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Estudos Socioantropológicos UN ID AD E 3 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 2 Ao abordarmos os conceitos de trabalho e consumo e sua possível relação, consideraremos que na atualidade eles encontram-se desvinculados da questão do suprimento das necessidades básicas do homem. Se, antes, o homem atingia sua realização por meio do trabalho, e este tinha um valor significativo, pois com ele o homem conseguia manter uma relação de consumo direta com o suprimento de suas necessidades de sobrevivência, hoje, com a evolução dos tempos, a realidade social traz à cena um conceito de obrigatoriedade do trabalho em troca de um salário, que muitas vezes, não supre o consumo das necessidades vitais do homem e de sua família; com isso, vemos um mundo do trabalho extremamente precarizado, um incremento nos índices de pobreza e desigualdade na distribuição de renda, sem falar nas mudanças da regras e leis que regem esse universo e das várias iniciativas e estímulos para que os indivíduos criem suas próprias oportunidades de trabalho. Precisamos saber que, de acordo com a evolução da estrutura socioeconômica, as relações sociais de trabalho se transformam para acompanhar as diferentes demandas mundiais. 3 3 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Fo nt e : C e nt o d ie ci .it Assim, nesta unidade, entenderemos os conceitos de trabalho, procurando relacionar sua definição com as várias diferentes formas de atividades que se apresentam no universo de sua dinâmica, o mundo do trabalho. Abordaremos também a definição e compreensão da ideia de sociedade do consumo. Por isso, organizados em tópicos, estudaremos os seguintes assuntos: T1. Divisão Social do Trabalho e o Trabalho na Sociedade Industrial Capitalista. T2. Pós-fordismo, Flexibilidade, Automação e Desemprego Tecnológico. T3. A Sociedade do Consumo: indústria cultural e cultura de massa. T4. Padrões de Consumo: consumismo e consciência ecológica. Desejamos que os temas abordados possibilitem a visão geral das relações de trabalho e sociedade de consumo com objetivos de: explicar o que é a divisão social do trabalho e o trabalho na sociedade industrial capitalista; desenvolver a compreensão do mundo pós-fordismo, bem como os conceitos de flexibilidade, automação e desemprego tecnológico; a sociedade do consumo: indústria cultural e cultura de massa; padrões de consumo: consumismo e consciência ecológica. Vamos iniciar? T1 Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 4 Divisão Social do Trabalho e o Trabalho na Sociedade Industrial Capitalista Em estudos socioantropológicos, é importante distinguir o que falam os clássicos da Sociologia sobre a divisão social do trabalho. Eles procuraram definir as formas e reflexões sobre as diferentes relações que podem acontecer entre homem e o mundo do trabalho, levando em consideração a dimensão social, política e econômica de tal divisão. Para falar de divisão social do trabalho, precisamos resgatar o pensamento clássico de Karl Marx (1818- 1883), que aponta a origem da divisão social do trabalho a partir do próprio desenvolvimento da sociedade capitalista. Marx concebe a divisão social do trabalho no bojo da própria evolução do capitalismo, na medida em que esse define a estrutura de papéis e funções, e a forma como as atividades são divididas, tomando como base o suprimento de nossas necessidades. Podemos, então, dizer que a divisão social do trabalho nada mais é que: A maneira como o trabalho está distribuído nas diferentes sociedades, que possuem especificidades em suas estruturas socioeconômicas e que dividem indivíduos e grupos por atividades específicas fundadas a partir do desenvolvimento das forças produtivas e da própria configuração interna das comunidades. Marx nos aponta que a divisão social do trabalho resulta da complexidade do desenvolvimento das relações capitalistas de produção. Em seu enfoque, o homem vende sua força de trabalho em troca de um salário, ou seja, submete- se à máquina e ao dono dela. Além disso, ocorre uma relação em que o operário precisa vender sua força de trabalho, e o proprietário dos meios de produção precisa comprar esta força. Fo nt e : M D C Fo n te : C ria çã o d a A u to ra . 