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AULA 5 TECNOLOGIAS ASSISTIVAS Profª Simone Schemberg 2 CONVERSA INICIAL Caro aluno, agora que você já conhece a função da educação especial frente ao contexto inclusivo e às Tecnologias Assistivas (TA), assim como a importância de uma rede de apoio entre todos os profissionais envolvidos, é importante conhecer alguns artefatos destas nas diferentes áreas das deficiências, para que possa perceber que cada necessidade demanda recursos diferenciados. Além disso, mais do que reconhecer as TA como ferramentas de acessibilidade, é necessário conhecer sua aplicabilidade e saber avaliar quais deverão ser oportunizadas em cada situação e contexto. Cabe, então, aos profissionais envolvidos observar, analisar e avaliar as necessidades do educando, os obstáculos na acessibilidade e as dificuldades de acesso ao currículo, à informação e à comunicação, para que possam articular ações que viabilizem o uso dos artefatos de TA, além de produzir, quando necessário, materiais que promovam a acessibilidade. CONTEXTUALIZANDO Os serviços da Educação Especial (como modalidade do ensino) são locais privilegiados para o uso das TA, por isso é importante que os profissionais, não só especialistas na área, mas todos os envolvidos no contexto inclusivo, conheçam a aplicabilidade e a função social dos artefatos tecnológicos. O trabalho em rede propicia maiores possibilidades de desenvolvimento, já que cada profissional atuará com seu olhar específico e poderá interferir de modo a focar as potencialidades e as diferentes formas de aprendizagem. Porém não basta somente conhecer as TA e saber da sua existência, é preciso perceber de que forma cada recurso pode ser utilizado nas diferentes áreas, de forma que os objetivos e os planejamentos prévios sejam essenciais. As TA devem permear todo o contexto escolar, além de se estender a outras áreas que prestam atendimento ao educando. Assim, o envolvimento de uma equipe multidisciplinar exige o olhar de cada profissional sobre as potencialidades que poderão ser alcançadas a partir do uso das TA, para ultrapassar o olhar terapêutico e reabilitador no campo da educação especial. 3 TEMA 1 – TA NAS DIFERENTES ÁREAS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL É preciso, antes de mais nada, quando falamos em TA, considerar o trabalho e a avaliação a partir de uma abordagem multidisciplinar, em que cada profissional deve conhecer as especificidades dos sujeitos, colaborando para um trabalho em rede e para o uso funcional dessas tecnologias. Além disso, a escolha, os níveis de adaptação e o uso desses artefatos devem ser definidos a partir das necessidades específicas de cada usuário, das diferenças individuais, da faixa etária, do contexto social, bem como dos interesses e das habilidades. Ao atuar no contexto escolar, muitas vezes observamos o trabalho isolado do professor, ou ainda, do profissional da educação especial. Há, no entanto, outros profissionais que podem estar envolvidos no processo de desenvolvimento do aluno, seja na área clínica, seja na área pedagógica. Um desses profissionais, por exemplo, é o psicopedagogo. Neste caso, é preciso que haja interação entre as áreas para que se possam determinar objetivos quanto ao trabalho em rede, já que a atuação dele poderá ter grande impacto no desenvolvimento escolar do aluno, levando em conta o processo de mediação. Considerar os artefatos das TA em cada campo de atuação significa contemplar a visão sociointeracionista, tão defendida por Vigotsky (1998), que aponta os recursos culturais desenvolvidos pelo homem como determinantes no desenvolvimento cognitivo, de modo que estes atuam nas funções psicológicas superiores. Assim, para ele: O uso de meios artificiais – a transição para a atividade mediada – muda, fundamentalmente, todas as operações psicológicas, assim como o uso de instrumentos amplia de forma ilimitada a gama de atividades em cujo interior as novas funções psicológicas podem operar. Nesse contexto, podemos usar o termo função psicológica superior, ou comportamento superior com referência à combinação entre o instrumento e o signo na atividade psicológica. (Vigotsky, 1998. p. 73) Nesse sentido, fazer uso dos artefatos como elementos de compensação para a superação das limitações é um dos fatores primeiros a serem considerados pelos profissionais envolvidos no processo inclusivo. 