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lllTURAS 
~@~~~== 
"A Escola e a Cornpreensao da Realidade - Maria Teresa 
Nidelcoff 
.. A Questao Politica da Educaçao Popular - Carlos R. Brandffo 
.. Corno Lidar corn as Crianças - G. Della Piana 
" Cuidado! Escola - Paulo Freire e outras 
.. Descarninhos da Educaçao P6s-68 - Cad. Debate 8 - Varias 
autores 
" Desregulagens - Educaçao, planejarnento e tecnologia corno 
ferrarnenta social - Laymert G. dos Santos 
" Educaçao ou Desconversa? - Alrnanaque 11 - Varias autores 
" Escola e Trabalho - Claudio Salm 
" Fundarnentos da Escola do Trabalho - Pistrak 
" ldeologia e Curriculo - Michel W. Apple 
'" Liberdade para as Crianças - Allen Graubard 
" Os Anos Magicos - A prirneira infância - Selma H. Fraiberg 
" Uma Escola para o Povo - Maria Teresa Nide/coff 
" Vivendo e Aprendendo - Paulo Freire e outras 
Coleçao Primeiros Passos 
" 0 que é Método Paulo Freire - Carlos R. Brandiio 
Coieçao Primeiros Vôos 
" Pedagogia: Reproduçao ou Transforrnaçao - Laura de O. Lima 
Carlos Rodrigues Brandâo 
OQUEÉ 
EDUCAÇÂO 
1~ ediçào 14"1 
7~ ediçao 
40 anos de bons livres 
Cop ·. · 
'Yn,gnt © Carlos Ro . 
dngues Brandao 
Capa: 
123 (antigo 27) 
Artistas Graficos 
Caricaturas. 
Emûio Damiani 
Revtsao: 
1 osé B. Andrade 
Lucia S. Nicolai 
/[fJ 
editora bras T 
01223 - i 1ense s.a. 
sao n.q, ,,,.... r. Q:ner~/ iardim, 160 
i 
f l 
1 
l 
I 
1 
{ 
1 
ÎNDICE 
· / - Educaçâ'o? Educaçoes: aprender corn o 
lndio.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 
2 - Ouando a escola é a aldeia. . . . . . . . . . . . . . 13 
> - Entâ'o, surge a escola. . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 
1
1 - Pedagogos, mestres-escola e sofistas. . . . . . . 36 
5 - A educaçao que Roma fez, e o que ~la 
ensina ............................ . 
" - Educaçâ'o: isto e aquilo, e o contrario 
de tu do ........................... . 
1 - Pessoas versus sociedade: um dilema que 
ocu lta outras ....................... . 
<b_ Sociedade contra Estado: classe e educaçâ'o 
'I - A esperança na educaçao .............. . 
1.) - lndicaçoes para leitura ................ . 
•• 
- ... 11111 -
48 
54 
et 
73\ 
98 i 
111 
r 
EDUCAÇÂO? EDUCAÇÔES: 
APRENDER COM 0 ÎNDIO 
Pergunto coisas ao buriti; e o que ele rfsponde é: 
a coragem minha. Buriti quer todo o azul, e nâo se 
aparta de sua agua - carece de espelho. Mestre nâo 
é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. 
Joâo Guimarâes Rosa/Grande Sertao: Veredas 
Ninguém escapa da educaçâ'o. Em casa, na rua, 
na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos 
todos n6s envolvemos pedaços da vida corn ela: 
para aprender, para enstnar, para aprender-e-
-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para 
conviver, todos os dias misturamos a vida corn 
a educaçâ'o. Corn uma ou corn varias: educaçâ'o? 
Educaçoes. E ja que pelo menos por isso sernpre 
achamos que temos alguma coisa a dizer sobre 
a educaçâ'o que nos invade a vida, por que nâ'o 
8 
r 
Carlos Rodrigues Brandiio 
começar a pensar sobre ela corn o que uns lndios 
uma vez escreveram? 
Ha muitos anos nos Estados Unidos, Virginia 
e Maryland assinaram um tratado de paz corn 
os f ndios das Seis Naçoes. Ora, como as promes-
sas e os slmbolos da educaçâ'o sempre foram 
muito adequados a momentos solenes como 
aquele, logo depois os seus governantes mandaram 
cartas aos (ndios para que enviassem alguns de 
seus jovens às escolas dos brancos. Os chefes 
responderam agradecendo e recusando. A carta 
acabou conhecida porque alguns anos mais tarde 
Benjamin Franklin adotou o costume de divulga-la 
aqui e ali. Eis o trecho que nos interessa: 
" .. . N6s estamos convencidos, portanto, que 
os senhores desejam o bem para n6s e agrade-
cemos de todo o coraçao. 
Mas aqueles que siio sabios reconhecem que dife-
rentes naçoes têm concepçoes diferentes das coisas 
e, sendo assim, os senhores n§o ficar§o ofendidos 
ao saber que a vossa idéia de educaçao n§o é 
a mesma que a nossa. 
.. . Muitos dos nossos bravos guerreiros forarn 
formados nas esco/as do Norte e aprenderam toda 
a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para 
n6s, eles eram maus corredores, ignorantes da 
vida da floresta e incapazes de suportarem o trio 
e a tome. Niio sabiam coma caçar o veado, matar 
o inimigo e construir uma cabana, e falavam a 
O que é Educaçâo 
nossa l/ngua muito mal. Eles eram, portar:to, 
tata/mente inuteis. Nao serviam coma guerre1ros, 
coma caçadores ou coma conselheiros. 
Ficamos extremamente agradecidos pela vossa 
oferta e, embora niio possamos aceita-la, para 
mostrar a nossa gratidiio oferecemos aos nobres 
senhores de Virginia que nos enviem alguns dos 
seus jovens, que lhes ensinaremos tudo o que 
sabemos e faremos, de/es, homens." 
De tudo o que se discute hoje sobre a educaçâ'o, 
algumas das questoes entre ~s ~ais i~po~antes 
estâ'o escritas nesta carta de 1 nd1os. Nao ha uma 
forma (mica nem um (mico modela de educaçâ'o; 
a escola nâ'o é o unico lugar onde ela acontece 
e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar nâ'o 
é a sua unica pratica e o professor profissional 
nâ'o é o seu uriico praticante. 
Em mundos diversos a educaçâ'o existe dife-
rente: em pequenas sociedades tribais d:i povos 
cacadores agricultores ou pastores nomades; 
e~ sociedades camponesas, em pa lses desenvol-
vidos e industrializados; em mundos sociais sem 
classes, de classes, corn este ou aquele tipo ?e 
conflito entre as suas classes; em tipos de soc1e-
dades e culturas sem Estado, corn um Estado 
em formaçâ'o ou corn ele consolidado entre e 
sobre as pessoas. . . . 
Existe a educaçâ'o de cada categoria de suie1tos 
de um povo; ela existe em cada povo, ou entre 
9 
10 
/ 
Carlos Rodrigues Brandâo 
povos que se encontram. Existe entre povos 
que submetem e dominam outras povos, usando 
a educaçâ'o como um recurso a mais de sua domi-
nância. Dac famllia à comunidade, a educacâ'o 
existe difusa em todos os mundos sociais, en.tre 
as incontâveis prâticas dos mistérios do aprender· 
primeiro, sem classes de alunas, sem livros ~ 
sem professores especialistas; mais adiante corn 
escolas, salas, professores e métodos pedag6gicos. 
A educaçâ'o pode existir livre e, entre todos, 
pode ser uma das maneiras que as pessoas criam 
para tornar comum, como saber, como idéia, 
como crença, aquilo que é comunitârio como 
be~'. c?mo trabalho ou como vida. Ela pode 
ex1st1r 1mposta por um sistema centralizado de 
poder, que usa o saber e o controle sobre o saber 
como armas que reforçam a desigualdade entre 
os homens, na divisâ'o dos bens, do trabalho 
dos direitos e dos sf mbolos. ' 
A educaçâ'o é, como outras, uma fracâ'o do 
modo de vida dos grupos sociais que a· criam 
e recriam, entre tantas outras invençoes de sua 
cultura, em sua sociedade. Formas de educaçâ'o 
que produzem e praticam, para que elas reprodu-
zam, entre todos os que ensinam-e-aprendem, 
o saber que atravessa as palavras da tribo, os 
c6digos sociais de conduta, as regras do trabalho, 
os segredos da arte ou da religiâ'o, do artesanato 
o~ da tecnologia que qualquer povo precisa para 
re1nventar, todos os dias, a vida do grupo e a 
0 que é Educaçâo 
/ 
de cada um de seus sujeitos, através de trocas 
sem fim corn a natureza e entre os homens, trocas 
que existem dentro do mundo social onde a 
pr6pria educaçâ'o habita, e desde onde ajuda a 
explicar - às vezes a ocultar, às vezes a inculcar -
de geraçâ'o em geraçâ'o, a necessidade da exis-
tência de sua ordem. 
Por isso mesmo - e os lndios sabiam - a edu-
caçâ'o do colonizador, que contém o saber de 
seu modo de vida e ajuda a conf irmar a aparente 
legalidade de seus atos de domlnio, na verdade 
nâ'o serve para ser a educaçâ'o do colonizado. 
Nâ'o serve e existe contra uma educaçâ'o que ele, 
nâ'o obstante dominado, tambérn possui coma 
um dos seus recursos, em seu mundo, dentro de 
sua cultura. 
Assim, quando sâ'o necessârios guerreiros ou 
burocratas, a educaçâ'o é um dos n;ieios de que 
os homens lançam mâ'o para criar guerreiros 
ou burocratas. Ela ajuda a pensar tipos de homens. 
Mais do que isso, ela ajudaa cria-los, através 
de passar de uns para os outros o saber que os 
constitui e legitima. Mais ainda, a educaçâ'o parti-
cipa do processo de produçâ'o de crenças e idéias, 
de qualificaçoes e especialidades que envolvem 
as trocas de slmbolos, bens e poderes que, em 
conjunto, constroem tipos de sociedades. E esta 
é a sua força. 
No entanto, pensando às vezes que age por 
si proprio, livre e em nome de todos, o educador 
11 
12 Carlos Rodrigues Brandiio 
imagina que serve ao saber e a quem ensina mas, 
na verdade, ele pode estar servindo a quem o 
constituiu professor, a fim de usa-Io, e ao seu 
trabalho, para os usos escusos que ocultam também 
na educaçâ'o - nas suas agências, suas praticas 
e nas idéias que ela professa - interesses pol 1-
ticos impostos sobre ela e, através de seu exerc(cio, 
à sociedade que habita. E esta é a sua fraqueza. 
Aqui e ali sera preciso voltar a estas idéias, 
e elas podem ser como que um roteiro daqui 
para a trente. A educaçâ'o existe no imaginario 
das pessoas e na ideologia dos grupos sociais e, 
ali, sempre se espera, de dentro, ou sempre se 
diz para fora, que a sua missâ'o é transformar 
sujeitos e mundos em alguma coisa melhor, de 
acordo corn as imagens que se tem de uns e outros: 
" ... e deles faremos homens". Mas, na pratica, 
a mesma educaçâ'o que ensina pode deseducar, 
e pode correr o risco de fazer o contrario do que 
pensa que faz, ou do que inventa que pode fazer: 
" ... eles eram, portanto, totalmente inûteis". 
... ·- .. 
QUANDO A ESCOLA É A ALDEIA 
A educaçâ'o existe onde nâ'o ha a escola e por 
toda parte podem haver redes e estruturas sociais 
de transferência de saber de uma geraçâ'o a outra, 
onde ainda nâ'o foi sequer criada a sombra de 
algum modelo de ensino formai e centralizado. 
Porque a educaçâ'o aprende corn o homem a 
continuar o trabalho da vida. A vida que trans-
porta de uma espécie para a outra, dentro da 
histéria da natureza, e de uma geraçâ'o a outra de 
viventes, dentro da historia da espécie, os princf-
pios através dos quais a prépria vida aprende 
e ensina a sobreviver e a evoluir em cada tipo 
de ser. 
Os bichos do mundo aprendem de dentro para 
fora corn as armas naturais do instinto. Mas a 
isto eles acrescentam maneiras de aprender de 
fora para dentro, convivendo corn a espécie, 
14 Carlos Rodrigues Brandâo 0 que é Educaçâo 
observando a conduta de outras iguais de seu 
mundo e experimentando repetir muitas vezes 
essas condutas da espécie, por conta pr6pria. 
Entre os que nos rodeiam de perto ou de longe, 
nao sâ'o raros os bichas cujos pais da proie criam 
e recriam situaçoes, para que o treino dos filhotes. 
faça e repita os atos da aprendizagem que garante 
a vida, coma a mâ'e que um dia expulsa corn 
amor o filho do ninho, para que ele aprenda 
a arte e a coragem do primeiro vôo. 
0 homem que transforma, corn o trabalho 
e a consciência, partes da natureza em invençoes 
de sua cultura, aprendeu corn o tempo a trans-
formar partes das tracas feitas no interior desta 
cultura em situaçoes sociais de aprender-ensinar-
-e-aprender: em educaçâ'o. Na espécie humana 
a educaçâ'o nâ'o continua apenas o trabalho da 
vida. Ela se instala dentro de um dom(nio propria-
mente humano de tracas: de s(mbolos, de inten-
çoes, de padroes de cultura e de relaçoes de poder. 
Mas, a seu modo, ela continua no homem o traba· 
!ho da natureza de fazê-lo evoluir, de toma-Io 
mais humano. E esta a idéia que Werner Jaeger 
tem na cabeça quando, num estudo sobre a edu-
caçâ'o do homem grego, procura explicar o que 
ela é, afinal: 
"A natureza do homem, na sua dupla estrutura 
corp6rea e espiritua/, cria condiçoes especiais 
para a manutençao e tran~missao da sua forma 
c: 
0 .... 
'ë z 
<i 
....; 
Na aldeia a/ricana o "velho" ensina às crianças o saber 
da tribo. 
particular e exige organizaçêies f/sicas e espirituais, 
ao conjunto das quais damas o nome de educaçao. 
Na educaçao, coma o homem a pratica, atua 
a mesma força vital, criadora e plastica, que espon-
taneamente impele todas as espécies vivas à conser-
vaç§o e à propagaç§o de seu tipo. E ne/a, porém, 
que essa força atinge o seu mais alto grau de inten-
sidade, através do esforço consciente do conheci-
mento e da vontade, dirigida para a consecuç§o 
de um fim." 
15 
16 Carlos Rodrigues Brandiïo 
Quando um povo alcança um estagio complexo 
de organizaçao da sua sociedade e de sua cultura; 
quando ele enfrenta, por exemplo, a questao 
da divisao social do trabalho e, portanto, do 
poder, é que ele começa a viver e a pensar como 
problema as formas e os processos de transmissao 
do saber. É a partir de entao que a questao da 
educaçao emerge à consciência e o trabalho de 
educar acrescenta à sociedade, passo a passo, os 
espaças, sistemas, tempos, regras de pratica, 
tipos de profissionais e categorias de educandos 
envolvidos nos exerc(cios de maneiras cada vez 
menos corriqueiras e menos comunitarias do 
ato, afinal tao simples, de ensinar-e-aprender. 
No entanto, muito antes que isso aconteça, 
em qualquer lugar e a qualquer tempo - entre 
dez Indics remanescentes de alguma tribo do 
Brasil Central, no centro da cidade de Sao Paulo -
a educaçao existe sob tantas formas e é praticada 
em situaçoes 'tao diferentes, que algumas vezes 
parece ser invislvel, a nao ser nos lugares onde 
pendura alguma placa na porta corn o seu nome. 
Quando os antrop61ogos do começo do século 
safram pelo mundo pesquisando "culturas primi-
tivas" de sociedades tribais das Américas, da Âsia, 
da Âfrica e da Oceania, eles aprenderam a descre-
ver corn rigor praticamente todos os recantos 
da vida destas sociedades e culturas. No entanto, 
qua se nenhum del es usa a palavra educaçfio, 
embora quase todos, de uma forma ou de outra, 
, 
0 que é Educaçiïo 
descrevam relaçoes cotidianas ou cerimônias 
rituais em que crianças aprendem e jovens sao 
solenemente admitidos no mundo dos adultos. 
De vez em quando, aparece, perdido num 
mar de outras conceitos, o de educaçiio, como 
quando Radcliffe-Brown - um antrop61ogo ingl~s 
que participa da criaçâ'o da moderna Antropolog1a 
Social - lembra que, entre os andamaneses, um 
grupo tribal de ilhéus entre Burma e Sumatra, 
para se ajustar a criança à sua comunidade "é 
preciso que ela seja educada ". Parte deste pro-
. cesse consiste em a criança e o adolescente apren-
derem aos poucos a caçar, a fabricar o arco e 
flecha e assim por diante. Outra parte envolve 
a aquisiçao de "sentimentos e disposiçoes emocio-
nais" que regulam a conduta dos membros da 
tribo e constituem o corpo de suas regras sociais 
de moralidade. , 
Quando os antrop61ogos pouco falam em 
educaçiio, eles pouco querem falar de processos 
formalizados de ensino. Porque, onde os andama-
neses, os maori, os apaches ou os xavantes pra-
ticam, e os antrop61ogos identificam processos 
sociais de aprendizagem, nao existe ainda nenhuma 
situaçao propriamente escolar de transferência 
do saber tribal que vai do fabrico do arco e flecha 
à recitaçao das rezas sagradas aos deuses da tribo. 
Ali, a sabedoria acumulada do grupo social nâ'o 
"da aulas" e os alunos, que sao todos os que 
aprendem, "nâ'o aprendem na escola". Tudo 
17 
, 
1 l ; 
18 
Carlos Rodrlgues Brandiïo 
o que se sabe aos poucos se adquire por viver 
muitas e diferentes situaçoes de trocas entre 
pessoas, corn o corpo, corn a consciência, corn 
o corpo-e-a-consciência. As pessoas convivem 
umas corn as outras e o saber flui, pelos atos 
de quem sabe-e-faz, para quem nao-sabe-e-aprende. 
Mesmo quando · os adultos encorajam e guiam 
os momentos e situaçoes de aprender de crianças 
e adolescentes, sao raros os tempos especialmente 
reservados apenas para o ato de ensinar. 
Nas aldeias dos grupos tribais mais simples, 
todas as relaçoes entre a criança e a natureza, guia-
das de mais longe ou mais perto pela presença de 
adu ltos conhecedores, sao situaçoes de apren-
dizagem. A criança vê, entende, imita e aprende 
corn a sabedoria que · existe no proprio gesto 
de fazer a coisa. Sao também situaçoesde aprendi-
zagem aquelas em que as pessoas do grupo trocam 
~ens materiais entre si ou trocam serviços e signi-
f1cados: na turma de caçada, no barco de pesca, 
no canto da cqzinha da palhoça, na lavoura fami-
liar ou comunitaria de mandioca, nos grupos de 
brincadeiras de meninos e meninas, nas cerimônias 
religiosas. 
Emile Durkheim, um dos principais soci61ogos 
da educaçâ'o, explica isto da seguinte maneira: 
"Sob regime tribal, a caracterlstica essencial da 
educaçao reside no fato de ser difusa e adminis-
trada indistintamente par todos os elementos 
0 que é Educaçiïo 
do cla. Nao ha mestres determinados, nem inspe-
tores especiais para a formaçao da juventude: 
esses papéis s§o desempenhados par todos os 
anciaos e pela conjunto das geraçoes anteriores." 
As meninas aprendem corn as cornpanheiras 
de idade, corn as maes, as av6s, as irrnas mais 
velhas, as velhas sabias da tribo, corn esta ou · 
aquela especialista ern algurn tipo de magia ou 
artesanato. Os rneninos aprendern entre os jogos 
e brincadeiras de seus grupos de idade, aprendern 
corn os pais, os irrnaos-da-rnâ'e, os av6s, os guer-
reiros, corn algurn xarnâ' (rnago, feiticeiro), corn 
os velhos ern volta das fogueiras. Todos os agentes 
desta educaçâ'o de aldeia criarn de parte a parte 
as situaçôes que, direta ou indiretarnente, forçarn 
iniciativas de aprendizagern e treinarnento. Elas 
existern rnisturadas corn a vida e.rn rnornentos 
de trabalho, de lazer, de carnaradagern ou de 
arnor. Ouase sernpre nao sâ'o irnpostas e nao é 
raro que sejarn os aprendizes os que t:Drnarn a seu 
cargo procurar pessoas e situaçoes de troca que 
lhes possarn trazer algurn aprendizado. Assirn, 
entre os Wogeo, da Nova Guiné, de acordo corn 
o depoirnento de urn antrop61ogo: 
"Onde é necessério aprender habilidades especiais 
as criancas estao em regra geral, ansiosas par 
saber a· que os ;eus pais conhecem. 0 orgulho 
do trabalhador e o prestlgio do bom artesao 
19 
20 Carlos Rodrigues Brandiïo 
dominam sua vida e e/as necessitam de muito 
pouco est/mu Io para procura-los par si mesmas." 
