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Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 Pancreatite crônica 1. PÂNCREAS NORMAL 1.1 PÂNCREAS EXÓCRINO 90% da massa pancreática Produção de enzimas essenciais ao processo da digestão – colecistoquinina, acetilcolina e pancreosinina Rigidamente controlado por sistema neuroendócrino Células acinares → grãos de zimogênio (pro enzimas) Grande quantidade de RER e complexo de Golgi Células centroacinares H2O e HCO3 – que juntamente com as enzimas fazem parte da composição do suco pancreático Células ductais Formação dos pequenos ductos 1.2 PÂNCREAS ENDÓCRINO Ilhotas de Langerhans – 1-2% - síntese de hormônios Células Beta – INSULINA Células Alfa – GLUCAGON Somatostatina Células PP - Polipeptídeo pancreático 1.3 CÉLULAS ESTRELARES 1.4 INTERSTÍCIO PANCREÁTICO Vasos sanguíneos, vasos linfáticos, nervos e estroma • Considerações importantes: Pâncreas exócrino e endócrino são derivados de células progenitoras comuns O pâncreas é morfologicamente maduro ao nascimento, mas a maturidade funcional é alcançada somente no desmame 2. SECREÇÃO PANCREÁTICA • Líquido claro, 97% água e eletrólitos e 3% de proteínas • Proteínas: protease (80%), amilase (7%), lipase (4%) e nucleasse (1%) • Correta absorção de nutrientes é dependente de: Enzimas pancreáticas Sais biliares Mucosa intestinal intacta • Quando não há lipídios, grande quantidade de lipases são inativadas • QUADRO CLÍNICO IPE (INUFICIÊNCIA PANCREÁTICA EXÓCRINA) Esteatorreia → Aumento de evacuações diárias → Fezes gordurosas e volumosas, difícil de limpar, 2-3 x ao dia (principalmente após refeições com alto teor de gordura). Pode ou não ser sintoma diário Perda de peso Anorexia 3. ETIOLOGIA DA PANCREATITE CRÔNICA Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 • Associação entre fatores genéticos e ambientais • Algumas causas relacionadas: Tóxicos (álcool e fumo) Anormalidades metabólicas – hiperlipidemia / hiperparatireoidismo Mecanismos idiopáticos e genéticos (cromossomo 17 – alterações relacionadas a fibrose cística) Resposta autoimune – doença Mecanismos obstrutivos 4. FISIOPATOLOGIA: lesão da célula acinar em resposta ao stress acinar → disfunção do ducto → alteração neuroimune • Caracterizada por inflamação continua do pâncreas e perda progressiva da função tanto endócrina quanto exócrina, por atrofia e/ ou substituição do tecido normal por fibrose • Células estrelares pancreáticas – importante na classificação do tipo de pancreatite 5. CLASSIFICAÇÕES DA PANCREATITE CRÔNICA Classificação de pancreatite crônica Marselhe-Roma, 1989 • Divide a pancreatite crônica em: Calcificante Alcoolismo crônico – 70-90% dos casos Tabagismo o muitas vezes aparece em associação com o álcool (risco somatório) o Por si só já é um fator de risco para o aparecimento de pancreatite crônica Alterações genéticas o Cromossomo 17 – autossômico dominantes – levam a calcificações grosseiras Alterações idiopáticas o Pancreatite Tropical o Pancreatite Senil o Pancreatite Juvenil Obstrutiva Obstrução crônica do pâncreas levando a uma hipertensão ductular que pode cursar com processo inflamatório, destruição do tecido pancreático e fibrose (obstrutivo) Causas: o Pós-traumática o Prótese endoscópica o Pancreatite aguda o Anastomoses o Tumores (lesões neoplásicas): ▪ Adenocarcinoma ▪ Neoplasia mucinosa intraductal ▪ Cistoadenoma seroso ▪ Tumores endócrinos Inflamatória (responsiva a esteroides) Autoimune o TIPO I – doença do IgG 4 o TIPO II – associado a doença inflamatória intestinal Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 6. PATOGÊNESE DA PANCREATITE CRÔNICA • A patogênese da pancreatite crônica está diretamente relacionada as células estrelares pancreáticas (quiescentes, armazenam vitamina A) localizadas ao redor dos ácinos pancreáticos • Caso ocorra algum insulto e