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Insuficiência renal e terapia dialítica

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VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT 
 
INSUFICIÊNCIA RENAL E TERAPIA DIALÍTICA 
Referências: Tratado de Fisiologia Médica- Guyton, 12ed, cap 29e 30 e parte do 31; Site da Sociedade Brasileira de Nefrologia; 
Artigo de revisão “Distúrbios do equilíbrio ácido-básico”- Jefferson Pedro Piva, Sociedade Brasileira de Pediatria, 1999. 
 
1) Insuficiência renal associada aos distúrbios hridroeletrolíticos e ácido-básicos: 
1. IR AGUDA: 
▪ As causas da insuficiência renal aguda podem ser divididas em três 
categorias principais: 
a) Insuficiência renal aguda decorrente da diminuição do aporte sanguíneo para 
os rins; essa condição é conhecida como insuficiência renal aguda pré-renal, por 
refletir o fato de que a anormalidade ocorre como resultado de anormalidade 
originada fora dos rins. Por exemplo, pode ser consequência de insuficiência 
cardíaca com redução do débito cardíaco e pressão sanguínea baixa, ou de 
condições associadas ao menor volume de sangue e pressão sanguínea baixa, como 
nas hemorragias graves. 
b) Importante saber que os rins normalmente recebem abundante aporte 
sanguíneo, em torno de 1.100 mL/min, ou cerca de 20% a 25% do débito cardíaco 
e, como há redução desse fluxo na IR pré-renal, há oligúria ou anúria, causando 
acúmulo de água e de solutos nos líquidos corporais. Desde que o fluxo sanguíneo 
renal não caia abaixo de 20% a 25% do normal, a insuficiência renal aguda 
pode ser usualmente revertida se a causa da isquemia for corrigida antes da 
ocorrência de lesão às células renais; o rim consegue suportar essa redução 
do fluxo sanguíneo antes de ocorrer dano real às células renais porque, 
enquanto o fluxo sanguíneo renal e a FG diminuem, os requisitos para o 
consumo renal de oxigênio também são reduzidos, já que é reduzida a 
quantidade de cloreto de sódio que precisa ser absorvida pelos túbulos (que 
usariam grande parte da energia e do oxigênio consumidos pelo rim 
normal). Quando o fluxo sanguíneo é reduzido abaixo dessa necessidade 
basal que usualmente fica abaixo de 20% a 25% do fluxo sanguíneo renal 
normal, as células renais começam a ficar hipóxicas, e reduções ainda 
maiores do fluxo sanguíneo renal, se prolongadas, causam dano ou até 
mesmo morte das células renais, de modo especial das células do epitélio 
tubular, podendo evoluir para IR intrarrenal. 
c) Insuficiência renal aguda intrarrenal, decorrente de anormalidades 
nos próprios rins, incluindo as que afetam os vasos sanguíneos, os 
glomérulos ou os túbulos. Essa categoria de insuficiência renal aguda pode 
ser dividida em (1) condições que afetam os capilares glomerulares ou 
outros vasos renais menores, (2) condições que lesam o epitélio tubular 
renal e (3) condições que causam lesão do interstício renal, como necrose 
tubular. Esse tipo de classificação se refere ao local primário da lesão, mas 
na medida em que a vasculatura renal e o sistema tubular em termos 
funcionais são interdependentes, o dano dos vasos sanguíneos renais pode 
levar a dano tubular, e o dano tubular primário pode levar a dano dos vasos 
sanguíneos renais. 
d) Insuficiência renal aguda pós-renal, decorrente da obstrução do 
sistema coletor de urina, em qualquer ponto, desde os cálices até a saída da 
bexiga. As causas mais comuns de obstrução do trato urinário fora do rim 
são cálculos renais causados por precipitação de cálcio, de urato ou de cistina. 
Algumas das causas de insuficiência renal aguda pós-renal incluem (1) obstrução 
bilateral dos ureteres ou das pelves renais, causada por grandes cálculos ou coágulos 
de sangue, (2) obstrução da bexiga e (3) obstrução da uretra. 
▪ Fisiologia: Um dos principais efeitos fisiológicos da insuficiência renal aguda é 
a retenção de água, de produtos da degradação metabólica e de eletrólitos no sangue e 
no líquido extracelular, podendo levar à sobrecarga de água e sal, o que por sua vez 
pode levar a edema e hipertensão. Todavia, a retenção excessiva de potássio é com 
frequência ameaça mais séria a pacientes com insuficiência renal aguda, porque o 
aumento da concentração de potássio no plasma (hipercalemia) acima de 8 mEq/L 
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(duas vezes o normal) pode ser fatal. Além 
disso, na medida em que os rins também não 
conseguem excretar íons hidrogênio 
suficientes, os pacientes com insuficiência 
renal aguda desenvolvem acidose metabólica, 
que por si só pode ser letal ou agravar a 
hipercalemia. 