5 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Assim, de acordo com o desenvolvimento das sociedades, Marx organiza a relação divisão social do trabalho da seguinte maneira: Já Durkheim (1858-1917), também filósofo da Sociologia, define papéis e funções, ao discorrer sobre a divisão social do trabalho, em consonância com critérios morais e não econômicos, pois, para ele, a divisão social do trabalho traz em si o sentimento entre aqueles que realizam as mesmas funções. Assim, o trabalho cumpre a importante função de integrar a sociedade, de forma orgânica e harmônica. Mas, se a divisão do trabalho produz a solidariedade, não é apenas porque ela faz de cada indivíduo um ‘trocador’, como dizem os economistas; é porque ela cria entre os homens todo um sistema de direitos e deveres que os aliam uns aos outros de maneira duradoura. Do mesmo modo que as similitudes sociais dão origem a um direito e a uma moral que as protegem, a divisão do trabalho dá origem as regras que asseguram o concurso pacífico e regular das funções divididas (DURKHEIM, 2004, p. 429). Max Weber (1864 -1920), outro clássico da Sociologia, apresenta a ideia de que podemos observar fortemente uma diferença na concepção de divisão social do trabalho entre católicos e protestantes. Para ele, os últimos valorizavam o trabalho e tinham um rigor com sua doutrina religiosa, bastante alinhada com o Capitalismo, o que demonstra o espírito empreendedor presente muito fortemente em sociedades protestantes. A ideia da obrigação do ser humano com a propriedade que lhe foi confiada, à qual se sujeita como prestimoso administrador ou mesmo como ‘máquina de fazer dinheiro’, estende-se por sobre a vida feito uma crosta de gelo. Quanto mais posses, tanto mais cresce – se a disposição ascética resistir a essa prova – o peso do sentimento da responsabilidade não só de conservá-la na íntegra, mas ainda de multiplicá-las para glória de Deus através do trabalho sem descanso. Mesmo a gênese desse estilo de vida remonta em algumas de suas raízes à Idade Média como, aliás, tantos outros TALENTOS E CAPACIDADES INDIVIDUAIS SÃO DENOMINADOS COMO HABILIDADES E COMPETÊNCIAS. Fo nt e : I d e ia su st e nt av e l Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 6 elementos do espírito do capitalismo [moderno], mas foi só na ética do protestantismo ascético que ele encontrou um fundamento ético consequente. Sua significação para o desenvolvimento do capitalismo é palpável (WEBER, 2004: 155). Já que a divisão social do trabalho marca a vida dos indivíduos na sociedade industrial capitalista, precisamos, então, entender que esta divisão na sociedade se dá a partir das diretrizes de seu entendimento. Mas, como esta divisão ocorre em tempos atuais? Na atualidade, vemos que a organização do trabalho no mundo capitalista está muito determinada por uma compreensão de atributos individuais, para o desenvolvimento das diferentes atividades. Dessa forma, existe uma discussão que aponta que para além das determinações de classe, gênero e raça, os indivíduos devem ser alocados no mundo produtivo e remunerado, por meio da identificação de seus talentos e capacidades individuais. Com isso, observamos uma busca por qualificação profissional e diferentes formações que foquem no desenvolvimento desses atributos, preparando o trabalhador para atender a demandas dos novos postos de trabalho e uma redefinição da ideia de divisão social do trabalho. Articulada a esta situação, ocorre também uma revisão das formas de remuneração do trabalhador. Além disso, vivenciamos a flexibilização proporcionada pela própria dinâmica da transformaçãoda estrutura econômica mundial e também da consequente reorganização do trabalho, a qual remonta à era das terceirizações, José Dari Krein (2018), em seu artigo, analisa as consequências da reforma trabalhista sancionada recentemente no Brasil. Confira no link abaixo: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0103-20702018000100077&lng =en&nrm=iso saiba mais? 7 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo despadronização de jornadas de trabalho, relação de emprego sob forma de pejotização, remuneração variável e benefícios oscilantes. Tudo isso, fruto da pressão que os empregadores desenvolveram para a alteração das regras formais que regulam as relações de trabalho. Aliada a isso, temos diferentes indivíduos exercendo funções e atividades diversas no mundo do trabalho ante a aguda crise de vagas ofertadas. Inclusive, o desemprego é o grande desafio das sociedades atuais, assim como o consumo descontrolado sem possibilidades de um