agressão e destruição das células acinares há o extravasamento de enzimas as quais provocam lesões parenquimatosa, o recrutamento de PMNs e a liberação de mediadores pró inflamatórios que desencadeiam a inflamação. • Hipótese “necrose-fibrose” – após sucessivas crises de pancreatite aguda com destruição parenquimatosa são seguidos por fibrose progressiva → as citocinas liberadas nesses períodos estimulam as células estreladas pancreáticas, as quais se diferenciam em fibroblastos e iniciam a produção de colágeno A manutenção da agressão (fatores agressores) – como a ex: álcool, tabaco – estimula e sustenta esse processo inflamatório com ativação das células estreladas. A fibrose leva a obstrução ductular e hipertensão dos canalículos – levando a dor e as intercorrências dessa condição Mostrou ducto com cálculos, podendo fazer dilatações e áreas de estenose, pseudocistos, pode levar a obstrução do colédoco intrapancreatico (quadro de colestase), também pode levar a produção de pseudoaneurismas (na artéria esplênica – risco de rompimento), trombose esplênica (e trombose porta);obstrução de vísceras 7. PANCREATITE CRONICA E ALCOOL Necropsias em pacientes alcoolistas – 2009 Mais da metade dos pacientes possuíam alterações pancreáticas, comparado a 42,7% que não apresentaram nenhuma lesão Cerca de ~30% tinham comprometimento extenso do fígado – 30% É muito frequente a concomitância dessas duas condições. Contudo a manifestação clinica precoce é pobre (sinais e sintomas aparecem quando há extenso grau de fibrose) 8. PANCREATITE AUTOIMUNE TIPOS I E II Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 TIPO I relacionado a IgG IV + Mais prevalente no SM Acometimento de outros órgãos Resposta dramática ao so d corticoide Tipos de apresentação clinica: Aspecto de massa (semelhante a lesão tumoral) – 5-7 cm – DD com neoplasia (pois paciente apresenta dor) Pâncreas em salsicha Melhora drástica com utilização do corticoide. Lesão some/ tumor some TIPO II Associada a doença inflamatória intestinal Predisposição equivalente entre os sexos – adultos jovens ~30 anos IgG4 pode ou não estar presente Também respondem ao corticoide 9. MANIFESTAÇÕS CLÍNICAS MAIS COMUNS NA PANCREATITE CRÔNICA • Dor abdominal – está presente quase que na totalidade dos pacientes e normalmente é a primeira manifestação clínica. Paciente normalmente relata episódios de dor abdominal alta de forte intensidade e episódica – com duração de 2-3 dias (normalmente relacionados ao consumo de álcool) Essa dor pode se repetir de tempos em tempos – com o passar do tempo há o agravamento da dor e a redução do intervalo entre as crises Paciente sem dor – “quando acaba a dor, acabou o pâncreas” – Da Penha Maria OBS: derrames cavitários como: ascite pancreática, derrame pleural pancreático e derrame pericárdico pancreático – ocorrem por rompimento de um cisto ou ducto pancreático com extravasamento de liquido para a cavidade → DIAGNÓSTICO: punção e analise do liquido – dosagem de amilases → muito elevada (considerar quando acima da amilase sanguínea) Hemorragia digestiva – pode ocorrer quando o paciente tem por exemplo um pseudoaneurisma e esse vem a romper → graves 10. EXAME FÍSICO • Perda de peso • Perda de massa muscular, principalmente interóssea • Fata de gordura subcutânea • Leuconíquia ugueal • Alterações associadas a deficiência das vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K) – não há absorção de gordura e, portanto, a absorção dessas vitaminas fica comprometida Equimoses – deficiência de vitamina K Ataxia e neuropatia periférica – deficiência de vitamina E Cegueira noturna e xeroftalmia – deficiência de vitamina A Contração ou espasmos musculares,osteomalácia e osteoporose – alterações da vitamina D e hipocalcemia Toda dor abdominal alta solicitar !! Amilase, lipase e EAS Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 