0 saber da comunidade, aquilo que todos conhe-
cem de algum modo; o saber proprio dos homens 
e das mulheres, de crianças, adolescentes, jovens, 
adultos e velhos; o saber de guerreiros e esposas; 
o saber que faz o artesao, o sacerdote, o feiticeiro, 
o navegador e outras tantos especialistas, envolve 
portanto situaçoes pedag6gicas interpessoais, fami-
liares e comunitarias, onde ainda nao surgiram 
técnicas pedag6gicas escolares, acompanhadas 
de seus profissionais de aplicaçao exclusiva. Os 
que sabem: fazem, ensinam, vigiam, incentivam, 
demonstram, corrigem, punem e premiam. Os que 
nao sabem espiam, na vida que ha no cotidiano 
o saber que ali existe, vêem fazer e imitam sa~ 
instru i'dos corn o exemplo, incentivados, trein~dos, 
corrigidos, punidos, premiados e, enfim, aos 
poucos aceitos entre os que sabem fazer e ensinar, 
corn o proprio exercfcio vivo do fazer. Esparra-
madas pelos cantos do cotidiano, todas as situaçoes 
entre pessoas, e entre pessoas e a natureza -
situaçoes sempre mediadas pelas regras, slmbolos 
e valores da cultura do grupo - têm, em menor 
ou maior escala a sua dimensâ"o pedagôgica. Ali, 
todos os que convivem aprendem, aprendem, 
da sabedoria do grupo social e da força da norma 
dos costumes da tribo, o saber que torna todos 
e cada um pessoalmente aptos e socialmente 
0 que é Educaçiïo 
21 
reconhecidos e legitimados para a convivência 
social, o trabalho, as artes da guerra e os oflcios 
do amor. 
"Os meninos observam os homens quando fazem 
arcos e f!echas; o homem os chama para perto 
de si e eles se vêem obrigados a observa-Io. As 
mulheres, par outra fado, levam as meninas para 
fora de casa, ensinando-as a conhecer as plantas 
boas para confeccionar cestos e a argila que serve 
para fazer potes. E, em casa, as mulheres tecem 
os cestos, costuram os mocassins e curtem a 
pele de cabrito diante das meninas, dizendo-!hes, 
enquanto estao trabalhando, que observem cuida-
dosamente, para que, quando forem grandes, 
ninguém as passa chamar de preguiçosas e igno-
rantes. Ensinam-nas a cozinhar e aconselham-
-nas sobre a busca de bagas e outras frutos, assim 
coma sobre a colheita de alimentas." ' 
Em todos os grupos humanos mais simples, 
os diversos tipos de treinamento através das tracas 
sociais, que socializam crianças e adolescentes, 
incluem, entre outras, estas situaçoes pedagégicas: 
e o treinamento direto de habilidades corporais, 
par meio da pratica direta dos atos que condu-
zem o corpo ao habita; 
• a estimulaçao dirigida, para que o aprendiz 
faça e repita, até o acerto, os atos de saber 
. '\ 
22 
' 
Carlos Rodrigues Brandiio 0 que é Educaçiio 
e habilidade que ignora; 
• a observaçao livre e dirigida, do educandfJ, 
dos procedimentos daque/es que sabem; 
• a correçao interpessoal, familiar ou comuni-
taria, das praticas ou das condutas erradas, 
por meio do castigo, do rid(cu/o ou da admoes-
taçao · 
• a assistência convocada para cerimônias rituais 
e, aos poucos (ou depois de uma iniciaçao), 
o direito à participaçao nestas cerimônias 
(solenidades re/igiosas, danças, rituais de pas-
sagem); 
• a incu/caçao dirigida em situaçoes de quase-ensi-
no, com o uso da pa/avra e turmas de ouvintes, 
dos va/ores marais, dos mitas hist6rico-religiosos 
da tribo, das regras dos c6digos de conduta. 
Assim, tudo o que é importante para a comuni-
dade, e existe corne algum tipo de saber, existe 
também corne algum modo de ensinar. Mesme 
onde ainda nâ'o criaram a escola, ou nos intervalos 
dos lugares onde ela existe, cada tipo de grupo 
humano cria e desenvolve situaçoes, recursos 
e métodos empregados para ensinar às crianças, 
aos adolescentes, e também aos jovens e mesmo 
aos adultes, o saber, a crença e os gestes que os 
tornarâ'o um dia o modelo de homem ou de mulher 
que o imaginario de cada sociedade - ou mesmo 
de cada grupo mais especlfico, dentro dela -
idealiza, projeta e procura realizar. De duas tribos 
' 
vizinhas de pastores do deserto, é posslvel que 
se dê franca importância a um artiflcio pedag6gico, 
em uma delas, corne o castigo corporal, por exem-
ple, ou a atemorizaçâ'o de crianças, e ele seja 
simplesmente rejeitado na outra. Mas em uma e 
na outra, corne em todas do mundo, nunca as 
pessoas crescem a esmo e aprendem ao acaso. 
O que vimos acontecer até aqui, formas vivas 
e comunitarias de ensinar-e-aprender, tem si do 
chamade corn varies nomes. Ao processo global 
que tudo envolve, é comum que se dê o nome 
de socializacao. Através dela, ao longe da vida, 
cada um d~ n6s passa por etapas sucessivas de 
inculcaçao de tipos de categorias gerais, parciais 
ou especializadas de saber-e-habilidade. Elas fazem, 
em conjunto, o contorno da identidade, da ideo-
logia e do modo de vida de um grupo social. 
Elas fazem, também, do ponte de vis.ta de cada 
um de n6s, aquilo que aos pouces somos, sabemos, 
fazemos e amamos. A socializaçâ'o realiza em sua 
esfera as necessidades e projetas da sociedade, 
e realiza, em cada um de seus membres, grande 
parte daquilo que eles precisam para serem reco-
nhecidos corne "seus" e para existirem dentro dela. 
Ora no interior de todos os contextes sociais 
coleti:os de formaçao do adulte, o processo 
de aquisiçâ'o pessoal de saber-crença-e-habito 
de uma cultura, que funciona sobre educandos 
corne uma situaçâ'o pedag6gica total, pode ser 
chamade (corn algum susto) de endoculturaçao. 
23 
24 Carlos Rodrigues Brandiïo 
Dentro d~ sua c~ltura, em sua sociedade, aprender 
d~ _ ma?,e1ra. mais ou menas intencional (alguns 
dirao: mais ou menas consciente") através do 
envolvimento direto do corpo, da ~ente e da 
afetividade, entre as incontaveis situaçôes de 
relaçâ'o corn a natureza e de tracas entre os ho-
mens, é parte do processo pessoal de endocul-
turaçâ'o, e é também parte da aventura humana 
do "tornar-se pessoa". 
Vista em seu vôo mais livre, a educaçâ'o é uma 
fraçào da experiência endoculturativa. Ela apa-
~ece s_:mpreque. ha relaçôes entre pessoas e 
intençoes de ensmar-e-aprender. lntenç5es, por 
exemplo, d~ aos poucos "modelar" a criança, 
para conduz1-la a ser o "modela" social de adoles-
cente e, ao adolescente, para toma-Io mais adiante 
um jovem e, depois, um adulto. Todos os povos 
sempre traduzem de alguma maneira esta !enta 
transformaçâ'o que a aquisiçâ'o do saber deve 
operar. Ajudar a crescer, orientar a maturaçâ'o, 
transformar em, tornar capaz, trabalhar sobre 
domar, polir, criar, coma um suJ·eito social a obra' 
d 
, ' 
e que o homem natural é a matéria-prima. 
Nâ'o é nada raro que tanto na cabeça de um 
lndio quanta na de um de nossos educadores 
oci~enta.is, a r:nelhor imagem de coma a educaçâ'o 
se 1deal1za se1a a do oleiro que toma o barra 
e faz o pote. 0 trabalho cuidadoso do artesâ'o 
q.ue age c?m tempo e sabedoria sobre a argila 
v1va que e o educando. A argila que resiste às 
J 
0 que é Educaçao 
mâ'os do oleiro, mas que se deixa conduzir por 
elas a se transformar na obra feita: o adulto edu-
cado. Ouando o educador pensa a educaçâ'o, 
ele acredita que, entre homens, ela é o que da 
a forma e o polimento. Mas ao fazer isso na pratica, 
tanto pode ser a mào do artista que guia e ajuda 
o barro a que se transforme, quanta a forma que 
iguala e deforma. 
E bom separar agora algumas palavras usactas 
até aqui e que serâ'o ainda trabalhadas mais adiante. 
Tudo o que existe transformado da natureza pelo 
trabalho do homem e significado pela sua cons-
ciência é u ma parte de sua cultura: o pote de barra, 
as palavras da tribo, a tecnologia da agricultura, 
da caça ou da pesca, o estilo dos gestos do corpo 
nos atos do amer, o sistema de crenças religiosas, 
as est6rias da historia que explica quem aquela 
gente é e de onde veio, as técnicas e situaçëes 
de transmissâ'o do saber. Tudo o que existe dispo-
nlvel e criado em uma cultura como conhecimento 
que se adquire através da experiência pessoal 
com o mundo ou com o outra; tudo o que se 
aprende de um modo ou de outro faz parte do 
processo de endocu/turaçiio, através do quai 
u m grupo social aos pouces socia/iza, em sua 
cultura, os seus membres, como tipos de sujeitos 
sociais. 
Ora, a educaçiio é o territ6rio mais motivado 
deste mapa. Ela existe quando a mâ'e corrige o 
filho para que ele fale direito a 1 lngua do grupo, 
25 
. -., 
26 Carlos Rodrigu.es Brandiio 
ou quando fala à filha sobre as normas soc1a1s 
do modo de "ser mulher" ali. Existe também 
quando o pai ensina ao filho a polir a ponta da 
flecha, ou quando os guerreiros saem corn os 
jovens para ensina-los a caçi:ir. A educaçâ'o aparece 
sempre que surgem formas sociais de conducâ'o 
e controle da aventura de ensinar-e-aprender. 
0 ensino formai é o momento em que a educaçâ'o 
se sujeita à pedagogia (a teoria da educaçâ'o), 
cria situaçoes pr6prias para o seu exerclcio, produz 
os seus métodos, estabelece suas regras e tempos, 
e constitui executores especializados. E quando 
aparecem a escola, o aluno e o professor de quem 
começo a falar daqui para frente. 
•• •••• 
r 
ENTÂO, SURGE A ESCOLA 
Mesmo em algumas sociedades pnm1t1vas, 
quando o trabalho que porduz os bens e quando o 
poder que reproduz a ordem sâ'o divididos e 
começam a gerar hierarquias sociais, também 
o saber comum da tribo se divide, começa a se 
distribuir desigualmente e pode passar a servir 
ao uso pol ltico de reforçar a diferença, no lugar 
de um sa ber anterior, que afirmava a comunidade. 
Entâ'o é o começo de quando a sociedade 
separa e aos poucos opoe: o que faz, o que se 
sabe corn o que se faz e o que se faz corn o que 
se sabe. Entâ'o é quando, entre outras categorias 
de especialidades sociais, aparecem as de saber 
e de ensinar a saber. Este é o começo do momento 
em que a educaçâ'o vira o ensino, que inventa 
a pedagogia, reduz a aldeia à escola e transforma 
"todos" no educador . 
' , 
28 
r 
Carlos Rodrigues Brandiio 0 que e Educaçiïo 
0 que é que isto significa? Significa que, para 
além das fronteiras do saber comum de tàdas as 
pessoas do grupo e transmitido entre todos livre 
e pessoalmente, para além do saber dividido 
dentra do grupo entre categorias naturais de 
pessoas (homens e mulheres, crianças, jovens, 
adultos e velhos) e transferido de uns aos outras 
segundo suas linhas de sexo ou dè idade, por 
exemplo, emergem tipos e graus de saber que 
correspondem desigualmente a diferentes cate-
gorias de sujeitos (o rei, o sacerdote, o guerreira, 
o professor, o lavrador), de acordo corn a sua 
posiçâ'o social no sistema politico de relaçëes 
do grupo. Onde todos aprendem para serem 
"gente", "adulto", "um dos nossos" e, meio a 
meio, alguns aprendem para serem "homem" 
e outras para serem "mulher", outras ainda come-
çam a aprender para serem "chefe", "feiticeiro", 
"artista", "professor", "escravo". A diferença 
que o grupo reconhece neles por vocaçâ'o ou por 
origem, a diferença do que espera de cada um deles 
coma trabalho social qualificado por um saber, 
gera o começo da desigualdade da educaçâ'o de 
"homem comum" ou de "iniciado", que cada 
um deles diferentemente começa a receber. 
Uma divisao social do saber e dos agentes e 
usuarios do saber coma essa existe mesmo em 
sociedades muito simples. Em seu primeira piano 
de separaçâ'o - o mais universal - numa idade 
sempre pr6xima à da adolescência, meninos e 
r 
meninas sao isolados do resta da tribo. Em alguns 
casas convivem entre iguais e corn adultos por 
perlodos de reclusâ'o e aprendizagem que envolvem 
situaçëes de ensino forçado e duras provas de 
iniciaçâ'o. Todo o trabalho pedag6gico da forma-
çâo destes jovens é conduzido por categorias de 
educadores escolhidos entre todos para este tipo 
de offcio, de que os meninos saem jovens-adultos 
e guerreiras, por exemplo, e as meninas, moças 
prantas para a passe de um homem, uma casa 
e alguns filhos. 
Nas suas formas mais simples, estas situaçoes 
pedag6gicas de ensino especializado que apressa 
o adulto que ha no jov~m podem ser muito breves. 
Padern envolver pouco mais do que momentos 
pravocados de convivência intensificada entre 
grupos de adolescentes e grupos de adultos. 
Depressa eles sao devolvidos ao grupo social 
e, quase sempre, depois de cerimôni~s publicas 
de iniciaçâ'o (os ritos de passagem), sâ'o reconhe-
cidos, pela posiçâ'o que o grupo lhes atribui e 
pelo saber que lhes reconhece, coma homens 
e mulheres aptos e legltimos para a vida do adulto 
da tribo. 
Outras vezes este perlodo de aprendizagem sepa-
rada é muito mais longo, muito mais diversificado 
e, por certo, muito mais pr6ximo dos modelas 
de agências e procedimentos de ensino que temos 
na cabeça quando pensamos em educaçao. Em 
sociedades tribais da Libéria e de Serra Leoa, 
29 
.... 
30 
/ 
il 
Carlos Rodrigues Brandiio 
na Africa, ha tipos de escolas para os menines 
(as escolas "Pore") e para as meninas (as escolas 
"Sande"). De tribo para tribo os meninos estudam 
por perlodos que vao de ano e meio a oito anos. 
Estudam, convivem entre si e corn seus mestres 
e treinam. Divididos de acordo corn seus grupo~ 
de idade (como etn nossas "séries"), eles aprendem 
as crenças, as tradiçêies e os costumes culturais 
da tribo, além do sa ber dos of Ici os de guerra e 
paz. A escola Pore leva em conta diferenças indivi-
duais e, corn o trabalho docente de diferentes 
professores-especialistas, forma novos especialistas. 
Se um menino demonstra talentos para o trabalho 
do fabrico de tecidos, de coure, para o exerclcio 
da dança, ou para os off cios da medicina tribal 
ele acrescenta estes treinos e estudos ao corp~ 
comum do programa por que passa corn todos 
os outres companheiros de idade. 
Entre grupos de pescadores da Nova Zelândia 
e do Arquipélago da Sociedade, existem "casas 
de ensino", verdadeiras universidades em escala 
indlgena, onde toda a sabedoria da cultura é 
ensinada aos jovens de ambos os sexos por prefes-
sores-sacerdotes. Durante a metade do ano estas 
"casas" permanecem abertas e, por todo o dia, 
oferecem cursos corn alguma teoriae muita pra-
tica sobre pelo menas os seguintes assuntos: 
genealogia, tradiçoes e historia, princlpios de 
crença e cultos religiosos, magia, artes da nave-
gaçao, agricultura, dança, literatura. O pregrama 
U que ê Educaçiïo 
de ensino divide a "Mandlbula Superior", onde 
os jovens aprendem corn os sacerdotes os segredos 
do sagrado, da "Mandlbula lnferior", relacionada 
corn os assuntos terrenos. 
Em um segundo piano, mais restrito e mais 
marcadamente polltico, diferentes categorias de 
menines e meninas recebem o saber especializado 
que ha em uma "educaçao de minorias privile-
giadas", destinadas por herança aos cargos de 
chefia. Assim acontece, por exemple, entre quase 
todos os grupos originais do Havai, onde os nobres 
e ·outres jovens selecionados de antemao ·para 
postas futures de poder sobre os outres passavam 
por verdadeiros cursos superiores de estudos 
que lhes tomavam quase todo o tempo da adoles-
cência e da juventude. A tribo que mais adiante 
submetera a eles a chefia comunitaria - o trabalho 
social de dirigir - atribuira a eles como um direito, 
e exigira deles como um dever, o sal:ier especia-
lizado do chefe. E o proprio tempo prelongado 
de estudo, treino e teste, muito mais do que o 
de todos os outros meninos, vale coma um ates-
tado social de diferenças entre o chefe e os outres, 
dado pela educaçâ'o. 
Mesmo os grupos que, como os nossos, dividem 
e hierarquizam tipos de saber, de alunos e de usos 
do saber, nao podem abandonar por inteiro as 
formas livres, familiares e/ou comunitarias de 
educaçao. Em todos os cantos do mundo, primeire 
a educaçfio existe como um inventario amplo 
31 
' 'I 
32 Carlos Rodrigues Brandâo 
de relaçoes interpessoais diretas no âmbito fami-
liar: mae-filha, pai-filho, sobrinho-irmâ'o-da-mae, 
irmâ'o-mais-velho-irmâ'o-caçula e assim por diante. 
Esta é a rede de trocas de saber mais universal 
e mais persistente na sociedade humana. Depois, 
a educaçâ'o pode existir entre educadores-edu-
candos nâ'o parentes - mas habitantes de uma 
mesma aldeia, de uma mesma cidade, gente de 
uma mesma linguagem - semi-especializados 
ou especialistas do saber de algum oflcio mais 
ample ou mais restrito: artesâ'o-aprendiz, sacer-
dote-iniciado, cavaleire-escudeire, e tantes outres. 
Até aqui o espaça educacional nâ'o é escolar. 
Ele é o lugar Ja vida e do trabalho: a casa, o 
templo, a oficina, o barco, o mato, o quintal. 
Espaça que apenas reune pessoas e tipos de ativi-
dade e onde viver o fazer faz o saber. 
Em todo o tipo de comunidade humana onde 
ainda nâ'o ha uma rigorosa divisâ'o social do tra-
balho entre classes desiguais, e onde o exerclcio 
social do poder ainda nao foi centralizado por 
uma classe como um Estado, existe a educaçâ'o 
sem haver a escola e existe a aprendizagem sem 
haver o ensino especializado e formai, corne um 
tipo de pratica social separada das outras. E 
da vida. 
Mesme nas grandes sociedades civilizadas do 
passade - corne na Grécia e em Roma, corn que 
vamos nos encontrar um pouce mais adiante -
um sistema pedag6gico controlado por um poder 
0 que é Educaçâo 
externe a ele, atribui'do de fora para dentre a uma 
hierarquia de especialistas do ensino, e destinado 
a reproduzir a desigualdade através da oferta 
desigual do saber, é uma conquista tardia na 
historia da cultura. 
Em nome de quem os constitui educadores 
estes especialistas do ensino aos pol.Jcos toma~ 
a seu cargo a tarefa de assumir, controlar e recodi-
ficar domi'nios, sistemas, modes e usos do saber 
e das situaçoes coletivas de distribuiçâ'o do saber. 
Onde quer que apareça e em nome de quem venha, 
todo o corpo profissional de especialistas do 
ensino tende a dividir e a legitimar divisoes do 
conhecimento comunitario, reservando para o seu 
proprio domlnio tanto alguns tipos e graus do 
saber da cultura, quanto algumas formas e recursos 
proprios de sua difusâ'o. 
Assim, aos pouces acontece corn a, educaçâ'o 
o que acontece corn todas as outras praticas 
sociais (a medicina, a religiâ'o, o bem-estar, o 
lazer) sobre as quais um dia surge um interesse 
pol ltico de contrele. Também no seu interior 
sistemas antes comunitarios de trocas de bens
1 
de serviços e de significados sâ'o em parte contre: 
lados por contrarias de especialistas, mediadores 
entre o poder e o saber. 
Os estudos mais recentes da Historia têm indi-
cado que a palavra escrita parece ter surgido em 
sociedades-estado enriquecidas e corn um poder 
muito centralizado, corne entre os eglpcios ou 
33 
34 
r 
Carlos Rodrigues Hrandiio 0 que é Educaçiio 
entre os astecas. Ela teria aparecido primeiro 
sendo usada pelos escribas, para fazer a contabi-
lidade dos bens dos reis e faraos. So mais tarde 
é que foi usada também pelos poetas para cantarem 
as coisas da aldeia e de sua gente. Assim também 
a educaÇâ'o. Por toda a parte onde ela deixa de 
ser totalmente livre e comunitaria (nâ'o escrita) 
e é presa na escola, entre as mâ'os de educadores 
a serviço de senhores, ela tende a inverter as 
uti 1 izaçoes dos seus frutos: o sa ber e a repartiçâ'o 
do saber. A educaçâ'o da comunidade de iguais 
que reproduzia em um momento anterior a igual-
dade, ou a complementariedade social, por sobre 
diferenças naturais, começa a reproduzir desigual-
dades socia is por sobre igualdades naturais, começa 
desde quando aos poucos usa a escola, os sistemas 
' r 
pedagogicos e as "leis do ensino" para servir ao 1 
poder de uns poucos sobre o trabalho e a vida 1 
de muitos. Onde um tipo de educaçâ'o pode tomar 
homens e mulheres, crianças e velhos, para torna-
-los todos sujeitos livres que por igual repartem 
uma mesma vida comunitaria; um outra tipo 
de educaçâ'o pode tomar os mesmos homens, 
das mesmas idades, para ensinar uns a serem 
senhores e outras, escravos, ensinando-os a pensa-
rem, dentra das mesmas idéias e corn as mesmas 
palavras, uns como senhores e outras, como 
escravos. 
