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CINESIOLOGIA E BIOMECÂNICA Mariluce Ferreira Romão Cinesiologia do esporte Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Determinar as principais variáveis biomecânicas e cinesiológicas ana- lisadas nas modalidades esportivas. � Identificar a forma de aplicação das variáveis cinesiológicas na pres- crição de exercícios físicos e treinamento desportivo. � Relacionar a biomecânica e a cinesiologia ao desempenho do atleta no esporte. Introdução Neste capítulo, você estudará as principais variáveis biomecânicas e cine- siológicas analisadas nas modalidades esportivas; sua forma de aplicação na prescrição de exercícios físicos e treinamento desportivo; bem como a relação da biomecânica e da cinesiologia com o desempenho do atleta. Principais variáveis biomecânicas e cinesiológicas analisadas nas modalidades esportivas A capacidade de fazer uma análise técnica no esporte, com ênfase nas va- riáveis consideradas, representa uma importante habilidade do treinador, porque se trata de um contexto que envolve análises qualitativas e quantitativas (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). A análise qualitativa se trata de observar sistematicamente e julgar de forma introspectiva a qualidade do movimento humano, para fazer uma in- tervenção adequada e melhorar o desempenho. Ela torna-se favorável devido ao conhecimento do treinador, que é acessado e utilizado oportunizando a instrução imediata para o atleta. Tal conhecimento deve ser usado com cautela, pois o profissional, na tentativa de não perder nada, pode deixar de observar elementos importantes que determinam o desempenho. O treinador também dispõe da análise quantitativa, capaz de aferir o de- sempenho e que utiliza variáveis deste com auxílio tecnológico (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Veja a seguir alguns exemplos de análise quantitativa do desempenho esportivo, de acordo com Ackland, Elliott e Bloomfield (2011): Um cronômetro, ou replay de vídeo pode ser utilizado para quantificar as variáveis de tempo do desempenho humano. Um treinador de beisebol pode ter acesso a um canhão de radar, que mede a velocidade da bola, durante sua trajetória no ar, e uma câmera ligada a um computador, para o cálculo de aspectos cinemáticos selecionados do arremesso. Variáveis cinemáticas como ângulo da articulação, velocidade rota- cional de um implemento (p. ex., raquete de tênis), ou ponto terminal de um segmento (p. ex., o tornozelo em esportes que usam chutes ou a cabeça do taco no golfe), e o deslocamento de um segmento (p. ex., o movimento da cabeça, durante um swing no beisebol), descrevem com precisão o movimento executado pelo atleta. O talento considerado atlético nato é importante devido ao alcance de níveis mais altos do desempenho espor tivo, e o treinamento baseado em princípios científicos esportivos também tem representatividade no desenvolvimento pleno desse talento. Portanto, deve-se primeiramente identificá-lo e, depois, desenvolvê-lo para que o desempenho ideal do atleta seja alcançado. Em geral, os treinadores e pesquisadores da área esportiva “reconhecem que o desempenho de alto nível depende de um grupo identificável de fatores básicos, cada qual, deten tor de uma importância relativa, para a atividade em questão” (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Saiba mais sobre os fatores que definem o potencial de um atleta, o conhecimento pessoal dos seus fato res biológicos e/ou comportamentais, bem como as tendências modernas mundiais no desempenho no capítulo 1 da obra “Anatomia e biomecânica aplicadas no esporte”, de Timothy R. Ackland, Bruce C. Elliott e John Bloomfield. Cinesiologia do esporte2 No esporte, as técnicas utilizadas para análise podem ser qualitativas ou quantitativas e envolver variáveis cinemáticas, na descrição do movimento, e cinéticas, na identificação das suas causas. O treinador deve ter habilidade e conhecimento, tanto experimental como científico, ao escolher a técnica mais eficaz, incluindo a prática esportiva. Entre as variáveis consideradas nas análises cinesiológicas e biomecânicas, destacam-se o equilíbrio; as