4 TEMA 2 – TA E DEFICIÊNCIA FÍSICA Antes de falarmos das TA na área da deficiência física, é interessante sabermos um pouco mais a respeito desse contexto. No que se refere ao seu conceito, temos as seguintes definições: Alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida [...]. (Brasil, 1999, art. 4°) A deficiência física se refere ao comprometimento do aparelho locomotor que compreende o sistema osteoarticular, o sistema muscular e o sistema nervoso. As doenças ou lesões que afetam quaisquer desses sistemas, isoladamente ou em conjunto, podem produzir quadros de limitações físicas de grau e gravidades variáveis, segundo os segmentos corporais afetados e o tipo de lesão ocorrida (Alves, 2006, p. 28). Como é possível observar, a deficiência física pode comprometer o desenvolvimento motor em maior ou menor grau, a depender da lesão. É levando em conta esse comprometimento que devem ser observadas as TA aplicáveis em cada caso, de modo a suprir ou complementar os movimentos que se acham limitados, auxiliando na execução das atividades. As órteses e as próteses são exemplos de tecnologias que visam substituir ou corrigir um membro (Figuras 1 e 2): Figura 1 – Órtese Fonte: Bilkei, [S.d.]. 5 Figura 2 – Prótese Fonte: WeStudio, [S.d.]. Órteses são aparelhos destinados a suprir ou corrigir a alteração morfológica de um órgão, de um membro ou de um segmento de um membro, ou a deficiência de uma função. Próteses, por sua vez, são aparelhos ou dispositivos destinados a substituir um órgão, um membro ou parte de um membro destruído ou gravemente acometido. Essas tecnologias já são vistas e utilizadas socialmente há muito tempo. No entanto, há hoje diversas outras disponíveis, que podem, inclusive, propiciar a acessibilidade no contexto educacional. O contexto escolar, como espaço social e tendo em vista os atuais paradigmas de inclusão e acessibilidade, deve propiciar ações que oportunizem o uso das mais diversas TA. Estas podem ser simples ou mais complexas (Figuras 3 e 4). Figura 3 – Mesas e cadeiras adaptadas Fonte: Wicklund, [S.d.]a. 6 Figura 4 – Livros digitais com touchscreen Fonte: Wicklund, [S.d.]b. Mesas e cadeiras adaptadas podem mostrar-se como artefatos de acessibilidade que acabam por eliminar a barreira enfrentada pelo educando, possibilitando o desenvolvimento de suas potencialidades, assim como um livro digital para aqueles casos em que há limitação motora. Esses recursos podem ser de alto ou baixo custo. Uma simples tesoura adaptada (Figura 5) é também uma TA que pode facilitar a execução de tarefas para aqueles que apresentam dificuldade motora, possibilitando a resolução de problemas de ordem funcional, ao que se denomina também Ajudas Técnicas. Estas podem ser definidas como “produtos, instrumentos e equipamentos ou tecnologias adaptados ou especialmente projetados para melhorar a funcionalidade da pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida, favorecendo a autonomia pessoal, total ou assistida.” (Brasil, 2004), ou seja, dizem respeito às TA. Figura 5 – Exemplo de tesoura adaptada 7 Schirmer et al. (2006, p. 42) comentamum caso de uso dessa tesoura em sala de aula: Na educação infantil [sic] todas as crianças estão se desafiando no uso da tesoura. Alguns alunos possuem maior facilidade, outros ainda mostram dificuldades, mas todos estão orgulhosos de seus feitos. Nesse caso, o menino com deficiência física não poderá participar da atividade de recorte e colagem, a menos que consigamos uma tesoura diferente para que ele possa manejá-la com a habilidade que possui (fechar a mão ou bater a mão). Encontramos ou construímos uma tesoura adaptada para nosso aluno, mas ele ainda não consegue manejar simultaneamente a tesoura e o papel. Nesse caso, mudamos a atividade, que de individual passa a ser coletiva: o grupo de alunos trabalha junto e um colega segura o papel, o outro usa a tesoura, o outro passa a cola e juntos fazem a colagem. Como você percebeu, é preciso que haja conhecimento por parte