Nas sociedades primitivas que nos acompa-
nharam até aqui, a educacâ"o escolar que ajuda 
( ' 
a separar o nobre do plebeu parece ser um ponto 
terminal na escala de invençâ'o dos recursos huma-
nos de transferência do saber de uma geraçâ'o a 
outra. Também nas sociedades ocidentais con:io a 
nossa - sociedades complexas, sociedades de clas-
ses, sociedades capital istas - a educaçâ'o escolar é 
uma invençâ'o recente na historia de cada uma. Da 
maneira como existe entre nos, a educaçâ'o surge 
na Grécia e vai para Roma, ao longe de muitos 
séculos da historia de espartanos, atenienses 
e romanos. Deles deriva todo o nosso sistema 
de ensino e, sobre a educaçâ'o que havia em Atenas, 
até mesmo as sociedades capitalistas mais tecnolo-
gicamente avançadas têm feito poucas inovaçoes. 
Talvez estejam, portante, entre os seus inven-
tas e escolas, algumas das respostas às nossas 
perguntas. 
•• ·- .. 
35 
PEDAGOGOS, MESTRES-ESCOLA 
E SOFISTAS 
Todas as grandes sociedades ocidentais que, 
coma Atenas e Roma, emergiram de seus bandas 
errantes, de suas primeiras tribos de clâ's de pasto-
res ou camponeses, aprenderam a lidar corn a 
educaçâ'o do mesmo modo coma qualquer outra 
grupo humano, em qualquer outra tempo. Tal 
coma entre os f ndios das Seis Naçôes, os primei-
ros assuntos e problemas da educaçâ'o grega foram 
os dos oflcios simples dos tempos de paz e de 
guerra. 0 que se ensina e aprende entre os primei-
ros pastores, mesmo quando eles começaram 
rusticamente a enobrecer, envolve o saber da 
agricultura e do pastoreio, do artesanato de subsis-
tência cotidiana e da arte. Tudo isso misturado, 
sem muitos mistérios, corn os princlpios de honra, 
de solidariedade e, mais do que tudo, de fideli-
dade à polis, a cidade grega onde começa e acaba 
0 que é Educaçâo 
' I' 
•• 
; 
i 
a vida do cidadâ'o livre e educado. Esta educaçâ'o 
grega é, portanto, dupla, e carrega dentro dela 
a oposiçâ'o que até hoje a nossa educaçâ'o nâ'o 
resolveu. Ali estâ'o normas de trabalho que, quando 
reproduzidas coma um saber que se ensina para 
que se faça, os gregos acabaram chamando de 
tecne eque, nas suas formas mais rusticas e menas 
enobrecidas, ficam relegadas aos trabalhadores 
manuais, livres ou escravos. Ali estâ'o norméls 
de vida que, quando reproduzidas coma um 
saber que se ensina para que se viva e seja um 
tipo de homem livre e, se posslvel, nobre, os 
gregos acabaram chamando de teoria. Este saber 
· que busca no homem livre o seu mais pleno desen-
volvimento e uma plena participaçâ'o na vida da 
polis é o proprio ideal da cultura grega e é o 
que ali se tinha em mente quando se pensava 
na educacâ'o. 
De tudo o que pode ser feito e transformado, 
nada é para o grego uma obra de arte tao perfeita 
quanta o homem educado. A primeira educaçâ'o 
que houve em Atenas e Esparta foi praticada 
entre todos, nos exerclcios coletivos da vida, 
em todos os cantos onde as pessoas conviviam 
na comunidade. Ouando a riqueza da polis grega 
criou na sociedade estruturas de oposiçâ'o entre 
livres e escravos, entre nobres e plebeus, aos 
meninos nobres da elite guerreira e, mais tarde, 
da elite togada é que a educaçâ'o foi dirigida. 
Por alguns séculos, mesmo para eles, ainda nâ'o 
37 
38 Carlos Rodrigues Brandiio . 0 que é Educaçiio 
havia a escola. 
Das relaçoes familiares diretas até a convivência 
entre jovens, segundo os seus grupos de idade, 
ou entre ·grupos de menines educandos e um 
velho educador, entre os gregos sempre se conser-
vou a idéia de que todo o saber que se transfere 
pela educaçâ'o circula através de trocas interpes-
soais, de relaçoes Hsica e simbolicamente afetivas 
entre as pessoas. Assim, a pederastia acaba sendo 
considerada em Esparta como a forma mais pura 
e mais completa de educaçâ'o entre homens livres 
e iguais. Em toda a Grécia a formaçâ'o do nobre 
guerreiro apenas desenrola ao longo dos anos 
uma seqüência de trocas entre um mestre e seus 
discîpulos. 
Aquilo que a cultura grega chama corn pleno 
efeito de educaçâ"o - paideia - dando à palavra 
o sentido de formaçâ'o harmônica do homem 
para a vida da polis, através do desenvolvimento 
de todo o corpo e toda a consciência, começa 
de fato fora de casa, depois dos sete anas. Até 
la a criança convive corn a sua criaçao, convi-
vendo corn a mâ'e e escravos domésticos. 
Para além ainda do que entre os sete e os catorze 
anas aprende corn o mestre-escola, a verdadeira 
educaçâ'o do jovem aristocrata é o fruto do lento 
trabalho de um ou de poucos mestres que acom-
panham o educando par muitos anas. 
Em Atenas, par volta do VI século A.C., a edu-
caçâ'o deixa de ser uma prâtica coletiva, de estilo 
militar, desti~ada apenas à formaçâ'o do cidadâ'o 
nobre. Até entâ'o, mesmo no apogeu da demo-
cracia grega, a propriedade é restritamente 
comunal; pertence aos cidadâ'os ativos do Estado. 
0 poder pertence aos estratos mais nobres destes 
cidadâ'os ativos, e a vida e o trabalho colocam 
de um lado os homens livres, senhores e, de outro, 
os escravos ou outras tipos de trabalhadores 
manuais expulsas do direito do saber que existe 
na paideia. 
Durante muitos séculos os "pobres" da Grécia 
aprenderam desde criança fora das escolas: nas 
oficinas e nos campos de lavoura e pastoreio. 
Os meninos "ricos" inicialmente aprenderam 
também fora da escola, em acampamentos ou 
ao redor de velhos mestres. Além das agências 
estatais de educaçâ'o, coma a Efebia de Esparta, 
que educava o jovem nobre-guerreiro, toda a 
educaçao fora do lar e da oficina é u'ma empresa 
particular, mesmo quando nâ'o é paga. Particular 
e restrita a muito pouca gente. 
Apenas quando a democratizaçâ'o da cultura 
e da participaçâ'o na vida publica colocam a neces-
sidade da democratizaçâ'o do saber, é que surge 
a escola aberta a qualquer menino livre da cidade-
-estado. A escola primâria surge em Atenas par 
volta do ano 600 A.C. Antes dela havia locais 
de ensino de metecos e rapsodistas que aos inte-
ressados ensinavam "a fixar em s(mbolos os neg6-
cios e os cantos". S6 depois da invençâ'o da escola 
39 
40 Carlos Rodrigues Brandiio 
de primeiras letras é que o seu estudo é pouco 
a pouco incorporado à educaçâ'o dos meninos 
nobres. Assim, surgem em Atenas escolas de 
bairro, nâ'o raro "lojas de ensinar", abertas entre 
as outras no mercado. Ali um humilde mestre-
-escola, "reduzido pela miséria a ensinar", leciona 
as primeiras letras e contas. 0 menino escravo, 
que aprende corn o trabalho a que o obrigam, 
nâ'o chega sequer a esta escola. 0 menino livre 
e plebeu em geral para nela. 0 menino livre e 
nobre passa por ela depressa em direçâ'o aos lugares 
e aos graus onde a educaçâ'o grega forma de fato 
o seu modela de "adulto educado". Citaçâ'o 
de Solon, legislador grego: 
"As crianças devem, antes de tudo, aprender a 
nadar e a Ier; em seguida, os pobres devem exer-
citar-se na agricultura ou em uma industria qual-
quer, ao passa que os ricos devem se preocupar 
com a musica e a equitaçao, e entregar-se à fi/o-
sofia, à caça e à freqüência aos ginasios." 
Esta concepçâ'o Xenofonte, historiador, poeta, 
fil6sofo e militar grego, criticaria quase dois 
séculos depois: 
"S6 os que podem criar os seus filhos para nao 
fazerem nada é que os enviam à escola; os que nao 
podem, nao enviam.,, 
0 que é Educaçiio 41 
Pequenas imagens gregas de terracota retratam o escravo 
pedagogo conduzindo para a escola a criança. 
42 
Carlos Rodrigues Brandâo 
A educaçâ'o do jovem livre vai em direcâ'o à 
teoria, que é o saber do nobre para compre~nder 
e comandar, nâ'o para fazer, curar ou construir. 
~ur~nte toda a antigüidade a (mica disciplina 
tecn1ca (entendida como a de uma formacâ'o 
que. ~ponta para um oflcio determinado) é a 
me?1cma., ~ao ha outras escolas . coletivas de 
ens1no ~ecn1co para o preparo de arquitetos, 
engenhe1ros. ou agrimensores, por exemple. Tai 
como. fer~e1ros ou tecelêies, eles aprendem de 
mane1ra simples e direta, na oficina e no tra-
bai~?, através do convlvio corn algum velho 
art1f1ce. 
Diferenças de saber de classe dos educandos 
produziram diferenças curiosas entre os tipos 
de educadores da Grécia antiga. De um lado 
desprez lveis mestres-escola e artesâ'os-professores '. 
de outro, escravos pedagogos e educadores nobres' 
ou de nobres. De um lado, a pratica de instrui; 
P.ara o trabalho; de outra, a de educar para a 
vida e o poder que determina a vida social. 
De todos estes adultos transmissores de saber 
va!e a pena falar do pedagogo. Pequenas estatuetas 
de terracota guardam a mem6ria dele. Artistas 
gregos representaram esses velhos escravos _ 
q~ase sempre cativos estrangeiros - conduzindo 
cnanças a caminho da escola de primeiras letras. 
E ~or que eles e nâ'o os mestres que nas escolas 
ensinavam? Porque os escravos pedagogos -
condutores de - eram afinal seus educa-
0 que é Educaçiio 
dores muito mais do que os mestres-escola. Eles 
convi~iam corn a criança e o adolescente e, mais 
do que os pais, faziam a educaçâo dos preceitos 
e das crenças da cultura da polis. 0 pedagogo 
era o educador por cujas mâ'os a criança grega 
atravessava os anos a caminho da escola, por 
caminhos da vida. 
Nos primeiros tempos, mais do que fil6s?fos 
ou matematicos, os gregos foram guerreiros, 
musicos e ginastas. Assim, mais do que jurf dica 
ou cientffica, a educaçâ'o do cidadâ'o livre era 
ética e artlstica (no pleno sentido que estas duas 
palavras possufam na paideia grega), dentro de 
uma cultura pouco acostumada a separar a verdade 
da beleza. Mais tarde, sob a influência de S6crates 
e Epicure (um sujeito feio e outra doentio) é que 
a educaçâ'o começa a ser pensada como formadora 
do esplrito. Por muitos e muitos séculos ela aponta 
para a harmonia que existe na bele!Za dC? corpo 
( e a destreza para a luta) ao lado da clareza da 
mente (e a fidelidade à polis dos cidadâ'os livres). 
Mesmo no n(vel da cultura letrada dos nobres, 
a civilizaçâo classica nao conservou sempre ~m 
unico modela ou estilo de saber, logo, de educaçao. 
Ela oscilou entre duas formas de algum modo 
antagônicas: a filos6fica, cujo ~i~o do~ina~te 
pode ser Platâ'o, e a orat6ria (retorica), CUJO t1po 
dominantepode ser ls6crates. 
Depois de constitu 1 das as classes de ho mens 
livres que regem a democracia dos gregos sobre 
43 
44 
/ 
Carlos Rodrigues Brandâo 0 que é Educaçâo 
45 
a divisa? do trabalho e a instituiçâ'o do regime 
escravag1sta, para os seus adolescentes a educacâ'o 
coletiva nâ'o é uma atividade voluntaria ou ~m 
direi~o de berça. É um dever imposte pela polis 
ao livre. Porque o seu exerclcio modela nâ'o um 
homem abstrato, sonho de poetas, mas o cidadâ'o 
madur~ . para ? serviço à comunid9de, projeta 
do pol1t1co. A 'obra de arte" da paideia é a pessoa 
plenamente madura - coma cidadâ'o, coma militar 
coma pol îtico - posta a servico dos interesse~ 
da cidade-comunidade. Assim, o ideal da educacâ'o 
é reproduzir uma ordem social idealmente co~ce­
bida como perfeita e necessaria, através da trans-
missâ'o, de geraçâ'o a geraçâ'o, das crencas valores 
e habilidades que tornavam um home~ tao mais 
perfeito quanta mais preparado para viver a cidade 
a que servia. E nada poderia haver de mais precio-
so, a um homem livre e educado, do que o proprio 
saber e a identidade de sabio que ele atribui ao 
homem. 
Depois de haver conquistado a cidade onde 
vivia o fil6sofo Estilpâ'o, Demétrio Poliorceto 
pretendeu indeniza-lo pelos preju lzos materiais 
que sofrera por causa da pilhagem. Ouando pediu 
que fizesse o inventârio do que lhe pertencera 
e fora destru fdo, Estilpao respondeu que nada 
havia perdido do que era seu, porque nao lhe 
haviam roubado a sua cul tu ra - 1rnlo ew - dado 
que ainda conservava a eloqüência e o saber. 
0 formador de jovens, o educador, o fil6sofo-
-mestre como S6crates, Platâ'o e Arist6teles, 
reunem à sua volta os seus alunas, em suas escolas 
superiores. A escola filos6fico-iniciatica de 
Pitagoras, que interna educandos, cria regras 
pr6prias de conduta e lhes absorve boa par~e 
do tempo da juventude, antecede a Academ1a 
de Platâ'o, o Uceu de Arist6teles e a Escala de 
Epicuro. Mas sâ'o os fil6sofos sofistas os ql:'e 
democratizam o ensino superior, tornando-o 
remunerado e, portanto, aberto a todos os que 
podem pagar. Ap6s a longa crise de tirania por 
volta do VI século A.C., a vida social de Atenas 
possibilita a participaçâ'o de todos os cidadâ'os 
livres e isto recoloca a questâ'o do preparo do 
hom~m para o exerclcio da cidadania, a questâ'o 
de aprender para legislar e para estar de algu.,:n 
modo presente nas assembléias de representaç~o 
pol ltica. Os sofistas transformam a educaçao 
superior em um tempo de formaçâ'o do orador, 
onde a qualidade da ret6rica tem mais valor do que 
a busca desinteressada da verdade, exercîcio 
dos nobres dos perlodos anteriores. 
Aos poucos até Arist6teles e Alexandre Magno, 
muito depressa durante a Civilizaçâ'o Helenlstica, 
a educaçâ'o classica passa por algumas mudanças: 
1) ela vai do cultiva aristocratico do corpo e 
da mente, corn vistas à formaçâ"o do nobre guer-
reiro e dirigente, à habilitaçâ'o do cidadâ"o livre, 
comum, para a carreira polftica; 2) ela vai de um 
domînio do "saber desinteressado", de fundo 
46 Carlos Rodrigues Brandiio 
artfstico-musical, para o literario, daî para o 
ret6rico, o livresco e o escolar (de aprender a 
sabedoria para aprender a informaçfio); 3) ela 
vai das agências de reproduçâ'o restrita do saber 
de nobres, entre nobres, para o sa ber dispon îvel, 
à venda em escolas pagas que educam da criança 
ao adulto. 
Corn o tempo a educaçâ'o classica deixa de ser 
um assunto privado, passe e questâ'o da comuni-
dade dos nobres dirigentes, e passa a ser questâ'o 
de Estado, publica. Arist6teles exige do 1 mperador 
leis que regulem direitos e controlem o exerclcio 
da educaçâ'o. Atras das tropas de conquista de 
Alexandre Magno, os gregos levam as suas escolas 
por todo o mundo. Elas sâ'o, mais do que tudo, 
o rneio de impedir que a distância da Patria de 
origem ameace perder-se a cultura do vencedor 
entre os costumes e o sa ber dos vencidos. 
Corno seria possîvel fazer uma sîntese dos 
princîpios que orientaram toda a educaçâ'o classica 
criada pelas gregos? Ela foi sempre entendida 
coma um longo processo pela quai a cultura 
da cidade é incorporada à pessoa do cidadâ'o. 
Uma trajet6ria de amadurecimento e formaçâ'o 
(coma a obra de arte que aos poucos se modela), 
cujo produto final é o adulto educado, um sujeito 
perfeito segundo um modela idealizado de homem 
livre e sabio. mas ainda sempre aperfeiçoavel. 
Assim, a educaçâ'o grega nâ'o é dirigida à criança 
no sentido cada vez mais dada a ela hoje em 
0 que é Educaçiio 
dia. De algum modo, é uma educacâ'o contra a 
criança, que nâ'o leva em conta o q~e ela é, mas 
olha para o modela do que pode ser, e que anseia 
torna-la depressa o jovem perfeito (o guerreiro, 
o atleta, o artista de seu proprio corpo-e-mente) 
e o adulto educado (o cidadâ'o pol ltico a serviço 
da polis). 
Esta educaçâ'o humanista de uma sociedade 
que deixa ao escravo e ao artesâ'o livre o trabalho 
de fazer, desdenha a técnica e olha para "o homem 
todo", formado de aprender a teoria e praticar 
o gesto que constroem o saber e o habita do 
homem livre. Em seu pleno sentido, é uma edu-
caçâ'o ética cujo saber conduz o sabio a viver, 
corn a sua pr6pria vida, o modela de um modo 
de ser idealizado, tradicional, que é missâ'o da 
paideia conservar e transmitir. 
Finalmente, os gregos ensinam o que hoje esque-
cemos. A educaçâ'o do homem existe por toda 
parte e, rnuito mais do que a escola, é o resultado 
da açâ'o de todo o meio sociocultural sobre os 
seus participantes. É o exercîcio de viver e convi-
ver o que educa. E a escola de qualquer tipo 
é apenas um lugar e um momento provisérios 
onde isto pode acontecer. Portanto, é a comu-
nidade quem responde pela trabalho de fazer 
corn que tudo o que pode ser vivido-e-aprendido 
da cultura seja ensinado corn a vida - e também 
corn a aula - ao educando. 
• .,-
47 
r 
A EDUCAÇÂO QUE ROMA FEZ, 
E 0 QUE ELA ENSINA 
Os primeiros latinos foram camponeses aos 
poucos enriquecidos e, alguns, tornados nobres 
na Penînsula ltalica. Ali aconteceu coma em 
tantas outras partes do mundo. Classes sociais 
que corn o tempo chegaram a ser "privilegiadas" 
e separaram a direçiio do traba/ho do proprio 
exerc!cio do trabalho, separando corn isso as 
forças produtivas mentais das flsicas, desem-
penharam antes funç5es ûteis. Primeiro, entre 
os romanos, o trabalho é entre todos e o saber 
é de todos. Os primeiros reis de Roma punham 
corn os sûditos as mâ'os no arado e lavravam 
a terra. 
Corno entre os lndios, coma nos tempos de 
origem dos povos gregos, a educaçâ'o dos campo-
neses latinos é comunitaria e existe difusa em 
todo o meio social. Muito mais do que na Grécia, 
t 
0 que é Educaçâo 
a educaçâ'o da criança é uma tarefa doméstica. 
Na aurora da historia do poder de Roma, ela foi 
uma !enta iniciaçâ'o da criança e do adolescente 
nas tradiçoes consagradas da cultura, e servia à 
consagraçâ'o da tradicionalidade quase venerada 
de um modo camponês de vida, simples e austero. 
A criança começava a aprender em casa, corn 
os mais velhos, e quase tudo o que aprendia era 
para saber e preservar os valores do mundo dos 
"mais velhos", dos seus antepassados. 
Essa educaçâ'o doméstica busca a formaçâ'o 
da consciência moral. 0 adulto educado que ela 
quer criar é o homem capaz de renûncia de si 
proprio, de devotamento de sua pessoa à comu-
n idade. Sâ'o as virtudes do campesinato de todos 
os tempos e lugares, o que dirige a primitiva 
educaçâ'o de Roma, que exalta em verso e prosa 
a austeridade, a vida simples, o amor ao trabalho 
coma supremo bem do homem, e '0 horror ao 
luxo e à ociosidade. Ao contrario do que aconteceu 
cedo em Atenas, em Roma nâ'o ha de in lcio 
qualquer tipo de cuidado corn a pura formaçâ'o 
flsica e intelectual do cidadâ'o ocioso, ocupado 
corn pensar, governar e guerrear. A educaçâ'o 
de uma comunidade dedicada ao trabalho corn 
a terra foi durante séculos uma formaçâ'o do 
homem para o trabalho e a vida, para a cidadania 
da comunidade igualada pelo trabalho. 