2. IR CRÔNICA: 
▪ Resulta da perda progressiva e 
irreversível de grande número de néfrons 
funcionais. Com muita frequência, não ocorrem 
sintomas clínicos sérios até que o número de néfrons funcionais diminua, pelo menos, a 70% a 75% abaixo do normal. 
Podem haver mudanças adaptativas nos nefrons restantes, mas chegará um momento em que essas mudanças 
adaptativas renais podem levar à lesão adicional dos néfrons restantes, em particular dos glomérulos desses néfrons. 
▪ Em muitos casos, um insulto inicial ao rim leva à deterioração progressiva da função renal e à perda de néfrons, 
até o ponto em que a pessoa precisa ser colocada em tratamento de diálise ou ser submetida a transplante renal para 
sobreviver. Essa condição é referida como doença renal terminal (DRT), que pode estar associadas a diabetes, 
hipertensão, glomerulonefrite, etc. 
• Efeitos da Insuficiência Renal sobre os Líquidos Corporais: Os efeitos da completa insuficiência renal sobre os 
líquidos corporais dependem de (1) da ingestão de água e de alimentos e (2) do grau de comprometimento da função 
renal. Efeitos importantes incluem (1) edema generalizado, decorrente da retenção de água e sal, (2) acidose resultante 
da incapacidade dos rins de livrar o corpo dos produtos ácidos normais, (3) concentração elevada de nitrogênios não 
proteicos — especialmente, ureia, creatinina e ácido úrico — devido à incapacidade do corpo de excretar os produtos da 
degradação metabólica de proteínas e (4) altas concentrações de outras substâncias excretadas pelo rim, incluindo 
fenóis, sulfatos, fosfatos, potássio e bases de guanidina. Essa condição completa é referida como uremia (aumento da 
Ureia e de Outros Nitrogênios não Proteicos) devido à concentração elevada de ureia nos líquidos corporais. A acidose é 
causada porque todos os dias o corpo normalmente produz cerca de 50 a 80 milimoles a mais de ácido metabólico do 
que álcali metabólico e quando os rins não conseguem funcionar, ácido se acumula nos líquidos corporais. Os tampões 
dos líquidos corporais conseguem tamponar normalmente 500 a 1.000 milimoles de ácido, sem aumentos letais da 
concentração de H+ no líquido extracelular, e os compostos de fosfato, nos ossos, conseguem tamponar outros poucos 
milhares de milimoles de H+. Entretanto, quando esse poder de tamponamento se esgota, o pH do sangue cai de forma 
drástica, e o paciente entrará em coma e falecerá se o pH cair abaixo de 6,8. 
 
2) Terapia dialítica 
• “Tratamento da Insuficiência Renal por Transplante ou Diálise com Rim 
Artificial” é necessária quando há perda grave da função renal, tanto aguda quanto 
cronicamente, porque são quadros que ameaçam a vida e requerem remoção de 
resíduos tóxicos e restauração do volume e da composição dos fluidos corporais 
normais. Isto pode ser conseguido pelo transplante de rim ou por diálise 
com rim artificial. 
• O transplante bem-sucedido de doador único de rim pode restaurar a 
função renal a nível que é suficiente para manter, essencialmente, a 
homeostasia normal dos líquidos e eletrólitos corporais, sendo que 
pacientes que receberam transplante de rim geralmente vivem mais e 
têm menos problemas de saúde do que os que são mantidos em diálise. 
Nesses casos, porém, a manutenção da terapia imunossupressora é 
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necessária a quase todos os pacientes para ajudar a prevenir a rejeição aguda e perda do rim transplantado. Os efeitos 
adversos dos fármacos que suprimem o sistema imune incluem aumento do risco de infecções ede alguns tipos de 
câncer. 
• A diálise pode ser indicada em determinados tipos de insuficiência renal aguda, quando se utiliza um rim artificial 
para estabilizar o paciente até que seus rins reassumam suas funções normais, mas se a perda da função renal for 
irreversível, será preciso fazer diálise cronicamente para manter a vida. Como a diálise não consegue manter a 
composição inteiramente normal do líquido corporal e não pode substituir todas as múltiplas funções realizadas pelos 
rins, a saúde dos pacientes mantidos em rins artificiais em geral permanece comprometida de modo significativo. 
• Basicamente, na hemodiálise a máquina recebe o sangue do paciente por um acesso vascular, que pode ser um 
cateter (tubo) ou uma fístula arteriovenosa, e depois é impulsionado por uma bomba até o filtro de diálise (dialisador). A 
fístula arteriovenosa (FAV) pode ser feita com as próprias veias do indivíduo ou com materiais sintéticos, sendo 
preparada por uma pequena cirurgia no braço ou perna. É realizada uma ligação entre uma pequena artéria e uma 
pequena veia, com a intenção de tornar a veia mais grossa e resistente, para que as punções com as agulhas de 
hemodiálise possam ocorrer sem complicações; a cirurgia é feita por um cirurgião vascular e com anestesia local, sendo 
ideal que a fístula seja feita de preferência 2 a 3 meses antes de se começar a fazer hemodiálise. Já o cateter de 
hemodiálise é um tubo colocado em uma veia no pescoço, tórax ou virilha, com anestesia local, sendo uma opção 
geralmente temporária para os pacientes que não têm uma fístula e precisam fazer diálise. 