do profissional envolvido acerca da limitação do aluno, para que possa lançar mão do seu conhecimento em torno das TA de forma adequada. O olhar diferenciado diante das estratégias de aprendizagem e desenvolvimento das potencialidades também é um fator determinante. A disponibilidade dos recursos da área da informática também faz parte do contexto das TA. Nesse campo, há uma diversidade de equipamentos, softwares e materiais adaptados que permitem o acesso à comunicação e à informação, como ilustrado nas Figuras 6, 7, 8 e 9: Figura 6 – Cadeiras adaptadas, microfone e uso de touchscreen 8 Figura 7 – Teclado colmeia Figura 8 – Teclado acessível Figura 9 – Ponteira de cabeça 9 Quanto aos softwares, há uma gama de recursos disponíveis, pagos e gratuitos, como, por exemplo, o Motrix (Figura 10), software gratuito que viabiliza o acesso ao computador por pessoas com deficiência física grave, permitindo “que o usuário tetraplégico possa utilizar o computador usando apenas comandos de voz pelo microfone [...] especializado em acesso à Internet, o que inclui a prática de escrita, leitura e comunicação do usuário.” (Thomaz, 2015, p. 2). Figura 10 – Software Motrix Thomaz (2015, p. 3) afirma que “o uso do Motrix viabiliza a execução de quase todas as operações que são realizadas por pessoas sem deficiência, mesmo as que possuem acionamento físico.”. Para saber mais sobre a história, a instalação e o uso desse software, você pode acessar o tutorial completo disponível nesse material do autor, ou explorar o site do Projeto Motrix ([S.d.]). Vale pontuar que as TA na área da deficiência física, vistas como objetivos, assim como refere Santarosa (2010), permitem o desenvolvimento de atividades de caráter motor com um mínimo de esforço físico, além de proporcionar a independência e a autonomia nessa área. TEMA 3 – TECNOLOGIAS ASSISTIVAS E DEFICIÊNCIA VISUAL A área da deficiência visual tem sido muito beneficiada com os recursos de TA. No entanto, é preciso que haja um vasto conhecimento acerca dos tipos e graus dessa deficiência para que estes sejam aplicados de forma eficiente. Assim, é importante diferenciarmos, antes de mais nada, a cegueira e a baixa visão, pois de acordo com o grau é que poderemos planejar e definir o uso dos recursos. 10 Sá, Campos e Silva (2007, p. 15) propõem o seguinte conceito de cegueira: “uma alteração grave ou total de uma ou mais das funções elementares da visão que afeta de modo irremediável a capacidade de perceber cor, tamanho, distância, forma, posição ou movimento em um campo mais ou menos abrangente.”. No mesmo documento, as autoras também definem a baixa visão: A definição de baixa visão (ambliopia, visão subnormal ou visão residual) é complexa devido à variedade e à intensidade de comprometimentos das funções visuais. Essas funções englobam desde a simples percepção de luz até a redução da acuidade e do campo visual que interferem ou limitam a execução de tarefas e o desempenho geral. Em muitos casos, observa-se o nistagmo, movimento rápido e involuntário dos olhos, que causa uma redução da acuidade visual e fadiga durante a leitura. (Sá; Campos; Silva, 2007, p. 16) Montilha et al. (2006, p. 287) trazem a Organização Mundial da Saúde (OMS) para o diálogo sobre o tema: Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é considerado portador de cegueira o indivíduo com acuidade visual desde 3/60 (0,05), no melhor olho e melhor correção óptica possível, até ausência de percepção de luz, ou correspondente perda de campo visual no melhor olho com a melhor correção possível. A definição de visão subnormal corresponde à acuidade visual igual ou menor do que 6/18 (0,3) mas, igual ou maior do que 3/60 (0,05) no melhor olho com a melhor correção possível. Conhecendo as diferenças é que se poderá relacionar as tecnologias adequadas a cada comprometimento, as quais podem ser divididas, conforme exemplificado por Bersch (2013), em: • Naturais: aquelas produzidas a partir de elementos da natureza, devidamente ressignificados e transformados com um objetivo bem definido (exemplo: utilização de um graveto e de um galho, de diâmetros diferentes, para auxiliar a conceituação de “grosso” e “fino”). • Pedagógicas: relacionadas a dispositivos (sofisticados ou não), que podem ser confeccionados por pais, professores e profissionais envolvidos, a fim de subsidiar a aprendizagem. • Tecnológicas: referem-se a dispositivos mais sofisticados (gravadores, computadores, scanners, impressoras em Braille etc.). • Culturais: livros gravados (cassete e CD) ou em Braille. Vejamos, então, algumas dessas tecnologias. 