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MÚLTIPLOS OLHARES 68 Elaine Cristina Marques Professora no curso de Graduação de discipli- nas relacionadas à química e à ciência dos mate- riais no UniAnchieta e na USF; coordenadora do curso de Engenharia de Produção da USF – Campus Itatiba. Doutorado e Mestrado em Engenharia e Ciência dos Materiais pela Uni- versidade São Francisco – USF; Licenciatura em Química. Uma experimentação diferente em Química: a construção de moléculas com massa de modelar É na prática que se aprende. Quem nunca ouviu essa frase ou alguma outra semelhante? Quando se fala no ensino de química, a experimentação pode ser forte aliada no processo de aprendizagem, já que os próprios alunos atribuem à experimentação “[...] um caráter motivador, lúdico, essen- cialmente vinculado aos sentidos.” (GIORDAN, 1999). Além disso, a experimentação sempre se apresentou fundamental para o crescimen- to da ciência, desde o século XVII, quando Galileu Galilei atribuiu à experimentação o papel de fazer a ciência se tornar legítima. Suota e Wisniewski (2008) afirmam que dois dos grandes obstá- culos no ensino de química são a abstração e a complexidade dessa ciência, causando desmotivação e desinteresse por parte dos alunos. Nesse sentido, a experimentação é vista como parte do processo de investigação que forma os pensamentos e governa as atitudes de quem as vivencia tornando a química uma ciência interessante (GIORDAN, 1999). Além disso, Chassot (1993) nos diz que tornar a química mais “palpável” é uma oportunidade de associá-la com os avanços tecnológicos que afetam diretamente a sociedade. Entretanto nem todos os conteúdos de química podem ser abor- dados de maneira direta com o uso de uma atividade prática de expe- LIVRO MULTIPLOS OLHARES VOL III COPIA.pmd 09/10/2013, 15:4068 http://www.pdfcomplete.com/cms/hppl/tabid/108/Default.aspx?r=q8b3uige22 69 na construção do conhecimento - Vol. III rimentação. Assuntos como ligações químicas, por exemplo, podem se tornar difíceis de serem experimentados de fato e, além disso, é preciso que as atividades práticas sejam bem elaboradas para que o conteúdo tenha significado (GALIAZZI e GONÇALVES, 2004). Nesse caso, uma saída é a experimentação por simulação, na qual, segundo Giordan (1999, p. 47) “[...] o sujeito se percebe diante de uma representação da realidade, obrigando-se a formular a sua própria, que venha a se ajustar àquela em simulação.” Neste trabalho, é apresentado um exemplo prático de experimen- tação por simulação realizada com alunos dos semestres iniciais de cursos de Engenharia e objetivou-se a confecção de moléculas tridimensionais com massa de modelar e palitos de dente. Para situar o leitor, podemos resumir da seguinte maneira: as substâncias são for- madas por meio de ligações químicas primárias iônicas, covalentes ou metálicas entre os átomos. Compostos iônicos e metálicos geralmente se organizam em estruturas cristalinas (arranjos organizados), enquan- to que as substâncias covalentes formam moléculas que se organizam em função da polaridade das ligações primária e secundária (também chamada de interação intermolecular). Uma série de propriedades pode ser explicada por meio do tipo de ligações primária e secundária que as substâncias – e os materiais – possuem: ponto de fusão e de ebuli- ção; densidade; condutividade elétrica; solubilidade; propriedades mecânicas etc. Para as substâncias covalentes, é possível explicar fenô- menos simples do dia a dia, mas que exercem grande influência na sociedade, como o porquê de a água e o óleo não se misturarem e o porquê de o sabão ser capaz de misturar as duas substâncias. O enten- dimento desse e de muitos outros fenômenos começa com o assunto geometria molecular, abordado neste trabalho, sem o qual não se é capaz de prever o tipo de interação intermolecular existente (MAIA e BIANCHI, 2007). Para isso, os alunos, antes da aula experimental, recebem o proce- dimento experimental detalhado na TAB.1 LIVRO MULTIPLOS OLHARES VOL III COPIA.pmd 09/10/2013, 15:4069 http://www.pdfcomplete.com/cms/hppl/tabid/108/Default.aspx?r=q8b3uige22 MÚLTIPLOS OLHARES 70 Na Tabela 2 é apresentada a folha de avaliação disponibilizada aos alunos, para que preencham no decorrer da aula prática. Para efeito didático, as colunas estrutura de Lewis e a geometria da molécula são apresentadas preenchidas, juntamente com os devidos códigos mos- trados na Tabela A. Também é apresentada uma foto de cada molé- cula montada por um grupo de alunos. LIVRO MULTIPLOS OLHARES VOL III COPIA.pmd 09/10/2013, 15:4070 http://www.pdfcomplete.com/cms/hppl/tabid/108/Default.aspx?r=q8b3uige22 71 na construção do conhecimento - Vol. III Entre os anos de 2012 e 2013, cerca de 400 alunos de vários cur- sos de Engenharia da Universidade São Francisco (distribuídos nos câmpus Itatiba, Bragança Paulista e Campinas) realizaram essa ativida- de. De maneira geral, os alunos se apresentam bastante interessados nessa atividade, o que possivelmente estaria vinculado ao uso do lúdico, como visto por Giordan (1999). Todo o conteúdo necessário para o