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17 O espelho da vida A arte expressa a vivência pessoal de alguém (suas ideias, sentimentos ou história pessoal) através de uma matéria (som, imagem, cor etc), podendo encontrar identificação com outro sujeito. Vamos avançar no entendimento e análise de uma obra de arte. Dessa forma, podemos desdobrar os conceitos destacados no parágrafo acima da seguinte forma: a • vivência pessoal do artista pode ser entendida como o conteúdo de uma obra de arte; a • matéria da obra de arte e a forma como ela é trabalhada definem uma técnica de trabalho; a • identificação de alguém com o conteú- do apresentado pelo artista através de uma técnica acaba gerando o público dessa obra. Conteúdo, técnica e público. Sobre esse tripé é que a arte se concretiza. Uma obra de arte só existe como tal até que cumpra esse ciclo. O pintor holandês Vincent Van Gogh (1853-1890) e o escritor tcheco Franz Kafka (1883-1924), dois dos maiores artistas de todos os tempos, têm em comum o fato de terem pedido, no leito de morte, que suas obras fossem destruídas. Se tivessem sido atendidos, o conteúdo e a técnica sem igual desses dois artistas não teriam encon- trado seu público e suas obras não existiriam. Descobrir uma obra de arte é descobrir-se nela. Representa uma experiência única e uni- versal ao mesmo tempo. Entretanto, tatear a incerteza é improdutivo e a arte como qualquer objeto de estudo requer certo conhecimento que só nasce de um amor prolongado e uma dedica- ção paciente. Aguçar a visão para penetrar numa obra de arte é a tarefa que tentaremos executar a partir de agora. Se alguém quiser entender uma obra de arte é preciso encará-la como um todo, por exemplo, qual o clima de suas cores e a dinâmica de suas formas. Assim, vamos estudar os elementos fun- damentais das artes, em especial das artes plásticas, para perceber como o artista, usando da técnica, é capaz de dar forma a um conteúdo e mexer conosco, o espectador. A arte mostra o nosso mundo Observando diferentes obras de arte, e obtendo informações sobre o contexto em que foram realizadas, podemos desvendar parte da realidade em que cada artista estava inserido. Dessa forma, observando as pinturas rupestres dos caçadores pré-históricos, ou lendo a carta do descobrimento do Brasil de Pero Vaz de Caminha (1450-1500), podemos nos encontrar por instan- tes vivendo essas histórias do passado, que, no entanto, são trazidas de volta à vida por terem sido construídas por verdadeiros artistas. Qual é o segredo dessa mágica de fazer reviver acontecimentos do passado? Em cada um desses momentos, encontraremos algo (um conteúdo) sobre o qual alguém (um artista) quis falar de alguma forma (uma técnica), mas que só pode ser revivido com a participação ativa de um observador (público), se ele coloca sua atenção, seu raciocínio, seus sentimentos e sua própria história de vida à disposição nesse momento. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 18 Inicialmente, seria importante percebermos quem é esse indivíduo que pretende “falar algu- ma coisa” ao observador: o artista. Ele é aquele que apresenta ao público a sua interpretação do mundo. Segundo a filósofa Marilena Chauí, “o artista é aquele que recolhe de maneira nova e inusitada aquilo que está na percepção de todos e que, no entanto, ninguém parece perceber” (CHAUÍ, 2003, p. 271). Quando um artista con- segue isso, nos traz o sentimento de eternizar um momento. Perceberemos essa realidade a seguir, nas obras de dois artistas brasileiros que eternizaram momentos da vida nacional. Usando técnicas para se expressar através de obras de arte, fizeram de nós, espectadores, elementos centrais da construção de suas obras. O crítico da arte brasileira Tadeu Chiarelli divide os retratos pintados por Portinari em três tipos fundamentais: os que buscavam fixar cer- tos tipos populares brasileiros, retratos de fami- liares e amigos e, finalmente, retratos de figuras da sociedade (CHIARELLI, 1999, p. 179). D om ín io p úb lic o. Os Retirantes, 1944. Candido Portinari. Óleo sobre tela. O quadro anterior traz o retrato de uma fa- mília de retirantes nordestinos fugindo da seca. No céu, urubus estão à