11 3.1 Bengala Há diversos tipos e modelos de bengala, e a Figura 11 ilustra um deles: Figura 11 – Exemplo de bengala É importante observar que o uso da bengala, por mais que pareça algo simples, é algo complexo, pois há técnicas específicas, contextos de uso diferenciados, além de uma diversidade de modelos existentes. Assim, é preciso passar por um processo que chamamos de orientação e mobilidade, ou seja, a pessoa cega deve aprender a fazer uso dessa tecnologia. Isso fica claro nos trechos abaixo, trazidos de Weid (2015, p. 946-949): A introdução e as técnicas de uso da bengala longa são apresentadas para a pessoa cega nos treinamentos de Orientação e Mobilidade (OM). No caso da criança que nasce cega [sic] é indicado desde cedo o desenvolvimento de atividades conhecidas como “pré-bengala”, que envolvem experiências preliminares com o objetivo de facilitar a compreensão do uso e a posterior manipulação eficiente da bengala. [...] A bengala, em uma metáfora perceptiva, é comparada ao prolongamento do braço e das mãos, ao sentido do tato – as oscilações, interrupções e variações do caminho são transmitidas pela ponta e pelo cabo da bengala às mãos do cego e, através dela, é como se o seu tato se estendesse ao chão. Mas a bengala também recebe, nessa articulação antropomórfica, habilidades “visuais” privadas ao indivíduo que a manipula – ela “vê” o obstáculo, “vê” a altura do degrau. Para que se chegue até lá, para que esse híbrido corpo-bengala adquira tais capacidades, é preciso passar por um processo de treinamento físico, de incorporação, no qual é fundamental aprender técnicas e segui-las, desenvolver uma habilidade. Mas é necessário, ainda, desenvolver uma relação de confiança corpo-dispositivo: descobrir, pela prática e pela experiência pessoal, que essa hibridização pode ser útil. 12 3.2 Materiais em Braille O sistema Braille (Figura 12) foi inventado por Louis Braille em 1825 e é utilizado até hoje no processo de leitura e escrita para pessoas cegas. A partir dele, várias tecnologias são desenvolvidas. Figura 12 – Sistema Braille Gil (2000, p. 43) descreve seu funcionamento da seguinte forma: O sistema braille, inscrito em relevo, é explorado por meio do tato. Cada ‘cela’ é formada por um conjunto de seis pontos, permitindo 63 diferentescombinações para obter todos os sinais necessários à escrita: letras do alfabeto, sinais de pontuação, maiúsculas e minúsculas, símbolos de Matemática, Física, Química e notação musical. Os seis pontos são dispostos em duas colunas, com três pontos em cada uma, formando um retângulo, ou ‘cela’ de 6 milímetros de altura por 2 de largura. Para facilitar sua identificação, os pontos são numerados. 3.2.1 Utilização de reglete e máquina Braille para a escrita Para a escrita Braille, alguns instrumentos foram criados (Figuras 13 e 14). 13 Figura 13 – Exemplo de reglete Figura 14 – Exemplo de máquina de escrever Braille 3.2.2 Materiais escritos em Braille Temos, na Figura 15, um exemplo de texto escrito em Braille: Figura 15 – Exemplo de escrita em Braille 14 3.3 Artefatos de acesso à comunicação e à informação na área da informática Alguns dispositivos e recursos têm o papel de promover o uso da informática no que diz respeito à acessibilidade. São eles: • Player de audiolivro e aplicativos de celular: o uso do celular é um grande avanço no que se refere à superação das barreiras na comunicação para as pessoas com deficiência. Há muitos aplicativos que possibilitam a execução de áudios, o acesso à internet e as funções disponíveis nos aparelhos, possibilitando seu uso por pessoas com deficiência visual (Figuras 16 e 17). Figura 16 – Player de audiolivro Figura 17 – Aplicativos de celular • Softwares e programas de computador: um dos softwares amplamente utilizados atualmente é o Dosvox (Figura 