Ouandoo mundo romano de camponeses enri-
quece corn os excedentes da terra e das pilhagens 
49 
50 Carlos Rodrigues Brandfio 
de outros povos, quando op5e classes sociais 
e inventa o Estado, ele ainda defende a criança 
de ser entregue cedo a alguma forma de educaçâ'o 
estatal, militarizada, fora do lar. Entre os romanos 
os primeiros educadores de pobres e nobres sâ'o 
0 pai e a mae. Mesmo os mais ricos, senhores 
de escravos, nao entregam· a um servo-pedagogo 
ou a uma governanta o cuidado dos filhos. Ouando 
o menino completa, aos 7 anos, o aprendizado 
cheio de afeiçà'o que recebe da mà'e, ele passa 
para o pai, que nà'o divide sequer corn o mestre-
-escola o direito de educa-lo, ou seja, de formar 
a sua consciência segundo os preceitos das crenças 
e valores da classe e da sociedade. 
Em Roma, portanto, ao contrario do que vimos 
acontecer em Atenas e principalmente em Esparta, 
a famllia prolonga o poder de socializar o cidadao 
e, através dela, a sociedade civil estende o alcance 
do seu modela em toda uma primeira educaçà'o 
da crianca. A partir de Homero, no alvorecer 
da hist6~ia grega, o ideal da paideia é o her6i 
da polis. Na educaçâ'o romana o modela ideal 
é o ancestral da famîlia, depois o da comunidade. 
Quando uma nobreza romana enriquecida 
corn a agricultura e o saque abandona o trabalho 
da terra peio da pol ltica, e cria as reg ras do 1 mpério 
de que se serve, aquele primitivo saber comu-
nitârio divide-se e força a separaçao de tipos, 
nlveis e agências de educaçâ'o. Quando hâ livres 
e escravos, senhores e servos, começa a haver 
0 que é Educaçfio 
um modela de educaçâ'o para cada um, e limites 
entre um modela e outra. 
Aos poucos a educaçâ'o deixa de ser o ensino 
que forma o pastor, o artifice ou o lavrador e 
nas suas formas mais elaboradas, prepara o futur~ 
guerreiro, o funcionario imperial e os dirigentes 
do 1 mpério. 0 sistema comunitârio de base peda-
g6gica familiar compete corn outras. Aos poucos 
aparece a oposicà'o entre o ensino de educar 
dos pais, dos ~estres-pedagogos que convive~ 
corn os educandos e os acompanham, prolon-
gando corn eles o saber que forma a consciência 
e que é a sabedoria; e o ensino de instruir, do 
mestre-escola que monta no mercado a /oja de 
ensino e vende o saber de ler-e-contar coma uma 
mercadoria. 
0 ensino elementar das primeiras letras apareceu 
em Roma antes do IV século A.C. Um tipo de 
ensino que podemos identificar corn' o secundario 
surgiu na metade do século 111 A.C. e o ensino 
que hoje em dia chamar(amos de superior, univer-
sitario, apareceu pelo século 1 A.C. Mas, durante 
quase toda a sua historia, o Estado Romano 
nâ'o toma a seu cargo a tarefa de educar, que ficou 
deixada à iniciativa particular, mas ja nao mais 
comunitaria, coma ao tempo em que os reis 
aravam a terra. S6 depois do advento do Cristia-
nismo, por volta do século IV D.C., é que surge 
e se espalha par todo o 1 mpério a schola pubfica, 
mantida pelas cafres dos munic(pios. 
51 
52 Carlos Rodrigues Brandiio 
Nos tempos do domlnio de Augusto e de Tibé-
rio, a criança, educada em casa pelos pais, aprendia 
depois dos 7 anos as primeiras letras na escola 
(loja de ensino) do /udimagister. Aos 12 anos ela 
esta va pronta para freqüentar a escola do gramma-
ticus e, a partir dos 16, a do lector. Na sua forma 
mais simples esta é a estrutura de educaçâ'o que 
herdamos e conservamos até hoje. 
Do lado de fora das portas do lar, a (!ducaçâ'o 
latina enfim separa em duas vertentes o que se 
pode aprender. Uma é a da of ici na de trabalho, 
para onde vâ'o os f ilhos dos escravos, dos servos 
e dos trabalhadores artesâ'os. Outra é a e$co!a 
livresca, para onde vâ'o o futuro senhor (o diri-
gente livre do trabalho e do Estado) e o seu media-
dor, o funcionario burocrata do Estado ou de 
neg6cios particu lares. 
Esta educaçao de escola, que os romanos criam 
em Roma copiando a forma e alguma coisa do 
espîrito dos gregos, espalham primeiro pela Penin-
sula ltalica e depois por todo o mundo que con-
quistam na Europa, na Asia e no Norte da Africa. 
Do mesmo modo coma o sacerdote, o educador 
caminha atras dos passas do general. A educaçâ'o 
do conquistador invade, corn armas mais pode-
rosas do que a espada, a vida e a cultura dos 
conquistados. A educaçâ'o que serve, longe da 
Patria, aos filhos dos soldados e funcionarios 
romanos sediados entre os povos vencidos; serve 
também para impor sobre eles a vontade e a 
0 que é Educaçiio 
visâ'o de mundo do dominador. 
Plutarco descreveu como Roma usou a educaçâ'o 
para "domar" os espanh6is dominados: 
"As armas nao tinham conseguido submetê-los 
a nao ser parcialmente; foi a educaçfio que os 
domou." 
L._ ... ·- ·-
53 
EDUCAÇÂO: ISTO E AQUILO, 
E 0 CONTRÂRIO DE TUDO 
Ora, uma outra mane+ra de se compreender 
o que a educaçao é, ou poderia ser, é procurar 
ver o que dizem sobre ela pessoas coma legisla-
dores, pedagogos, professores, estudantes e outros 
sujeitos um tanto mais tradicionalmente diflceis 
de entender, como fil6sofos e cientistas sociais. 
Nos dois dicionarios brasileiros mais conhecidos 
a educaçâ'o aparece definida assim: 
"Açiio e efeito de educar, de desenvolver as facul-
dades f{sicas, intelectuais e marais da criança e, 
em geral, do ser humano; disciplinamento, instru-
çfio, ensino." (Dicionario Contemporâneo da 
L(ngua Portuguesa, Caldas Aulete) 
"Açfio exercida pelas geraçoes adultas sobre as 
geraçoes /avens para adapta-las à vida social; 
traba!ho sistematizado, sefetivo, orientador, pela 
0 que é Educaçâo 
/ 
quai nos ajustamos à vida, de acordo corn as 
necessidades ideais e prop6sitos dominantes· 
ato ou efeito de educar; aperfeiçoamento integraf 
de todas as facu/dades humanas, po/idez, cortesia." 
(Pequeno Dicionario Brasileiro de L/ngua Portu-
guesa, Aurélia Buarque de Hollanda) 
Um pouco mais adiante vamos ver que o miolo 
de cada uma destas definiçoes de dicionario pende 
para um dos lados em que se recortam as maneîras 
de explicar o que a educaçâ'o é e a que serve. 
Na "letra da Lei" a coisa nao muda muito. 
Ao pretenderem estabelecer quais os fins da 
educaçiio no pals, os nossos legisladores, pelo 
menas em teoria, garantem para todos o melhor 
a seu respeito. Eles falam sobre o que deve deter-
minar e controlar o trabalho pedag6gico em 
todos os seus graus e modalidades. De certo modo 
falam a respeito de uma educacao 
1 
idealizada 
ou falam da educaçao através de, uma ideologî~ 
(ver 0 que é ldeologia, nesta mesma colecâ'o): 
"Art. 10. - A d ~ · ! r-1 e ucaçao nactana , inspirada nos 
prindpios de liberdade e nos ideais de solidarie-
dade humana, tem por fim: 
a) a compreensao dos direitos e deveres da 
pessoa humana, do cidadiio do Estado 
da fam//ia e dos demais gru~os que corn: 
poem a comunidade; 
55 
56 Carlos Rodrigues Brandiio 
b) o respeito à dignidade e às liberdades funda-
mentais do homem; 
c) o fortalecimento da unidade nacional e da 
solidariedade internacional; 
d) o desenvo/vimento integra/ da personalidade 
humana e a sua participaçâ'o na obra do 
bem comum; 
e) o preparo do indiv(c/uo e da socïedade para 
o dom/nia dos recursos cient/ficos e tecno-
16gicos que lhes permitam utilizar as possibi-
lidades e vencer as dificuldades do meio; 
f) a preservaçao do patrimônio cultural; 
g) a condenaçao a qua/quer tratamento desigual 
par motiva de convicçâ'o filos6fica, polt'tica 
ou religiosa, bem coma a quaisquer precon-
ceitos de classe ou raça." (Lei 4024, de 20 
de dezembro de 1961) 
Mas, do outra lado do palco, intelectuais, educa-
dores e estudantes fazem e refazem todos os dias 
a cr(tica da pratica da educaçâ'o no Brasil. Eles 
levantam questoes e afirmam que, do Ministério 
à escolinha, a educaçao nega no cotidiano o que 
afirma na Lei. Nâ'o ha liberdade no pals e a edu-
caçao nao tem tido pape! algum nos ûltimos 
anos para a sua conquista; nâ'o ha igualdade entre 
os brasileiros e a educaçâ'o consolida a estrutura 
classista que pesa sobre n6s; nao ha nela nem 
a consciência nem o fortalecimento dos nossosverdadeiros valores culturais. 
0 que é Educaçiio 
Um grupo de estudantes candidatos à direçao 
da UNE resume parte desta crltica e reclama 
para a luta estudantil itens que, co.m alguma 
variaçao de linguagem, quase poderiam caber 
nas "leis do ensino". 
"Os homens discriminados coma negros, velhos, 
criancas, homossexuais, mulheres. . . descobre.m 
que, · nestes anas todos de dominaçâ'o, a força 
imensa que mexeu e transformou a face do planeta 
nasce de cada oprimido, de cada explorado~ de 
cada homem de cada mulher. Descobrem a ongem 
e o fim de 'toda a atividade humana: o proprio 
homem. 
"Coraçoes e mentes se abrem para uma nova 
vida. lrrompe uma nova consciência. 
"A percepçao ampla e profunda das aç_oes .a r~ia­
coes entre os homens é inerente e mseparavel 
de qualquer trabalho de produçâ'o~ veiculaçâ'o 
ou discuss!io cultural. 
"E buscar todos os meios para que todo esse 
trabalho floresca, para que toda essa força con-
tida venha à t~na, é funçâ'o nossa, das entidades 
estudantis. 
"Criar condiçêfes para que, através da mantfes-
taçao de todos, possamos perceber os anseios, 
as contradiçoes de cada um, do homem e de toda 
a sociedade. 
"Ampliar as idéias sobre o trabalho cultural. 
Abranger o homem, as suas relaçoes, as discri-
57 
58 Carlos Rodrigues Brandiio 
minaçoes raciais, sexuais, etârias, a moral opoder 
a dominaçâ'o. ' ' 
"Ramper os limites, soltar a cabeca as mâ'os 
os pés, o corpo para a realidade inq~ie~a, questio~ 
nadora. 
"Destruir as regras do jogo. 
"Subir no palco e invadir os camarins do mundo 
Assumir ? P,~pel de agentes da Historia. Repre~ 
sentar a vida. (Vaz Ativa - Cultural) 
Sem rodeios as "leis do ensino" no pa(s garan-
tem que: 
"A educaçâ'o é direito de todos e serâ dada no 
far e na escola. . . . A famt'lia cabe escolher o 
gênera de educaçâ'o que deve dar a seus filhos. 
... <,? d ireito à educaçâ'o é assegurado: pela obri-
gaçao do poder publico e pela liberdade de inicia-
tiva particular de ministrarem o ensino em todos 
os graus, na forma da lei em vigor; pela obrigaçâ'o 
do Estado de fornecer recursos indispensâveis 
para que a fam/lia e, na fa/ta desta, os demais 
membros da comunidade se desobriguem dos 
encargos da educaçâ'o, quando provàda a insufi-
~iên~ia de meios, de modo que sejam asseguradas 
1gi.:a1s oportunidades a todos." (Artigas 29 e 39 da 
let 4024) 
Mas, se entre o pensado e o vivido ha diferencas 
as pesso~s do pals protestam e cobram, de q~e~ 
fa~ a .1e1, que pela menas ela seja cumprida: que 
ha1a l1berdade na educaçao e, através dela, que a 
0 que é Educaçâo 
escola exista para todos e seja distribulda por 
igual entre todos. Assim, os docentes universitarios 
reunidos num Encontro Nacional de Associaçoes 
escreveram o seguinte no documenta final: 
"O regime pol/tico e o modela socioeconômico 
impostos nos ultimos anas à Naçâ'o Brasileira 
produziram danos marcantes na qualidade do 
ensino de nossas escolas, seja pela repressâ'o pol/-
tico-ideol6gica que se abateu sobre toda a comu-
nidade, seja pela carater flagrantemente antidemo-
crâtico de suas leis e decretos, que se reflete 
na elaboraçao e modificaçâ'o i!eg/timas de regi-
mentos e estatutos das Universidades. 
"A po//tica educaciona/ imp!antada Jevou à 
progressiva desobrigaçâ'o do Estado com o custeio 
da Educaçâ'o, e à expansâ'o do ensino privado. 
Assim, a educaçao estâ aberta à açâ'o dos e.7:;:.-e-
sarios do ensino, sujeita às leis da inicùativa privada, 
sendo negociada coma mercadoria entre as partes 
interessadas em vender e comprar, o que reve/a 
0 carater e/itista do atua/ processo educaciona! 
no Brasil." ( Bofetim Nacional das Associaçoes 
de Docentes, nC? 3) 
A fala do poder que constitui a educaçâ'o no 
pals propôe o exerclcio de uma prâtica idealizada. 
A fala dos praticantes da educaçâ'o, os educadores, 
faz entâ'o a cr(tica da distância que hâ entre a 
promessa e a realidade. Faz mais, denuncia a alte-
59 
60 Carlos Rodrigues Brandâo 
raçâ'o para pior das pr6prias leis que dizem o que 
é e coma deve ser a Educaçâ'o no Bras!/. 
Nâ'o ha apenas idéias apostas ou idéias diferentes 
a respeito da Educaçâ'o, sua essência e seus fins. 
Ha interesses econômicos, pal lticos que se proje-
tam também sobre a Educaçâ'o. Nâ'o é raro que 
aqui, coma em toda parte, a fala que idealiza 
a educaçâ'o esconda, no silêncio do que nâ'o diz, 
os interesses que pessoas e grupos têm para os 
seus usas. Pois, do ponta de vista de quem a 
controla, muitas vezes definir a educaçâ'o e legislar 
sobre ela implica justamente ocultar a parcialidade 
destes interesses, ou seja, a realidade de que eles 
servem a grupos, a classes sociais determinadas, 
e nâ'o tanto "a todos", "à Naçâ'o", "aos brasi-
leiros". Do ponta de vista de quem responde 
par fazer a educaçâ'o funcionar, parte do trabalho 
de pensa-la implica justamente em desvendar 
o que faz corn que a educaçâ'o, na realidade, 
negue e renegue o que oficialmente se afirma 
dela na lei e na teoria. 
Mas a razâ'o de desavenças é anterior e, mesmo 
entre educadores, ela tem alguns fundamentos 
na diferença entre modos de compreender o que 
o ato de ensinar afinal é, o que o determina e, 
finalmente, a que e a quem ele serve. 
... •• •• 
PESSOAS "VERSUS" 
SOCIEDADE: UM DILEMA 
QUE OCULTA OUTROS 
Quando alguém tenta explicar o que sao estes 
nomes e o que eles misturam: educaçfio, escola, 
ensino a fala que explica pode pender para um 
lado ~u para o outra de uma velh.a d~sc~s~a?. 
Uma discussao ontem quente, hoje em dia 1nut1I, 
a nao ser quando serve para revelar o ~que se 
esconde par detras de pensar a educaçao desta 
maneira ou daquela. 
De acordo corn as idéias de alguns fil6sofos 
e educadores a educaçao é um meio pela quai 
0 homem (a' pessoa, o ser humano, o indivlduo, 
a crianca etc.) desenvolve potenCialidades biopsl-
quicas in~tas, mas que nâ'o atingiriam a sua perfe!-
câ'o (o seu amadurecimento, o seu desenvolv1-
~ento, etc.) sem a aprendizagem realizada a~ra~és 
da educaçao. Pode até ser que haja formas proprias 
62 
Carlos Rodrigues Brandiio 
/ 
de auto-educaçâ'o, mas é de suas praticas interativas 
( interpessoais), coletivas, que se estâ falando 
quando se escreve um livra sobre "Filosofia da 
Ed~caçâ'o", par exemplo. Assim coma a prôpria 
soc1edade e um corpo coletivo formado da indi-
vidualidade das pessoas que a compêiem, e assim 
coma o seu fim é a felicidade de seus membros 
a quem todas as suas instituiçêies devem servir 
a~si,:n também a educaçâ'o, coma idéia (a defi~ 
niçao, a "f ilosofia "), deve ser pensa da em nome 
da pe~s~a e, coma instituiçao (a escola, o sistema 
pedagog1co) ?LI como pratica (o ato de educar), 
deve ser real1zada coma um serviço coletivo que 
se presta a cada indivlduo, para que ele obtenha 
?el~ . tudo o que precisa para se desenvolver 
1nd1v1dualmente. 
. Muitas vezes, entre os que pensam assim a 
d1me_:isâ'o subjetiva da educaçâ'o é ressalt~da 
e, nao raro, toma conta de todo o espaça em 
~ue o seu processo esta sendo pensado. Nâ"o 
importa considerar sob que condicêies sociais 
e através de que recursos e procedim.entos exter-
nos a pessoa aprende, mas apenas a pensar 0 
ato de aprender do ponta de vista do que acontece 
do educando para dentro. 
"A Educaçao nao é mais do que o desenvolvimento 
consciente e livre das faculdades inatas do ho-
mem." (Sciacca); 
"A Educaçao é o processr; externo de adaptaçao 
0 que é Educaçiio 
r 
superior do ser humano, f/sica e mentalmente 
desenvolvido, livre e consciente, a Deus, ta! coma 
se manifesta no meio intelectual, emocional e 
volitivo do homem". (Herman Horse); 
"O fim da Educaçao é desenvolver em cada indi-
v(c/uo toda a perfeiçao de que ele seja capaz." 
(Kant); 
"É toda a espécie de formaçao que surge da 
inf!uência espiritual." (Krieck). 
Quando a Enciclopédia Brasileira de Moral e 
Civismo, editada pela Ministério de Educaçâ"o 
e Cultura, define educaçâ'o, pensando talvez 
expressar uma idéia consensual, ela de fato repete 
o ponta de vista das definiçêies anteriores. Ve-
jamos: 
"Educaçâ"o. Do !atirn'educere', que significa 
extrair, tirar, desenvolver. Consiste~ essencial-
mente, na formaçao do homem de carater. A 
educaçao é um processo vital, para o quai con-
correm forças naturais e espirituais, conjugadas 
pela açao consciente do educador e pela vontade 
livre do educando. Niio pode, pois, ser confundida 
com o simples desenvolvirnento ou crescimento 
dos seres vivos, nem com a mera adaptaçao do 
indiv(cfuo ao meio. É atividade criadora, que visa 
a levar o ser humano a realizar as suas potencia-
lidades f/sicas, marais, espirituais e inte/ectuais. 
Nao se reduz à preparaçao para fins exclusiva-
63 
64 Carlos Rodrigues Brandéio 
mente utilité/rios, coma uma profissao, nem para 
desenvolvimento de caracter/sticas parciais da 
personalidade, coma um dom art/stico, mas 
abrange o homem integral, em todos os aspectas 
de seu corpo e de sua alma, ou seja, em toda a 
extensao de sua vida sens/vel, espiritual, inte-
lectual, moral, individual, doméstica e social, 
para eleva-/a, regu/éi-la e aperfeiçoa-la. E processo 
cont/nuo, que começa nas origens do ser humano 
e se estende até à morte." 
Se voltarmos às duas definiçôes de dicionârios 
brasileiros de algumas pâginas atrâs, veremos que 
a da Enciclopédia concorda mais corn a primeira 
do que corn a segunda. Uma enfatiza o que. acon-
tece da pessoa para dentro; a outra o que acontece 
dela para fora, em direçâ'o à sociedade onde vive 
e de que aprende. 
A meio caminho entre um lado e outra, algumas 
propostas lembram que aquela formaçâ'o do 
ser humano, segundo as suas proprias potencia-
lidades e através de seu proprio esforço, é o resul-
tado de um trabalho intencional, deliberado -
aquilo que faz da educaçao a parte mais motivada 
da endoculturaçao, coma eu disse vârias pâginas 
atrâs. Esta açâ'o dirigida ao educando procede 
de um educador, de uma agência de educaçâ'o, ou 
do que existe de educativo no meio sociocultural. 
