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Educação Especial: Identidades e Culturas Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Dr.ª Rutinéia Cristina Martins Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo • Introdução; • O Mundo Contemporâneo e a Deficiência; • Educação Especial na Realidade Brasileira; • Educação Especial e Propostas de Ensino; • Reflexões Sobre a Educação Especial no Século XXI: Mudanças nas Concepções. • Compreender a Educação Especial na realidade brasileira após o conhecimento e a refl e- xão sobre as infl uências culturais a que foi submetida; • Analisar a medida das mudanças de mentalidade, valores e atitudes no ambiente escolar por infl uência das mudanças na Legislação e nas propostas de Ensino. OBJETIVOS DE APRENDIZADO Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo Contextualização Observe o quadro a seguir: Figura 1 – Guernica Fonte: Wikimedia Commons Guernica é uma obra do pintor espanhol e cubista Pablo Picasso. Ela retrata a cidade de Guernica durante a Guerra Civil espanhola (1936-1939). Trata-se de uma das obras mais emblemáticas do artista e que foi produzida em 1937 (DIANA, on-line). Costuma-se dizer que Guernica é uma declaração de guerra contra a guerra, posto que é uma manifestação contra a violência ocorrida naquele período. Qual a relação entre essa obra de arte e o conteúdo desta Unidade? Por que as situações de guerra foram tão importantes para a construção do pa- radigma contemporâneo de Educação Especial? 8 9 Introdução Enfim, chegamos à nossa última Unidade, chamada de Educação Especial: a construção de um paradigma contemporâneo. Mas o que é paradigma? O dicionário (FERREIRA, 2013, p. 562) nos informa que é um modelo ou padrão. Nas Ciências Sociais, entre elas a Antropologia, que se dedica ao estudo das questões culturais, o termo é usado para descrever o conjunto de experiências, crenças e valores que incidem sobre a forma segundo a qual um indivíduo compre- ende a realidade e na sua forma de resposta. Será que houve mudança de paradigma em relação à deficiência e à Educação Especial? Ou a Sociedade continua querendo eliminá-las e segregá-las? O Mundo Contemporâneo e a Deficiência A contemporaneidade, época atual em que vivemos – período posterior à Revo- lução Francesa (1789), representa uma inter-relação entre todas as concepções de deficiência que conhecemos. Em grande parte das pessoas, há um sentimento de piedade e repulsa, pois na memória das Sociedades atuais, há a informação de que deficientes não convivem com pessoas ditas normais. Mesmo assim, houve pessoas que, por meios de estudos ou ações, favoreceram a condição material dos deficientes e os recursos oferecidos a eles, o que está de- monstrado na tabela a seguir: Tabela 1 Data Ação Local Autor Pós-1815 (após Guerras Napoleônicas 1803-1815) Busca de reabilitação dos soldados feridos em guerra, com serviços compatíveis com a deficiência. França Napoleão Bonaparte 1824 Invenção do Sistema Braile de escrita. Paris-França Louis Braile 1854 Criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos, atual Instituto Benjamin Constant. Rio de Janeiro- Brasil Imperador Pedro II 1857 Criação do Imperial Instituto de Surdos Mudos – atual Instituto Nacional de Educação de Surdos. Rio de Janeiro- Brasil Hernest Huet/ Imperador Pedro II 1884 Lei de readaptação e reabilitação ao trabalho para soldados feridos em guerra. Alemanha Chanceler Otto Von Bismarck 1902-1912 Crescimento de organizações de proteção à pessoa com deficiência. Europa Diversos órgãos governamentais e não governamentais 1907 Conferência da Casa Branca sobre Cuidados com crianças deficientes. Estados Unidos Diversos órgãos governamentais e não governamentais Fonte: Elaborado pela autora, a partir da leitura de ATANE (2016, on-line) e GUGEL (on-line) 9 UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo Assim, vemos que no mundo – e também no Brasil, essas mudanças e ações proporcionam o começo de formação de uma cultura de cuidado e respeito aos de- ficientes, ainda que isso seja um processo lento para a maioria das pessoas, presas a antigas concepções. Todavia, o século XX traz dois eventos que são fundamentais para acelerar esse processo: as duas Grandes Guerras Mundiais (1914-1918 e 1939-1945). Elas trouxeram uma carga de destruição tão grande e intensa