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Hallmarks do câncer – M1 19.2 ➢ Qual a principal característica de uma célula tumoral? Capacidade de proliferação exacerbada em relação às outras células. ➢ Por que uma célula normal se torna uma célula tumoral? Devido a perda do controle dos processos regulatórios de proliferação. Hanahan e Weinberg lançaram um trabalho em 2000 no qual eles definiram os hallmarks do câncer, características que estão presentes em todas as células tumorais. Hallmarks do câncer: 1) Capacidade de sustentar a sinalização de proliferação. As células recebem sinais exógenos que vão sugerir à célula que está no momento de se multiplicar. Mecanismo: As células apresentam receptores em sua superfície que se ligam a hormônios e fatores de crescimento e ativam uma via de sinalização, o que vai regular a progressão do ciclo celular, o crescimento e o desenvolvimento da célula. Alterações nas vias de sinalização de crescimento podem ser decorrentes de mutações causadas por danos no DNA. Exemplo: via de Ras, MapK: O receptor se liga a uma determinada molécula sinal, que dispara uma cascata de sinalização no sentido de ativar transcrição de determinados genes que guiarão a célula ao longo da proliferação. Esse sinal não se mantém ativado constitutivamente; pois existe um estímulo inicial que ativa essa via de sinalização, mas em determinado momento essa via deve ser inativada, portanto, a sinalização deve ser desligada (feedback negativo), nesse caso, feita por ERK. A mutação em alguma kinase da via pode deixá-la resistente a outra kinase, impedindo que a primeira seja desligada, o que causa uma sinalização constitutiva e torna a proliferação da célula afetada mais intensa que a da célula normal. Em uma célula cancerígena, esse mecanismo sustenta a sinalização de proliferação. 40% dos melanomas são caracterizados por células com mutações que causam a super-ativação da via de MAPK. 2) Resistência à morte celular programada. A apoptose tem a função de promover a morte da célula em condições que a célula acumule danos em seu DNA quando os mecanismos de reparo falham. Os reparos ao DNA somente funcionam quando os danos ocorrem em níveis basais; quando é impossível corrigí-los, como em um processo tumorigênico, para que a célula não comprometa todo o tecido, ela entra em apoptose, induzida por uma sinalização. Mutações em genes que regulam a apoptose são muito encontradas em tecidos tumorais. Exemplo: Defeito na p53 que controla a apoptose. Sem essa apoptose a célula acumula, cada vez mais, mutações. De 50% dos cânceres são caracterizados por mutações que levam a perda de função de p53 (controla a apoptose). 3) Capacidade de replicação ilimitada das células cancerígenas. Telômero, a extremidade do cromossomo. Ao longo de cada replicação, ocorre um encurtamento do telômero, que age como uma medida do envelhecimento da célula. Quanto mais o telômero vai reduzindo, mais ciclos celulares a célula vivenciou. Quando o telômero é encurtado demais, a célula pode já ter acumulado uma série de danos, de forma que a sua proliferação seja parada como medida de defesa. Nesse caso, é disparada uma determinada sinalização que faz a célula entrar no estado de senescência. Durante a replicação, a DNA polimerase precisa entender o DNA a partir de um primer de RNA. Ao final da replicação do cromossomo, é adicionado um primer de RNA, que vai ser usado como sinalizador para que a polimerase possa replicar esse cromossomo. Ao final da replicação, esse primer é degradado, mas não é substituído. Ao final de múltiplas replicações, isso promove o encurtamento do telômero. Existe um balanço entre o encurtamento do telômero e a ação da enzima telomerase, que resgata parte da sequência perdida. Em uma célula normal, a degradação da telomerase se sobrepõe um pouco ao seu resgate pela telomerase, e quando o telômero é encurtado até certo ponto, a célula entra em senescência para que ela não cause problemas ao tecido. Em células tumorais, há mutações que podem promover o aumento da expressão da telomerase, o que favorece o resgate da extremidade que está sendo erodida e estende o tempo de vida de uma célula tumoral, aumentando as chances de ela vir a acumular danos exponencialmente. Desse modo, as células tumorais passam a se replicar ilimitadamente, e a célula perde a capacidade de parar a replicação. 