"Educaçao é um sentido de va!orizaçâ'o individual 
0 que é Educaçéio 
e organizado, variavel em extensâo e profundidade 
para cada indivkiuo e processado pelas riquezas 
culturais." (Kerschensteiner); 
"f a influência deliberada e consciente exercida 
sobre o ser maleavel e inculto, com o prop6sito 
de forma-Io." (Cohn). 
Um pouco mais perto dos que nos esperam 
do outra lado desta aparente historia de "ovo-e-
-galinha", estâ'o alguns estudiosos da educaçâ'o 
que consideram que nâ'o so a pessoa, individual-
mente, mas alguma coisa indicada coma "a civili-
zaçâ'o", "o meio social" ou "a sociedade" deve 
ser o destina do homem educado: 
"Podemos agora definir de modo mais precioso 
o objeto da educaçao: é guiar o homem no desen-
volvimento dinâmico, no curso do quai se consti-
tuirâ coma pessoa humana - dotada 'das armas 
do conhecimento, do poder de julgar e das virtudes 
marais - transmitindo-lhe ao mesmo tempo 
o patrimônio espiritual da naçâ'o e da civilizaçâ'o 
às quais pertence e conservando a herança secular 
das geraçoes." (Maritain); 
"A Educaçiio é a organizaçiio dos recursos biol6-
gicos individuais, e das capacidades de compor-
tamento que tornam o indivkiuo adaptavel ao 
seu meio f/sico ou social." (William James). 
Procuremos refletir um pouco sobre tudo 
65 
' 
66 Carlos Rodrigues Brandiio 
isto. Ao discutir os ideais da educacao entre os 
gregos, Werner Jaeger lembra uma 'coisa muito 
importante. Nao é sempre e nâ'o sâ'o todos os 
pavas e homens que consideram a educaçao 
apenas coma o que vimos até aqui. Na verdade 
esta é uma maneira de "imaginar" caracterlstica 
da nobreza de todos ?S pavas em que ela existiu, 
em todos os tempos. E proprio de elites separadas 
do trabalho produtivo - ou dos intelectuais 
que pensam o mundo par elas, e para elas -
propor coma educaçao a formaçao da persona-
lidade humana através do conselho sistematico 
e da direçao espiritual. 
Esta crftica, do mesmo modo coma algumas 
feitas nos primeiros cap(tulos, aqui, procura 
separar o que a educaçao é, de fato, do que as 
pessoas dizem dela. Jaeger nâ'o entra no mérita 
da veracidade de algumas idéias sobre a educacao. 
Afinal, quem poderia negar que a educacao deve 
servir ao homem, deve servir para educa-10; torna-lo 
melhor, desenvolver nele tudo o que tem, e tudo 
a que tem direito? Ouero insistir em que muitas 
vezes o que se critica em quem apresenta a edu-
caçao, tal coma ela apareceu até aqui, nao é 0 
que foi dito, maso que ficou oculto: a) ou porque 
quem disse nao sabe de onde vem a educacao 
o que ela é em cada mundo real e o que faz; bl o~ 
porque quem disse sabe, mas explica a educacao 
justamente para negar a sua origem, os seus m~ca­
n ismos e os se us usas. Corno é posslvel compreen-
0 que é Educaçiio 
der aigu ma coisa que se passa entre relacoes sociais 
de categorias de homens, que educa tr~nsmitindo 
de uns a outras crenças e valores sociais, que serve 
tanto a igualar quanta a diferenciar as pessoas 
de acordo corn projetas de usas do saber situados 
fora dos sonhos do educador, sem pensa-la dentro 
dos mundos reais onde acontecem as tracas tam-
bém reais entre os homens, verdadeiros homens 
de carne e osso, situados de um lado e do outra 
da educaçao? 
Na verdade, quem descobriu que na prat1ca 
0 "fim da educaçao" sao os interesses da socie-
dade, ou de grupos sociais determinados através 
do saber que forma a consciência que 'pensa o 
mundo e qualifica o trabalho do homem educado 
nâ'o foram fil6sofos do passado ou cientista~ 
sociais de hoje. Esta é a maneira natural dos 
povos primitivos, corn quem estivemos até ha 
pouco, tratarem a educaçao de suas1 crianças, 
mesmo quando eles nâ'o sabem explicar isto corn 
teorias corn pl icadas. 
Os lndios e os camponeses realizam, no modo 
coma ensinam o que é importante para alguém 
aprender, a consciência de que o saber que se 
transmite de um ao outro deve servir de algum 
modo a todos. Mas o que Werner Jaeger diz é que 
justamente nas formaçoes sociais mais desenvol-
vidas, onde par sobre o tr.abalho de muitos aparece 
a elite dominahte de uns poucos, surge corn o 
tempo a idéia de uma educaçao que deve servir 
67 
68 Carlos Rodrigues Brandâo 
a alguns ho mens individualmente, desvinculada 
da idéia de que eles existem dentro de grupos 
ou mundos sociais, e a seu serviço. Esta maneira 
de compreender para que serve a educaçao é 
decorrência de um "esquecimento", ou de um 
ocultamento de que, afinal, par mais louvavel 
que seja, a educaçao é uma pratica social entre 
outras. 
Entre os gregos, vimos que a educaçao dos 
jovens nobres, que viviam do trabalho de escravos 
estrangeiros e que, quando adultos, participavam 
da direçâ'o da cidade, procurava desenvolver 
o corpo e a inteligência para formar homens 
fortes e sabios destinados à defesa e à pal (tica 
da comunidade. 0 que à distância poderia parecer 
a formaçâ'o do ocioso era, na verdade, uma apren-
dizagem feita durante um longo perlodo de ôcio 
nobre (separaçâ'o do trabalho braçal), para a 
formaçâ'o do homem polltico. A educaçao grega 
e, depois, a de Roma preocupavam-se em formar 
o cidadfio e eram, portanto, educaçoes da e para 
a comunidade. 
No mundo ocidental, é depois do advento 
e da difusao do Cristianismo que aparecem idéias 
sobre a educaçâ'o que isolam o saber da sociedade 
e o submetem ao destina individual do cristao. 
0 homem que aprende busca na sabedoria a 
perfeiçâ'o que ajuda à salvaçâ'o da alma. Mas nao 
é o Cristianismo Primitivo quem sugere a "edu-
caçâ'o humanista", de que os cursos de "humani-
0 que é Educaçâo 
dades" que houve no Brasil até ha pouco tempo 
sâ'o o melhor exemplo. Foi necessario que, a partir 
de Roma, o Estado cristianizado e as elites de 
sua sociedade tomassem passe da mensagem 
cristâ' de militância e salvaçâ'o, fazenda dela parte 
de sua ideologia. Tornando-a o repertôrio de slm-
bolos e valores pelas quais representavam.o mundo, 
representavam-se nele e, assim, legitimavam, 
corn as palavras originalmente dirigidas a pobres 
e deserdados, a sua posiçâ'o de domlnio econômico 
e de hegemonia pal îtica sobre eles. 
Foi entâ'opreciso o advento de uma nobreza 
plenamente separada do trabalho produtivo e, 
cada vez mais, até mesmo do trabalho polltico -
entregue nas maos de intelectuais mediadores 
de seus interesses - para que surgisse uma classe 
de gente capaz de representar o mundo quase 
fora dele. Esta elite ociosa e seus intelectuais 
sacerdotes, filôsofos e artistas puderam imaginar 
coma "puras" a vida, a arte, a ciência e até mesmo 
a educaçâ'o. 
Ela começa a representar rea!mente alguma 
coisa (pensa, faz pensar, constrôi sistemas de 
pensamento) sem representar coisa alguma de real; 
sem conseguir explicar mais, para si prôpria e para 
as outras classes, 0 que sao de fato os homens, 
o mundo e as relaçoes concretas entre o mundo 
e os homens. Ora, é a partir deste universo de 
idéias puras que a educaçâ'o afinal é pensada coma 
o exercîcio do educador sobre a alma do educando, 
69 
70 Carlos Rodrigues Brandâo 
corn o prop6sito de purifica-la do mal que existe 
na ignorância do saber que conduz à salvaçifo. 
Da Antigüidade decadente à ldade Média, da 
ldade Média ao Renascimento (um tempo da 
Historia rico em redefiniç6es da idéia de edu-
cacâ'o) e do Renascimento à ldade Maderna, 
toi preciso esperar muitos séculos para que de 
nova os brancos civilizados aprendessem a repen-
sar a educaçâ'o coma os (ndios. E uma nova 
maneira de definir a educaçâ'o coma uma pratica 
social cuja origem e destina sâ'o a sociedade e a 
cultura, foi formulada corn muita clareza pela 
soci61ogo francês Emile Durkheim. 
Ele sacode a poeira de um assunto que s6 
aos poucos foi recolocado na Europa de seu tempo, 
nos ultimos anas do século passado. Se o fim 
da educacâ'o é desenvolver no homem toda a 
perfeiçâ'o ·de que ele é capaz, que "perfeiçâ'o" 
é esta? De onde é que ela procede? Guern a define 
e a quem serve? Par que, afinal, ideais de perfeiçao 
sâ'o tao diversos de uma cultura para outra? É 
falso imaginar uma educaçâ'o que nâ'o parte da 
vida real: da vida tal coma existe e do homem 
tal coma ele é. Ë falso pretender que a educaçâ'o 
trabalhe o corpo e a inteligência de sujeitos soltos, 
desancorados de seu contexto social na cabeça 
do fil6sofo e do educador, e que os aperfeiçoe 
para "si proprios", desenvolvendo ne les o saber 
de valores e qualidades humanas tao idealmente 
universais que apenas exjstem coma imaginaçâ'o 
0 que é Educaçâo 
em toda parte e nâ'o existem coma realidade (coma 
vida concreta, coma trabalho produtivo, coma 
compromisso, coma relaç6es sociais) em parte 
aigu ma. 
0 que existe de fato sâ'o exigências sociais de 
formaçâ'o de tipos concretos de pessoas na e para 
a sociedade. Sâ'o, portanto, modos proprios de 
educar - par isso, diferentes de uma cultura 
para outra - necessarios à vida e à reproduçâ'o 
da ordem de cada tipo de sociedade, em cada 
momento de sua historia. Nâ'o se trata de dizer 
que a educaçâ'o tem, também, de modo abstrato 
e muito amplo, um compromisso corn a "cultura", 
corn a "civilizaçâ'o", ou que ela tem um vago 
"fim social". 0 que ocorre é que ela é inevita-
velmente uma pratica social que, par meio da 
inculcaçâ'o de tipos de saber, reproduz tipos de 
sujeitos sociais. 
"A educaçâ'o é a açiio exercida pelas geraçoes 
adultas sobre as geraçoes que niio se encontram 
ainda preparadas para a vida social; tem par objeto 
suscitar e desenvolver na criança certo nûmero 
de estados f/sicos, intelectuais e marais recla-
mados pela sociedade polt'tica no seu conjunto 
e pela meio especial a que a criança, particular-
mente, se destina." (Durkheim) 
Entre muitas outras, esta é uma maneira socio-
16gica de compreender a educaçâ'o. Depois de 
71 
72 
/ 
Carlos Rodrigues Brandiio 
Durkheim (que, por· sua vez, aprendeu isso corn 
outras cientistas anteriores e, quem sabe?, corn 
alguns lndios) inûmeros soci61ogos, antrop61ogos, 
fil6sofos e educadores começaram a formular 
pontas de vista semelhantes. Nao é que eles tives-
sem a proposta de uma "nova educacâ'o" menas 
abstrata e desancorada do que a "Edu~açâ'~ Huma-
nista" que criticavam. 0 que eles buscaram fazer 
foi esclarecer mais e mais coma a sociedade e a 
cultura sao e funcionam, na realidade. Corno, 
portanto, a educaçâ'o existe dentro delas e funciona 
sob a determinaçao de exigências, princlpios e 
controles sociais. 
'/ 
SOCIEDADE CONTRA ESTADO: 
CLASSE E EDUCAÇÂO 
A idéia de que nâ'o existe coisa alguma de social 
na educaçâ'o; de que, coma a arte, ela é "pura" 
e nâ'o deve ser corrompida por interesses e contro-
les sociais, pode ocultar o interesse polftico de 
usar a educaçâ'o coma uma arma de controle, e 
dizer que ela nao tem nada a ver corh isso. Mas 
o desvendamento de que a educaçao é uma pratica 
social pode ser também feito numa direçao ou 
noutra e, tal coma vimos antes, pode se dividir 
em idéias apostas, situadas de um lado ou do 
outra da questâ'o. 
Vamos por partes, portanto. Até aqui chegamos: 
a educaçao é uma pratica social (coma a saude 
publica, a comunicaçao social, o serviço militar) 
cujo fim é o desenvolvirnento do que na pessoa 
humana pode ser aprendido entre os tipos de 
saber existentes em uma cultura, para a formaçao 
74 
/ 
\. 
Carlos Rodrigues Brandao 
de tipos de sujeitos, de acordo corn as necessi-
dades e exigências de sua sociedade, em um 
momento da historia de seu proprio desenvol-
vimento. Nao procurei inventar uma nova defi-
niçâ'o, porque delas acho que ja ha demais. 
Procurei reunir as idéias correntes entre os que 
concebem a educaçao coma Durkheim. 
Assim, dos dois historiadores da educaçao de 
cujos livras aprendi quase tudo o que disse sobre 
Grécia e Roma, um deles dira o seguinte: 
"Primeiro que tudo, a educaçao nao é uma proprie-
dade individual, mas pertence par essência à comu-
nidade. 0 carater da comunidade imprime-se 
em cada um dos seus membros e é no homem ... 
muito mais que nos animais, fonte de toda a 
açao e de todo o comportamento. Em nenhuma 
parte o inf/uxo da comunidade nos seus membros 
tem maior força que no esforço constante de 
educar, em conformidade corn o seu proprio 
sentir, cada nova geraçao. ",(Werner Jaeger). 
Toda a estrutura da sociedade esta fundada 
sobre codigos sociais de inter-relaçâ'o entre os 
seus membros e entre eles e os de outras socie-
dades. Sao costumes, princ(pios, regras de modos 
de ser às vezes fixa dos em leis escritas ou nâ'o. "A 
educaçao é, assim, o resultado da consciência 
viva duma norma que rege uma comunidade 
humana, quer se trate da famllia, duma classe 
, 
0 que é Educaçao 75 
/ 
ou duma profissâo, quer se trate dum agregado 
mais vasto, coma um grupo étnico ou um Es-
tado." Corno outras praticas sociais constitu-
tivas, a educaçao atua sobre a vida e o crescimento 
da sociedade .em dois sentidos: 1) no desenvol-
vimento de suas forças produtivas; 2) no desen-
volvimento de seus valores culturais. Par outra 
lado, o surgimento de tipos de educaçao e a sua 
evoluçâ'o dependem da presença de fatores sociais 
determinantes e do desenvolvimento deles, de 
suas transformaçëes. A maneira coma os homens 
se organizam para produzir os bens corn que 
reproduzem a vida, a forma de ordem social 
que constroem para conviver, o modo coma 
tipos diferentes de sujeitos ocupam diferentes 
posiçëes sociais, tudo isso determina o repertorio 
de idéias e o conjunto de normas corn que uma 
sociedade rege a sua vida. Determina também 
coma e para quê este ou aquele tipo de educaçao 
é pensado, criado e posta a funcionar. 
Quando sao transformados a "maneira", a 
"forma" e o "modo" de que falei acima, tanto 
as idéias quanta as normas, os sistemas e os méto-
dos de um tipo de educaçao sao modificados. 
Ao fazer a sua cr(tica, Émile Durkheim pergun-
tava a pensadores da educaçao que considerava 1 
ilustres, mas ingênuos: que "perfeiçao" é essa? 
"Mas, que se deve entender pela termo perfeiçao?" 
Ele quer perguntar o seguinte: quem afinal esta-
belece os ideais e os princlpios da educaçao? 
76 Carlos Rodrigues Brandiio 
Uns e outros sao universais? Existiram para todos 
os povos, em todos os tempos,de u ma mesma 
maneira, pelo fato de que é sempre a mesma 
a "essência do homem"? Pode ou deve existir 
uma espécie de "educaçâ"o universal"? Durkheim 
conclui que nâ"o. E conclui que o ponto fraco 
das idéias pedag6gicas que avaliou esta na crença 
ilus6ria (ilus6ria sempre, ou algumas vezes mal-
-intensîonada?) de que ha, ou deveria haver, 
uma "educaçâ'o ideal, perfeita, apropriada a todos 
os homens, indistintamente". 
Até al tudo bem. Assino embaixo. Mas sera 
que nâ'o poderlamos fazer a Durkheim leitor 
a pergunta que ele fez aos outros? Oua~do fal~ 
de sociedade e, mesmo, de sociedades concretas, 
do que esta falando? Que tipo de sociedades 
regidas por que modos e mecanismos interna~ 
de produçâ'o de bens, de serviços, de poder e 
de . idéias entre os seus integrantes? Ele respon-
der.1a corn segurança: "cada uma"; cada tipo de 
soc1edade real, hist6rica, cria e impoe o tipo de 
educaçâ'o de que necessita. E arremataria: 
"Na verdade, porém, cada sociedade, considerada 
em momento determinado de seu desenvolvi-
mento, possui um sistema de educaçiio que se 
impoe ~os indiv/duos de modo geralmente irresis-
t/vel. E uma ilusfio acreditar que podemos educar 
nossos filhos coma queremos . .. Hâ, pois, a cada 
momento, um tipo regulador de educaçiio do quai 
0 que é Educaçiio 77 
niio nos podemos separar sem vivas resistências, 
e que restringem as velocidades dos dissidentes." 
No entanto, o que é "cada sociedade consi-
derada em um momento determinado de seu 
desenvolvimento"? Ë preciso reforçar algumas 
perguntas e fazer outras. Afinal, "eada socie-
dade" existe e funciona como um todo orgânico 
e harmônico, fundado sobre a igualdade entre 
todos e o consenso de todos? Dentro dela, em 
posiçoes especiais de privilégia, de hegemonia 
e de controle sobre outros, nâ'o existirâ'o classes 
sociais capazes de impor uma educaçfio que fazem 
criar e existir? Para seu uso proprio e por sobre 
outras classes e grupos sociais (mais do que "em 
nome deles"), nâ'o ha, em determinadas socie-
dades concretas, classes e grupos, às vezes muito 
minoritarios, que resolvem por sua conta como 
sera e para quê servira a "educaçâ'ID oficial"? 
Ou, perguntando de outra maneira, ja que cada 
tipo de sociedade - a "tribal" de lndios Gê, 
do Brasil Central; a chinesa ap6s a revoluçâ'o 
socialista; a indiana do V século A.C.; a da 
Alemanha medieval ou mesmo a de uma aldeia 
de camponeses, dentro dela; a portuguesa colonia-
l ista do sécu Io XV! 1; a do Brasi 1 "p6s-64" -
inventa e faz a sua educaçâ'o ou as suas educaçoes, 
nos sistemas mais oficiais, mais organizados em 
projetas e programas pedag6gicos, sâ'o pensados 
a partir das idéias fu ndamenta is de todos os tipos 
78 Carlos Rodrigues Brandâo 
de pessoas?_ As mesmas escolas servem ao operario, 
ao engenhe1ro e ao capitalista imobiliario do mes-
mo modo. (como as leis brasileiras de ensino garan-
te_m que s1m e os professores crfticos garantem que 
nao)? Uma educaçâ'o ensina o saber da "comuni-
d~~e nacional" a todos, para os mesmos usos so-
c1a1s, e segundo os mesmos direitos individuais de 
todas as categorias de seus "adu ltos educados"? 
Ora, entre os que colocam "sociedade e cultura" 
no meio da questâ'o da educaçâ'o, alguns pesquisam 
e ~~enas r~conhecem que ela é, na cultura, uma 
prat1ca social de reproduçâ"o de categorias de saber 
através da f?rmaçâ'o de tipos de sujeitos educados. 
Outros profetam e defendem a necessidade deste 
o_u daquele tipo de educaçâ"o para este ou aquele 
t1po de sociedade. 
Entre estes ultimes, um pensamento muito 
corrente hoje em dia é o de que a educacâ'o é um 
dos_ principais meios de realizaçâ'o de 'mudanca 
so_c1al ou, pela menos, um dos recursos de adapta-
çao das pessoas a um "mundo em mudanca". 
Este modo de imaginar tende a ser domin~nte 
atualmente. Mas ele nâ"o fazia sentido para gregos 
e r?~an~s. e nem mesmo para os portugueses 
e m1ss1onanos que tentaram educar nossos antepas-
sados durante a Colônia. 
A idéia de que a educacâ"o nâ"o serve apenas 
à sociedade, ou à pessoa ~a sociedade, mas à 
mudança social e à formaçâ"o conseqüente de 
sujeitos e agentes na/da mudança social, pode 
0 que é Educaçiio 
nâ'o estar escrita de maneira direta nas "leis do 
ensino". A final, as leis quase sempre sao escritas 
por quem pensa que nem elas nem o mundo 
vao mudar um dia. Mas as suas conseqüências 
podem aparecer indiretamente. Por exemplo, 
na "Lei de Diretrizes e Bases da Educaçâ'o Brasi-
leira" (também conhecida como "5692", neste 
mundo onde tudo é numerado), os fins da edu-
caçâ'o acrescentam a formaçao para o trabalho, 
ou enfatizam este objetivo do ato de ensinar, 
mais do que as leis anteriores. 