que a Humanidade necessitou tomar medidas expressas de acolhimento e reabilitação de pessoas que se tornaram deficientes, como afirma Tahan (2012, p. 21): Foi a partir da Segunda Guerra Mundial que o direito necessita se pre- ocupar com grupos sociais específicos, nesse caso surgem os mutilados da guerra, pessoas que foram para a guerra sem nenhuma deficiência e voltam às suas casas com algum tipo de mutilação que impedem a fruição normal de suas atividades de vida diária. Monumento de Auschwitz, feito do vidro quebrado no parque de Amsterdã Wertheim: http://bit.ly/2Q8V3ZcEx pl or No período de 1914 a 1945, que compreende as duas Guerras, e o intervalo de 1918 a 1939, o mundo assistiu a atrocidades jamais vistas, como o Holocausto, que eliminou aproximadamente 6.000.000 de pessoas, dentre as quais mais de 200.000 pessoas com deficiência. Segundo a Holocaustencyclopedia (online), a Alemanha possuía um programa de eliminação de indivíduos que tinham algum tipo de deficiência física, retardo ou doença mental. Além disso, segundo Scwarz (2014, on-line) houve a esterilização de mais de 400000 pessoas com doenças hereditárias, problemas natos ou adquiridos no de- senvolvimento mental, além de pessoas com comportamentos indesejados, como criminosos e prostitutas. Holocausto: É o nome que se dá ao genocídio cometido pelos nazistas ao longo da Segunda Guerra Mundial e que vitimou aproximadamente seis milhões de pessoas entre judeus, ci- ganos, homossexuais, testemunhas de Jeová, deficientes físicos e mentais, opositores políticos etc. De toda forma, o grupo mais foi vitimado no Holocausto foi o dos judeus que, por sua vez, preferem referir-sea esse genocídio como Shoah, que em hebraico significa “catástrofe” (SILVA, on-line). Ex pl or Por causa desse estado de calamidade instaurado em nível mundial, foram cria- dos órgãos como a Organização das Nações Unidas (ONU-1945) e documentos como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), visando à reorganiza- ção social, política e econômica, pois os países estavam empobrecidos, assim como 10 11 muitos jovens que teriam a função de ajudar a prover suas famílias estavam mortos ou mutilados. O mundo estava desmoronado e precisava ser reerguido. As questões relativas às pessoas com deficiência, de algo que era escondido e deixado de lado, passaram a ser relevantes por questão de ordem pública. Educação Especial na Realidade Brasileira E a realidade brasileira? Como construiu o seu modelo de Educação Especial em meio a um contexto mundial tão conturbado? Essa construção auxiliou na constru- ção de uma cultura de inclusão da pessoa com deficiência no país? A esse respeito, Januzzi (2004, p. 34) nos mostra que a década de 1930 foi um momento de grande importância porque a Sociedade Civil começou a se organizar em Associações de pessoas preocupadas com a questão da deficiência na Socie- dade, ainda que a esfera governamental desencadeasse algumas ações no sentido de criar Escolas junto a Hospitais e ao Ensino Regular, há fundação de Entidades Filantrópicas especializadas e outras formas de atendimento em Clínicas e Institutos Psicopedagógicos, sendo que o atendimento ao deficiente era compreendido como algo mais vinculado à saúde do que à educação. Outro fator que demonstra a cultura assistencialista da época é que a Educação da pessoa com deficiência também se vinculava à filantropia, ou seja, à caridade e benevolência. Não era um serviço compreendido como direito e, dessa forma, poderia ser so- licitado, mas não exigido. Figura 2 – Menino surdo de Sorriso aprende Língua de Sinal Fonte: Getty Images A Lei brasileira também foi sendo modificada à medida em que se ampliava o entendimento sobre as necessidades educacionais das pessoas com deficiência. 