desenvolvimento da atividade prática foi abordado em sala de aula antes da ida ao laboratório. Durante as aulas teóricas, foi possível verificar claramente a dificuldade de entendi- mento do assunto, devido à abstração do tema. Suota e Wisniewski (2008) observaram grande desmotivação por parte de alunos da zona rural. Ao LIVRO MULTIPLOS OLHARES VOL III COPIA.pmd 09/10/2013, 15:4071 http://www.pdfcomplete.com/cms/hppl/tabid/108/Default.aspx?r=q8b3uige22 MÚLTIPLOS OLHARES 72 serem, no entanto, realizadas atividades práticas utilizando materiais e as- suntos próximos ao cotidiano, o que contribui para a diminuição da abs- tração desta ciência, os autores perceberam a aproximação dos alunos com a química, evidenciada pelo aumento do interesse dos mesmos. Quando da realização da atividade prática, alguns erros na monta- gem das moléculas já são esperados e se concretizam, sendo raros os grupos que montaram todas as moléculas como previsto pelo modelo de Repulsão dos Pares Eletrônicos da Camada de Valência (RPECV). Durante a realização da atividade prática, embora a grande maioria dos alunos tenha representado a estrutura de Lewis corretamente, há confu- são na definição da geometria das moléculas de: amônia (NH3), cujo par de elétrons do nitrogênio não é considerado e eles a classificam como trigonal planar; tetracloreto de carbono (CCl4), em que representam os átomos de Cl dispostos na forma de cruz, sem considerar, portanto, o espaço tridimensional. Com relação a este tipo de representação, Giordan (1999) afirma que a manipulação de modelos de bola e vareta pode auxiliar no desenvolvimento de habilidade cognitiva importante para a compreensão de fenômenos químicos microscópicos, já que cria a opor- tunidade para que o aluno perceba o espaço tridimensional. Após a montagem das moléculas, a presença do professor é soli- citada pelos alunos, a fim de que eles possam responder à questão 2 da folha de avaliação, apresentada na tabela 2. Nesse instante, o papel do professor é discutir com o grupo as bases científicas ou de senso co- mum utilizadas na montagem das moléculas, levando-os a concluírem qual o melhor arranjo espacial para as mesmas. Tal abordagem de ensino, baseada na construção do conhecimento, pode ser chamada de aprendizagem significativa que, segundo Guimarães (2009), “[...] ocorre quando uma nova informação ancora-se a conceitos relevantes preexistentes na estrutura cognitiva do aprendiz.” , o que é complementado por Silva e Zanon (2000) que afirmam que essa abor- dagem se mostra dinâmica, processual e significativa, tendo capacida- de de promover as potencialidades humanas e sociais. Sendo assim, podemos concluir que o uso de atividades práticas ou de simulação nas aulas de química se mostra um aliado importante no processo de construção da aprendizagem. Ainda se deve ressaltar que os alunos que participaram dessa atividade raramente têm consci- ência da importância de se ter a disciplina de química nocurrículo, mas que, por serem alunos de cursos de engenharia, gostam de realizar práticas manuais e são, portanto, contemplados com aquilo que gos- LIVRO MULTIPLOS OLHARES VOL III COPIA.pmd 09/10/2013, 15:4072 http://www.pdfcomplete.com/cms/hppl/tabid/108/Default.aspx?r=q8b3uige22 73 na construção do conhecimento - Vol. III tam de fazer. Por mais lúdica que seja a atividade, devemos entendê-la como motivadora do interesse pela química, que é de importância fundamental no mundo tecnológico atual e que precisa ser compreen- dida pelos estudantes, a fim de que eles possam se tornar cidadãos mais críticos e atuantes, do que carece a sociedade. Referências Bibliográficas ATKINS, P., JONES, L. Princípios de Química: Questionando a vida moderna e o meio ambiente. 1ª ed. Porto Alegre: Bookman Compa- nhia Editora, 2001. CHASSOT, A. I. Catalisando transformações na educação. Ijuí: Unijuí, 1993. GALIAZZI, M. C.; GONÇALVES, F. P. A natureza pedagógica da experimentação: uma pesquisa na licenciatura em química. Química Nova, São Paulo, v. 27, n. 2, p. 326-331, 2004. GIORDAN, M. Experimentação e ensino de ciências. Química Nova na Escola, n. 10, p. 43-49, 1999. GUIMARÃES, C.C. Experimentação no ensino de química: cami- nhos e descaminhos rumo à aprendizagem significativa. Química Nova na Escola, v. 31, n. 3, p. 198-202, 2009. MAIA, J.D.; BIANCHI, J.C.A. Química Geral: fundamentos. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. SILVA, L. H. A.; ZANON, L. B. A Experimentação no ensino de ciências. Org. SCHNETZLER, R. P. e ARAGÃO, R. M. R. DE. Ensino de Ciências: Fundamentos e Abordagens. Campinas: Capes; UNIMEP, 2000, p. 120-153. SUOTA, M. J.; WISNIEWSKI, G. Ensino da química: emprego de ma- teriais caseiros na educação do campo. In: 8° Encontro de Iniciação Científica da FAFIUV, 2008. VALENTE, M.V.; MOREIRA, H. Estrutura de Lewis e Geometria Molecular... mas não necessariamente por essa ordem! Química e Ensino, v.106, p.25-27, 2006. LIVRO MULTIPLOS OLHARES VOL III COPIA.pmd 09/10/2013, 15:4073 http://www.pdfcomplete.com/cms/hppl/tabid/108/Default.aspx?r=q8b3uige22
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