planejamento orçamentário. Tudo isso resulta em uma nova organização produtiva com diferentes formas de execução do trabalho, forjando lógicas de variados contratos de trabalho, que proporcionem possibilidades de criação de um contrato de emprego “flexível” e adaptado ao novo contexto. Despadronização da jornada ou flexibilização refere-se ao banco de horas e escalas, e turnos muito diferenciados por setor econômico e empresa. Pejotização quer dizer que o empregado passa a prestar serviços por meio de uma empresa, eliminando a necessidade de pagamento de encargos trabalhistas, já que o serviço prestado é entre duas pessoas jurídicas. T2 Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 8 Pós-Fordismo, Flexibilidade, Automação e Desemprego Tecnológico Iniciamos este tópico com a compreensão de lógicas e práticas de reestruturação do mundo do trabalho que nos ajudam a entender como as relações de trabalho se redefinem no mundo contemporâneo. Com isso, entenderemos a flexibilização das relações de trabalho e a nova dinâmica dos contratos diante da realidade pós-fordista. Para alcançarmos a compreensão do mundo pós-fordista, vamos passar pelo entendimento de dois outros modelos que nos levaram até ele: taylorismo e fordismo. Taylorismo O Taylorismo pode ser definido como uma criação de Frederick Taylor, no início do século XX, com o intuito de organizar o processo produtivo capitalista, focado na extração do maior aproveitamento possível da força de trabalho. Tal processo contava com um ambiente produtivo com forte maquinário, definição precisa dos tempos e movimentos realizados pelos trabalhadores. Além disso, contava com treinamento e organização dos empregados, divididos por quem chefia e fiscaliza o processo produtivo, cujas atividades repetitivas (braçais) lhes eram destinadas. Normalmente quem executava eram os trabalhadores de baixa qualificação. Fo nt e : t o d o e st u d o RESUMO DAS DIFERENÇAS ENTRE O TAYLORISMO E O FORDISMO 9 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Fordismo Na sequência da continuidade e aprimoramento destas rotinas, Henry Ford, em 1913, pode ser considerado o criador da produção padronizada, que se refere a uma organização verticalizada da produção na fábrica - constando do início do manuseio e tratamento da matéria-prima até a concepção e elaboração do produto final e sua comercialização. Esse processo ficou conhecido a partir das chamadas linhas de montagem, nas quais haviam as esteiras de produção, para evitar a perda do tempo e o desperdício de energia do trabalhador ao realizar movimentos que não fossem padrão. Com esse modelo, as relações de trabalho seguiram pelo caminho da amplitude da precarização das conquistas dos trabalhadores. Fo n te : e m h s Fo nt e : D ire ito S in d ic al is m o Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 10 Pós-Fordismo Após a era Ford, no contexto chamado pós-fordismo, vemos alterações significativas em contratos de trabalho. As relações de trabalho e as conquistas obtidas no contexto do sindicalismo forte e do Estado do Bem-Estar Social são duramente atacadas e enfraquecidas. Um dos expoentes do pós-fordismo é o sistema Toyota de produção, criado no Japão após a Segunda Guerra Mundial, com as seguintes características: • Necessidade de mão-de-obra muito qualificada, na qual os trabalhadores possam atuar em diferentes funções e em qualquer parte do processo da produção; • Produção que não excede a demanda do mercado; • Controle visual para acompanhar as etapas da produção; • Sistema de qualidade total, buscando evitar o desperdício de tempo e matéria-prima, just in time (produção do necessário em termos de tempo dispendido e quantidade de produtos); e • Pesquisa de mercado para atender às demandas dos consumidores. Com isso, cada vez mais, observamos a flexibilização dos direitos e garantias dos empregados, além da retirada da proteção ou regulamentação das possíveis relações de trabalho. Associado à precarização, nasce também o fenômeno da terceirização, que vai retirando os trabalhadores da empresa para inseri-los em empresas prestadoras de serviço. A flexibilização emerge a partir do discurso de que existe uma crise econômica séria, que afeta a redução de empregos e, então, tal redução viria como alternativa para a sua preservação, ainda que modificasse as relações de trabalho e as conquistas alcançadas pelos trabalhadores. A lógica seria que ao optar por diminuição