11 UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo Vejamos como as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional tratam da questão: Tabela 2 Legislação Avanços Lei 4024/1961 A EDUCAÇÃO dos excepcionais é incluída no título X, sendo enquadrada no Sistema Geral de Educação como forma de integração à Sociedade (Artigo 88). No artigo 89, o Poder Público tem a responsabilidade de incentivar a iniciativa privada a promover a Educação para essa parcela da população por meio de Bolsas de Estudo, empréstimos e subvenções. Lei 5692/1971 No Artigo 9º, garante tratamento especial aos alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais. Por conta dessa orientação, houve a estruturação da Secretaria de Estado de Educação e do Serviço de Educação dos Excepcionais. Foram organizadas Classes Especiais e criados programas de Mestrado em Universidades Públicas sobre o assunto. Lei 9394/1996 Em seu Artigo 58, inclui o termo Educação Especial na Legislação brasileira, tornando-a mais abrangente ao incluir também as pessoas com transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades. A grande diferença em relação às Legislações anteriores é atender às pessoas com deficiência preferencialmente na Rede Regular de Ensino e oferecer, com recursos públicos o atendimento educacional especializado. Fonte: Elaborado pela autora a partir da leitura de BRASIL (1961, 1971 e 1996) e ROGALSKI (2004) Cada Legislação trouxe sua contribuição para as condições educacionais das pessoas com deficiência, mas nenhuma foi tão efetiva como provocadora de mu- danças culturais como a Lei 9394/1996, vigente na Educação brasileira. Essa Legislação trouxe a convivência efetiva das pessoas com deficiência para a Escola Regular. As últimas décadas representaram um árduo processo de fazê-las conviver com todos os tipos de criança, ao invés de ficarem escondidas ou segregadas em Esco- las Especiais. Como já dissemos, as mudanças culturais operam de maneira lenta na mentali- dade das pessoas; porém, no século XXI, é impossível ignorar a presença daqueles considerados diferentes e a proximidade tem o poder de modificar as ideias pré- -concebidas por meio do conhecimento. O processo de inclusão não foi e nem está sendo simples, pois vai de encontro a questões culturais, como a visão de deficiência de professores e alunos e também de questões estruturais, como a infraestrutura e a formação dos profissionais, como no depoimento a seguir, expostos na monografia de Lima (2011, p.29): O primeiro ano com um aluno incluído foi um tanto traumático, pois assim como a maioria dos professores, não recebi orientação de como trabalhar com esse aluno e muito menos fui informada, a priori, que teria um aluno com Deficiência Intelectual, D.I., em minha classe de 6ª série. Outro depoimento trata do assunto: “A maior dificuldade é a falta de entendi- mento da deficiência, não sabendo lidar com as reações dos alunos. Busco me inteirar da dificuldade estudando dissertações e teses” (LIMA, 2011, p.30). 12 13 Os depoimentos selecionados se referem a professores que enxergam as difi- culdades, mas aceitam o processo, procurando ajuda e qualificação. A visão dos pais a respeito da Educação Especial também reflete a cultura contemporânea, como nos exemplos catalogados por Garcia (2018, on-line): “A escola não deveria achar que faz um favor para a criança especial ao incluí-la (pai de um menino autista, de 12 anos)”. Meu foco não é no que ele ainda não faz, mas, sim nas suas grandes conquistas! É uma batalha diária. Mas eu faço questão de tomar as rédeas e transformar o cenário em algo positivo, animador. Isso foi um grande aprendizado e foi essencial para lidar com todos os momentos de tensão e dor, pelos quais passei desde a gestação. (Mãe de um menino de 10 anos, com dificuldades motoras causadas por uma hemorragia cerebral) Figura 3 – Menino adolescente com paralisia cerebral Fonte: Getty Images Os depoimentos acima foram dados por pessoas esclarecidas sobre seus direi- tos e possibilidades. Passaram por todas as dificuldades de aceitação pelas quais passam os pais de crianças com deficiências, mas após vencido o período de luto, procuraram recursos para estimular os seus filhos e oferecer boas condições de aprendizagem. Entretanto, não é a realidade da maioria das pessoas no Brasil. O estranhamento, as concepções negativas de deficiência que coexistem em nossa cultura e a falta de conhecimentos formais, fazem com que pouco se possa oferecer para auxiliar a Educação de seus filhos. Ainda assim, a legislação que inclui as pessoas com deficiência na Rede Re- gular de Ensino se constitui como avanço, vez que, com todas as dificuldades de formação e infraestrutura, os deficientes saem do anonimato para conviver com as pessoas ditas normais. 