leis de Newton; a ligação dos movimentos linear e angular; o movimento projétil, de força ou torque; a energia; o coeficiente de restituição; a coordenação e o sequenciamento dos segmentos corporais; o atrito; a dinâmica de fluidos; e a força centrípeta (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Você pode ver a seguir as variáveis consideradas nas análises cinesiológicas e biomecânicas. � Equilíbrio: estabilidade estática. � Leis de Newton: relação entre força e movimento. � Ligação dos movimentos linear e angular: diferenciação entre distância (escalar) e deslocamento (vetorial). � Movimento projétil: um implemento (corpo) que deixa (afasta) o solo. � Movimento de força ou torque: aplicação de força longe do centro de gravidade. � Energia: potencial, cinética e rotacional. � Coeficiente de restituição: estimativa da perda de energia de um objeto em relação a outro. � Coordenação e sequenciamento dos segmentos corporais: controle corporal em movimento. � Atrito: força entre duas superfícies em contato. � Força centrípeta: aceleração na direção do centro do círculo de movimento. � Dinâmica de fluidos: viscosidade e densidade do fluido. Análise qualitativa A análise qualitativa solicita do treinador uma compreensão do movimento, integrada aos outros tipos de experiência, em que se junta várias ciências esportivas e se associa o conhecimento específico do esporte ao do atleta que realiza a ação. No comportamento motor, trata-se de uma perspectiva ecoló- gica que une o conhecimento do atleta à tarefa e ao ambiente (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). 3Cinesiologia do esporte Outra consideração fundamental e inovadora é a visão ampliada e holís- tica da análise qualitativa, em que se destaca todas as fases do movimento, favoráveis ou não, passíveis de possibilitar um diagnóstico do desempenho. Tradicionalmente, a análise sempre enfatizou a observação e a identificação de erros/falhas, acompanhadas pelas correções, com um treinador apto a determinar os pontos positivos e negativos desse desempenho e que consegue diagnosticar as causas prováveis do desempenho ruim, sendo capaz de oferecer melhores sugestões para ter progressos mais promissores. Segundo Ackland, Elliott e Bloomfield (2011), na Figura 1 e no Quadro 1, você pode conferir quatro tarefas importantes para se considerar na análise qualitativa. Figura 1. Modelo de Knudson e Morrison de análise qualitativa do movimento humano com quatro tarefas. Fonte: Adaptada de Ackland, Elliott e Bloomfield (2011). Cinesiologia do esporte4 Fonte: Adaptado de Ackland, Elliott e Bloomfield (2011). Preparação Observação Avaliação Intervenção O treinador reúne o conhecimento sobre o atleta, o esporte e as técnicas analisadas. O treinador utiliza todos os sentidos relevantes, não apenas da visão, reunindo informações sobre o desempenho para servirem como base nas suas avaliações e nos diagnósticos subsequentes. O treinador avalia os prós e contras do desempenho e faz o diagnóstico das causas do desempenho ruim. O treinador implementa a forma de intervenção selecionada na avaliação e no diagnóstico para ajudar o atleta a melhorar. Quadro 1. Tarefas na análise qualitativa Análise quantitativa A análise quantitativa no esporte faz referência a uma técnica realizada por meio da medição de variáveis biomecânicas, capazes de fazer uma descrição precisa do desempenho. Para tal, é necessário ser especialista na técnica biomecânica, preferencialmente no esporte, para avaliar de forma correta os dados coletados. As intervenções dos treinadores somente surtem efeitos positivos quando ela for precisa, sendo que a relação de cooperação entre eles e eventuais profissionais nessa área para examinar problemas técnicos específicos se trata da forma mais utilizada por muitos centros detreinamento olímpicos em nível mundial (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Essa análise envolve quatro categorias: imagens, dinamometria, eletromio- grafia e modelagem preditiva (simulação), as quais são técnicas de mensuração que fornecem informações sobre as variáveis cinemáticas e cinéticas, conforme você pode observar no Quadro 2. 