18), um sintetizador de voz que permite à pessoa com deficiência visual o acesso ao computador. É 15 distribuído gratuitamente e apresenta um sistema que rapidamente é aprendido pelo usuário, considerando que, na sua execução, há autoexplicações. Figura 18 – Exemplo de software Segundo a página do Projeto Dosvox ([S.d.]): O sistema realiza a comunicação com o deficiente visual através de síntese de voz em Português, sendo que a síntese de textos pode ser configurada para outros idiomas. O que diferencia o DOSVOX de outros sistemas voltados para uso por deficientes visuais é que no DOSVOX, a comunicação homem-máquina é muito mais simples, e leva em conta as especificidades e limitações dessas pessoas. Ao invés de simplesmente ler o que está escrito na tela, o DOSVOX estabelece um diálogo amigável, através de programas específicos e interfaces adaptativas. Isso o torna insuperável em qualidade e facilidade de uso para os usuários que vêm no computador um meio de comunicação e acesso que deve ser o mais confortável e amigável possível. Grande parte das mensagens sonoras emitidas pelo DOSVOX é feita em voz humana gravada. Isso significa que ele é um sistema com baixo índice de estresse para o usuário, mesmo com uso prolongado. 3.4 Recursos ópticos para baixa visão Os recursos ópticos são aqueles que visam potencializar o resíduo visual, como lentes de aumento, lupas, lunetas, telescópios, entre outros (Figura 19). Figura 19 – Alguns recursos ópticos para baixa visão Poderíamos explanar aqui diversos outros recursos nessa área, mas, agora que você já sabe que há uma diversidade deles, pode fazer uma pesquisa tentando encontrar outros artefatos de TA que possam proporcionar a 16 acessibilidade e o desenvolvimento das potencialidades da pessoa com deficiência visual, refletindo sobre a sua área de pesquisas e estudos. TEMA 4 – TA E SURDEZ Por muito tempo, as pessoas surdas foram excluídas dos contextos sociais, de modo que sua interação esteve restrita ao uso da oralidade, tendo que se adaptar aos padrões estabelecidos socialmente em torno da oralidade. Hoje, sabemos que a cultura, a língua e as diferentes identidades devem ser levadas em conta nessa área. Assim, ao tratarmos do contexto das TA para surdos, podemos vislumbrar os avanços em relação à acessibilidade em torno da comunicação e do acesso à informação. Entretanto, antes de falarmos dessas tecnologias, é importante pensar sobre as diferentes abordagens em torno dessa área. Clinicamente falando, a deficiência auditiva refere-se à perda de sensibilidade aos sons produzida por algum problema no sistema auditivo, podendo ser uni ou bilateral, de grau moderado a profundo, de tipo condutiva, neurossensorial ou mista. Esses fatores poderão definir o tipo de TA quando se trata de reabilitação. No entanto, no que se refere aos aspectos sociais, pedagógicos e inclusivos, podemos tomar o conceito trazido pelo Decreto n. 5.626, de 22 de dezembro de 2005 (Brasil, 2005, p. 1), que, em seu art. 2º, refere pessoa surda como “aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio das experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS.”. Nesse sentido, ampliam-se as possibilidades de recursos disponíveis, pensando-se na acessibilidade nos mais diversos contextos. 4.1 Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) e implante coclear O AASI (Figura 20) funciona da seguinte maneira: “converte o sinal sonoro, como o som de fala, em um sinal elétrico. O circuito do aparelho manipula o sinal elétrico e o converte novamente em um sinal acústico, encaminhando o som amplificado, através do molde auricular, para o conduto auditivo externo do deficiente auditivo.” (MEC, 2006, p. 24). 