das várias análises e contribuições do Curso de Linguística Geral, quatro 
pares de conceitos são destacados, conhecidos como “as dicotomias 
saussureanas”. A palavra dicotomia significa divisão em duas partes, ou seja, as 
dicotomias são concepções teóricas com duas perspectivas diferentes para os 
estudos linguísticos. 
Assim, os quatro conceitos, que serão apresentados separadamente a seguir, 
são: 
a) Sincronia e diacronia; 
b) Língua e fala; 
c) Significante e significado; 
d) Paradigma e sintagma. 
 
3.2 A dicotomia Sincronia e Diacronia 
 
A primeira dicotomia de Saussure que estudaremos será sincronia e 
diacronia. Na palavra sincronia, o prefixo de origem grega {sin-} significa 
conjuntamente, ao mesmo tempo e o radical {cronos} significa tempo. Por 
conseguinte, sincronia se refere aos fatos que ocorrem simultaneamente ou ao 
mesmo tempo. A Linguística sincrônica descreve o sistema linguístico (sons, 
palavras, gramática) em um dado momento, não necessariamente no momento 
atual, pois podemos estudar, por exemplo, a poesia medieval sem fazer nenhuma 
comparação com poesias de outras épocas, realizando, assim, um estudo 
sincrônico. 
A descrição sincrônica apenas analisa o sistema linguístico, descrevendo sua 
estrutura. Essa primeira grande dicotomia saussureana tem grande importância, pois 
separa os fatores internos de um sistema dos fatores externos, históricos e culturais, 
que condicionam esse sistema. De acordo com essa perspectiva, o tempo não é 
fator determinante das mutações linguísticas, ele apenas permite que esses fatores 
externos ajam uns sobre os outros, ocasionando as mutações. 
Já na palavra diacronia, o prefixo de origem grega {dia-} significa separação e 
o radical {cronos}, como já foi dito, significa tempo. A diacronia, portanto, identifica 
os estudos dos fatos linguísticos que ocorreram em momentos diferentes. A 
Linguística diacrônica analisa esses fatos, comparando-os com fenômenos 
históricos, estuda as transformações históricas da língua. Por exemplo, quando 
estudamos as mudanças que ocorreram no latim para que surgisse a língua 
portuguesa, quando comparamos o português de hoje com o português medieval, ou 
os sonetos da época de Camões com os sonetos modernos, ou quando estudamos 
a mudança das palavras (“vossamercê” se transformou em “você”), estamos 
fazendo estudos diacrônicos. 
Saussure utiliza a seguinte figura para ilustrar essa dicotomia: 
 
 C 
 
 
 A B 
 
 
 D 
 
Figura 1 – Dicotomia sincronia-diacronia. 
Fonte: Saussure (1974, p. 95). 
a) AB representa o eixo das simultaneidades, que diz respeito à sincronia, às 
coisas que coexistem, sem a intervenção do tempo; 
 
b) CD representa o eixo das sucessividades, que diz respeito à diacronia, às 
coisas que acontecem temporalmente. 
 
A Linguística sincrônica também é chamada Linguística estática, ou interna, 
ou ainda Linguística dos estados. O objeto de estudo sincrônico é a organização do 
sistema, sua estrutura. Já a Linguística diacrônica é conhecida também como 
Linguística evolutiva, histórica, externa ou ainda Linguística dinâmica. Seu objeto de 
estudo são os estados sucessivos dos sistemas, ou seja, as transformações e 
mudanças que as línguas apresentam conforme passa o tempo. 
Para melhor compreensão dos dois conceitos, vejamos suas principais 
diferenças: 
 
 
LINGUÍSTICA SINCRÔNICA 
 
 
LINGUÍSTICA DIACRÔNICA 
Estuda os fatos linguísticos simultâneos; Estuda os fatos linguísticos sucessivos; 
Não considera o fator tempo; Considera o fator tempo; 
É interna (estuda exclusivamente os 
fatos próprios da língua); 
É externa (inclui o estudo dos fatos 
extralinguísticos, ou seja, sociais e 
históricos, fora da língua); 
É estática, pois se ocupa de um só 
recorte temporal; 
É dinâmica, pois considera vários 
recortes temporais; 
Não é histórica (não estuda a história 
dos fatos da língua); 
É histórica; 
Não é, portanto, evolutiva. 
É evolutiva (considera a evolução das 
línguas e suas mudanças ao longo do 
tempo). 
Quadro 1 – Linguística sincrônica x Linguística diacrônica. 
 
A imagem de Saussure está ligada à divisão entre Linguística interna e 
Linguística externa, o que ocasionou várias críticas feitas a ele, como se a 
Linguística saussureana fosse antifilológica, ou seja, contrária aos estudos históricos 
das línguas. Apesar de ter realmente feito essa divisão, ele nunca negou a 
importância da Linguística diacrônica (que ocupa uma boa parte do seu livro), sendo 
ele mesmo um filólogo. O que aconteceu é que a repercussão do Curso de 
Linguística Geral se deu por causa das novidades que havia ali, que são justamente 
as teses que vão embasar os estudos estruturais, ou seja, a parte que trata da 
Linguística sincrônica, interna. Por isso, ele é o mentor do estruturalismo e “pai” da 
Linguística moderna. 
Com relação a essa dicotomia, há ainda mais um fator importante: a 
possibilidade de haver estudos sincrônicos e diacrônicos ao mesmo tempo 
(chamados de pancronia, em que o morfema {pan-} significa tudo, todos). Saussure 
admite que é possível realizar estudos linguísticos sob o ponto de vista pancrônico, 
porém somente com relação às leis gerais da língua, pois, segundo ele, os fatos 
particulares das línguas ou são estudados sob o ponto de vista sincrônico ou sob a 
perspectiva diacrônica. 
 