espera da morte de um deles. Portinari retratou os membros da família quase como fantasmas, e usa cores escuras e fúnebres para transmitir a ideia de morte que os envolve: marrom, cinza, azul, preto, amarelo e vermelho. O pintor dá ênfase às texturas (terra seca, roupas rotas, pele marcada), nos sugerin- do sensações visuais e táteis da situação. Os pés enormes dessas figuras sugerem uma rela- ção íntima com a terra e os corpos deformados parecem indicar a força extenuante dessa família de trabalhadores para chegar a um local que possa proporcionar uma vida melhor, ou seja, o ideal de toda história da migração brasileira. Na época em que foi pintado, em 1944, o Brasil vivia o grande fluxo da migração dos nordestinos, especialmente para o sudeste, conforme texto abaixo: A consequência da industrialização e da concentra- ção da propriedade da terra foi o incremento das correntes migratórias, principalmente do Nordeste para o Sudeste e do campo para a cidade [...] a industrialização dos anos 50 a 60, juntamente com as dificuldades enfrentadas no campo – a maioria dos trabalhadores não tinha terra, nem assistência técnica, nem financiamento à produção – provocaram uma grande migração para as cidades. Com isso a população das grandes cidades cresceu rapidamen- te, tornou-se maior que a rural e seus problemas se multiplicaram [...]. (PILETTI, 1999, p. 279) Vemos como um quadro torna-se uma experiência viva de todo um contexto histórico, inclusive despertando reflexão sobre o contexto atual. Mas como Portinari alcança tamanho im- pacto em nós, espectadores? É aí que entram as escolhas técnicas e estéticas do artista. Já dissemos que em Portinari a escolha por retratar o cidadão comum vinha se formando desde a infância, passada em uma fazenda de café no interior paulista nas primeiras décadas do sé- culo XX. Mas vejamos um relato de como essas escolhas se formaram para ele a partir do início da década de 1940: Durante a estadia em Nova York, Portinari vê uma obra que muito o impressiona, Guernica. A guerra vista por Picasso, duma forma cubista e sem a utili- zação das cores. Fica impressionado com o quadro. [...] no Brasil, o sofrimento é provocado pela natureza. O Nordeste é atingido por grandes secas que trazem consequências gravosas para os camponeses. Mui- tos são aqueles que utilizam as suas artes para falar do que os rodeia – Jorge Amado, Érico Verissimo, Graciliano Ramos. Também Portinari a nada disto fica alheio. Exprime-o com a sua pintura, reflete-o. É a cor que se apaga, um drama que se observa. São os Retirantes, expressos em algumas das suas obras. (VAZ, 2009) Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 19 Reunindo sua história de vida, seus ideais, sua técnica e a influência dos artistas de sua época, Portinari criou esse retrato poderoso do seu momento histórico, que repercute em nós na atualidade. Observemos esta outra grande obra da pintura brasileira, Noite de São João, de Alberto Guignard (1896-1962), que, no entanto, traz uma temática totalmente distinta dessa que acabamos de observar. D om ín io p úb lic o. Noite de São João, 1961. Alberto Guignard. Óleo sobre tela. Este quadro faz parte de uma série de qua- dros realizados por Guignard retratando Ouro Preto, cidade em que viveu grande parte da vida, durante a tradicional festa de São João. Sobre esse quadro, diz Walter Zanini: Pode-se dizer que Guignard pintava o visível como se imerso em estado de sonho. Todo o seu universo etéreo de paisagens [...] o revela. [...] salientam-se [...] vistas com perspectiva aérea das cidades bar- rocas mineiras, envoltas num véu de fantasia. Os balões da noite juninaapoderam-se do céu atrás das montanhas. Com sua linha de alta precisão e seus tons nuançados, valeu-se sempre de apurado senso decorativo. (ZANINI, 1983, p. 17) Assim, observamos como o tema leve da festa de São João é impregnado, na visão de Guignard, de um clima de magia e sonho. O uso das cores e de outros elementos de composição nos levam a essa sensação, conforme comple- menta Bruno Maya: [...] as paisagens retratadas são trechos de lugar nenhum, cheios de vazios. A falta de um chão e as figuras de aspecto esfumaçado, por vezes sombrio, mostram