17 Mas é preciso considerar que, assim como o próprio nome já diz, esse aparelho apenas amplifica os sons, porém não garante a compreensão da palavra falada, por exemplo, para uma pessoa que tem perda auditiva severa ou profunda. Figura 20 – AASI Já o implante coclear (Figura 21) é uma prótese que ativa as terminações nervosas na cóclea, que está localizada no nervo auditivo, sendo indicada para pessoas com perda auditiva profunda. Cabe considerar que apenas a intervenção cirúrgica não é suficiente para a aquisição da linguagem oral, é preciso que haja um trabalho intensivo de reabilitação auditiva, além de aspectos particulares de cada sujeito. Figura 21 – Implante coclear 18 4.2 Celular e aplicativos O uso do celular pelas pessoas surdas possibilita a acessibilidade no que se refere à comunicação e à interação de diversas formas (Figura 22). Alguns exemplos são chamadas de vídeos, comunicação por vídeo, gravação de vídeos, acesso a vídeos em Libras e/ou com legenda, editores de vídeo e textos, grupos de interação e de bate-papo. Além disso, os aplicativos disponíveis oferecem diversas possibilidades, além de poderem ser utilizados como ferramentas pedagógicas e em outras áreas interdisciplinares, tanto na aprendizagem como na interação. Figura 22 – Uso de celular por uma pessoa surda O hand talk é um exemplo de aplicativo que pode ser usado tanto por surdos, para acesso aos sinais da Língua de Sinais e à Língua Portuguesa, quanto como estratégia de comunicação entre surdos e ouvintes e para aqueles que querem conhecer a Libras (Figura 23). Além disso, pode ser utilizado como ferramenta pedagógica. 19 Figura 23 – Exemplo de aplicativo: hand talk Que tal instalar o aplicativo no seu celular e explorar seus recursos? Além dele, você pode buscar outros que atuem nesse contexto da comunicação com os surdos. 4.3 Programas e softwares de computador Pela exploração de programas e softwares, é possível desenvolver diversas práticas de acessibilidade tanto em Língua Portuguesa quanto em Libras. A produção de legendas por meio de editores de texto e vídeo, os sites de compartilhamento de vídeos, imagens e texto, bem como diversos softwares disponíveis para produção, possibilitam a efetivação do bilinguismo. Nessa concepção, os sujeitos surdos são vistos a partir da sua diferença linguística e cultural, sendo a Libras reconhecida como sua primeira língua, de modo que ao ouvinte cabetambém conhecê-la, já que é a segunda língua oficial de nosso país. Para saber mais sobre a concepção bilíngue e os aspectos legais da Libras, leia o Decreto n. 5.626/2005 e a Lei n. 10.436, de 24 de abril de 2002 (Brasil, 2002), disponíveis on-line. Além desses recursos, há diversas adaptações que podem propiciar acessibilidade nos diversos espaços sociais, como sinalizadores luminosos e aparelhos vibratórios ao invés de sonoros. A acessibilidade é uma via de mão dupla, na qual os usuários têm direito de acesso aos diversos recursos, mas há também a necessidade de que todos busquem oportunizar situações de acessibilidade. 20 Isso é ainda mais importante quando se trata dos profissionais envolvidos no processo de ensino-aprendizagem e inclusão educacional, uma vez que conhecer os recursos disponíveis e utilizá-los na sua área de atuação é fundamental para o desenvolvimento das potencialidades e superação dos obstáculos. No ambiente escolar: Pensar e construir uma prática pedagógica que assuma a abordagem bilíngue e se volte para o desenvolvimento das potencialidades das pessoas com surdez na escola é fazer com que esta instituição esteja preparada para compreender cada pessoa em suas potencialidades, singularidades e diferenças e em seus contextos de vida. (Alvez; Ferreira; Damázio, 2010) TEMA 5 – TA COMO INSTRUMENTOS DE APOIO À AVALIAÇÃO As TA podem/devem constituir-se, além de tudo, como instrumentos de apoio aos processos de avaliação. Vale lembrar que a avaliação é um processo, e não um fim, por isso é preciso repensar sua função, não se atendo a limitações e diagnósticos estabelecidos, mas às possibilidades de desenvolvimento das potencialidades, o que deve ser considerado também para além do ambiente escolar. Quando falamos de diagnóstico, referimo-nos a uma atividade limitada à busca de patologias nos indivíduos como causa explicativa de seus desajustes ou dificuldades e, portanto, relacionada com um modelo médico explicativo da conduta: [...]