11. DIAGNÓSTICO DA PANCREATITE CRÔNICA • O diagnóstico precoce é um desafio!! – sintomas sutis Diagnóstico por imagem tardio – alterações só são vistas na imagem quando o paciente apresenta quadro avançado de doença Imagem de colangiopancreatografia retrógrada – normalmente o ducto pancreático possui cerca de 3 mm – na imagem podemos observar que existe uma dilatação do ducto, sendo possível enxergar até os ductos terciários (não visíveis em pacientes normais) Diagnósticos com testes indiretos – tardio e difícil • Estágios avançados de doença → diagnostico mais fácil - pode ser feito por US, TC, RNM, ecoedoscopia – quando presentes essas alterações demonstram que cerca de 90% do parênquima pancreático já foi comprometido (pois antes disso não é possível fazer o diagnostico de PC com base na imagem) Fibrose variável e calcificação do parênquima e ductulares Dilatação, distorção e estreitamento dos ductos pancreáticos Pseudocistos Estreitamento do ducto biliar intrapancreático Estreitamento do duodeno Trombose mesentérica superior, portal e/ ou da veia esplênica 12. TESTES DE FUNÇÃO PANCREÁTICA • Avaliar se as enzimas estão funcionantes • O melhor teste – PADRÃO OURO - seria a avaliação da gordura fecal – porém é extremamente complexo, pois depende da coleta de fezes do indivíduo durante 72 horas para depois analisar • Ácido esteatócrito – também precisa de fezes 24-72 h – correlação próxima com o teste de avaliação de gordura fecal – porém não é usado na pratica clínica • Elastase Fecal – exame mais utilizado na clínica – única enzima pancreática que chega nas fezes com a mesma quantidade em que é produzida no pâncreas – não sofre nenhuma metabolização nem nenhuma secreção durante o trajeto – ELISA – exame de fezes → não se modifica se o paciente estiver fazendo reposição de enzimas pancreáticas (são de origem suína normalmente), isso porque o anticorpo utilizado na técnica de ELISA permite identificar a elastase fecal humana • Teste respiratório com marcação de triglicerídeos por C13 – fácil execução, mas requer validação • RNM – colangiorresonância com aplicação de secretina – exame promissor → alto custo e ainda não esta validado, não é acessível a pratica clinica • Avaliação do estado nutricional – testes simples – magnésio, prealbumna, albumina, retinol, ferritina, hemoglobina → ainda precisa de validação para utilização com segurança na pratica clínica Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 O que nós fazemos na pratica clínica é a ELASTASE FECAL. Contudo, sabemos que em situação precoce de doença (leve) ela não se altera, somente vem a se alterar em quadros moderados/ graves 13. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DE PC • Critérios principais Achados de imagem definidos Achados patológico definidos • Critérios menores Dor abdominal superior repetida – crises de dor (agudização) Amilase sanguínea anormal – durante períodos de crise Insuficiência exócrina pancreática Insuficiência endócrina pancreática Mutações patogênicas – cromossomo 17/ fibrose cística Histórico de alcoolismo 14. ESTÁGIOS CLÍNICOS DA PC Estágio 0 – subclínico – paciente é assintomático Estágio 1 - dor abdominal ou pancreatite aguda sem sinais de insuficiência pancreática Estágio 2 – pacientes com insuficiência endócrina ou exócrina Estágio 3 – paciente com insuficiência endócrina E exócrina Estágio 4 – paciente com insuficiência endócrina E exócrina, que não sente dor (“não possui mais pâncreas viável para inflamar e causar dor” 15. INSUFICIENCIA PANCREÁTICA ENDÓCRINA (TIPO 3C) • 40-70% das pancreatites crônicas • Levam a diabetes insulino-dependentes – tratamento com insulina • Somente na fase inicial é que o antidiabético oral – aqueles que incrementam a secreção pancreática de insulina (SUFANILREIAS e GLINIDAS) podem fazer efeto • Não se usa Metformina!! – OBS: sabemos que essa medicação é a primeira a ser prescrita quando se tem o diagnostico de D tipo 2 (resistente à insulina). Esse paciente normalmente apresenta um perfil de dislipidemia, sobrepeso, obesidade, hipertenso... totalmente diferente do paciente com PC (emagrecido) • Raramente ocorre cetoacidose – mesmo com glicemia alta • Frequentemente ocorre hipoglicemia – • TRATRAMENTO: INSULINA + DIETA (restrição de carboidratos simples, não fazemos restrição de carboidratos complexos!! – a dieta deve ter no mínimo 2100cal – balanço de proteína e gordura que não podem ser consumidas em grande quantidade) 16. AVALIAÇÃO DO PACIENTE COM INSUFICIÊNCIA PANCRÁTICA EXÓCRINA • História Perda de peso Abuso de álcool e drogas (obs: atenção tabagismo) Cirurgias prévias Intolerância alimentar Glossites, dermatites e parestesia – sinais de desnutrição • Antropometria Peso, IMC e circunferência abdominal Circunferência do braço 1 CRITÉRIO PRINCIPAL OU DOIS CRITÉRIOS MENORES Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 • Testes bioquimicos Albumina, pré-albumina, transferrina, ferritina Vitaminas lipossolúveis e vitamina B12 Colesterol e suas frações – OBS: colesterol baixo → sinal de desnutrição • Competência Imunológica Contagem de linfócitos • Força muscular • Índices nutricionais • Densitometria óssea • Conduta: mistura de amilase + lipase + protease – derivadas de pâncreas suíno A lipase é a enzima mais importante a ser reposta pois seu balanço é mal compensado pelos mecanismos extrapancreáticos A lipase tem alta sensibilidade ao pH ácido – desnatura no estomago (deve estar protegida – preparações administradas como minimicroesferas com revestimento) 17. DIETA PARA PACIENTE COM PANCREATITE CRÔNICA • Lembrar que se trata de um paciente desnutrido • Lipídios – 30-40% das calorias • Proteínas – 1-1,5 g/kg/dia • Reposição de vitaminas lipossolúveis • Reposição de vitamina B12 • Antioxidantes #CONDUTA: reposição com extrato pancreático, dieta hipercalórica com reposição de insulina 1 semana após a conduta – melhora significativa do quadro clinico 17.1 PONTOS PRÁTICOS IPE Todo paciente com IPE deve ser tratado com reposição de enzimas, INDEPENDENTE do grau de esteatorréia e má digestão Dose recomendada: pancreatina – 25.000 a 75.000 U de lipase nas principais refeições e 10.000 a 25.000 nos lanches, a depender da ingesta de gordura (quanto mais gordura maior deve ser a dose) Seguir a dieta é essencial ao tratamento, observando que não se deve restringir lipídios de forma restritiva Clinicamente IPE ocorre quando 90% da função esta perdida Em IPE avançada paciente apresenta deficiência de vitaminas ADEK, Ca2+, Mg2+, folato e zinco Aumento do risco de osteoporose Aumento do risco cardiovascular (diminuição de fatores protetores),independente do estilo de vida do paciente Detecção precoce e tratamento efetivo da IPE reduz a morbidade e letalidade dos pacientes Importância de se entender a pancreatite crônica: A doença é negligenciada Natália Giacomin Lima – medicina UFES 101 70-90% são alcoolistas – o álcool pode ser a causa da pancreatite, mas não devemos descartar o fato de que outras causas podem estar relacionadas e não focar somente na etiologia alcoolica Outras causas são pouco levantadas por profissionais da saúde - ex: fibrose cística, trauma, medicamentos O diagnostico precoce é difícil Para efetiva ação da enzima pancreática administrada no tratamento é necessário inclusão de lipídeos na alimentação A desnutrição ocorre muito antes da esteatorreia Déficit de oligoelementos (vitaminas e minerais) e aumento da geração de radicaislivres – danos a saúde Aumento do risco cardiovascular (redução de fatores protetores), independente do estilo de vida Eleva-se o risco de osteoporose e fraturas
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