dos direitos trabalhistas, a empresa reduz custos de produção e sobrevive no mercado global. Na prática, a flexibilização tem mostrado a redução da proteção trabalhista e previdenciária. Reforçam-se os fundamentos econômicos do Capital com o barateamento da produção e aumento de lucros das empresas e demissões em massa de funcionários. Todo esse movimento conta com as transformações industriais trazidas pela automação da produção, que envolve um sistema fundado no uso de técnicas computadorizadas ou mecânicas para dinamizar e otimizar todos os processos produtivos em todos os setores da economia. A ideia é agilizar, dinamizar e baratear custos com a introdução de máquinas e processos de tecnologias digitais. Conheça como se deu a regulamentação das relações de trabalho através do Estado. https://luizfurtdadojr.jusbrasil.com.br/ a r t i g o s / 1 5 2 0 6 8 5 9 0 /o - e s t a d o - e - a - regulamentacao-das-relacoes-de-trabalho saiba mais? 11 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo A automação pode ser dividida em: automação industrial e automação informatizada. Automação Industrial Utilização de modernas técnicas de produção, com destaque para a robotização, o uso de robôs controlados por computadores que realizam o trabalho de seres humanos. Automação Informatizada Processo de automação, por meio de sistemas computacionais, no tratamento da informação. Todo esse processo colabora essencialmente para a modernização dos processos industriais e para o investimento em estudos e produção de novas tecnologias. Assim, de forma permanente, ocorre a atualização do desenvolvimento das rotinas e práticas de produção nas empresas, resultando no avanço socioeconômico das sociedades contemporâneas. No entanto, precisamos destacar que a automação da produção conduz ao que chamamos de desemprego tecnológico, marcado basicamente por duas dimensões: a ausência de qualificação específica por parte dos trabalhadores, para operar em máquinas e tecnologias modernas; e a redução, até mesmo desaparecimento, de muitos postos de trabalho, que são substituídos pela lógica da automação. Dessa forma, temos um aumento de desempregados na população ativa, por não terem preparação e formação para preencherem as ofertas de vagas disponíveis no mercado de trabalho. Mesmo com as mudanças nos processos de produção, com a implementação das novas tecnologias, as leis trabalhistas permaneceram praticamente iguais. Isso resultou na manifestação dos trabalhadoresem busca de direitos mínimos que lhes assegurassem proteção e incentivou a intervenção do Estado nas relações de trabalho. As leis trabalhistas são consequência das mudanças econômicas que ocorreram no mundo no século XX. Fo nt e : G az e ta d o P ov o Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 12 Podemos dizer que, atualmente, a análise da inclusão social dos indivíduos não mais ocorre somente pelo lugar que ocupam na estrutura social de produção. Mas sim, pela capacidade de consumo de cada grupo ou indivíduo, o que vai definir uma nova relação do homem com o mundo do consumo. A onda mundial de precarizações e retirada dos direitos do trabalhador é uma forte realidade em tempos atuais. No Brasil, vivemos a Era da Reforma Trabalhista, que reforça a remoção dos direitos do trabalhador, por flexibilizar a relação entre patrões e empregados. Essa realidade perversa para os trabalhadores de carteira assinada e inseridos no mercado de trabalho formal, e mesmo, para todos os outros trabalhadores, já é um fato recorrente em muitos outros países. Estados Unidos Nos Estados Unidos, há uma regulação menor sobre o mercado de trabalho, porque o seu modelo econômico de tradição liberal mostra que o Estado não interfere, por isso apresentam uma legislação trabalhista flexível. O governo federal não determina limite para a jornada de trabalho, mas o padrão são 40 horas por semana. Como a lei federal americana não prevê férias remuneradas, alguns estados obrigam as empresas a pagar os dias de descanso, tudo acordado em contrato de trabalho. China A China, por ser um país que possui um Estado forte e centralizador, não possui legislação que assegura os direitos dos trabalhadores. E esta é uma sociedade que mais explora a mão de obra barata de trabalhadores e trabalhadoras. Recentemente, tivemos várias denúncias de exploração do trabalho infantil em Indústrias chinesas e mesmo, de mão de obra escrava. Os contratos de