"O ensino de 1C! e 2<? graus tem par objetivo 
geral proporcionar ao educando a formaçao neces-
sâria ao desenvolvimento de suas potencialidades 
coma e/emento de auto-realizaçao, qualificaçao 
para o trabalho e preparo para o exerc/cio cons-
ciente da cidadania." 
79 
Quando a idéia de educaçao vem associada 
à de adaptaçiio para alguma coisa externa à pessoa, 
e que se transforma, a proposta pode ser formu-
lada assim: "Educaçâ'o é preparaçao da criança 
para uma civilizacâ'o em mudança." (Kilpatrik) 
ou assim: 
"Em uma sociedade dinâmica coma a nossa, s6 
pode ser eficaz uma educaçao para a mudança. 
Esta (educaçao) consiste na formaçao do espkito 
isento de todo dogmatismo, que capacite a pes-
80 Carlos Rodrigues Brandiïo 
soa para elevar-se acima da corrente dos acon-
tecimentos, ao invés de arrastar-se por e!es." 
(Mannheim) 
Um outro nome para a educaçâ'o pode ser até 
mesmo sugerido, quando se constata, por exemplo, 
que o rumo e a velocidade das transformaçoes 
do mundo moderno exigem cada vez mais, de 
todos os homens, uma constante reciclagem 
de conhecimentos e uma continua readaptaçâ'o 
a um mundo que, afinal, ainda é sempre o mesmo 
e ja é sempre um outra. 
"A Educaçao Permanente é uma concepçâ'o dialé-
tica da educaçao, coma um dup!o processo de 
aprofundamento, tanto da experiência pessoal 
quanta da vida social, que se traduz pela parti-
cipaçâ'o efetiva, ativa e responsâvel de cada sujeito 
envolvido, qualquer que seja a etapa de existência 
que esteja vivendoo ... 0 primeiro imperativo 
que deve preencher a Educaçâ'o Permanente 
é a necessidade que todos nos temos de sempre 
aperfeiçoar a nossa formaçao profissiona!. Num 
mundo coma o nosso, em que progridem ciência 
e suas aplicaçoes tecno/6gicas cada dia mais, nao 
se pode admitir que o homem se satisfaça durante 
toda a vida corn o que aprendeu durante uns 
poucos anas, numa época em que estava profun-
damente imaturo. Deve informar-se, documen-
tar-se, aperfeiçoar a sua destreza, de maneira a 
0 que é Educaçiïo 81 
82 Carlos Rodrigues Brandiio 0 que é Educaçiio 
/ 
se tornar mestre da sua praxis. 0 dom(nio de 
uma profissao nao exclui o seu aperfeiçoamento. 
Ao contrario, sera mestre quem continuar apren-
dendo." (Pierre Furter) 
Nao sera estranho que, aqui e ali, a proposta 
de uma educaçao apareça armada do poder de 
realizar, ela pr6pria, o trabalho de transformar 
a sociedade. Ouando este tipo de proposta consi-
dera a educaçao como uma entre outras praticas 
sociais cujo efeito sobre as pessoas cria condicé5es 
necessarias para a realizaçao de transformaÇoes 
indispensaveis, a sugestao é aceitavel e realista. 
Nada se faz entre os homens sem a consciência 
e o trabalho dos homens, e tudo o que tem o 
poder de alterar a qualidade da consciência e 
do trabalho, tem o poder de participar de sua 
praxis e de ser parte dela. No entanto, quando a 
educaçao é imaginada - agora pelo utopista 
social - como o unico ou principal instrumente 
de qualquer tipo de transformaçao de estruturas 
pollticas, econômicas ou culturais, sem que haja 
a lembrança de que ela pr6pria é determinada 
por estas estruturas, estamos diante de pequeno 
acesso de "utopismo pedag6gico". 
"Se educaçao é transformaçao de uma realidade 
de acordo com uma idéia me/hor que possut'mos: 
e se a educaçao s6 pode ser de carater social 
resultara que pedagogiaé a ciência de trans: 
formar a sociedade." (Ortega y Gasset) 
Associar "educaçao" a "mudança" nao é novi-
dade. Tem sido um costume desde pelo menos 
as primeiras décadas do século. Mas s6 um pouco 
mais tarde, quando pollticos e cientistas come-
çaram a chamar a "mudança" de "desenvolvi-
mento" (desenvolvimento social, socioeconômico, 
nacional, regional, de comunidades, etc.), é que foi 
lembrado que a educaçao deveria associar-se a 
ele também. Este foi o momento de uma transiçao 
importante. Antes de se difundirem pelo mundo 
idéias de mudança e de necessidade de mudança 
social, a educaçao era pensada como alguma coisa 
que preserva, que conserva, que resguarda justa-
mente de se mudarem, de se perderem, as tradi-
cé5es os costumes e os val ores de "um povo", 
;,um~ cultura" ou "uma civilizaçao". Antes de se 
inventa rem pof(ticas de desenvolvimento, a edu-
caçao era prescrita como um direito pa pessoa, 
ou como uma exigência da sociedade, mas nunca 
como um investimento. Um investimento como 
outros, como os de saude, transporte e agricultura. 
A educacâ'o deixa finalmente de ser vista como 
um privilégie, um direito apenas, e deixa também 
de ser percebida como um meio apenas de adapta-
çâ'o da pessoa à mudança que se faz sem ela, e 
que apenas a afeta depois de feita. 
Pessoas educadas (qualificadas como "mao-de-
-obra" e motivadas enquanto "sujeitos do proces-
so") sao agentes de mudança, promotores do 
83 
' 
84 Carlos Rodrigues Brandiio O que é Educaçiio 
85 
desenvolvimento, e é para toma-los, mais do que 
cuitas, agentes, que a educaçao deve ser pensada 
e programada. Nao é raro que em alguns palses 
se defenda entâ'o que as propostas basicas da 
educaçao venham quase prontas do Ministério 
do Planejamento para o da Educaçâ'o. 
"A Educaçao é hoje considerada coma um fator de 
mudanças: um dos principais instrumentas de inter-
vençao na rea!idade social corn vistas a garantir a 
evoluçào econômica e a evoluç!Jo sociale dar conti-
nuidade à mudança no sentido desejado . .. 
"Salienta-se, no entanto, um aspecta em que 
a educaç!Jo representa investimento a curto prazo: 
é quando ela desempenha funç!Jo de forma-
çao de mao-de-obra. Ao fado da formaçao da 
personalidade, da preparaçao necessâria de cada 
cidadao para assumir as obrigaçoes sociais e pal/-
a educaçao desempenha a tarefa de preparar 
para o trabalho, e influi substancialmente na 
de novas quadros de mao-de-obra corn 
capacidades técnicas adequadas aos novas proces-
sos produtivos que o desenvo!vimento introduz 
criando novas mercados de traba!ho." (SAGMACS 
- educaçao e planejamento) 
"I nvestimento", 
para o trabalho", 
quadas". . . sao os 
momento em . que 
"mao-de-obra", "preparaçâ'o 
"capacidades técnicas ade-
nomes que denunciam o 
os interesses pol lticos de 
l 
emprego de uma força de trabalho "adequa-
damente qualificada" misturam a educaçâ'o antiga 
da of ici na corn a da escola, reduzem o seu compro-
misso aristocrata corn a "pura" formaçao da 
personalidade e inscrevem o ato de educar entre 
as praticas pol ltico-econômicas das "arrancadas 
para o desenvolvimento". Arrancadas que, nas 
sociedades capitalistas sao de modo geral estra-
tégias de reorganizaçâ'o de toda a vida soci~I, 
de acordo corn projetas e interesses de reproduçao 
do capital. De multiplicaçâ'o dos ganhos das em-
presas capitalistas. 
Esta é a crftica que tem sida feita por cientistas 
e educadores que, sem deixarem de reconhecer 
corn Durkheim que a educaçao existe·· na socie-
dade, dentro da cultura, procuram compreender 
coma ela existe al e sob que condiçoes é prati-
cada contra o homem ou a seu favor. 
Ora às veses mais util do que comprar e discu-
tir o ~onteudo de estilos diferentes de definiçoes 
ou propostas de tipos de educaçâ'o, é procurar 
ver de onde eles vêm. Quem diz, em nome de 
quem e para quê? 
A variaçâ'o da maneira coma o triângulo edu-
caçâ'o-ensino-escola tem sido formulado no Brasil 
pelas pessoas que possuam o poder direto ou 
indireto de determinar como ele vai existir, da 
o que pensar. Até ha alguns anos atras o universo 
da educacâ'o estava dividido por aqui tal como 
na Gréci~ e em Roma, ha muitos séculos. As 
86 
/ 
Carlos Rodrigues Brandâo 
crianças filhas de pais "das boas famllias" iam 
às escolas, mesmo que por poucos anos. As escolas 
eram particulares, "abertas" por professores 
avulsos ou pelas ordens religiosas. Eram pagas, 
aigu mas custavam caro e as poucas crianças pobres 
que aprendiam "de graça" aprendiam nos orfa-
natos ou nos anexos dos colégios religiosos. 
Os escravos e os filhos dos deserdados da for-
tuna - lavradores livres, artistas pobres, artesâos -
aprendiam "no offcio". Rara vez um deles alisava 
corn o traseiro magro o banco de madeira de 
alguma escola, razâ'o por que o pals tinha, até ha 
poucos anas, um dos maiores Indices de analfa-
betismo em todo o mundo. 
Havia, portanto, duas educaçoes em curso. 
Uma era a da escola, destinada aos filhos das 
"gentes de bem". Ali, fora o ensino de primeiras 
letras, havia cursos sempre nâ'o profissional izantes, 
que ensinavam Latim, Grego, Literatura e Mûsica 
para os que chegavam até depois dos estudos 
primarios. Mesmo nas três primeiras décadas 
deste século, até entre os mais ricos eram raras 
as pessoas que faziam algum curso superior. Havia 
poucas faculdades isoladas e a nossa universidade 
mais antiga, a de Sâo Paulo, nâ'o tem ainda 50 anas. 
Outra era a da oficina, misturada corn a da 
vida, destinada pelas ossos do off cio aos f ilhos 
"da pobreza". Analfabetos "de pai e mâ'e", mas 
excelentes lavradores, mi neradores, pedreiros, 
carapinas, ourives, ferreiro.s, estes homens "rudes", 
0 que é Educaçiio 
r 
porque "sem cultura", de acordo corn a visâo 
das elites, mas sabios do saber que faz o trabalho 
prodÙtivo, fizeram a riqueza e as obras do pals 
e de cada uma de suas cidades. 
"'Mestre carapina, conhecido na historia da cidade, 
queria dizer carpinteiro, mas sua atividade nao 
se circunscrevia apenas a este of/cio. Eram enge-
nheiros praticos: estes escravos calculavam ·a 
construçao de um sobrado e o constru/am. lsto 
ocorreu até a metade do século passado corn 
sobrados que chegam até nossos dias e foram 
constru /dos por estes engenheiros (toda a parte 
de taipa, armaçao do telhado de grande dimen-
sao), sendo que os engenheiros graduados s6 
chegavam na fase final para terminar a construçiio. 
A velha lgreja do Carma foi feita s6 por 'mestres 
carapinas', coma muitos outras prédios cujos 
construtores podem ser identificados ainda hoje." 
(Celso Maria de Mello Pupo, sobre a cidade de 
Campinas, em Sao Paulo) 
Nas prime iras décadas deste século, pol lticos 
e educadores liberais trouxeram idéias novas para 
a educaçâ'o no pals. Entre outras coisas eles come-
çaram a falar de uma escola mais dirigida à vida 
de todo dia e mais estendida a todas as pessoas, 
ricas ou pobres. A "luta pela democratizaçâ'o 
do ensino" resultou na escola pûblica. Resultou 
no reconhecimento pol ltico do direito de estudar 
87 
' 
89 
88 Carlos Rodrigues Brandfi~ 0 que é Educaçâo 
( 
para todas as pessoas atravé 
de ensino leigo oferecid 1 s de escolas gratuitas, 
H, '. 0 pe o governo 
a quem d1ga que isto foi o . 
confronta entre "l"b . resultado de um 
1 era1s" e " 
na polltica, um confronta . co~servadores" 
da educaçâ'o. De um lado f~ue invad1u a questao 
em nome das elites a , l?aram o~ ~ue falavam 
acostumadas a padr- grarias trad1c1onalistas e 
pol ftico. De outra ~ae~o u rapassados de domînio 
em nome das novas elit~~aram. os. que falavam 
a novas tempos e p bl cap1tal1stas, atentas 
portas do mundo e d r~ er:ias que batiam nas 
eu quero ressaltar , o ras1I. No entanto, o que 
dores liberais - ale qued esses polîticos e educa-
b 
. guns eles sem du .d I' . ! 
e em-intencionados _ VI a uc1dos . 
uma educacâ'o voltad ao pregarem idéias de 
· a para a vida d 
o progressa, a democracia . , a mu ança, i 
tempo o imaginario dem~c~~?uz1am ao mesmo r 
e, por outra lado o . ico de seu tempo 
- , projeta I'· 
aos interesses de no d po 1t1co que servia 
nomia. E tal coma v~s otnos do poder e da eco-
d . ' con eceu em out 
a soc1edade brasileira as . - ras setores 
para a .educacâ'o prop1· c-' inovaçoes pro postas · 1aram nov t. 
pol fticos de todo o os ipos de usos , aparato ped , · 
do-o a realidade de agog1co, adaptan-
1 
novas tempos e 
os de controle d , . a novas mode-
preparacâ'o de "qo edxerc1c10 da cidadania e de 
· ua ros" 1 ·t· 
trabalho das f 'b . qua 1 icados para o 
. a ricas. lndust i . 
o capital brasileiro e d . ras ~ue pr1meiro 
comecaram a semear p 1' e~o1s, o internacional 
· e o pais. ' 
\... ______ ___.1.1 
Corno tipos de intelectuais (educadores, fil6-
sofos, legisladores, cientistas sociais) const"1tu f dos 
e sustentados, direta ou indiretamente, pelas novas 
donos do poder, quase todos os militantes de 
uma nova educaçao souberam lutar corn entu-
siasmo por toma-la mais aberta e democratica 
por dentro e por fora, sem saber muitas vezes 
que as suas idéias apenas consolidavam outras 
projetas pol f ticos para a educaçâ'o. E les subs-
titu fa m outras intelectuais, aqueles cujas idéias 
pedag6gicas serviram aos interesses pol fticos 
dominantes de outras tempos, e que nao tinham 
mais lugar nem poder, porque eram as idéias 
que traduziam os interesses de preservaçâ'o de 
um tipo de ordem social inadequada no Brasil 
diante das mudanças aos poucos havidas na~ 
relaç5es de produçâ'o de bens e de poder. 
\. 
Por uma porta os filhos dos pobres começam 
a entrar nas escolas publicas. Por outra o pafs 
ingressa enfim em tempos de transferência do 
capital da agricultura para a indûstria, e de poder 
e pessoas do campo para a cidade. Entâ'o pol (ticos 
e educadores começam a chamar a atençao para a 
evidência de que, mesmo nas escolas pûblicas, o 
ensino escolar era inadequado. Nao servia para 
preparar o cidadao para a vida nem para preparar 
o trabalhador para o trabalho, em qualquer um 
dos seus nfveis. Quando as exigências de ordem 
e trabalho do capital redefiniram aos poucos 
a vida e o trabalho, a idéia de que, além de uma 
90 Carlos Rodrigues Brandâo 
vaga "personalidade do educando", a educaçâ'o 
tinha compromissos para corn a vida social e o 
traba!ho produtivo passou a figurar entre leis 
e projetas de escolarizaçâ'o no pals. 
Este progressivo ingresso da criança pobre 
nas salas das escolas, associado a uma redefiniçâ'o 
do ensino escolar em direçâ'o ao trabalho produ-
tivo, nâ'o fez mais do que trazer para dentro 
dos muras do colégio a divisâ'o anterior entre o 
aprender-na-oficina para o trabalho suba/terno 
e o aprender-na-escola para o trabalho dominante. 
Algumas pesquisas de soci61ogos americanos, 
realizadas desde a década de 50, confirmam que, 
mesmo nos Estados Unidos, o filho do operârio 
estuda para ser o operario que acaba sendo, e 
o filho do médico para ser médico ou engenheiro. 
Apesar de ser, também lâ, um projeta te6rico 
de reproduçâ'o da igualdade, a educaçâ'o da socie-
dade capitalista avançada reproduz na moita e 
consagra a desigualdade social, sem esquecer 
de fazer a larde em festa de formatura quando 
algum filho de operârio consegue sair formado 
da Faculdade de Engenharia. 
Em um dos mais importantes estudos recentes 
sobre o assunto, dois franceses, Christian Baudelot 
e Roger Establet, demonstram que a escola capi-
talista francesa superpôe, sobre o sistema oficial 
de ensino - aquele que é proclamado coma demo-
craticamente aberto a todos - uma divisao entre 
duas redes "heterogêneas. . . apostas. . . antagô-
0 que é Educaçâo 
nicas". E claro que esta oposiçâ'o real, que existe 
sob uma unidade proclamada, nâ'o é oficialmente 
aceita .. Nâ'o é reconhecida coma existente e deter-
minante do sistema pedag6gico francês pelas seus 
ide61ogos. Mas é através do que separa e de coma 
separa quem entra e quem sai das escolas que a 
educaçâ'o capitalista cumpre a sua funcâ'o de 
reproduzir e consagrar a desigualdade, afi~mando 
que existe coma um instrumenta democrâtico 
de produçâ'o da igualdade social através do acesso 
ao saber. 
Uma rede é a de tipo PP, primârio-profissiona/ 
limite dos estudos para os filhos do povo desti~ 
nados, também par ela, aos padroes do trabalho 
operario. Outra rede é a de tipo SS, secundârio-
-superior, destinada aos filhos dos ricos enviados 
também par ela, às pontes-de-comando d'o trabalh~ 
"superior". 
Entâ'o, esta educaçâ'o que incorpora o povo 
ao ensino oficial, que arranca o menino proletârio 
da oficina e o deseja pelo menas par alguns anas 
na escola, sera a educaçâ'o que serve a ele? Oue 
serve pela menas também a ele? 
Este é o momento de voltarmos juntos, leitor, 
a algumas pâginas do comeco desta conversa 
sobre ensinar-e-aprender. 0 tipo de formacao 
social onde n6s vivemos nâ'o é coma o de u'ma 
pequena aldeia tribal, embora haja muitas delas 
em nosso mundo. Nao é sequer, coma na Grécia, 
de onde saiu o modela de nossa educacao o 
' ' 
91 
92 
r 
Carlos Rodrigues Brandfio 
lugar da polis, onde pelo menos nos melhores 
tempos vigora a democracia de todos os cidadâ'os 
livres, mesmo que ela seja sustentada pelo traba-
lho dos escravos. Vivemos aqui, hoje, dentra de 
uma ordem social regida por um sistema amplo 
e muito complexa de relaçëes de produçâ:o entre 
tipos de meios e pradutores, que se costuma 
chamar de modo de produçao capitalista. Embora 
passa ser fatigante e parecer agressivo, é muito 
pouco real pensar, seja a educaçao, seja quase 
tudo o mais que acontece por aqui, sem levar 
em conta que sâ'o tipos de tracas regidos pela 
oposiçâ'o entre o capitale o trabalho. 
Ora, por toda parte, em sociedades como a 
nossa, grupos nacionais ou estrangeiras, que 
repartem entre si a prapriedade e o contrale 
direto dos meios de praduçao dos bens de que 
se nutrem as pessoas e seu mundo, concentram 
entre si o poder de constituîrem, em seu praveito, 
o tipo de Estado que, por sua vez, repraduz ser-
vicos e normas de segurança, de propriedade, 
d~ direito, de saûde e até de educaçâ'o, serviços 
e normas que servem em conjunto para manter 
coesa e, se possîvel, em relativa paz a ordem 
social de que se nutre o capita 1, ou seja, aqu~la 
ordem em que ele se multiplica. 
Esta é uma afirmaçao comum hoje em dia entre 
os que pensam sobre a educaçâ'o sem se iludirem 
corn as condiçëes de sua existência real. E também 
uma cr(tica que se confirma a todo momento, 
0 que é Educaçfio 
r 
inclusive por meio de dadas estatlsticos. Ela nao 
vale s6 para um pals de economia pobre e depen-
dente como o nosso, situado, como diriam os 
economista:., "na periferia do sistema capitalista". 
Vale também para os pafses de economia desen-
volvida, os da "metr6pole" do sistema. 