5Cinesiologia do esporte Fonte: Adaptado de Ackland, Elliott e Bloomfield (2011). Análise de imagem Dinamometria Eletromiografia Modelagem preditiva É caracterizada pelo uso de câmeras de vídeo ou opto reflexivas (óticas sem imagem visual que geram um modelo anatômico que, por sua vez, utiliza marcadores reflexivos) para registro do movimento. Permite a medição direta de variáveis cinéticas (força ou torque) utilizando diversas tecnologias. O dinamômetro mais comum na biomecânica esportiva é a plataforma de força, capaz de medir as forças de reação do solo e seus componentes perpendiculares. Detecta os potenciais elétricos nas fibras musculares. O sinal da eletromiografia, depois do processamento apropriado, proporciona uma indicação do momento de ocorrência e do nível de ativação de um músculo ou grupo muscular. Utiliza um modelo matemático do corpo e um software de computação para primeiro fazer uma simulação (modelo de computação validado) e, depois, uma otimização (simulação no computador para otimizar uma faceta do desempenho). Quadro 2. Categorias da análise quantitativa Aplicação das variáveis cinesiológicas na prescrição de exercícios físicos e treinamento desportivo No esporte, o atleta precisa imprescindivelmente de equilíbrio ou estabilidade estática, sobretudo quando a habilidade pretendida depende do elevado nível de estabili dade. Por exemplo, o arqueiro executa, de forma coordenada, a soltura da fecha, dependendo da estabilidade corporal; já o jogador de squash se movimenta rapidamente; e o nadador necessita de equilíbrio momentâ- neo no início da prova, precedendo à necessidade de estabilidade dinâmica. Atletas que dominam a estabilidade dinâmica ou momentânea estão aptos a iniciar um movimento e, em geral, a localização do centro de gravidade em relação à base de sustentação define o seu tipo (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Cinesiologia do esporte6 Em relação às leis de Newton, a primeira estabelece que um corpo prossegue em seu estado de repouso, ou de movimento uniforme, em linha reta, a menos que sobre esse corpo incida uma força externa. Ela se trata de um movimento criado por meio da aplicação de uma força interna, como acontece nos músculos; externa, como no impacto da bola de golfe com o taco; ou da modificação de um movimento previamente criado ou tendencioso. Já a segunda lei determina que uma mudança de movimento é proporcional à força aplicada e ocorre na linha de ação da força. Ela se aplica ao esporte como determinante de desempenho e dissipação de força. A terceira lei, por sua vez, afirma que, para cada ação, há uma reação igual e oposta, indicando que o dinamismo corporal, por exemplo, arremessos, lançamentos, tacadas e chutes, ocasiona uma contração corporal sistêmica (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Associar os movimentos linear e angular exige a compreensão desses dois tipos. A distância (escalar) e o deslocamento (vetorial) são medidas tecnica- mente diferentes, por exemplo, se um indivíduo correr 400 m voltando ao ponto de partida, a distância percorrida é de 400 m, porém, seu deslocamento corresponde a 0 m. Portanto, deve-se destacar que se tratam de duas variáveis com equivalentes angulares: � distância (m) — distância angular (medida em radianos ou graus); � velocidade (m/s) — velocidade angular (medida em radia nos por segundo ou graus por segundo). Com o intuito de associar os movimentos angular e linear, deve-se multiplicar o com- primento da alavanca pela velocidade angular do segmento (V). Por exemplo, no boliche de dez pinos, seria necessário adicionar a velocidade horizontal do ombro (Vombro) ao comprimento do membro superior (Lbraço) multiplicado pela sua velocidade de rotação (Vbraço) para calcular a velocidade da bola quando ela fosse lançada, conforme a seguinte equação: Vbola = Vombro + (Lbraço × Vbraço). Contudo, para que esse cálculo seja efetuado, o movi mento angular deve ser medido em radianos, não em graus (divida a distância de rotação em graus por 57,3° para converter em radianos). No movimento projétil, o corpo do atleta se afasta do solo em resposta a um salto ou um implemento, no qual deixa o solo devido ao