como o artista via o Brasil das décadas de 1950 e 1960, um país ainda temeroso da urbaniza- ção que se expandia ferozmente sobre os costumes populares. (MAYA, 2009) Percebemos que, na análise das sensações geradas por essas obras de arte, falamos de cores, texturas, luz, volumes (vazios/cheios) etc. Ninguém ignora que são esses elementos que formam uma obra de arte, mas também não ignoramos que conhecer tudo isso demanda certa dose de informação. O mundo pessoal do artista e o do espectador abre horizonte para determinados focos de interesse que muitas vezes são diferentes. O Professor Bruno Munari, da Universidade de Harvard, em Massachusets, nos EUA, mostra a importância de entender os elementos que formam uma obra de arte: Conhecer as imagens que nos circundam significa também alargar as possibilidades de contato com a realidade; significa ver mais e perceber mais. É muito interessante, por exemplo, ver as estruturas das coi- sas, mesmo na parte que está à superfície, aquilo que se chama de “textura”. (MUNARI, 1997, p. 11) Para Munari, cada um vê apenas aquilo que conhece e se não sabemos os elementos fundamentais da obra de arte podemos entrar num mundo de códigos secretos que fazem com que as mensagens sejam pouco entendidas ou, pior ainda, compreendidas de forma errada. Portanto, são esses códigos que vamos abordar na sequência. Do que a arte é feita Diante da infinidade e da diversidade de manifestações das artes plásticas (pintura, es- cultura, gravura etc.) e, mais ainda, da infinidade de sensações e experiências que podem nascer em nós da observação dessas obras, vamos definir alguns elementos básicos que servirão de referência para nossa análise: ponto, linha, cor, volume, superfície e luz. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 20 Esses elementos aparecem sempre com- binados na maioria das obras de arte, mas, de acordo com o estilo e o desejo de expressão do artista, alguns deles podem se impôr sobre outros. Vamos analisá-los um a um e observar o uso deles em algumas obras. O ponto é o mais simples de todos os ele- mentos. Trata-se de uma marca no espaço de trabalho definido pelo artista que chama nossa atenção, de acordo com a sua posição. Pode ser combinado com outros pontos de várias formas, sugerindo sensações diferentes. (A P E V T. A da pt ad o. ) Pontos de atenção. Concentrados. Saturação. Dispersos. Ordenados. Uma linha é um ponto que se arrasta pelo espaço ou uma sucessão contínua de pontos, com poder expressivo próprio. Linhas verticais denotam firmeza ou dignidade. Linhas horizon- tais podem ser associadas à calma ou repouso. Linhas inclinadas, desequilíbrio ou mudança. Já as curvas podem sugerir sensualidade. Agressividade. Padrões e ritmos. Suavidade e simpatia. Formas da realidade. (A P E V T. A da pt ad o. ) Combinando linhas já somos capazes de sugerir uma grande variedade de ideias e sen- sações em imagens. (A P E V T. A da pt ad o. ) Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 21 (A P E V T. A da pt ad o. ) Isso a que chamados de cor na verdade são apenas reflexos de luz, ou seja, são sensações produzidas por organizações nervosas quando estão sob a ação da luz. A cor apresenta uma infinidade de variedades geradas a partir desses estímulos nervosos. Os estudiosos da cor clas- sificam as cores-pigmentos da seguinte forma: cores primárias, cores complementares, cores secundárias e terciárias. Dentro dessa classifi- cação temos ainda as cores quentes e as frias. As cores primárias são vermelho, amarelo e azul que, combinadas, formam as cores secundárias (verde, laranja e violeta) que também podem ser combinadas indefinidamente, gerando uma infi- nidade de pequenas variações de cores que são as terciárias. Em relação às sensações geradas pelas cores, cabe chamar a atenção para as co- res quentes (amarelo, vermelho e todas as que nelas predominem) e frias (azul e verde, assim como aquelas que nelas predominem). Assim, qualquer cor pode parecer quente ou fria depen- dendo da combinação de cores primárias que há nela. O uso da cor, como veremos a seguir, é um elemento criativo e expressivo fundamental das artes plásticas. Comparando a seguir as obras dos pintores noruegueses