Em um estudo sobre "a educaçâ'o como processo 
social", o norte-americano Wilbur Braokover 
concluiu que em seu pais a educaçâ'o: a) tem o seu 
controle situado em mâ'os "de elementos conserva-
dores da sociedade"; b) é dirigida de modo a 
impedir mudanças significativas, "exceto nas areas 
em que os grupos dominantes desejam a mudança"; 
c) na melhor das hip6teses, pode atuar como 
um agente interna de mudanças sociais, nao como 
um agente externo, ou seja, capaz de pravocar 
por sua conta mudanças significativas; d) nâ'o é 
acreditada como criadora de um possîvel "mundo 
melhor", a nâ'o ser quando "outras forças também 
operam como agências de mudanças". _ 
Dentra de um tipo de ordem social assim divi-
dida, a educaçâ'o (como tantas outras coisas da 
vida e dos sonhos de todos os homens) perde 
a sua dimensâ'o de um bem de usa e ganha a de 
um bem de troca. Ela nâ'o vale mais pelo que é 
e pelo que representa para as pessoas. Nâ'o é mais 
um dom do fazer que existe no ensinar o saber 
que é um outra dom de todos e que a todos 
serve. A educaçâ'o vale como um bem de mercado, 
e por isso é paga e às vezes custa caro. Vale como 
93 
94 Carlos Rodrigues Brandiio 
um instrumenta cujos segredos se programam 
nos gabinetes onde estâ'o os emissarios dos interme-
diarios dos interesses pol (ticos postas sobre a edu-caçâ'o. Esta é a sua dupla dimensâ'o de valor 
capitalista:a) valer coma alguma coisa cuja passe se 
detém para usa prôprio ou de grupos reduzidos, 
que se vende e compra; b) valer coma um instru-
menta de controle das pessoas, das classes sociais 
subalternas, pela poder de difusâ'o das idéias de 
quem controla o seu exerclcio. 
Entâ'o, o que parece inacreditavel faz parte 
da prôpria lôgica do modo coma a educaçâ'o 
existe na sociedade desigual. Ouando pensada 
coma uma "filosofia" ou uma "pal (tica de edu-
caçâ'o", ela se apresenta juridicamente coma 
um bem de todos, de que o estado assume a 
responsabilidade de distribuiçâ'o em nome de 
todos. Mas sequer as pessoas a quem a educaçâ'o 
serve, em princlpio, sâ'o de algum môdo consul-
tadas sobre coma ela deveria ser. A educaçâ'o 
que chega à favela, chega pronta na escola, no 
livra e na liçâ'o. Os pais favelados dos alunas 
sâ'o convocados a matricular os seus filhos, coma 
se aquilo fosse um posta de recrutamento. Nâ'o 
sâ'o convocados, par exemplo, a debaterem corn 
os professores coma eles pensam que a escola 
da favela poderia ser uma verdadeira agência 
de serviços à sua gente. Mesmo que fossem, as 
suas idéias par certo nâ'o sairiam do caderno 
de anotaç5es da diretoria. Mas nâ'o sâ'o sô os 
. 0 que é Educaçao 95 
A autoridade do mestre na educaçao dita democrdtica 
96 
/ 
Carlos Rodrigues Brandâo 
pais e as crianças faveladas os que nao têm direitos 
de pensar na educaçao da favela. Mesmo os cida-
daos ricos e letrados nao tem poder algum sobre as 
idéias que determinam a educaçao de seus filhos, 
e a imensa massa dos proprio educadores da linha 
de frente do trabalho pedag6gico (professores, 
diretores de escola, orientadores, supervisores 
educacionais) têm o poder do exerclcio da repro-
duçao das idéias prontas sobre a educaçao e dos 
conteudos impostos à educaçao. Mas nao têm nem 
o direito nem o poder de participarem das decisoes 
pal (tico-pedag6gicas sobre a educaçao que prati-
cam. Elas estao reservadas aos donos do poder 
polftico e às pequenas contrarias de intelectuais 
constitu îdas coma seus porta-vozes pedag6gicos. 
Poucos espaças de trabalho social sao hoje, tao 
pouco comunitarios e democratizados entre 
os seus diferentes praticantes, coma a educaçao. 
E, em qualquer tipo de ordem social, quanta 
mais a educaçao autoritaria e classicista é expressao 
de um poder autoritario de uma sociedade classista, 
tanto mais ela procura apresentar-se coma uma 
pratica humanamente leg(tima, exercida em nome 
de leis legltimas e "para o bem de todos". A 
ideologia que fala através das leis, decretos e 
projetas da educaçao autoritaria nega acima de 
tudo que ela seja uma pedagogia contra o ho-
mem - contra a verdadeira liberdade do homem 
através do saber, liberdade que existe através 
da verdadeira igualdade entre os homens. 
0 que é Educaçâo 
Por isso ha "leis do ensino" que afirmam corn 
fé de oHcio os valores de uma suposta democracia 
feita através da educaçao, e que é a alma dos 
conteudos de seu ensîno. Estas afîrmaçoes te6rîcas 
ocultam o fato real de que o exerclcio desta 
educacao consagra a desîgualdade que deveria 
destru.îr. Afîrmar coma idéia o que nega coma 
pratica é o que move o mecanîsmo da educaçao 
autorîtaria na socîedade desîgual. 
97 
A ESPERANÇA NA EDUCAÇÂO 
Se a educaçâ'o é determinada fora do poder 
de controlè comunitârio dos seus praticantes, 
educandos e educadores diretos, par que parti-
cipar dela, da educaçâ'o que existe no sistema 
escolar criado e controlado par um sistema pal 1-
tico dominante? Se na sociedade desigual ela 
reproduz e consagra a desigualdade social, deixan-
do no limite inferior de seu mundo os que sâ'o para 
ficar no limite inferior do mundo do trabalho 
(os operarios e filhos de operârios), e permitindo 
que minorias reduzidas cheguem ao seu limite 
superior, por que acreditar ainda na educaçâ'o? 
Se ela pensa e faz pensarem o aposta do que é, 
na prâtica do seu dia a dia, par que nâ'o forçar 
o poder de pensar e colocar em prâtica uma outra 
educaçâ'o? 
A resposta mais simple,s é: "porque a educaçâ'o 
0 que é Educaçiio 
é inevitavel". Uma outra, melhor seria: "porque 
a educacâ'o sobrevive aos sistemas e, se em um 
ela serve. à reproduçâ'o da desigualdade e à difusâ'o 
de idéias que legitimam a opressâ'o, em outra pode 
servir à criaçâ'o da igualdade entre os homens 
e à pregaçâ'o da liberdade". Uma outra ainda pode-
ria ser: "porque a educaçâ'o existe de mais modos 
do que se pensa e, aqui mesmo, alguns deles 
podem servir ao trabalho de construir um outra 
tipo de mundo". 
"Rei<l'éntar a educaçâ'o" é uma expressâ'o cara 
a Paulo Freire e aos seus companheiros do lnstituto 
de Desenvolvimento e Açâ'o Cultural. De algum 
modo eles a aprenderam na Africa, trabalhando 
coma educadores junto a educadores de paîses 
coma a Guiné-Bissau e as ilhas de Sâ'o Tomé 
e Pr(ncipe, que se haviam tornado independentes 
de Portugal e tratavam de reinventar, mais do que 
sô a educaçâ'o, a sua prôpria vida social. 0 mais 
importante nesta palavra, "reinventar", é a idéia 
de que a educaçâ'o é uma invençâ'o humana e, 
se em algum lugar foi feita um dia de um modo, 
pode ser mais adiante refeita de outra, diferente, 
diverso, até oposto. Muitas vezes um dos esforços 
mais persistentes em Paulo Freire é um dos menos 
lembrados. Ao fazer a crltica da educaçâ'o capi-
talista, que ara chamou também de "educaçâ'o 
bancâria'', ora de "educaçâ'o do opressor", ele 
sempre quis desarmâ-la da idéia de que ela é maior 
do que o homem. De que as pessoas sâ'o um pro-
99 
100 Carlos Rodrigues Brandiio 
duto da educaçao, sem que ela mesma seja uma 
invençâ'o das pessoas, em suas culturas, vivendo 
as suas vidas. Ele sempre quis livrar a educaçâ'o de 
ser um fetiche. De ser pensada como uma reali-
dade supra-humana e, par isso, imutavel 
e assirn por diante. Ao contrario do que acontece 
corn os deuses, para se crer na é preciso 
primeiro dessacraliza-la. É acreditar que, 
antes, deterrninados tipos de homens criam deter-
minados tipas de para que, 
ela recrie determinados de homens. 
os que se interessarn por fazer da 
de seu poder autoritario tornam-na 
e o educador, "sacerdote". Para que n 
levante um gesto de cr(tica contra ela e, 
dela, aa poder de onde procede. 
Por isso, muitas paginas atras comecei falanda 
sobre ensinar-e-aprender como a ma coisa que 
começa corn os bichas sabe corn as plantas, 
corn os seres niverso?) e que, entre 
existe par toda parte. Procurei 
r a visao estreita de que a educaçâ'o se 
confunde corn a escolarizaçao e se encontra s6 
no que é "forma "oficial", "programado", 
, Se em algumas pagi-
nas falei dela como um entre outroc: instrumentas 
de desigualdade e alienaçao, em outras imaginei-a 
como uma aventura humana. 1 
A educaçâ'o existe em toda parte e faz parte 1 
dela existir entre opostos. 0 que vimos juntos, J 
0 que é Educaçiio 
Nas "zonas libertadas" durante as lutas contra o colonia-
lismo, uma escola na Guiné-Bissau. 
leitor, acontecer na Grécia, repete-se mil vezes 
em mil tempos de outras mundos sociais. Entre 
101 
1 
102 Carlos Rodrigues Brandiio 
sujeitos igualados pela trabalho comum e o saber 
comunitario, também a educaçâ'o pertence do 
mesmo modo a todos e, se existe diferente para 
alguém, é para especializar, para o usa de todos, 
o seu saber e o seu trabalho. Mais do que poder, 
portanto, ela atribui compromissos entre as 
pessoas. 
Ouando o fruto do trabalho acumula os bens 
que dividem o trabalho, a sociedade inventa 
a passe e o poder que separa os homens entre 
categorias de sujeitos socialmente desiguais. A 
passe e o poder dividem também o saber entre os 
que sabem e os que nao sabem. Dividem o trabalho 
de ensinar tipos de saber a tipos de sujeitos e 
criam, para o seu usa, categorias de trabalhadores 
do saber-e-do-ensino. 
É a partir da( que a educaçâ'o aparece coma 
propriedade, coma sistema e coma esco!a. O 
controle sobre o saber se faz em boa medida 
através do controle sobre o quê se ensina e a 
quem seensina; de modo que, através da educacao 
erudita, da educaçâ'o de elites ou da educa~ao 
"oficial", o saber oficialmente transforma-se ~m 
instrumenta pol(tico de poder. Ele abandona 
a communitas de que fez parte um dia e ingressa 
na estrutura dos aparatos de controle. 0 "processo 
grego" se repete entâ'o: a educaçâ'o da comu-
nidade, a escola, a oposiçâ'o entre a educaçâ'o-de-
-educar e a educaçao-de-instruir, a passagem da 
aprendizagem coletiva para o ensino particular, 
0 que é Educaçiïo 
r 
o controle do Estado. Em primeiro lugar, em 
algum tempo ela existe difusa no meio social 
de que todos participam e é ativamente exercida 
nos diferentes c(rculos naturais da sociedade: 
a famîlia, o cla, o grupo de idade, o grupo de 
socius. Mais adiante a educaçao especializa-se 
sob a égide da escola, rnas a escola particular 
do mestre avulso ainda é uma extensao da socie-
dade civil. Mais tarde ainda, a pr6pria educaçao 
escolar cai sob o poder de decisao do Estado 
que, quando autoritario e classista, exerce a edu-
caçao para o controle da sociedade civil, da comu-
n idade de todos. 
Onde surgem interesses desiguais e, depois, 
antagônicos, o processo educativo, que era uni-
tario, torna-se partido, depois, imposto. Ha edu-
caç6es desiguais para classes desiguais; ha interesses 
divergentes sobre a educaçâ'o, ha contrai adores. 
Grupos desiguais nao s6 participam de~igualmente 
da educaçâ'o - dos nobres, dos funcionarios, 
dos artesaos - coma sao também par ela desti-
nados desigualmente ao trabalho: para dirigir, 
para executar, para produzir. 
Mas, assim coma a vida é maior que a forma, 
a educ.açao é maior que o controle formai sobre 
a educaçâ'o. Alguns pesquisadores têm descoberto 
hoje o que existe ha milênios. Par toda parte 
as classes subalternas aprenderam a criar e recriar 
uma cultura de classe - mesmo quando aprovei-
tando muitos elementos dominantes que lhes 
103 
104 Carlos Rodrigues Brandâo 
/ 
foram impostos como idéias ou como praticas -
e também formas pr6prias de educaçao do povo. 
As oficinas de que falei aqui e ali sâ'o um exemplo 
que vem da antigüidade até nossos dias. Mas podem 
nao ser o melhor exemplo. 
0 que existe na verdade nas comunidades de 
subalternos é a preservaçâ'o de tipos de saber comu-
nitarios e de meios comunitarios de sua transfe-
rência de uma geraçâ'o para outra. Corno sempre 
se faz a historia da educaçâ'o erudita e formai 
quando se discute o que é educaçao, sempre se 
deixa de lado este seu outra fado. À margem 
da vida dos dominantes, dos escravos aos boias-
-frias de hoje, os subalternos souberam criar, 
dentro dos limites estreitos em que sempre lhes 
foi permitido "criar'' alguma coisa sua, os seus 
modos proprios de sa ber, de viver e de sa ber. 
Eles inventaram os seus codigos de tracas no 
interior da classe e entre classes. 
Sempre que posslvel, criaram formas peculiares 
de solidariedade para dentro da classe, e de resis-
tência e manipulaçâ'o para fora dela. Elaboraram 
as suas crenças e valores de representaçao do 
mundo, mesmo quando observando a escrita 
da ideologia dos seus senhores. Constru lram estilos 
e tecnologias rusticas dirigidos aos seus usas 
do cotidiano. lnventaram rituais sagrados e profa-
nas. Tuda isso a que se da o nome de "Cultura 
Popular", e que às vezes se vê da academia como 
um amontoado de coisas pitorescas, faz parte · . 
. 
0 que é Educaçâo 
/ 
de sistemas populares de vida e de representaçao 
da vida, e tem uma logica e densidade de que 
apenas levantamos o primeiro véu, depois de 
tantas pesquisas. 
Pois todo este trabalho tradicional de classe 
que sustenta um modo proprio de vida subalterna 
é sustentado por formas proprias e muitas vezes 
popularmente muito complexas de saber. Ë susten-
tado também par sistemas proprios de repro-
duçâ'o do sa ber popular, que impl icam nâ'o apenas 
em relaçoes simples, como as de um pai lavrador 
corn um filho aprendiz, mas também em redes 
e estruturas pedagogicas de que desconhecemos 
quase tudo. lsto é evidente em muitas situaçoes: 
na Capoeira da Bahia, nas confrarias populares 
de Folioes de Santos Reis, numa quadrilha de 
pivetes ou numa equipe rustica de construtores 
de casas. 
Estes modos proprios de uma edutaçao dos 
subalternos têm um teor polftico de que pouco 
se suspeita. Assim coma a educaçao do sistema 
dominante possui o valor polftico dos serviços 
que presta aos que a controlam, enquanto ensina 
desigualmente aos que a recebem, assim também 
as formas proprias de educaçâ'o do povo servem 
a ele coma redes de resistência a uma plena invasâ'o 
da educaçâ'o e do saber "de fora da classe". 
A propria maneira como uma populaçâ'o de 
favelados se relaciona corn a escola pode ser um 
bom exemplo disso. Ouando ha escola publica 
105 
106 
/ 
Carlos Rodrigues Brandiio 
na favela, os pais mandam os filhos para ela. 
Ouando nâ'o ha, as "comissoes de bairro" lutam 
para que haja. Mas quem envia os filhos nao se 
compromete corn a escola. Os esforços de profes-
sores e diretores para que haja um maior inter-
câmbio entre "a escola" e "a comunidade" resul-
tam quase sempre em fracassa. Ouanâo em alguma 
favela a coisa da resultado, às vezes 0 secretario 
da educaçâ'o vai visitar e, se posslvel, leva a TV 
Globo. 0 descompromisso dos adultos para corn 
a escola pûblica nâ'o é devido à falta de tempo. 
Muitos destes pais gastam o corpo, o tempo e o 
dinheiro por meses a fio nos preparos do "bloco 
do bairro", ou da "escola de samba". Eles fazem 
assim porque tratam a escola "do governo" coma 
tratam as suas outras agências: o posto de saûde, 
a delegacia, a agência de bem-estar social. Tratam 
coma locais para serviços de emergência e, ao 
mesmo tempo, como postas invasores de um tipo 
de domlnio de classe indesejavel. Se tratam a 
educaçâ'o dos seus filhos coma coisa que se passa 
"no mundo dos brancos", é porque têm também 
as suas formas pr6prias, tradicionais, de repro-
duçâ'o do saber. Por isso tratam o "bloco" e a 
"escola de samba" coma coisa sua, de seu mundo. 
Sem o saber que existe na fala, mas cheios do 
saber que existe na pratica, os subalternos criam 
e recriam a sua pr6pria educaçâ'o. E ela nâ'o existe 
s6 para difundir o saber, mas para reforçar o 
resistir. Alguns estudos de antrop61ogos franceses 
, 
0 que é Educaçâo 107 
na Âfrica, confirmados por outras feitos, por 
brasileiros, aqui no Brasil, demonstram coma 
existe uma sabia arma de resistência popular 
justamente naquilo que nos acostumamos a despre-
zar, por ver coma "tradicîonal", "atrasado", 
"primitivo". A aparente "primitividade" do pobre 
contra a invasâ'o sobre ele da "modernidade" 
do senhor é um meio popular avançado de lutar 
por manter e recriar uma identidade P'.6pria 
de subalterno (de lndio, de negro, de colon1zado, 
de escravo, de camponês), de manter o seu proprio 
saber e as suas pr6prias redes de educaçâ'o. 
Quando em alguma parte setores populares 
da populaçâ'o começam a descobrir formas novas 
de luta e resistência, eles redescobrem também 
velhas e novas formas de "atualizar" o seu saber, 
de torna-lo orgânico. Criam por sua conta e risco, 
ou corn a ajuda de agentes-educadores eruditos, 
outras formas de associaçao, coma os 'sindicatos, 
os movimentos populares, as associaçoes de mora-
dores. Estes grupos, que geram outras tipos de 
mestres entre as pessoas do povo, geram também 
outras situacoes vivas de aprendizagem popular. 
Eu nao tenho dûvidas em afirmar que é entre 
as formas novas de particîpaçâ'o popular, nas 
brechas da luta polltica, que, hoje em dia, surgem 
as experiências mais inovadoras de educaçao no 
Brasil. Os professores tradicionais e os tecnocratas 
da pedagogia sâ'o cegos para elas, mas é ali que 
as propostas mais avançadas de "educaçao e vida", 
108 Carlos Rodrigues Brandao 0 que é Educaçâo 109 
"educaçâ'o na prâtica", etc., sâ'o criadas e testadas. 
Mais. do que isso, em algumas partes do pals 
c.omunidades populares tentam inventar agora 
ttpos de esco!as comunitéirias que antecipariam, 
em uma plena democracia,o exerclcio de uma 
"educaçâ'o como prâtica da liberdade". Aquela 
que, sendo sustentada economicamente pelo poder 
publico, fosse polltica e pedagogicamente contro-
lada pelas comunidades onde se exercesse. 
De outra parte, mesmo nos setores eruditos 
da educaçâ'o oficial, é preciso compreender que 
ela existe em muito mais situaçoes do que dentro 
do sistema e na sala de aula. Ao lado das ino-
vaçoes pedag6gicas que provocam a reinvencâ'o 
do trabalho escolar, a mesma relaçao de opostos 
sobreexiste entre a formalidade da estrutura 
e a permanente oposiçao que fazem a ela as inu-
meras pequenas communitas de sujeitos envol-
vidos, de um modo ou de outra, corn o sistema 
de educaçâ'o. 
De um lado, os proprios professores que traba-
lham coma educadores (coma sujeitos de suas 
diversas categorias de especialistas), nas escolas 
colégios e universidades, aprendem a se organiza; 
também coma categorias pollticas e profissionais 
de traba/hadores da educaçao. As associacoes 
de tipos de especialistas do ensino e, mais ai~da 
as associaçoes de categorias de docentes sâ'o ~ 
resultado do desenvolvimento da consciência 
pol ltica do educador. 
De outra lado, os alunas criam e recriam as 
unidades de organizaçâ'o, os seus grêmios, 
pos de arte e cultura. Ouem poderia esquecer 
as experiências de Educaçao Popular e de 
Cuttura Popular no Brasil foram iniciadas dentro 
primitivos serviços de Extensao Universitaria, 
coma o da Universidade Federal de Pernambuco 
onde nasceu o Método Io Freire de Alfabeti'. 
zaçâ'o, ou coma os Movimentos de Cultura Popular 
e os Centras Populares de Cultura, vinculados 
ao movimento estudantil e às suas unidades de 
podem enxergar 
apenas dentro dos sisternas 
(que, al até 
ao certo se é uma c1encia, uma 
lizada ou uma teoria de educaçao, ou, quem 
nada disso). 