lançamento ao ar. As principais forças consideradas nele são a gravidade (opera na direção 7Cinesiologia do esporte do centro da Terra a 9,8 m/s2) e a resistência do ar (retarda a progressão). Há outros fatores que afetam a trajetória e a distância coberta, como o ângulo de projeção; a velocidade de lançamento ou partida; e a altura do lançamento ou da partida (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Para que ocorra um giro de um implemento ou segmento corporal, é preciso que haja uma aplicação de força afastada do centro de gravidade do objeto ou do seg mento, assim, o torque (ou momento de força) indica o produto da força pela distância perpendicular da linha de ação da força, até o eixo de rotação. Em ensino e/ou treinamento, deve-se saber como modificar essa situação, em sentido medial ou lateral, no momento em que a força é aplicada sobre um objeto, por exemplo, em um remo (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Sobre a energia, são considerados três tipos que interessam aos treinado- res e/ou professores: a potencial, a cinética e a rotacional. Como as energias potencial e cinética são pautadas com maior frequência, você as estudará neste capítulo. A potencial está relacionada “à posição de um objeto, sendo igual a massa × gravidade × posição”, como no arco e flecha em ação; já a cinética se define como “a energia do movimento, sendo igual a 0,5 × massa × velocidade”, por exemplo, no beisebol. A energia elástica se refere a um tipo de energia potencial especial, cuja forma de armazenamento nos músculos e tendões é similar ao de energia em uma fita elástica ao ser estendida. Ela se trata de um pré-estiramento, que deixa os músculos em melhor posição para uma contração vigorosa, em relação ao estado de repouso. Em geral, considerado como regra, “50% da energia armazenada é perdida depois de uma pausa de 1 segundo; assim, deverá ser mínima a pausa entre as fases de giro para trás, e giro para a frente, de um movimento, como por exemplo em batidas e arremessos” (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Em esportes que envolvem impactos, o coeficiente de restituição é usado para “estimar a perda de energia de um objeto, com referência a outro”. A mensuração adimensional varia em torno de 1,0 (para uma colisão muito elástica, como quando uma bola de borracha quica no chão) até 0,0 (para uma colisão perfeitamente inelástica, por exemplo, quando um automóvel impacta contra uma parede de concreto). A utilização mais frequente do coeficiente está na “definição das proprieda des elásticas das bolas utilizadas no esporte”, como a bola de tênis (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). A coordenação e o sequenciamento dos segmentos corporais fazem referência ao sincronismo de vários deles, que promove o controle dos atletas quanto a um implemento ou parte do corpo, concomitantemente, favorecendo a obtenção de altas velocidades, por exemplo, no squash e no boxe. Na maioria das vezes, Cinesiologia do esporte8 os segmentos do corpo apresentam movimentos alternados, em um esquema proximal para distal. De acordo com Ackland, Elliott e Bloomfield (2011): [...] a precisão tende a ter relação inversa, com o número de segmen tos en- volvidos em um movimento; assim, quando a precisão é mais importante do que a velocidade, os segmentos corporais devem se movimentar mais ou menos como uma unidade. O atrito é uma força que age paralelamenteentre duas superfícies em contato, durante um movimento, ou na iminência dele, e trata-se de uma força propor cional àquela normal entre as superfícies, como a que une dois corpos (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Os atletas que têm a intenção de aumentar sua velocidade na corrida, em linha reta, “devem aplicar mais força ao piso para acelerar, de acordo com a segunda lei de Newton (F = m × a)”. Assim, na curva, eles precisam aplicar força para conseguir esse aumento, sendo que a aceleração em direção ao centro do círculo de movimento se denomina aceleração centrípeta, e a “força radial em direção ao centro é chamada força centrípeta” (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Em diversos esportes, o