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CAPÍTULO 3
FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
  Apresentar as principais características da fotografi a.
  Abordar as relações entre fotografi a e história.
  Indicar métodos de análise da imagem fotográfi ca.
52
 Linguagem Visual na Historiografi a
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53
FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
53
 Capítulo 3 
CONTEXTUALIZAÇÃO
Até há bem pouco tempo, antes da supremacia da imagem digital, tinha-
se o costume de guardar, no fundo de uma gaveta ou em uma caixa velha 
de sapatos, fotografi as antigas. Estas imagens são verdadeiras lembranças 
visuais de familiares, amigos e lugares. Quando esquecemos a fi sionomia 
de alguém ou queremos lembrar as férias do ano anterior, recorremos a 
elas para recordar. 
A fotografi a tem estreita relação com a memória e a história e será 
nosso tema de estudos a partir de agora. Este artefato, além de servir 
como recordação, é responsável pela própria produção das imagens que 
trazemos em nossa imaginação, em nosso “arquivo de memória”. A fotografi a 
é comumente considerada um testemunho fi dedigno do real. Veremos, no 
entanto, que esta ideia dominante no senso comum é enganosa. 
Escolhemos dedicar este capítulo à fotografi a, justamente porque existe a 
necessidade de professores de história, como também de outras disciplinas, 
olharem com mais cuidado este tipo de suporte imagético. Devemos resgatar 
o sentimento de estranhamento frente à fotografi a (presente na sociedade 
do século XIX, que a viu nascer e se desenvolver); só assim poderemos 
problematizá-la, com o intuito de promover debates em sala de aula. A 
difi culdade que temos de “estranhar” a fotografi a é justifi cada pela banalização 
da imagem nos dias de hoje, especialmente após a invenção das câmeras 
digitais. Se este tipo de tecnologia promove a democratização da produção 
de imagens, também contribui para a relação naturalizada que estabelecemos 
com a fotografi a, “amolecendo” nossa capacidade de olhar criticamente este 
objeto de conhecimento. 
Se hoje vivemos em uma “sociedade da imagem”, boa parte disso se deve 
à fotografi a que, antes do cinema e da televisão, impulsionou a reprodução 
das imagens de “si” e do “outro”, assim como das mais inusitadas paisagens. 
A fotografi a realmente transformou nossa relação com o mundo, divulgou 
lugares e personalidades através da imprensa e dos cartões-postais. A magia 
da fotografi a, enquanto objeto material (ou virtual), não está nela mesma, mas 
nas relações que estabelecemos com ela. Convido você, então, a estudar esta 
classe de imagem que desperta tantas emoções, lembranças e fantasias. 
NOTAS SOBRE A HISTÓRIA DA FOTOGRAFIA
O termo fotografi a, que signifi ca o processo de produzir imagens sobre 
uma superfície fotossensível pela ação da luz, foi criado, segundo Boris 
Devemos resgatar 
o sentimento de 
estranhamento 
frente à fotografi a; 
só assim poderemos 
problematizá-la, com 
o intuito de promover 
debates em sala
de aula.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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Kossoy (1980), por Antoine Hercule Romuald Florence (1804-1879), em 1839. 
Hercule Florence era um imigrante francês, que se radicou no Brasil e fez 
parte do grupo dos primeiros pesquisadores a fi xar as imagens projetadas em 
uma câmara escura. 
A câmara escura (ou câmara obscura) é o ancestral mais 
longínquo da câmera fotográfi ca. Consiste basicamente em uma 
caixa com um orifício por onde entra a luz refl etida dos objetos 
postados em sua frente. A imagem é, então, projetada no fundo da 
caixa ou em uma superfície posta dentro dela. Este mecanismo, 
inventado por Leonardo da Vinci, foi utilizado pelos pintores do 
século XIX, para representar realisticamente seus temas pictóricos. 
Para conhecer mais sobre câmara escura, acesse o seguinte 
endereço eletrônico:
http://www.cotianet.com.br/photo/hist/camesc.htm 
Florence, Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833), Louis Jaques Mande 
Daguerre (1787-1851) e William Henry Romuald Talbot (1800-1877) são 
considerados os precursores da fotografi a, os primeiros a conseguir, cada 
um com seu método, fi xar imagens capturadas pelas câmeras. A fotografi a 
mais antiga de que se tem registro foi produzida por Niépce em 1826, através 
do processo de fi xação da imagem por meio do Betume da Judeia (uma 
resina fotossensível) aplicada sobre uma placa de prata. Este processo foi 
denominado de “heliografi a”. A fi gura 4 é uma reprodução da foto de Niépce. 
Trata-se da “vista descortinada da janela do sótão de sua casa, em Chalons-
sur-Saône”. (BUSSELLE, 1998, p. 30).
 
A fotografi a mais 
antiga de que se tem 
registro foi produzida 
por Niépce em 1826, 
através do processo 
de fi xação da imagem 
por meio do Betume 
da Judeia (uma resina 
fotossensível) aplicada 
sobre uma placa
de prata.
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FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
Figura 4 – 1ª fotografi a conhecida (1826)
Fonte: Disponível em: <http://www.niepce.com/pages/
page-inv.html>. Acesso em: 14 jul. 2009. 