13 UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo Educação Especial e Propostas de Ensino Nesse item, não vamos analisar os conteúdos sugeridos para o ensino na Educa- ção Especial, mas como ela é entendida nas propostas, ou seja, que aspectos culturais podem ser observados em sua elaboração e aplicação. Para isso, vamos analisar os documentos de abrangência nacional: Plano Nacional de Educação (PNE), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e Base Nacional Comum Curricular. As escolhas foram feitas por serem documentos de abrangência nacional e sub- sidiarem a construção de documentos curriculares regionais. Como foi construído o Plano Nacional de Educação? O texto do Plano Nacional de Educação foi elaborado a partir das propostas de vários segmen- tos da Sociedade, que participaram nos anos de 2009-2010 da Conferência Nacional de Educa- ção (CONAE), que teve etapas distritais, municipais, regionais, estaduais e nacionais. Conforme Brasil (2010, on-line), a Conae constituiu-se, assim, num espaço democráticode construção de Acordos entre atores sociais que, expressando valores e posições diferenciadas sobre os aspec- tos culturais, políticos, econômicos, apontam renovadas perspectivas para a organização da educação nacional e para a formulação do Plano Nacional de Educação 2011-2020, embora a Lei tenha sido promulgada em 2014 e a validade seja deste ano a 2024 (MEC, 2010). Ex pl or O PNE – Lei 13.005/2014 (BRASIL, 2014, on-line) – não é uma proposta cur- ricular, mas uma Legislação construída com a participação de educadores e comu- nidade, que oferece os direcionamentos da Educação. Sua meta de número 4 prevê: Universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garan- tia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados. A Lei é bem específica e oferece à população com deficiência as garantias de um bom atendimento educacional. Como não há referências à criação de uma cultura inclusiva, buscamos, entre as 19 estratégias de efetivação da meta, contidas no próprio Plano, aquelas que mais podem favorecer esse processo. Uma das estratégias é estimular a criação de Centros Multidisciplinares de Apoio, Pesquisa e Assessoria. Entende-se que a disseminação do conhecimento favorecerá o esclarecimento de ideias preconceituosas ainda existentes, mesmo entre profissio- nais esclarecidos como professores. 14 15 Esse trabalho deverá ser feito em articulação com Instituições Acadêmicas e integrados por profissionais das áreas de saúde, Assistência Social, Pedagogia e Psicologia, para apoiar o trabalho dos(as) professores(as) da Educação Básica com os(as) alunos(as) com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação (BRASIL, 2014, on-line). Outra estratégia diz respeito à promoção de parcerias com instituições comuni- tárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, conveniadas com O Poder Público, a fim de favorecer a participação das famílias e da Sociedade na constru- ção do Sistema Educacional Inclusivo. Ao utilizar essa estratégia, espera-se que toda a Sociedade esteja envolvida na Educação das pessoas com deficiência, havendo maior envolvimento por parte das famílias, fomentando a cultura de inclusão e participação dos deficientes. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009, é o documento mandatário na Educação de crianças de 0 a 5 anos. Em suas orientações, define a interação e a brincadeira como eixos norteadores e trata de concepções contemporâneas de Educação e Pedagogia para a infância, além de segmentos específicos como as crianças indígenas e do campo, conside- rando as particularidades dessas modalidades de ensino. Entretanto, não há refe- rências diretas à Educação Especial ou simplesmente à criança com deficiência na Creche ou na Pré-escola. A diversidade tratada no documento refere-se às relações étnicas e não às habi- lidades físicas ou mentais, que envolveriam as deficiências, transtornos globais do desenvolvimento ou superdotação. Figura 4 15 UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo A invisibilidade do público-alvo da Educação Especial nos dá referência das concepções envolvidas, ou seja, se esse público não foi percebido e inserido em meio à população sem deficiência, é porque suas diferenças não recebem valor ou são desconsideradas. E a Base Nacional Comum Curricular? Como concebe a pessoa com deficiência e a Educação Especial? Pode-se dizer que a palavra-chave para Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é referência. Para a Educação Básica, ela foi feita como um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades (MEC, 2019, on-line). Ao ler a Introdução, podemos compreender que o documento propõe a igualda- de educacional por meio das aprendizagens essenciais, visando à igualdade, diver- sidade e equidade, o que culminaria no conhecimento de que as necessidades dos estudantes são diferentes. A equidade, definida como disposição de reconhecer igualmente o direito de cada um (FERREIRA, 2013, p. 297), é descrita como o compromisso com as populações historicamente excluídas e/ou marginalizadas como os povos indígenas, afrodescen- dentes, remanescentes de quilombos e pessoas com deficiência, reconhecendo a neces- sidade de práticas pedagógicas inclusivas e de diferenciação curricular, conforme esta- belecido na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015). O ideal inclusivo também se expressa nas competências a serem desenvolvidas na Educação Básica, como o uso de diferentes linguagens – oral, visual-motora (como Libras), escrita, corporal, visual, sonora e digital (MEC, 2019, p. 9). Linguagens que se juntam a outras já tradicionais na Escola, como a Matemá- tica, Artística e Científica, que possibilitam a expressão de ideias, experiências e sentimentos nos diferentes contextos. Outra competência que diz respeito ao relacionamento da Sociedade com a Edu- cação Especial é o exercício da empatia, diálogo, resolução de conflitos e cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos (MEC, 2019, p. 10), com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qual- quer natureza. Esse ideário que nos leva a entender que haverá o favorecimento de uma cultura inclusiva que promova a Educação Especial, ao longo do documento, verifica-se um olhar mais técnico para essa modalidade de ensino, com foco no Atendimento Edu- cacional Especializado (AEE) e nos recursos pedagógicos e tecnológicos que dele fazem parte, como a Tecnologia Assistiva e as estratégias especializadas de ensino. Soma-se a isso a eliminação de barreiras de ordem física e atitudinal. Proposta da BNCC: http://bit.ly/2Q73YtX Ex pl or 16 17 Reflexões Sobre a Educação Especial no Século XXI: Mudanças nas Concepções “O homem, em suma, não tem natureza, o que tem é história.” (Ortega y Gasset). Ao lermos a frase de Gasset, concordamos com sua afirmação, pois entendemos que somos seres históricos no sentido de nossa cultura ser soma e produto de tudo que foi produzido tanto por nossos antepassados quanto por nossos contemporâneos. Por isso, ao longo desta Disciplina, transitamos por diversas épocas e culturas e suas concepções acerca das pessoas com deficiência e por fim, sobre a Educação Especial. Assim, foram vistos diversos paradigmas que podemos identificar na tabela a seguir, com suas respectivas palavras-chave: Tabela 3 Modelo Ideias-Chave Antiguidade Clássica (Grécia e Roma) Ocultação e eliminação. Antiguidade Oriental (Egito) Convivência integrada na Sociedade. Roma Cristã • Acolhimento por religiosos;• Sem participação social. Idade Medieval Acolhimento por religiosos e marginalização. Idade Moderna Desenvolvimento da Ciência em busca de melhorias na qualidade de vida. África • Rejeição; • Explicações sobrenaturais. Afro-brasileiros • Deficiência física causada por maus tratos em senzalas; • Participação nas comunidades remanescentes de quilombos; • Acolhimento pelas religiões de matriz africana. Indígenas • Impossibilidade de sobrevivência de deficientes na floresta. Século XX • Duas grandes guerras causando deficiência física em larga escala; • Esforço mundial para reabilitação dos deficientes; • Década de 1930 com movimentação da Sociedade para o atendimento à pessoa com deficiência. Século XXI Construção de paradigma de inclusão. Todas essas ideias-chave percorrem a nossacultura e nos influenciam em maior ou menor grau, dependendo das experiências de cada um. Nesse sentido, o que seria a construção de um paradigma contemporâneo? Esse paradigma seria construído a partir das necessidades do tempo presente, visto que embora as concepções segregacionistas ainda permeiem o ideário de educadores, a Sociedade avançou no sentido de construir direitos e estabelecer pro- cessos educativos para todos os segmentos. Por isso, como deve ser contemplado em diversas Disciplinas, a Educação das pessoas com deficiência surge como uma necessidade deste século, já que conquistaram, com muita luta, o direito à partici- pação na Sociedade. 