movimento sofre interferência do fluido, no qual a atividade é executada, que se trata da densidade e viscosidade, sinalizando características importantes para essa situação. A densidade é igual a massa pela unidade de volume, assim, o fluido mais denso gera um maior efeito no desempenho, por exemplo, quando o ar normal é comparado aquele com mais umidade. A viscosidade mede a resistência do fluido em relação ao fluxo, como na comparação da água com o ar. De acordo com Ackland, Elliott e Bloomfield (2011): [...] a força que se opõe ao movimento em um fluido é chamada arraste. Este opera no mesmo sentido do fluxo do fluido, ao passar pelo objeto, e no sentido oposto ao movimento do objeto. A força exercida em ângulo reto, com o fluxo do fluido, é conhecida como força de sustentação. Conheça mais exemplos da aplicação de variáveis cinesiológicas consideradas na prescrição de exercícios e treinamento desportivo no capítulo 1 da obra “Anatomia e biomecânica aplicadas no esporte”, de Timothy R. Ackland, Bruce C. Elliott e John Bloomfield. 9Cinesiologia do esporte Relação da biomecânica e cinesiologia com o desempenho do atleta no esporte Atualmente, um maior número de crianças e adolescentes participam de atividades esportivas em relação ao século passado, e o exercício físico tem sido indicado, inclusive por médicos, aos indivíduos de todas as idades, in- cluindo os idosos. Nesse contexto, os fisioterapeutas recebem muitas pessoas que sofreram lesões em atividades esportivas e/ou recreativas e demonstram grande ansiedade de retornar a elas. Na reabilitação, utiliza-se métodos tradicionais para intervir em lesões ortopédicas, porém, considerando que as pessoas têm a intenção de, tão logo, retornar às atividades que as causaram, o fisioterapeuta deve ter outros recursos para contribuir com o objetivo do paciente. Trata-se de incluir no programa de reabilitação “atividades que proporcionem a função ideal dos pacientes, em suas atividades esportivas e/ou recreativas”. Nessa perspectiva, ele precisa compreendê-las, distinguir a demanda física corporal solicitada e identificar as habilidades adequadas à sua realização. A cinesiologia clínica torna possível essa compreensão mediante a observação e análise do movimento, fornecendo subsídios ao fisioterapeuta na proposta terapêutica, bem como na assistência necessária aos seus pacientes (HOUGLUM; BERTOTI, 2014). O fisioterapeuta presta assistência ao paciente para retornar às atividades e restabelecer suas habilidades somente quando ele próprio tem um conhe- cimento detalhado do que as envolve. Preferencialmente, deve-se fazer uma análise quantitativa da atividade e identificar todas as suas fases, não como um profissional em biomecânica, que utiliza fórmulas e cálculos, mas, sim, como fisioterapeuta, usando a pesquisa de outros para obter as informações específicas desejadas (HOUGLUM; BERTOTI, 2014). Uma vez que o fisioterapeuta tenha a informação do que é normal, torna-se mais fácil identificar quais aspectos do desempenho do indivíduo precisam de correção. Embora as atividades, em geral, envolvam um movimento suave e contínuo, cada uma é dividida em segmentos ou fases para que seja mais fácil discutir as informações e identificar as expectativas de execução. Se ele desconhece um esporte ou uma atividade, há inúmeras fontes disponíveis para obter os dados necessários a fim de ajudar o paciente; algumas delas incluem técnicos locais, livros, vídeos e recursos on-line (HOUGLUM; BERTOTI, 2014). Cinesiologia do esporte10 Aplicação da biomecânica na melhora do desempenho esportivo Os treinadores que conhecem a base mecânica de uma habilidade conseguem fazer a análise de movimento, estabelecer uma melhor comunicação com seus atletas e minimizar a ocorrência de lesões. É comum eles aceitarem que o desempenho de alto nível e bem‐sucedido tecnicamente esteja sob dependência do domínio de alguns itens críticos. A zona de aceitação dessas variáveis mecânicas, identificadas como essenciais nas análises, oferece a quem observa uma referência clara na modificação da técnica (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Por exemplo, de acordo com Ackland, Elliott e