trabalho são frágeis e a qualquer momento podem ser quebrados. França Na França, sexta maior potência econômica, observamos que não existe carteira de trabalho, apenas dois diferentes contratos entre patrões e empregados: Contrato de Duração Indeterminada (CDI) e Contrato de Duração Determinada (CDD). O Brasil, como informamos antes, aprovou recentemente a Reforma Trabalhista. Abaixo listamos suas contribuições: • Flexibilização das normas trabalhistas mediante negociação coletiva, com possibilidades de compensação; • Ampliação do tempo dos contratos temporários e de tempo parcial; • Regulamentação para a terceirização; • Admissão da arbitragem para dissídios individuais, ou monopólio judicial; • Ênfase nas Comissões de Conciliação Prévia; • Criação da representação dos empregados na negociação. A precarização dos direitos trabalhistas, uma bandeira neoliberal que já mostrou em outros países que é um processo que causa danos à sociedade e aos trabalhadores. https://www.youtube.com/watch?v=NzjZ95iKMe4&feature=youtu.be saiba mais? 13 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Sem emprego e precarizado, o trabalhador atual se perde em um mundo em que gostos e desejos são construídos e empurrados como padrão pelos meios de comunicação de massa e também eletrônicos. Muitos endividam-se de forma volumosa, com a grande abertura de possibilidades de aquisição de crédito financeiro, via lógica de cartões de crédito, para sentirem-se pertencentes a um mundo em que o consumo material pesa na organização das relações sociais. REFORMA TRABALHISTA E SEUS IMPACTOS NA VIDA DOS TRABALHADORES. Fonte: O Povo Online T3 Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 14 A Sociedade do Consumo: indústria cultural e cultura de massa Nesse tópico, vamos aprender que a sociedade do consumo se desenvolveu de forma mais intensa ao longo dos séculos XVIII ao XX, por ocasião do avanço da atividade industrial, pois com as invenções e modernas formas de produzir mercadorias e objetos diferenciados, o consumo expandiu-se de forma significativa. Somado a isso, temos que considerar também a ampliação e divulgação dos meios de publicidade dos bens e produtos que surgiam para toda a população. Dessa forma, a sociedade de consumo remete-se ao contexto contemporâneo de evolução do capitalismo, caracterizado, fundamentalmente, pelo crescimento econômico e pela geração de lucros. Ambos advindos das atividades comerciais e do estímulo ao consumo exacerbado, que é empurrado aos indivíduos pela lógica do fetiche da mercadoria e do incremento nas mídias de comunicação. Devemos destacar que o Fordismo contribuiu e muito para que o consumismo se desenvolvesse ao longo do século XX, pois proporcionou uma produção em massa padronizada que deveria alcançar mercados consumidores. Nos Estados Unidos, emergiu a ideia do American way of life, estilo de vida americano, definido por um consumo descontrolado por parte das pessoas que imaginavam ser e estarem mais felizes por consumirem cada vez mais. Na atualidade, não vivemos mais as práticas do sistema fordista, mas ainda existem empresas que o adotam. O Toyotismo, que nasceu e se desenvolveu a partir do século XX, procura estabelecer equilíbrio entre demanda e produção, diferentemente do Fordismo, que investia na produção em massa. No Toyotismo, a produção em grandes quantidades ocorre quando há uma grande demanda pelo produto. Ainda assim, incentiva-se de forma permanente que o consumo se mantenha elevado para atingir altas metas de lucro. A publicidade torna-se uma grande aliada para este fim, na medida em que contribui para o elevado consumo com propagandas bem criativas e convidativas sobre os produtos que divulga. As propagandas ganharam quantidade e qualidade em suas abordagens para cumprir com seu papel de ampliar o número de consumidores, todos ávidos por novidades e sem muitas preocupações com a questão da sustentabilidade ambiental. Entenda a diferença entre Taylorismo, Fordismo e Toyotismo como modelos produtivos. https://www.youtube.com/watch?v=Knm9GPIuewQ Fo nt e : C o m u n ic at io n Z o n e 15 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Indústria Cultural e Cultura de Massa As críticas direcionadas à sociedade de consumo remetem-se a perspectivas de que este modelo econômico de relação produção-consumo não deve se sustentar e vai levar a sociedade às crises econômicas, que acarretam desemprego e miserabilidade