17 UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo No Brasil, Sassaki (apud SANTOS et al., 2017, p. 315) dividiu os períodos his- tóricos em quatro paradigmas: • Exclusão (rejeição social); • Institucionalização (segregação; • Integração (modelo médico da deficiência); • Inclusão. Embora na mente das pessoas ainda permaneçam os paradigmas que visavam à eliminação dos deficientes ou à sua separação da Sociedade, eles foram superados, graças a estudiosos e movimentos sociais que objetivavam a inserção social e a melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência. O paradigma contemporâneo abarca a conciliação entre Educação Especial e Edu- cação Inclusiva, de modo que esta pode ser concebida como uma Educação voltada para a cidadania global, plena, livre de preconceitos e que reconhece e valoriza as diferenças (ITARD, on-line), enquanto a Educação Especial é a modalidade de ensino que segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, on-line) é oferecida preferencialmente na Rede Regular de Ensino, para educandos com defi- ciência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, isto é, seria um modelo de Educação em que os educandos seriam incluídos, de fato: fariam parte da Sociedade, com seus direitos respeitados. Além disso, receberiam um tipo de ensino especializado e voltado ao atendimento de suas necessidades específicas. Esse processo ainda não se concretizou. As diversas realidades do país se apre- sentam em etapas diferentes de efetivação. Todavia, conhecer como se constituiu a cultura a respeito da pessoa com deficiência favorece a nossa participação como profissionais no intuito de criar e fomentar uma cultura de bem-estar, autonomia e participação da pessoa com deficiência na Sociedade, tendo a Educação Especial como principal caminho. Figura 5 – Menino com transtorno do desenvolvimento Disponível em: Getty Images 18 19 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros A Educação do Deficiente no Brasil: dos Primórdios ao Início do Século XXI JANUZZI, G. A educação do deficiente no Brasil: dos primórdios ao início do século XXI. Campinas. Autores Associados, 2004. Coleção Educação Contemporânea. Inclusão: Construindo uma Sociedade para Todos SASSAKI, R. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. São Paulo: WVA Editora, 2017. Filmes Meu Nome é Rádio Direção: Michael Tolin. Estados Unidos, 2003, 109 minutos. Meu Pé Esquerdo Direção: Jim Sheridan, Reino Unido, 1989, 100 minutos. 19 UNIDADE Educação Especial: A Construção de um Paradigma Contemporâneo Referências ATANE, S. A história do método Braile. Revista SuperInteressante. São Paulo: 31 out. 2016. Disponível em: <https://super.abril.com.br/historia/a-historia-do- -metodo-braile/>. Acesso em: 18 jul. 2019. BRASIL. Lei 4024, de 20 de dezembro de 1961, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legisla- cao/108164/lei-de-diretrizes-e-base-de-1961-lei-4024-61>. Acesso em: 21 jul. 2019. BRASIL. Lei 5692, de 11 de agosto de 1971, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legisla- cao/128525/lei-de-diretrizes-e-base-de-1971-lei-5692-71>. Acesso em: 21 jul. 2019. BRASIL. Diretrizes curriculares nacionais para a educação infantil. Brasília: MEC, SEB, 2010. BRASIL. Lei 13.005, de 25 de junho de 2019, aprova o PNE e dá outras providências. Disponível em: <http://pne.mec.gov.br/18-planos-subnacionais-de-educacao/543- -plano-nacional-de-educacao-lei-n-13-005-2014>. Acesso em: 28 jul. 2019. BRASIL. Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legis- lacao/109224/lei-de-diretrizes-e-bases-lei-9394-96>. Acesso em: 21 jul. 2019. DIANA, D. Guernica, de Pablo Picasso. Disponível em: <https://www.todamate- ria.com.br/guernica-de-pablo-picasso/>. Acesso em: 29 jul. 2019. FERREIRA, A. Mini-Aurélio: o dicionário da Língua Portuguesa. 8.ed. Curitiba: Positivo, 2013. GARCIA, V. Famosos e filhos especiais. Criança especial. 9 agosto 2018. Dispo- nível em: <http://criancaespecial.com.br/marcos-mion-a-escola-nao-deveria-achar- -que-faz-um-favor-para-a-crianca-especial-ao-inclui-la/>. Acesso em: 22 jul. 2019. GUGEL, M. 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