Bloomfield (2011), no saque do tênis, as pesquisas descritivas identificaram as seguintes características comuns aos tenistas de alto desempenho: � aproximadamente 120° ± 20° da flexão da perna (ângulo incluso) durante os mo- vimentos preparatórios; � um ângulo entre braço e tronco (abdução) de 100° ± 10° no impacto; � uma posição de impacto alinhada à parte anterior do calcanhar ± 20 cm para um saque potente. A responsabilidade de quem pretende ensinar uma nova técnica, corrigir ou modificar uma que já existe envolve o feedback e a prática, tendo em vista sua organização. O feedback, em geral, deve acontecer como resultado da finalização de um movimento; após cada exercício prático, exercendo uma influência benéfica em curto prazo no desempenho, porém, esse procedi- mento pode ser prejudicial ao aprendizado em longo prazo; a diminuição da frequência, conforme aumenta o nível de habilidade do atleta; bem como o aumento da frequência e precisão devido à melhora da habilidade (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Quanto à prática do treinamento, é comum organizar mais de uma por sessão para maximizar o tempo. Ao final dessa sessão, o objetivo do treinador deve ser alcançar o máximo possível de desenvolvimento da habilidade. Pesquisas na área do esporte sobre a teoria da interferência contextual sinalizam que, na maioria das vezes, “quanto maior o esforço mental aplicado, melhor o 11Cinesiologia do esporte aprendizado da habilidade praticada”, porém, a questão se trata de conseguir definir qual a quantidade de esforço mental necessário à atividade esportiva e/ou recreativa pretendida (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Foi feita uma comparação entre dois métodos de prática para examinar o impacto da interferência contextual. Seu grande nível costuma envolver uma prática aleatória ou uma abordagem prática, em que duas ou mais habilidades ou suas variações são praticadas, alternadamente, na mesma sessão. Por exemplo, o treinamento para futebol americano envolve um chute, um arremesso de mão, outro chute e assim por diante, sendo que nenhum é praticado repetidas vezes per se. Já um baixo nível de interferência inclui um esquema de prática bloqueada, em que se realiza uma habilidade de modo contínuo antes que outra seja praticada. Essa situação se tornou comum em campos de treinamento de drives de golfe, nos quais um jogador pode dar tacadas em um balde inteiro de bolas, visando ao alvo específico e utilizando apenas um taco. Segundo as pesquisas, a prática bloqueada leva a um melhor desempenho das habilidades em curto prazo do que a prática aleatória, o que pode parecer lógico em razão da capacidade dos jogadores de entrar na rotina de uma habilidade durante a sessão. No entanto, quando as habilidades são examinadas em longo prazo, com o objetivo de determinar se o desempenho do treinamento é permanente, nota‐se que a prática aleatória propicia uma melhor retenção ou aprendizado (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). O feedback e a prática são instrumentos essenciais, disponíveis aos profissionais e capazesde influenciar no desenvolvimento da habilidade técnica. De acordo com Ackland, Elliott e Bloomfield (2011): O feedback do treinador precisa ser, paulatinamente, reduzido à medida que o aprendizado progride, para que os atletas não passem a ficar dependentes de sua disponibili dade. A prática deve incentivar a varia- bilidade dos movimentos, em particular na fase inicial do aprendizado. Cinesiologia do esporte12 1. “A figura a seguir ilustra um modelo determinista das variáveis mecânicas, que contribuem para um salto em altura. Um treinador de pista pode utilizar essas variáveis, e esses princípios biomecânicos na análise qualitativa, para avaliar a qualidade do salto em distância de um atleta, e para prescrever melhoras na técnica ou práticas adequadas” (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). Altura do CG na decolagem (isso envolve o físico do atleta e o ângulo de decolagem) Altura H1 H2 H3 Velocidade na decolagem Posições do corpo ao ultrapassar a barra Potência muscular Velocidade da corrida Ângulos do membro inferior durante a decolagem Tempo no solo Fonte: Adaptada de Ackland, Elliott e Bloomfield (2011). Considerando a velocidade de decolagem destacada na figura anterior, é correto correlacioná-la com: a) coeficiente de restituição. b) coordenação segmentar. c) força centrípeta. d) equilíbrio. e) atrito. 