4) Capacidade de induzir angiogênese e a capacidade de ativar a invasão e a metástase. À medida que essas células perdem o controle de proliferação e começam a se dividir de forma exacerbada, elas formam um tumor primário, que tem uma intensa atividade metabólica, com uma demanda de nutrientes muito maior, que não é suprida pela rede de capilares que está associada a esse tecido. Desse modo, as células tumorais começam a secretar moléculas que sinalizam para um crescimento de vasos sanguíneos na direção dessas células, induzindo a angiogênese, de modo a conseguir um maior suprimento de nutrientes para garantir o seu metabolismo. 6) capacidade de disseminação celular: Formação de metástases Somente a indução da angiogênese não é suficiente, pois conforme o crescimento do tumor, as células começam a competir entre elas por nutrientes, gases e outros recursos essenciais para o seu metabolismo. Por isso, há mecanismos que permitem que uma determinada célula se desprenda desse tumor primário e se desloque para outras regiões do corpo, onde a competição por nutrientes seja menor, de modo que ela se estabeleça em outro tecido e inicie um tumor secundário ou terciário. A metástase é essa capacidade da célula tumoral se desprender da massa celular e colonizar outro tecido. A metástase é dependente da angiogênese, pois para que a célula possa se deslocar de um lugar para o outro, ela vai utilizar o sistema circulatório, que começa a infiltrar o tumor devido à angiogênese. Quanto mais vascularizado for o tumor, maior a capacidade de metástase. ➢ O que leva uma célula normal a adquirir todas essas características? Características facilitadoras como a instabilidade genômica e inflamação. Instabilidade genômica: É o aumento na frequência de mutações ou alterações no genoma ao longo do ciclo de vida de uma célula. Quanto mais mutações ou alterações a célula acumular, maiores as chances de futuramente ela promover a disfunção de algum dos eventos já explicados. Assim, um evento inicial responsável por todos os outros hallmarks é a instabilidade genômica, e esses hallmarks promovem a transformação de uma célula normal em uma célula tumoral. A instabilidade genômica é promovida pelo balanço entre a quantidade de danos aos quais o genoma está submetido e a capacidade da maquinaria de reparo de lidar com essas lesões. Quando um indivíduo está disposto a uma grande quantidade de danos, mesmo que sua maquinaria de reparo esteja funcionando, ele pode apresentar instabilidade genômica. As proteínas envolvidas com o reparo de DNA e as proteínas que impedem a proliferação exacerbada recebem o nome de supressores tumorais. Esses supressores são genes que controlam funções que antagonizam a tumorigênese, de modo que a sua perda possa acarretar instabilidade genômica. Consequências: • Mutações que levam a ativação de genes envolvido em proliferação - aumento da capacidade proliferativa; • Mutações que levam a inibição de supressores de crescimento - inibição dos supressores tumorais; • Mutações que levam a inativação da via de apoptose - inibição da morte celular programada; • Mutações que promovem a ativação da telomerase - imortalidade replicativa; • Mutações que promovem a perda de adesão celular - metástase; Exemplo de supressor tumoral: São os genes que controlam o reparo do DNA. O defeito no reparo do DNA está associado a uma maior susceptibilidade ao desenvolvimento de câncer. Quando háuma redução do reparo do DNA, haverá problemas durante a replicação, o que leva a um atraso da replicação, logo há uma tendência de acumular muito mais células na fase S do que nas outras fases do ciclo celular. Caso clínico: Xeroderma Pigmentoso É uma síndrome de predisposição genética caracterizada pela maior predisposição a câncer de pele e alta sensibilidade à radiação UV, devido à diminuição do reparo do DNA. Essa doença aumenta a predisposição ao câncer devido a defeitos no mecanismo de reparo de excisão de nucleotídeos (NER). Outros mecanismos de reparo importantes são o reparo de mau pareamento de bases e o reparo de excisão de bases (BER), aos quais foram associadas outras síndromes que causam predisposição ao câncer. Inflamação: Tumores são caracterizados por infiltrados de células imunológicas que produzem uma resposta inflamatória. Essas células imunológicas produzem uma resposta local que favorece o estabelecimento de alguns dos “hallmarks” Consequências: • Produção local de fatores de crescimento - aumento da capacidade proliferativa; • Produção de fatores pró-angiogênicos - favorecem angiogênese; • Produção de enzimas modificadoras de matriz celular - favorecem a metástase; • Produção de espécies reativas de O2 que causam danos no DNA - contribuem para a instabilidade genômica; Excetuando-se o efeito mutagênico das espécies reativas de O2 os fatores inflamatórios tem um papel nos estágios mais avançados da transformação enquanto que a instabilidade genômica, tem um efeito nos estágios iniciais da transformação. Garantir a