3.3 As dicotomias: Língua e Fala, Significado e Significante 
 
Veremos agora mais duas dicotomias de Saussure, a começar pela Língua e 
Fala (ou Linguagem, Langue e Parole). A linguagem humana é a capacidade que o 
homem tem de comunicar-se com os seus semelhantes através de signos verbais e 
essa linguagem verbal abrange a língua (langue) e a fala (parole), conforme o pai da 
Linguística. 
Saussure designa língua como o próprio sistema linguístico e fala como a 
utilização concreta do sistema pelos falantes, distinguindo as duas. Voltando à 
comparação com o jogo de xadrez, os valores das peças e as regras do jogo 
formariam a língua, enquanto as jogadas feitas constituiriam a fala. 
A língua é caracterizada pelo teórico como abstrata, pois ninguém conhece 
tudo sobre a língua; coletiva, pelo fato de ser um conceito social definido pelo grupo 
social ao qual o indivíduo pertence; e conceituada como o conjunto de todas as 
regras fonológicas, morfológicas, sintáticas e semânticas que orientam o emprego 
dos elementos linguísticos pelos falantes. 
Já a fala, ao contrário da língua, é concreta, pois é composta de elementos 
concretos que são os sons; e individual, uma vez que é realizada de maneira 
diferente, dependendo do falante. Há uma liberdade de combinações na fala, visto 
que cada um fala do seu jeito, combinando os fatores conhecidos da língua. Enfim, a 
fala é o uso da língua, é a língua posta em prática, dependendo dela para existir. 
Para finalizar, cabe aqui uma observação relevante: quando denominamos o 
sistema como um conjunto das regras da língua, não estamos fazendo referência à 
gramática normativa. Como já foi dito, a Linguística não faz julgamentos de valor 
sobre as formas e usos linguísticos. Regras, nesse contexto, correspondem ao que 
devemos respeitar para que fiquemos dentro do sistema da língua. Por exemplo, se 
dissermos “nós queremos dois pastéis”, ou “nóis qué dois pastel”, estaremos dentro 
do sistema da língua portuguesa, pois essas duas frases representam variedades da 
nossa língua, pertencem ao nosso sistema linguístico e são compreendidas numa 
situação de comunicação. Não importa se uma é considerada correta e bonita, e a 
outra errada e feia, considerando que são falas diferentes, mas que pertencem ao 
mesmo sistema, que não julga as realizações por serem diferentes; isso ocorre 
apenas socialmente. Todavia, se dissermos “nós querer dois pastéis”, estaremos 
usando uma frase que não pertence ao sistema do português, que não segue as 
regras da nossa língua, haja vista que numa sentença o verbo deve ser conjugado; 
apesar de ser compreendida, na verdade, falariam assim somente os estrangeiros, 
que não dominam a maneira de se fazer a conjugação dos verbos. 
Ainda com relação à dicotomia língua e fala, há um conceito que 
complementa essa ideia de Saussure, proposta pelo linguista Eugenio Coseriu, que 
introduziu na dicotomia saussureana língua e fala um terceiro elemento – a norma – 
com o objetivo de esclarecer aspectos da análise linguística que essa dicotomia de 
Saussure não resolve. Para Coseriu (1979), quando falamos, além de realizar 
concretamente o sistema abstrato, estamos realizando o modo de falar do grupo 
social ao qual pertencemos. Ou seja, o falante pertence a diversos grupos sociais 
(definidos pela faixa etária, nível de escolaridade, região onde vive, etc.) e cada 
agrupamento social possui uma determinada maneira de falar, que é a norma desse 
grupo. Assim, temos uma norma culta, outra popular, outra infantil, outra paulistana, 
outra carioca, e assim por diante. Vale lembrar que norma lembra “normal” e normal 
é exatamente aquilo que as pessoas geralmente fazem, ou seja, aquilo que se 
repete no comportamento social. É normal ir à praia de terno e gravata ou usando 
salto alto? Não, pois quase ninguém faz isso. Quando dizemos que o 
comportamento de alguém “não é normal”, estamos afirmando que esse 
comportamento é incomum e diferente do das outras pessoas. 
Se imaginarmos uma peneira e nela colocarmos todos os falares concretos 
das pessoas de um determinado grupo social (por exemplo, as pessoas nascidas na 
capital do Rio de Janeiro) e retirarmos dessa peneira tudo o que é realização 
individual, modo de falar de cada indivíduo, teremos a fala. Se peneirarmos de novo, 
retirando então tudo que se repete nas falas das pessoas cariocas, teremos a 
norma. O que resta na peneira, retirados os falares individuais e os modos de falar 
dos grupos, é o sistema, que é o conjunto de oposições funcionais básicas, das 
regras que identificam uma língua. 
Para facilitar, apresentamos um esquema, segundo as ideias de Coseriu 
(1979): 
 
 
SISTEMA (= LÍNGUA) 
 
NORMA 
 
FALA

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