2. “As técnicas de análise de imagens no esporte são caracterizadas pelo uso de câmeras de vídeo ou optorreflexivas (óticas sem imagem visual; geram um modelo anatômico, que utiliza marcadores reflexivos) para registro do movimento. A sequência de imagens múltiplas gravadas, com o passar do tempo, fornece dados de posição, que podem ser processados por softwares de computador para calcular diversas variáveis biomecânicas” (ACKLAND; ELLIOTT; BLOOMFIELD, 2011). 13Cinesiologia do esporte Fonte: Adaptada de Jacob Lund/Shutterstock.com. Considerando a figura anterior, que apresenta um atleta pronto para iniciar um teste, é correto afirmar que: a) trata-se de uma análise qualitativa, feita por dinamometria. b) trata-se de uma análise qualitativa, feita por eletromiografia. c) trata-se de uma análise quantitativa, feita por simulação. d) trata-se de uma análise quantitativa, feita por imagem. e) trata-se de uma análise qualitativa, feita por pesquisa. 3. Segundo Ackland, Elliott e Bloomfield (2011), “uma boa análise técnica deve, na verdade, lançar mão de habilidades de raciocínio de ordem mais elevada, do que a palavra “analisar” implica (quebrar algo em partes). A análise técnica altamente eficaz deve avaliar o movimento para que sejam identificados as virtudes e os defeitos e, em seguida, seja diagnosticado o desempenho para se prescrever a devida intervenção. É por isso que alguns estudiosos propuseram que a análise qualitativa da técnica seja denominada diagnóstico clínico”. Sobre as tarefas consideradas importantes nas análises qualitativas, é correto afirmar que: a) o treinador reúne informações específicas sobre o atleta na fase de avaliação. b) o treinador faz um diagnóstico das ações do atleta na fase de preparação. c) o treinador faz a análise do desempenho ruim na fase de intervenção. d) o treinador propõe adequações nas ações na fase de intervenção. e) o treinador avalia o desempenho do atleta na fase de observação. 4. “Embora não tão, extensamente, examinado como o arremesso de beisebol, algumas pesquisas investigativas analisaram a mecânica e a cinética do softball de lançamento rápido” (HOUGLUM; BERTOTI, 2014), como você pode ver na figura a seguir. Cinesiologia do esporte14 Fonte: Adaptada de Houglum e Bertoti (2014). Considerando práticas esportivas específicas, como as fases do softball apresentadas anteriormente, assinale a alternativa correta em relação ao treinador ou professor. a) A organização de práticas isoladas em cada sessão é comum. b) O feedback deve ser mais frequente com mais tempo de prática. c) A maior habilidade do atleta requer um feedback com menor precisão. d) O treinador deve conhecer a base mecânica do esporte em questão. e) O esforço mental deve ser inversamente proporcional à aprendizagem. 5. “O nado livre, como o futebol, é uma atividade que atrai uma ampla gama de faixas etárias. No entanto, diferentemente do futebol, essa atividade pode ser realizada como membro de uma equipe ou individualmente, seja de forma competitiva ou recreativa” (HOUGLUM; BERTOTI, 2014). Fonte: Adaptada de Houglum e Bertoti (2014). No meio aquático, conforme apresentado na figura anterior, é correto destacar uma grande interferência de: a) coeficiente de restituição. b) dinâmica de fluidos. c) força centrípeta. d) equilíbrio. e) atrito. 15Cinesiologia do esporte ACKLAND, T. R.; ELLIOTT, B. C.; BLOOMFIELD, J. (Ed.). Anatomia e biomecânica aplicadas no esporte. 2. ed. Barueri: Manole, 2011. 400 p. HOUGLUM, P. A.; BERTOTI, D. B. Cinesiologia clínica de Brunnstrom. 6. ed. Barueri: Manole, 2014. 740 p. Leituras recomendadas MOORE, K. L.; DALLEY, A. F.; AGUR, A. M. R. Anatomia orientada para a clínica. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. 1128 p. TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. 1220 p. Cinesiologia do esporte16 Conteúdo:
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