integridade genética das nossa células é fundamental para prevenir o desenvolvimento de câncer. ➢ Hipótese do fenótipo “mutador” A partir da década de 1980, começou o sequenciamento do DNA em larga escala, de modo que foram obtidas referências que podem ser comparadas com o sequenciamento de pessoas comdiversas doenças para entender as causas desses distúrbios. Pacientes cedem amostras do seu DNA, que passam por preparações específicas e são sequenciadas por meio de mecanismos informáticos, que conseguem identificar em que regiões do genoma mutações estão presentes para que sejam comparadas com o genoma de pessoas saudáveis. A partir da análise do sequenciamento do genoma de pessoas com câncer, identificou-se que a maioria dos genes que foram identificados como mutados são genes associados ao reparo do DNA. A hipótese do fenótipo mutador afirma que mutações randômicas assumidas durante o ciclo de vida de uma célula podem, eventualmente, afetar genes necessários para garantir a fidelidade da transferência de informação genética durante cada divisão celular (como os genes de reparo de DNA, por exemplo). Sem esses genes, a célula começa a acumular mutações em outros genes, e ao longo de cada ciclo celular, essas falhas vão passando de célula para célula. O fenótipo mutador facilita a aquisição de mutações em um processo progressivo, que transforma uma célula normal em tumoral. O câncer também apresenta um componente hereditário. Nesse caso, as mutações estão presentes nas células germinativas, de modo que o indivíduo já nasce com a mutação que o torna predisposto ao câncer, de modo que o fenótipo mutador seja deflagrado cedo. As mutações estão presentes em todas as células do indivíduo. Porém, alguns tipos de câncer hereditário somente se manifestam em determinados tecidos, pois nem todos os genes são expressos em todos os tecidos. Informação extra: No câncer esporádico, a mutação está presente nas células somáticas e é adquirida ao longo da vida, de modo que o fenótipo mutador seja deflagrado em idades avançadas. Além disso, a mutação, inicialmente, está limitada a um determinado tecido. Eventualmente, ela pode se espalhar até outros tecidos quando há metástase. Curiosamente, em tumores esporádicos, a frequência de mutações é muito baixa em genes de reparo; a frequência de mutações, nesses tumores, é alta em oncogenes, cujo aumento da expressão e função favorece processos tumorigênicos. Amostras de tumores esporádicos em estágios iniciais ainda não apresentam instabilidade genômica, mas já apresentam ativação de oncogenes e estresse de replicação. A maioria dos oncogenes está associada à proliferação celular, sendo que muitos deles atuam como reguladores do ciclo celular. Por exemplo, as ciclinas e CDKs (cinases dependentes de ciclinas). As ciclinas são expressas transitoriamente ao longo do ciclo celular. Assim, ao longo do ciclo celular, as CDKs vão se ligando a diferentes tipos de ciclinas e regulam a expressão de diferentes alvos, que serão importantes para determinar a ordem da progressão do ciclo celular. Normalmente, a fase S do ciclo celular é a mais curta, pois é durante essa fase que a célula está mais suscetível a acumular danos. Se uma célula começa a expressar exacerbadamente uma ciclina que somente deveria ser expressa durante a transição entre as fases G1 e S faz com que a célula permaneça por mais tempo do que deveria na fase S, podendo acumular mais danos. Porém, se a célula passa mais rapidamente pela fase S, ela pode não ter tempo suficiente de terminar a replicação do DNA antes de chegar em G2 e M. Nesse caso, a segregação dos cromossomos vai ocorrer, porém uma das células-filhas terá menos segmentos de DNA, podendo perder segmentos importantes para a célula. A superexpressão de oncogenes acarreta o atraso na progressão da fase S. Quando a célula perde muito tempo na replicação do DNA, ela chega às fases G2 e M com o DNA parcialmente duplicado, de modo que haja perda de material genético durante a segregação dos cromossomos. Por isso, no estágio inicial de cânceres esporádicos há alta expressão de oncogenes associada ao estresse de replicação. O estresse de replicação é o evento caracterizado pelo atraso na replicação do DNA. Dependendo de qual for a perda de material genético na célula-filha, eventos de instabilidade genômica são deflagrados. Por exemplo, caso o gene que esteja faltando na célula-filha seja importante para evitar o processo de proliferação, essa célula vai começar a se proliferar de maneira exacerbada. Os oncogenes são expressos normalmente nas células; o problema somente ocorre quando há a sua superexpressão.
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