Edvard Munch (1869-1944) e Peter Severin Kröyer (1851-1900), pintadas no mesmo ano (1893), vemos como o uso das cores (bem como de outros elementos, como as linhas e os volumes) definem os estilos dos artistas e são empregados com maestria para acentuar os climas e as ideias que pretendem despertar no observador: na primeira, a angústia e o deses- pero; na segunda, clareza e tranquilidade. O Grito, 1893. Edvard Munch. Óleo e pastel sobre cartão. G al er ia E dv ar d M un ch . Podemos perceber, por exemplo, que Edvard Munch, um artista melancólico, persegui- do pela doença e pela loucura, criou uma arte eletrizante. Estruturou sua pintura por meio de cores quentes e linhas sinuosas, emotivas. Esse recurso resultou numa atmosfera que, além de extremamente expressiva, funciona muito bem para mostrar sua infelicidade tornando esse quadro uma obra autobiográfica. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 22 Tarde de Verão em uma Praia do Sul, 1893. Severin Kröyer. Óleo sobre tela. S ka ge n M us eu m . Por outro lado, as cores usadas por Peter Severin Kröyer se apresentam no quadro acima de maneira delicada, usufruindo da atmosfera tranquila que o azul pode proporcionar. Esse quadro é basicamente construído em tons frios e luminosos. Um ambiente suave, iluminado pelo Sol é peculiar a um artista equilibrado que usa sua arte para transmitir uma atmosfera de repouso. De uma simplicidade encantadora, essa obra consegue ser o oposto radical da obra de Munch, o que demonstra que a arte tem inúmeras formas de se mostrar. O volume expresso em uma obra das artes plásticas diz respeito a como o artista usa o espaço para transmitir ideias e sugerir sensa- ções. O espaço positivo é aquele ocupado pelos elementos da obra e o espaço negativo são as zonas vazias ou pouco preenchidas. Se buscás- semos os espaços negativos em uma música, por exemplo, iríamos encontrá-los nos momen- tos de silêncio, ou nas pausas. A forma como os artistas dispõem dos espaços positivos e negativos chamamos de “composição espacial”. Na obra de Kröyer, que acabamos de observar, a composição espacial privilegia o espaço ne- gativo (vazio) para valorizar as figuras (moças) e reforçar a sensação de calma e placidez. A superfície, ou textura, de uma obra pode ser tátil ou visual. A textura tátil é definida pelo suporte do trabalho (tela, papel, pedra, madeira etc.) e pelo material (tinta óleo, aquarela, pig- mentos, etc.) usado na pintura. Trata-se de um elemento mais determinante para a escultura. Já a textura visual é forte na pintura, sendo produzida pelo detalhamento das imagens ou pela opção técnica do artista. Portinari trabalhou uma grande riqueza de texturas visuais na pele, nos tecidos das roupas, nos cabelos, no chão e no céu na tela que observamos (Os Retirantes), produzindo uma série de sensações que remetem ao sofrimento e à precariedade da família retratada. Finalmente, a luz aparece como um ele- mento muito exploradonas artes plásticas a partir da Renascença (século XV), seja para valorizar elementos do quadro, acentuar climas ou, como no caso do Impressionismo (século XIX), tornar-se o próprio objeto da pintura, já que os impressionistas davam forma a seus temas através dos seus “pontos de luz”. Claude Monet (1840-1926), um dos gran- des pintores impressionistas franceses, realizou uma série de mais de 30 pinturas da Catedral de Rouen, em Paris, entre 1893 e 1894. As pinturas foram realizadas em diferentes épocas do ano, climas e períodos do dia, e a variação da incidência da luz nos detalhes da catedral é o interesse central dessa série. Para demonstrar que diferentes condições de luz modificam o objeto retratado, o artista registrou a Catedral desde a madrugada até à luz brilhante do dia. Na sequência a seguir, a primeira imagem que vemos é esbranquiçada pelo Sol. A segunda projeta a luz mais suave, ressaltando tons de alaranjado com nuances de azul e, por fim, a mesma Catedral ao pôr do sol tem seus detalhes endurecidos pelas sombras e esfriados por con- ta da variação de azuis usada pelo artista. D om ín io p úb lic o. Catedral de Rouen com Sol. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 23 D om ín io p úb lic o. Catedral de Rouen com Tempo Cinza. D om ín io p úb lic o. Catedral de Rouen no Pôr do Sol. Caravaggio (1571-1610), mestre do Barroco italiano (século XVI), fazia uso da luz para produ- zir um contraste entre áreas claras e escuras nas cenas, como forma de acentuar a dramaticidade das situações que retratava. Como no quadro a seguir, A Incredulidade de São Tomé, que nos impressiona também por outra característica de Caravaggio: ele conseguia dar um ar natural a cenas religiosas, como se elas fossem desprovi- das de espiritualidade. A dramaticidade de seus quadros se resumia ao uso da luz. Ele contava a história a partir de sua habilidade no uso da técnica de luzes e sombras. A Incredulidade de São Tomé, 1599. Caravaggio. Óleo sobre tela. D om ín io p úb lic o. Ponto, linha, cor, volume, superfície e luz. Através da combinação desses elementos, podemos perceber a realização de obras muito distintas, como expressões dos artistas de lu- gares e épocas tão diferentes. Arte: elementos básicos Fazendo um paralelo com outras lingua- gens artísticas, vamos chamar a atenção para alguns elementos fundamentais da música e do cinema. Os elementos fundamentais da música são: a melodia, a harmonia e o ritmo. A melodia é uma combinação sucessiva de sons. É o elemento que geralmente lembramos de uma música, porque geralmente ele está em primeiro plano. Em uma canção, é onde está colocada a letra. A harmonia é uma combinação simultânea de sons. Isso significa que, reunindo várias notas musicais em um mesmo momento, é possível compor “ambientes sonoros”, que dão corpo à música para que a melodia passeie livremente. Já o ritmo é uma cadência que associa a com- binação de sons (da melodia e da harmonia) a uma repetição periódica. O cinema é uma arte híbrida, que agrega elementos de quase todas as linguagens artísti- cas. Por isso, ele penetra por vários dos nossos sentidos, proporcionando experiências ricas e impactantes. Vamos observar, no entanto, o que é único no cinema, segundo Marcel Martin: Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 24 Mas o que distingue o cinema de todos os outros meios de expressão culturais é o poder excepcional que vem do fato de sua linguagem funcionar a partir da reprodução fotográfica da realidade. Com ele, de fato, são os seres e as próprias coisas que aparecem e falam, dirigem-se aos sentidos e à imaginação: à primeira vista, parece que toda representação (sig- nificante) coincide de maneira exata e unívoca com a informação conceitual que veicula (significado). (MARTIN, 1990, p. 18) Ou seja, o cineasta apresenta imagens do mundo para expressar ideias, sensações e sen- timentos. Enquanto o pintor utiliza os elementos que analisamos, um músico usa sons, um poeta usa palavras para recriar o mundo em suas obras, o cineasta usa das imagens do mundo para cons- truir as suas. Enquanto o escritor diz “árvore”, o cineasta mostra “aquela” ou “essa” árvore que ele escolheu para filmar. Estará então o público do cinema totalmente privado do exercício da imaginação? Talvez, mas não necessariamente, ainda segundo Martin: “Vale dizer que a realida- de que aparece na tela não é jamais totalmente neutra, mas sempre signo de algo mais, num certo grau” (MARTIN, 1990, p. 18). Segundo o autor, está na forma como o cineasta apresenta a realidade filmada – através da seleção das imagens que contarão a história, da ordenação dessas imagens, do ponto de vis- ta, do uso do som (incluindo música) e de outros fatores – o poder de expressão dessa linguagem artística que ganhou o mundo. Através dessa breve reflexão sobre alguns dos elementos de análise de obras de arte de épocas, lugares e estilos tão distintos, busca- mos criar um pequeno repertório de conceitos que podem orientar a observação de obras artísticas. Para saber mais Anatomia de uma obra-prima (STRICKLAND, 2004, p. 137) Durante a Guerra Civil Espanhola, o dita- dor fascista Francisco Franco fez um acordo com a Lüftwaffe para destruir a cidadezinha basca de Guernica. Num bombardeio de três horas, dois mil civis foram massacrados, milhares foram feridos e a cidade foi arra- sada. Tomado de ódio patriótico, o espanhol Picasso criou um mural de 6,5 metros de largura por 2,80 