para a população. Há, também, aqueles que apontam uma exploração dos recursos naturais de forma exagerada e que degrada o planeta, com geração de lixo e poluição de forma desenfreada, sem projetos de sustentabilidade ambiental. Com este conhecimento da era da sociedade do consumo, vamos compreender dois conceitos que são sempre acionados para o estudo das práticas de consumo em nossa realidade, que são eles: indústria cultural e cultura de massa. Para Coelho (1993), a indústria cultural, os meios de comunicação de massa e a cultura de massa nasceram com a industrialização. Segundo o autor, a partir das transformações geradas no modo de produção e na forma do trabalho humano, desenvolve-se um tipo particular de indústria (a cultural) e de cultura (a de massa). Ambas se orientam pelos princípios em vigor na produção econômica em geral: 1. o uso crescente da máquina e a submissão do ritmo humano de trabalho ao ritmo da máquina; 2. a exploração do trabalhador; 3. a divisão do trabalho. Com isso, observamos também o nascer da cultura de massa, aquela que pode ser definida como: coletânea ou conjunto de costumes, atividades, crenças, entre outros, voltada às populações. Esta forma de fabricação de cultura tende à padronização de gostos, valores e pensamentos, pois difunde o mesmo para todos, reforçando a massificação de consciências, isto é, todos querem e gostam das mesmas coisas, o que faz o comércio de bens materiais e imateriais se engrandecer sempre. Além disso, ela não colaboracom o caráter inovador e criativo do cenário cultural. Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 16 Marx Horkheimer (1895-1973) e Theodor Adorno (1903-1969), membros da Escola de Frankfurt, escreveram uma obra intitulada “A indústria cultural: o esclarecimento como mistificação das massas”, cujas reflexões nos mostram que a cultura de massa causou grande impacto na sociedade, porque produziu uma homogeneização dos indivíduos. Para eles, ao conseguirem atingir um número de pessoas muito maior, os meios de comunicação fazem a difusão de modelos planificados de cultura, reproduzindo padrões homogêneos e não levando em consideração as diferentes possibilidades de configuração de gostos e identidades. Quem consome dessa forma pode ser considerado uma massa homogênea. Assim, podemos resumir indústria cultural e cultura de massa, de acordo com quadro a seguir: Indústria cultural Cultura de massa Designa a forma com que os produtos culturais dos vários setores são fabricados de acordo com a lógica do capital e como os meios de comunicação colaboram para definir seu consumo massivo. Ela impede a autonomia do indivíduo para criar e julgar o que de fato quer e precisa consumir para viver. Deve ser entendida como o produto desenvolvido pela indústria cultural, consistindo no fenômeno de manifestação em que se submetem as mais variadas expressões culturais a um ideal comum e homogêneo. A cultura de massa gera um mercado consumidor alienado e manipulado pelas máscaras construídas pelo universo da propaganda. Muitas vezes exagerada e enganosa dos produtos e serviços, padronizam os indivíduos por gostos e preferências a favor do lucro e em prejuízo do valor real do produto. Isso alimenta a lógica do capitalismo industrial e financeiro. Além disso, define os padrões de consumo e a consciência dos indivíduos que vivem envolvidos por esta relação exagerada, de querer consumir todas as coisas que veem ao seu redor, sem avaliar a ordem de suas reais necessidades de subsistência e as consequências dessa busca para um planeta sustentável. Fo nt e : C o n su m is m o Confira o vídeo “Consumismo e sociedade de consumidores”: https://www.youtube.com/watch?v=k9-8V95__AY saiba mais? 17 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Fonte: Tumblr Para Bauman (1999), nossa sociedade é voltada para o consumo. Segundo o autor, a sociedade moderna, em sua fase industrial, tornou-se uma sociedade de produtores e a ideia de uma sociedade de consumo é maior do que a observação de que todos consomem. Existe na sociedade atual uma maneira de moldar seus membros a partir do desempenho de papel de consumidor. Segundo o autor, cria-se um dilema: “é necessário consumir para viver, ou viver para consumir” (Idem, 1999, p. 89). Um dilema que marca nossas vidas com força, pois estamos todos inseridos cotidianamente nesta lógica da voraz sociedade de consumo. Hoje também avançamos muito para o que a