• O princípio básico do rim artificial é o de passar o sangue por diminutos canais sanguíneos limitados por delgada 
membrana. No outro lado da membrana passa o líquido dialisador, para o qual as 
substâncias indesejáveis no sangue passam por difusão. A Figura 31-8 mostra os 
componentes de tipo de rim artificial, no qual o sangue flui continuamente entre 
duas membranas finas de celofane; por fora da membrana fica o líquido dialisador. 
O celofane é suficientemente poroso para permitir que os constituintes do plasma, 
exceto as proteínas plasmáticas, se difundam em ambas as direções — do plasma 
para o líquido dialisador ou do líquido dialisador de volta ao plasma. Se a 
concentração da substância for maior no plasma do que no líquido dialisador, 
ocorrerá transferência efetiva da substância do plasma para o líquido dialisador. A 
intensidade da movimentação do soluto pela membrana dialisadora depende (1) do 
gradiente de concentração do soluto entre as duas soluções, (2) da permeabilidade 
da membrana ao soluto, (3) da área de superfície da membrana e (4) do período de 
tempo em que sangue e líquido permanecem em contato com a membrana. Assim, 
a intensidade máxima da transferência de soluto ocorre, inicialmente, quando o 
gradiente de concentração é maior (quando começa a diálise) e diminui à medida 
que o gradiente de concentração se dissipa. Em sistema de fluxo, como é o caso da 
“hemodiálise”, no qual o sangue e o líquido dialisador fluem pelo rim artificial, a 
dissipação do gradiente de concentração pode ser reduzida, e a difusão do soluto que atravessa a membrana pode ser 
otimizada aumentando-se a vazão do sangue, do líquido dialisador ou de ambos. Na operação normal do rim artificial, o 
sangue flui contínua ou intermitentemente e volta à veia. 
• A quantidade total de sangue no rim artificial, a qualquer momento, é em geral inferior a 500 mililitros, a intensidade 
do fluxo pode ser de várias centenas de mililitros por minuto, e a área total da superfície de difusão fica entre 0,6 e 2,5 
metros quadrados. Para evitar a coagulação do sangue no rim artificial, injeta-se pequena quantidade de heparina no 
sangue na sua entrada no rim artificial. Além da difusão dos solutos, pode ser produzida a transferência da massa de 
solutos e de água pela aplicação de pressão hidrostática para forçar o líquido e os solutos através das membranas do 
dialisador; essa filtração é denominada fluxo de massa (bulk flow). 
• O Líquido Dialisador possui concentrações de íons e de outras substâncias diferentes das concentrações no plasma 
normal ou no plasma urêmico, o que pode ser ajustado aos níveis necessários para causar o movimento apropriado de 
água e solutos através da membrana durante a diálise. Note também que não existe fosfato, ureia, urato, sulfato ou 
creatinina no líquido dialisador; entretanto, essas substâncias estão presentes em concentrações elevadas no sangue 
urêmico. Assim, quando o paciente urêmico é dialisado, essas substâncias são perdidas em grande quantidade para o 
líquido dialisador. A eficácia do rim artificial pode ser expressa em termos da quantidade de plasma que é depurada de 
diferentes substâncias a cada minuto; a maioria dos rins artificiais consegue eliminar ureia do plasma naintensidade de 
100 a 225 mL/min, o que mostra que, pelo menos em termos de excreção de ureia, o rim artificial pode funcionar tão 
rapidamente quanto dois rins normais juntos, cuja depuração de ureia é de apenas 70 mL/min. Contudo, o rim artificial é 
usado por apenas 4 a 6 horas por dia, três vezes por semana. Portanto, a depuração total do plasma é ainda 
consideravelmente limitada, quando o rim artificial substitui os rins normais. Além disso, é importante ter em mente que 
o rim artificial não pode substituir algumas das outras funções dos rins, como a secreção de eritropoetina, necessária 
para a produção de hemácias. 
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• A hemodiálise está indicada para pacientes com insuficiência renal aguda ou crônica graves. A indicação de iniciar 
esse tratamento é feita pelo seu médico especialista em doenças dos rins (o nefrologista), que avalia o seu organismo 
através de: 
a) consulta médica, investigando os seus sintomas e examinando o seu corpo; 
b) dosagem de ureia e creatinina no sangue; 
c) dosagem de potássio no sangue; 
d) dosagem de ácidos no sangue; 
e) quantidade de urina produzida durante um dia e uma noite (urina de 24 horas); 
f) cálculo da porcentagem de funcionamento dos rins (clearance de creatinina e uréia); 
g) avaliação de anemia (hemograma, dosagem de ferro, saturação de ferro e ferritina); 
h) presença de doença óssea.