Somente eles poderiam discutir, corna 
da educaçâ'o, problemas de método, de 'operacio-
nalidade curricular, de sistemâtica 
e assim por diante. Instrumentas sem 
mas pequenas algernas de controle quando empre-
gados sem a crltica do lugar e do sentido de tudo 
isso. S6 o educador "deseducado" do saber que 
existe no homem e na vida poderia ver educaçao 
no ensino esco!ar, quando ela existe solta entre 
os homens e na vida. Ouando, mesmo ao redor 
da escola e da universidade, ela estâ no sistema 
e na oposiçao a ele; na sala de aula ordem, 
no 
Carlos Rodrigues Br::::.:!!Z:; 
e no dia de greve estudantil; no trabalho rigoroso 
e persistente do professor-e-pesqu isador e, ao 
mesmo tempo, no trabalho poli'tico do profes-
sor-militante. 
Esta é a esperança que se pode ter na educacâ'o. 
Desesperar da ilusâ'o de que todos os seus ava~cos 
e melhoras dependem apenas de seu desenvoÎvi-
mento tecnol6gico. Acreditar que o ato humano 
de educar existe tanto no trabalho pedag6gico 
que ensina na escola quanto no ato polltico que 
luta na rua por um outro tipo de escola, para 
um outra tipo de mundo. 
E é bem possîvel que até mesmo neste "outro 
mundo", um reino de liberdade e igualdade busca-
do pelo educador, a educaçâ'o continue sendo 
movimento e ordem, sistema e contestaçâ'o. O 
saber que existe solto e a tentativa escolar de 
prendê-lo num tempo e num lugar. A necessidade 
de preservar na consciência dos "imaturos" o 
que os "mais velhos" consagraram e, ao mesmo 
tempo, o direito de sacudir e questionar tudo 
o que estâ consagrado, em nome do que vem 
pelo caminho. 
•• - - - -
INDICAÇÔES PARA LEITURA 
Para quem tiver fôlego e coragem ha do~s livras 
importantes a respeito da idéia de ed~caçao entre 
os gregos (de onde veio a ~o~~a, atrav~s ~e Roma~ 
e sobre a educaçâ'o na Ant1gu1dade Class1ca. Um e 
0 Paideia - a formaçâ'o do homem greg?, , ~e 
Werner Jaeger (Herder) e o outra, a f!tstor~a 
da Educadio na Antigüidade, de Henn-!re~~e 
Marrou (Herder/EDUSP). Ainda sobre. ht~t~r~a 
da educaçao a Editora Pedag6gica e .uni.vers1tari,a 
publicou Educaçâ'o e Sociedade na Prtme1ra Rep':!-
blica. Trata-se de um estudo sobre a. educaçao 
brasileira escrito por Jorge Nagle. F1~a1,n:ente, 
um livra simples e muito ~til é .a Htston~ da 
Pedagogia, publicado pela C1a. Ed1tora Nac1onal 
e escrito por René Hubert. 
* * * 
t Quem quiser conhecer o pensamento de um 
' 
dos principais educadores brasileiros deve Ier 
os trabalhos de Fernando de Azevedo, publicados 
-·~----·--· 
1 
1 
112 Carlos Rodrirmes n - 0 que é Educaçao o.,.. LJr..,.riuuv 
/ 
pel_a Melh~ramentos e pela Cia. Editora Nacional. 
Le1a espec1almente: A Educaçao na Encruzilhada e 
Novo~ Caminhos e Novas Fins. Vale a pena Ier 
tambem a sua Sociofogia da Educaçâ'o. 
* * * 
Ainda sobre a abordagem sociol6gica da edu-
caçâ"o, existem alguns livras que sao coletâneas 
de varias aut~res. Um deles, publicado ha algum 
tempo, mas ainda atual, é Educaçâ'o e Sociedade 
organizado por Luis Pereira e Maria Alice Foracchi 
e i:ublica_do, pela Cia. Editora Nacional. Alguns 
art1gos h1stoncos sobre a educaçâ'o, a sociedade 
e a cult~ra, coma um de Durkheim, foram reunidos 
n?~te l1~r~. A mesma editora tem uma longa 
sene de l_1vros sobre educaçâ'o. Vale a pena Ier 
f!emocrac1a _e. Educaçâ'o, de John Dewey, u m dos 
livras essenc1a1s para se compreender o movimento 
da ~scola Nova no Brasil. De modo geral, todos 
os livras de Anîsio Teixeira, outra educador 
dos tempos de renovaçâ'o da pedagogia no Brasil 
podem ser lidos. Sâ"o também publicados pel~ 
mesma editora. 
* * * 
A. Editora Vozes tem uma das melhores coleçoes 
de livras sobre educaçâ'o. Trata-se de Educacâ'o 
e T~mpo Presente. Destaco dela os três li~ros 
de ~1erre Furter~ Educaçâ'o e Reflexâ'o, Educaçiio 1 
e Vida e Educaçao Permanente e Desenvo/vimento 
Cultural. Na mesma linha de pensamento, existe 
o Educaçiio e ldeofogia, de Sinésio Bacchetto. 
Dois outras livras de leitura simples e de um bom 
poder de explicaçâ'o de questoes basicas da edu-
caçâ'o em nosso tempo sâ"o: Fenomenologia da 
Educaçao, do argentino Gustavo Cirigliano e 
Pedagogia de nosso Tempo, de Ricardo Nassif. 
Outra abordagem sociol6gica da edueaçâ'o brasi-
leira foi realizada por Ângelo Domingos Salvador, 
em Cultura e Educaçao Brasileira. Resta ainda 
da coleçâ"o o desafiante estudo de Ivan Illich, 
Sociedade sem Escolas. Da mesma editora ha 
um pequeno livra bastante util, escrito par Suzana 
Albornoz Stein: Por uma Educaçiio Libertadora. 
* * -;;· 
Alguns estudos sobre a universidade brasileira. 
A Universidade Tempora, pub1icado Ed. Civili-
zaçâ'o Brasileira, de Luis Antônio Cunha, rie 
quem todos os outras livras podern ser lidos 
sern susto e corn urn grande praveito,. especial-
mente Educaçao e Desenvolvimento Social no 
Bras!/. A Universidade Brasi/eira em Busca de 
sua ldentidade, de Maria de Lourdes de A. Favero, 
publicado pela mesma coleçao Educaçâ'o e Tempo 
Presente, da Vozes. Sobre o movimento estudantil, 
além dos seus proprios escritos, ha uma pesquisa 
que nâ'o pode deixar de ser lida. Ë o estudo de 
José Augusto Guilhon Albuquerque, Movimento 
Estudantil e Consciência Social na América Latina, 
publicado pela Paz e Terra. 
* * * 
113 
114 
Carlos Rodrigues Brandâo 0 que é Educaçiio 
I 
~obre quest6es re/ativas a - . 
log1a, entre os /ivros . educaçao e ideo-
três: Pratica Educati:a1~ r~en.tes quero destacar 
Pereira Ramalho da Ed. octedade, de Jether 
e Hegemonia de N" A't?ra Zahar, ldeologia 
da Editora C~rtez e '~~en;us Junqueira Paoli, 
e o Nacionalismo-Dese,nvo1nla _ment:, Paulo Freire 
P · v1ment1sta d V · a1va, publicado pela c· .,. - f e an1Jda 
1v1 izaçao Brasileira. 
* * * 
De modo gera/ sao · , . 
ampla gama de quest~u1to u~e1s e cobrem uma 
· oes os l1vro 
publ1cados pela Edit C s recentemente 
e Moraes). Esta edito~;a t o~tez (antiga Cortez 
estudos recentes sobre em a~çado a cada mês 
educaçao brasileira. questoes concretas da 
* * * 
Dentro da linha em 
tida aqui hâ muitos que ~ educaçao foi discu-
f, 1 _ outras livros T A d ac1 sao os escritos por Ped . _res . e acesso 
Educaçâ'o _ Modern. _ ro Ben1am1n Garcia: 
Clâudio l. Salm· Es~~~~ao ou Dependência, por 
T~reza Nidelkoff.:Uma J. Trabalho e por Maria 
Pnmeiro é da Livraria F sco!a para o Povo. 0 
ûltimos da Brasiliense ~anc1sco Alv:s ~ os dois { 
tem vârios livros p bl" aura de Ol1ve1ra Lima t1 
introducoes desaf"1adu 1cad?s e todos eles sao 
d . oras as qu t- t' a educaçao no Brasil: Ier el es oes quentes 
na Educaçao da V P 0 menos 0 Impasse 
D ' ozes Tecno/og · rd· · e emocracia da c· T ' - ta, c, ucacao ' 
, tv1 tzaçao Brasileira e Es~ola i 
no Futuro, da Editora Encontro. 
Absolutamente essencial é o livra de Demerval 
Saviani, Educaçaa Brasileira, Estrutura e Sistema, 
da Editora Saraiva. 
* * * 
A mesma Editora Brasiliense acaba de lançar 
talvez o mais inteligente e também o mais moti-
vante {e desafiador) livra sobre educaçao, para 
quem queira fazer sobre ela uma leitura de intro-
duçâ'o crltica. Trata-se de Cuidado, Escala!, escrito 
pela equipe do lnstituto de Desenvolvimento 
e Açâ'o Cultural, fundado por Paulo Freire. 
* * * 
Ha uma série de livras a respeito de Educaçâ'o 
Popular e entre eles é indispensâvel a leitura 
de pelo menos alguns livras de Paulo Freire. Os 
dois primeiros: Educaçaa coma Préftica da Lwer-
dade, editado pela Paz e Terra, e Pedagogia do 
Oprimida, da mesma editora. Entre os mais recen-
tes, nâ'o perder Cartas de Gui né-Bissau. Outras 
cartas de Paulo Freire estâ'o em A Ouestao Po/(~ 
tica da Educaçao Popular, que editei pela Brasi-
liense. Ler ainda o excelente Educaçâ'o Popu/ar 
e Conscientizaçâ'a, da Vozes, escrito pela uru-
guaio Julio Barreiro. Nâ'o perqer, ainda, Vivendo 
e Aprendendo, da equipe do IDAC e publicado 
pela Brasiliense. Sobre a prôpria histôria da edu-
caçâ'o popular no Brasil, é importante Ier: Edu-
caçâ'o Popular e Educaçâ'a de Adultas, de Vanilda 
115 
116 
Carlos Rodrigues Brandiio 
Pereira Paiva editado 1 Educaçâ'o Po~ular d tela Loy_ola; Estado e 
p· · ' e e so Ru1 Beisiegel, da 
p1one1ra; e, finalmente, PoHtica Educaçiio 
opu/~r, de Siivia Maria Manfred· 
pela S1mbolo. 1, publicado 
* * * 
Até aqui falei apenas b . . . 
e crltica sociol6gica da so ;e ln~;os de historia 
questoes de eda . e uca_çao. Mas sobre 
à educaçâ'o :Xiste90J~a e ~e _?Slcologia aplicadà 
Entre os livras de acess re aç~o ?~stante maior. 
os pubJicados pela Cia o E~_a1s facll estâ'o todos 
a pena procurar também. itora Nacional. Vale 
especializadas como a R ur1:1a entre outras revistas 
dos Pedag6gi~os publ" ~v1sta Brasileira de Estu-
Nacional de Est~dos ~~~a a P~10 f NEP O_n~tit,uto 
d~ Educaçâ'o e Cultura b°g1c~s),. do M1niste:io 
a1nda uma outra revist. . proprio MEC ed1ta 
a importante: Educaçiio. 
* * * 
Revistas sobre educacâ'o . . 
abordagem sociol6gica ~stâ ex1stem m~1tas. Uma 
dade, do CEDES distribu (d:m Educ~çao e Socie-
Em outra d. .: . . . pela Ed1tora Cortez 1recao d1rigida · 
Sala de Aula, publicada el ao professor, existe 
Anlsio Teixeira. P ° Centra de Estudos 
- - -·------' 
Biografia 
Carlos Rodrigues Brandao nasceu no Rio de J aneira 
em 14 de Abril de 1940. Desde 1963 trabalha corn grupos 
e movimentos de Educaçao Popular, pratica que iniciou 
no Movimento de Educaçao de Base e que hoje continua 
através do Centra de Estudos de Educaçao e Sociedade 
(CEDES) e do Centra Ecumênico de Documentaçao e 
Informaçao ( CEDI). 
É antrop61ogo e trabalha no Departamento de Ciências 
Sociais da Universidade de Campinas (UNICAMP). Lecio-
nou na Faculdade de Educaçao da Universidade de Brasi-
lia, da Universidade Federal de Goias e da Universidade 
Cat6lica de Goias. 
Tem alguns livras publicados nas areas de cultura popu-
lar e de educaçao popular. Na primeira: Cavalhadas de 
Piren6polis; 0 Divino, o Santo e a Senhora; Peoes, Pretos 
e Congas, A Folia de Reis de Mossâmedes, Deus te Salve, 
Casa Santa; Plantar, Colher, Camer (um estudo sobre o 
campesinato goiano). Pela Brasiliense publicou: Os Deuses 
do Povo. Na segunda area, editou, também pela Brasiliense, 
A Questâo Politica da Educaçâo Popular, e prepara A 
Questâo Politica do Saber Popular. Prepara também mais 
dois livras para a Coleçâo Primeiras Passos: 0 que é Religiâo 
(corn Rubem Alves) e 0 que é Folclore. 
Caro leitor: 
Se você tiver alguma sugestào de novos titulos para 
as nossas coleçôes, por favor nos envie. Novas idéias, 
novos titulos ou mesmo uma "segunda visào" de um 
jâ publicado serào sempre bem recebidos. 
1 
COlEÇÂO PRIMEIROS PASSOS 
1 - Socialismo Arnaldo Spindel 
2 - Comunismo Arnaldo Spindel 
3 · Sindicalismo Ricardo C. Antu-
nes 4 - Capitalismo A. Mendes 
Catani 5 . Arrarquismo Caio folio 
Costa 6 - Liberdade Caio Prado 
Jr. 7 - Racismo J. Rufino dos 
Santos 8 - lndüstria Cultural Tei-
xeira Coelho 9 - Cinema J. Clau-
de Bernardet 10 - Teatro Fernan-
do Peixoto 11 • Energia Nuclear 
J. Goldemberg 12 - Utopia Tei-
xeira Coelho 13 - ldeologia Ma-
rilena Chaui 14 • Subdesenvolvi-
mento H. Gonzalez 15 - Jornalis-
mo Cl6vis Rossi 16 - Arquïtetura 
Carlos A. C. Lemos 17 - Histôria 
Vavy Pacheco Borges 18 - Ques-
tâo Agrâria Josê G. da Silva 19 -
Comunidade Ec. de Base Frei 
Betta 20 - Educaçâo Carlos A. 
Brandan 21 Burocracia F. C. 
Prestes Motta 22 - Oitaduras 
Arnaldo Spindel 23 - Dialética 
Leandro Konder 24 - Poder Gé-
rard Lebrun 25 - Revoluçao Flo-
restan Fernandes 26 - Multina-
cionais Bernardo Kucinski 27 · 
Marketing Raimar Richers 28 · 
Empregos e Salélrios P. R. de 
ASAIR: 
Administraçâo Candida B. Aze-
vedo Alfabetizaçâo Ana Maria 
Poppov1c Amor Betty Milan An-
gUsi:ia André Gaiarsa Arqueolo-
gia Ulpiano B. Menezes As-
trologi·a Claudia Hoi!ander Auto-
nomismo Mauricio Tragtenberg 
Autoritarismo Carlos Estevan 
Martins Banditismo José Ri-
cardo Ramalho Biblioteca Luiz 
Milanesî Biologia Warnick Kerr 
Candomblé Leni Myra Siverstein 
Capital Financeiro M. C. Tavares 
Capital Monopolista de Estado 
J. M. Cardoso de Mello Capoeira 
Almir das Areias Carnaval Ro-
berto da Matta Cibernética Jo-
celyn Bennaton Cidadania Sérgio 
Adorno Ciência Rubem Alves 
Classes Sociais José A. Moysés 
Comunicaçâo Rural - Juan D. 
Bordenave Conscientizaçâo Mi-
guel Darcy de Oliveira Contra-
cultura Carlos A. Pereira Corpo 
Ana Verônica Mautner Critica 
Mariene Bîlinsky Curandeirismo 
Zeha Seiblitz Deficiente Joao 
Batista Ribas Desobediência 
Souza 29 - lntelectuais Horâcio 
Gonzalez 30 - Recessâo Paulo 
Sandroni 31 - Religiao Rubem 
Alves 32 - lgreja P. Evaristo, Car-
deal Arns 33 - Reforma Agrilrla 
J. Eli Veiga 34 - Stalinismo J. 
Paulo Netto 35 - lmperialismo 
A. Mendes Catani 36 · Cultura 
Popurar A. Augusto Arantes 37 · 
Filosofia Caio Prado Jr. 38 • Mé-
todo Paulo Freire C. R. Brandao 
39 - Psicologia Social S. T. Mau-
rer Lane 40 - Trotskismo J. Ro-
berto Campos 41 - lslamismo 
Jamil A. Haddad 42 - Violência 
Urbana Regis de Morais 43 • Poe-
sia Marginal Glauco Mattoso 44 -
Feminismo B. M. Alves/J. Pitan-
guy 45 - Astronomra Rodolphe 
Caniato 46 - Arte Jorge Coli 47 -
Comissêies de Fâbrica R. Antu-
nes/ A. Nogueira 48 - Geografia 
Ruy Moreira 49 - Direitos da 
Pessoa Dalma de Abreu Dallari 
50 - Familia Danda Prado 51 - Pa-
trimêinio Hist6rico Carlos A. C. 
lemos 52 - Psiquiatria Alterna-
tiva Alan lndio Serrano 53 - Lite-
ratura Marisa Lajolo 54 • Polltica 
Wolfgang Leo Maar 55 - Espiri-
Civil Evaldo Vieira Ecanomia 
Politica L. G. de Mello Belluzzo 
Educaçao Ambiental José M. Al-
meida Jr. Educaç8o lndigena Ara-
ci L. Silva Educador Rubem A!-
ves Estados Unidos Paulo Fran-
cis Estudar Paulo Freire Fisica 
Ernest Hamburger Forne Ricardo 
Abramovay Fotografia Claudio 
A. Kubrusly Geopolitica Ruy 
Moreira Homossexualismo Peter 
Fry/Edward MacRae lnflaçâo J. 
B. Amara[ Filho Judaismo Anita 
Novinsky Linguagem Carlos Vogt 
Maçonaria Arnaldo Mind!in Ma-
temiltica Artibano Micali Metafi-
sica Gerd A. Bornhefn Moradia 
Luiz C. O. Ribeiro/Robert M. 
Pechmann Museu Mariene Suano 
Müsica J. Jota de Morais Nacio-
nalismo Toledo Machado Ordem 
Econômica lnternacional Ladislau 
Dowbor Parlamentarismo Rubem 
Keinert Partidos Pohticos Fran-
cisco Weffort Pape! Otavio Roth 
Pedagogia Laura O. Lima Planeja-
mento Empresarial Aogério Ma-
chado Planejamento Familiar R. 
tismo Roque J~cintlÎo56 - Po-
der Legislativo Nelson Saldanha 
57 - Sociologia Carlos B. Mar-
tins 58 - Dîreito lnternacional J. 
Monserrat Filho 59 • Teoria Ota-
viano Pereira 60 - Folclore Car-
los Rodrigues Brandao 61 - Exis-
tencialismo Joâo da Penha 62 · 
Oireito Roberto Lyra Filho 63 · 
Poesia Fernando Paixâo 64 - Ca-
pital Ladislau Dowbor 65 - Mais-
Valia Paulo Sandroni 66 • Recur· 
sos Humanos Flâvio de Toledo 
67 - Comunicaçëo Juan Diaz Bor-
denave 68 - Rock Paulo Chacon 
69 - Pastoral Joâo Batista Liba-
nio 70 - Contabilidade Roque Ja-
cintho 71 - Capital lnternacional 
Rabah Benakouche 72 · Positivis· 
mo Joâo Ribeiro Jr. 73. Loucura 
Joâo A. Frayze-Pereira 74 - Lei-
tura Maria Helena Martins 75 -
Questiio Palestina Helena Salem 
76 - Punk Antonio Bivar 77 - Pro-
paganda ldeol6gica Nelson .larh 
Garcia 78 - Magia Jo8o Ribeiro 
Jr. 79 - Educaçâo Fisica Vitor 
Marinho de Oliveira. 
Darcy de Oliveira Planejamento 
Urbano Candida M. Campos Po-
litica Nuclear Ricardo Arndt 
Previdência Social Moyses Qua-
dros Psfcanâlise Fabio Herrmann 
Psicologia Arno Enge!man Psi-
comotricidade Eduardo Ravagnî 
Psicoterapia leda Porchat Reli-
gîâo Popular Rubem C. Fernan-
des Repressâo Sexual Marilena 
Chauf Ret6rica José A. Pessa-
mé Serviço Social Ana Maria Es-
tevâo Silêncio André Gaiarsa Sis-
tema Rogério Machado Socieda-
de Civil M. Sylvia C. Franco 
Sociobiologîa José M. Almeida 
Jr. Solo Urbano Sérgio Souza 
Lima Televisëo Walter Salles Jr. 
Teologia Rubem Alves Terroris· 
mo José Manoe! Barras Traba-
lho Ernildo Staine Transporte 
Urbano Sérgio Souza Lima Um-
banda Patricia Birman Universi-
dade Luiz Wanderley Vinho 
Abelardo Blanco Violência Nilo 
Od8lia. 
TiTULOS PUBUCADOS 
JANEIRO DE 83 
n.0 (6) 
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