pós-modernidade nos trouxe enquanto criação de uma cultura presa aos padrões da internet e redes sociais. A cultura midiática sinaliza o que devemos fazer em relação ao que é apresentado em redes sociais, como Facebook, Instagram, entre outras. O consumo e a vida das pessoas são determinados muito pelo que circula nas redes sociais, na midiatização e na virtualização do consumo nas rotinas de vida. Entenda a diferença entre cultura de massa e cultura de mídia com o quadro a seguir. T4 Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 18 Padrões de Consumo: consumismo e consciência ecológica Prosseguindo em nossos estudos acerca da ótica da sociedade do consumo, a cultura de massa contribui para a definição de determinados padrões de consumo. Esses devem ser entendidos como modelos que obedecem a diretrizes específicas e ditam as preferências e escolhas do que consumir e como consumir para os indivíduos. Estabelecem um nivelamento de hábitos, gostos, comportamentos e atitudes, definindo o consumo por grupos, cultura e formas de agrupamentos sociais. Bauman (2005), ao avaliar o ato de consumir, procura destacar que este suscita a satisfação momentânea e muitas vezes, exclusiva. Com isso, vemos que a utilidade de um objeto está diretamente vinculada à sua própria capacidade de realizar a satisfação. Sem esta satisfação garantida, extingue-se o fator necessidade de aquisição do produto ou serviço. Tal visão sobre o consumismo, no bojo desta sociedade que foca seus princípios na valorização do “ter” em detrimento do “ser”, a materialização extrema, dada pela mídia e pelos meios de reprodução social de consumo, mostra que é possível entender que quando nossa necessidade não é mais satisfeita, o consumo por futilidades, por exemplo, acaba por ser necessário, mas não exclusivo. Fontenelle (2005) nos aponta que na atualidade, em contextos nos quais a indústria cultural dita os rumos o modelo de produção capitalista, a pessoa tem cada vez mais possibilidades de consumir e saciar não apenas necessidades básicas, mas os seus desejos e expectativas latentes. Dowbor (2007) sinaliza que consumir é uma atividade agradável que consiste em satisfazer um conjunto de necessidades. Tais necessidades podem estar ligadas mais à satisfação psicológica do que o próprio sentimento do ter representa na vida das pessoas. Fo nt e : N o ta P o si tiv a 19 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Essas reflexões devem nos orientar em relação a uma perspectiva de racionalidade do consumo, uma lógica de compreensão do que consumismos, como consumimos e para que consumimos. Dessa forma, não temos como deixar de considerar a discussão sobre consumo sustentável e consciência ecológica. Ao abordar a questão da sustentabilidade, podemos destacar duas importantes dimensões, as razões que podem promover a sustentabilidade e as condições para que a sustentabilidade possa se realizar. Sustentabilidade Consciência ecológica Define-se como capacidade de desenvolver sustentação e conservação de um processo ou sistema. Esse conceito procura direcionar a forma como os indivíduos agem em relação à sua convivência com a natureza. Desenvolve-se a partir da ideia de que precisamos refletir para agir em relação à preservação dos recursos naturais, de nossa biodiversidade, a riqueza de espécies, fauna e flora, e de nossa própria existência humana futura. Fo n te : I n fo lo lis Confira abaixo o programa das Nações Unidas para o meio ambiente. https://nacoesunidas.org/agencia/ onumeioambiente/ saiba mais? Entenda um pouco mais sobre ética da compreensão na visão de Edgar Morin. Confira abaixo: h t t p : // w w w . p r o j e t o . u n i s i n o s . b r / humanismo/etica/eticacompreensao.pdf saiba mais? Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 20 Olhando mais de perto esse movimento de pensar um consumo mais responsável, que se preocupa com uma perspectiva de futuro para a humanidade, encontramos a resposta nos fundamentos éticos de perpetuação de nossa existência social. Eis a razão que buscamos para promover a sustentabilidade. Sobre a questão de buscar condições para a realização da sustentabilidade, verificamos que existe uma movimentação mundial que está focada em desenvolver soluções com políticas de consumo consciente. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) tem ajudado países nesta direção, notadamente, colaborando com os governos para que estes não gastem esforços e dinheiro investindo em criar modelos novos, já que podem conhecer e aplicar modelos já criados sobre os mesmos problemas. Este Programa destaca a Inglaterra e a Suíça entre os sete que mais avançaram nesta iniciativa. Morin (2000), em seus estudos sobre a ação do indivíduo na sociedade, nos conduz a entender que ele age sobre a sociedade e vice-versa. O ser humano só alcança a condição de indivíduo quando ultrapassa a dimensão biológica, chegando ao conhecimento a complexidade da qual todos nós pertencemos,pois os problemas globais são cada vez mais fundamentais e preocupantes e trazem desafios nos mais variados campos da experiência humana. Em relação ao Brasil, nos últimos anos, vemos inúmeras iniciativas em produção e consumo sustentáveis no âmbito das três dimensões do governo, no setor produtivo e no segmento da sociedade civil. Tais ações, com forte apelo ao consumidor de forma individual ou coletiva, podem ser reconhecidas por conta de criação e implementação de campanhas de consumo consciente, compras públicas sustentáveis, estímulo às cooperativas de catadores, resíduos sólidos e varejo sustentável e muitas outras com aspecto de produção de inovações e no âmbito das tecnologias digitais. 21 Unidade 03 Relações de Trabalho e Sociedade de Consumo Destacamos também o legado importante que a Agenda 21 nos proporcionou, na medida em que ressaltou que mudar os padrões de consumo e produção está no coração do desenvolvimento sustentável. A Agenda 21 é um dos principais resultados da conferência Eco-92 ou Rio- 92, ocorrida no Rio de Janeiro em 1992, resultando em um documento que estabeleceu a importância de cada país a se comprometer a refletir, global e localmente, sobre a forma pela qual governos, empresas, organizações não-governamentais e todos os setores da sociedade poderiam cooperar no estudo de soluções para os problemas socioambientais. Conheça um pouco mais no vídeo “O que é Agenda 21?”. https://www.youtube.com/watch?time_continue=129&v=QMRWxC9WhGY Conclusão Nesta Unidade procuramos estudar como a organização do trabalho evoluiu desde a ideia e configuração de um modelo de divisão social, em que patrões e empregados tinham papéis e funções definidas na esfera produtiva. As relações eram marcadas pela distância entre quem concebe e quem executa o processo industrial, para avançar até um mundo do trabalho contemporâneo, em que se suprime cada vez mais as conquistas e direitos dos trabalhadores ao longo da história. Vemos com isso a inserção do trabalhador, em contextos contemporâneos, focado na questão do que pode consumir e não do que necessita consumir. Nessa lógica, a questão da sustentabilidade se faz presente na medida em que é preciso pensar que o resultado de nosso trabalho deve ser convertido em uma racionalidade para pensar a sustentabilidade social e ambiental. Não é possível trabalhar com o progresso do capital sem pensar na sustentabilidade planetária. Referências BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008. __________ Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. __________ Identidade. Entrevista a Benedetto Vecchi. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. Agenda 21 consiste em plano de ação construído internacionalmente para direcionar em escala global, nacional e local os sistemas que incluem-se no âmbito das Nações Unidas, orientando governos e sociedade civil, em suas relações da ação humana com o meio ambiente. Estudos Socioantropológicos Graduação | UNISUAM 22 DOWBOR. L. Consumo Inteligente. In: ANTAS Jr., R. M. Desafios do Consumo. Petrópolis: Vozes, 2007. DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. FONTENELLE, Isleide A. O trabalho da ilusão: produção, consumo e subjetividade na sociedade contemporânea. Interações, Campo Grande, v. 10, n. 19, p. 63-86, 2005. KREIN, José Dari. O desmonte dos direitos, as novas configurações do trabalho e o esvaziamento da ação coletiva: consequências da reforma trabalhista. Tempo Social. 2018, vol.30, no.1, p.77- 104. ISSN 0103-2070. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0103-20702018000100077&lng=en&nr m=iso>. Acessado em: 27 set. 2018. MORIN, Edgar. Ciência com Consciência. Ed. revista e modificada pelo autor. 8. ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005. WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. Companhia das Letras, São Paulo, 2004.
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