de altura que foi pintado em um mês. É considerado a mais forte denúncia dos horrores da guerra. “A pintura não é feita para decorar apartamentos”, dizia Picasso. “É um instrumento de guerra, de ataque e defesa frente ao inimigo.” Picasso incorporou certos elementos do desenho para criar um efeito de an- gústia. Usou uma nuance branco-cinza para enfatizar o desespero e distorceu propositalmente as figuras para transmitir violência. As linhas quebradas e os planos fragmentados do Cubismo denotam terror e confusão, enquanto o formato em pirâmide segura a unidade da composição. Alguns símbolos de Picasso, como o guerreiro morto com a espada quebrada, implican- do derrota, não são difíceis de decifrar. A única explicação de Picasso para os outros símbolos era: “O touro não é o fascismo, mas a brutalidade e a escuridão... O cavalo representa o povo”. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 25 Guernica, 1937. Pablo Picasso. Painel pintado. D om ín io p úb lic o. Dicas de estudo Pablo Picasso (1881-1973) foi um dos maiores gênios artísticos do século XX. Assis- tindo ao filme Os Amores de Picasso (direção de James Ivory, EUA, 1996) você verá que sua obra teve influência direta da relação que ele tinha com as mulheres. Esse filme mostra a fase mais tumultuada da vida do pintor, que aos 60 anos conhece sua sétima esposa, Françoise Gilot, então com 23 anos. Ao assistir o empenho de Picasso em apresentar o mundo da arte à sua amada, o espectador pode fazer um passeio pelas obras de arte dos grandes pintores. Picasso foi o mestre de um movimento artístico chamado Cubismo. Você sabia que no Brasil esse movimento teve repercussão? No site <www.historiadaarte.com.br/cubis- mo.html> você verá um resumo sobre o Movi- mento Cubista e uma breve inserção na obra de dois artistas modernistas influenciados pelo Cubismo: Tarsila do Amaral e Rego Monteiro. Nesse mesmo site há um link para você navegar por dois importantes museus onde as obras de Picasso estão expostas: O museu Picasso da França e da Espanha. Boa viagem! Exercícios de aplicação Observe a pintura a seguir. Ela se chama 1. A Ceia em Emaús e foi pintada por Caravaggio em 1601. Essa é uma cena religiosa onde Cristo aparece retratado abençoando uma ceia. Faça uma análise das cores elinhas usadas pelo pintor para simbolizar o clima desse quadro respondendo às questões seguintes. A maioria das linhas dessa pintura são a) sinuosas ou geométricas? Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 26 As cores usadas na tela são quentes ou b) frias? A partir das respostas anteriores, qual c) foi a mensagem que o artista pretendeu transmitir? D om ín io p úb lic o. A Ceia em Emaús, 1601-1602. Caravaggio. Óleo sobre tela. A tela que você verá a seguir é de Vincent 2. Van Gogh e foi pintada em 1889. Noite Estre- lada expressa uma imagem extremamente emocional usando os mesmos elementos que já investigamos durante a aula. Respon- da às questões a seguir, levando em conta o que estudamos a respeito de linhas e cor. Comparado ao quadro a) O Grito, de Munch, qual dos dois consegue transmitir um clima mais vibrante? Qual é a temperatura das cores usadas b) em Noite Estrelada? Quente ou fria? No quadro de Van Gogh, as linhas sinu-c) osas servem para transmitir qual sensa- ção? D om ín io p úb lic o. Noite Estrelada, 1889. Vincent Van Gogh. Óleo sobre tela. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 27 Gabarito Exercícios de aplicação 1. As linhas são sinuosas.a) As cores são quentes.b) A atmosfera que o artista transmitiu foi c) de serenidade e calor humano, junta- mente com o movimento da ação que demonstra que os personagens estão em clima de afeição. 2. O quadro de Van Gogh transmite um cli-a) ma melancólico enquanto que o quadro de Munch consegue ser mais vibrante. Entretanto os dois trabalhos contêm uma forte reação emocional. A tela b) Noite Estrelada foi pintada com cores frias. As linhas sinuosas conseguem trans-c) mitir uma sensação de desequilíbrio e agitação. Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br 28 Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A., mais informações www.iesde.com.br
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