. Se falamos de avaliação, referimo- nos a um tipo de informação muito mais amplo sobre a pessoa, que não fica centrado exclusivamente no indivíduo, mas também no seu ambiente e na interação entre ambos, e que não utiliza como procedimento principal e quase único os testes psicológicos ou a avaliação clínica. (Solé, 2001, p. 188) FINALIZANDO Como você já sabe, a sala de recursos multifuncional é um espaço privilegiado para o uso das TA, e a educação especial tem um papel muito importante no que diz respeito ao aprendizado acerca delas. No entanto, é imprescindível que outras áreas multidisciplinares tenham acesso ao conhecimento sobre as TA e as especificidades em cada área das deficiências, para que possam efetivar ações capazes de potencializar o desenvolvimento por meio de seu uso. Nesta aula, você pôde perceber que: 21 • as tecnologias nas diferentes áreas devem visar à funcionalidade e ao uso efetivo com função, por isso a escola e os profissionais envolvidos no contexto inclusivo têm papel fundamental; • as TA podem ser de alto e baixo custo, e ainda ser produzidas manualmente de acordo com as necessidades observadas, por isso exigem avaliação e observação dos casos nas mais diversas áreas de atuação; • na área da deficiência física, as TA visam superar as limitações, promovendo a acessibilidade e a autonomia, devendo ser adequadas a cada especificidade; • é preciso considerar os diferentes graus e casos de deficiência visual para que sejam aplicadas as TA; • na área da surdez, as tecnologias, tanto na área clínica quanto pedagógica, devem promover acesso à comunicação e à informação; é preciso considerar as atuais propostas bilíngues que priorizam os aspectos visuais na acessibilidade, e, sobretudo, a Libras. LEITURA OBRIGATÓRIA Texto de abordagem teórica BERSCH, R.; MACHADO, R. Auxílio em Atividades de Vida Diária – Material Escolar e Pedagógico Adaptado. In: SCHIRMER, C. R. et al. Atendimento Educacional Especializado – Deficiência Física. Brasília: SEESP; SEED; MEC, 2006. p. 41-56. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/aee_df.pdf>. Acesso em: 6 jul. 2018. Texto de abordagem prática BERCH, R. Recursos Pedagógicos Acessíveis – Tecnologia Assistiva (TA) e Processo de Avaliação nas escolas. 2013. Disponível em: <http://www.assistiva.com.br/Recursos_Ped_Acessiveis_Avaliacao_ABR2013.pdf >. Acesso em: 6 jul. 2018. 22 Saiba mais JANELA da Alma. Direção: João Jardim; Walter Carvalho. Brasil: 2001. 73 min. A fim de refletir sobre a necessidade de perceber o outro frente ao atual contexto, reconhecendo a diferença e as particularidades de cada sujeito, assista a esse documentário e observe a percepção de mundo de pessoas com deficiência ou dificuldade visual. 23 REFERÊNCIAS ALVES, D. de O. Sala de Recursos Multifuncionais: espaços para atendimento educacional especializado. Brasília: MEC; SEESP, 2006. ALVEZ, C. B.; FERREIRA, J. de P.; DAMÁZIO, M. A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: abordagem bilíngue na escolarização de pessoas com surdez. Brasília: MEC; SEESP; Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2010. BERSCH, R. Introdução à Tecnologia Assistiva. Porto Alegre: 2013. BILKEI, O. Foto 519119119. Shutterstock, [S.d.]. Disponível em: <https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/cute-kid-having-physical- musculoskeletal-therapy-519119119>. Acesso em: 6 jul. 2018. BRASIL. Decreto n. 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei n. 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 21 dez. 1999. _____. Decreto n. 5.296, de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis n. 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 3 dez. 2004. _____. Decreto n. 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei n. 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei n. 10.098, de 19 de dezembro de 2000. 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Conversa inicial Caro aluno, agora que você já conhece a função da educação especial frente ao contexto inclusivo e às Tecnologias Assistivas (TA), assim como a importância de uma rede de apoio entre todos os profissionais envolvidos, é importante conhecer alguns arte... Além disso, mais do que reconhecer as TA como ferramentas de acessibilidade, é necessário conhecer sua aplicabilidade e saber avaliar quais deverão ser oportunizadas em cada situação e contexto. Cabe, então, aos profissionais envolvidos observar, anal...
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