Daguerre, por sua vez, fi cou conhecido pelo daguerreótipo – que 
consistia em uma imagem gravada em uma placa de cobre coberta 
com uma camada de prata polida, sensibilizada pelo vapor de iodo. Por 
sua vez, Talbolt produziu o calótipo, uma técnica que fi xava a imagem 
em papel albuminado (o qual recebia sobre sua superfície o albúmen – 
substância extraída da clara do ovo de galinha, que servia para fi xar os 
sais de prata), que foi o papel mais usado até 1890, quando surgiu o 
papel de prata gelatina. Para que uma imagem fosse gravada, utilizando 
essas técnicas, era necessário um longo tempo de exposição. Niépce, por 
exemplo, aguardou 8 horas para obter a imagem (fi gura 4). Porém, com a 
evolução progressiva da tecnologia, o tempo de exposição foi diminuindo. 
Na daguerreotipia o tempo de exposição variava entre 15 e 30 minutos. 
Não caberia aqui abordar de forma mais aprofundada a história da 
fotografi a e das técnicas fotográfi cas. Para isto, sugiro que você consulte o 
livro indicado a seguir, assim como as obras relacionadas nas referências 
bibliográfi cas, listadas no fi nal deste capítulo. 
Caso você queira estudar mais sobre história da fotografi a, 
indico o livro: BUSSELLE, Michael. Tudo sobre fotografi a. 8. ed. 
São Paulo: Thompson Pioneira, 1998. Esta obra apresenta o 
desenvolvimento das técnicas fotográfi cas,e ensina noções gerais 
sobre como tirar retratos. Porém, para obter informações sobre 
técnicas relacionadas à fotografi a digital sugiro o livro: RAMALHO, 
José. Fotografi a digital. São Paulo: Campus, 2004. 
56
 Linguagem Visual na Historiografi a
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Para que você tenha uma noção da evolução das câmeras fotográfi cas 
entre as décadas de 1830 e 1920, veja o quadro informativo da fi gura 5.
Figura 5 – Evolução das câmeras fotográfi cas (1830 e 1920)
Fonte: Busselle (1998, p. 32).
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FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
Perceba que a primeira câmera fotográfi ca portátil que oferecia ao 
fotógrafo facilidades no manuseio foi lançada pela Kodak em 1888. A operação 
desta máquina dispensava cálculos complexos para a execução da fotografi a. 
Como dizia a propaganda: “Você aperta um botão, nós fazemos o resto”. A 
fi gura 6 apresenta um cartaz de propaganda desta máquina.
Figura 6 – Primeira câmera fotográfi ca portátil
 
Fonte: Busselle (1998, p. 37).
58
 Linguagem Visual na Historiografi a
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A câmera da Kodak colocou a fotografi a ao alcance de todos. A partir 
da câmera portátil, qualquer pessoa podla tirar suas próprias fotografi as, de 
maneira simples e rápida. Com uma máquina desta nas mãos uma pessoa 
poderia registrar tudo aquilo que estivesse ao alcance de sua visão. Uma 
cena poderia ser registrada com apenasum “clic”. Daí a associação que a 
propaganda da Kodak fez entre esta câmera fotográfi ca e o trabalho do 
detetive: “A menor, mais leve e mais simples de todas as câmaras-detetive”. 
Aliás, o trabalho investigativo fazia parte do imaginário urbano do fi nal do 
século XIX, infl uenciado tanto pelos romances policiais de Sherlock Homes 
e pela literatura de Edgar Allan Poe, quanto pelo acelerado processo de 
urbanização das cidades europeias deste período. As cidades cresceram e 
os crimes também. Em função deste crescimento populacional, as cidades se 
transformaram. Paris, que era uma referência para o Ocidente, passou por 
reformas urbanas radicais, entre 1852 e 1870, no governo do prefeito Georges-
Eugène Hausmann (1809-1891). 
Sobre as reformas urbanas em Paris e suas infl uências no 
Brasil (Rio de Janeiro e Porto Alegre) ver:
PESAVENTO, Sandra J. O imaginário da cidade: visões literárias 
do urbano. Porto Alegre : Ed. da UFRGS, 1999.
As modifi cações no espaço urbano, ocorridas no fi nal do século XIX e na 
primeira metade do século XX – o alargamento de ruas, implantação de redes 
de energia elétrica e esgoto, construção de edifícios de apartamentos – foram 
acompanhadas pelo aumento populacional e por uma política de segregação, 
que empurrou a população pobre para a periferia das cidades. Neste contexto, 
como ensina Michel Foucault, a população foi alvo dos discursos e práticas 
de normalizações. Ou seja, criaram-se uma série de dizeres e normas 
sobre como o cidadão deveria se portar, que tinham como objetivo manter 
o controle sobre a população ou ordenar o espaço urbano. Neste sentido, a 
fotografi a passou a servir como ferramenta de identifi cação e controle sobre 
o espaço urbano. “A fotografi a será utilizada desde seus primórdios como 
uma ‘máquina de vigiar’ e produtora de imagens forjadas para o grande 
público”. (TACCA, 2005, p.15-16). Vejamos como Maria Borges se refere 
ao contexto de aparecimento da fotografi a. 
Na transição do século XIX para o século XX, os grandes 
centros urbanos, sobretudo aqueles ligados à produção 
industrial, recebiam um grande fl uxo de imigrantes. A 
organização de seus espaços vai sendo profundamente 
A fotografi a passou a 
servir como ferramenta 
de identifi cação e 
controle sobre o 
espaço urbano.
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FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
alterada pela presença de novos atores sociais, cujas vidas 
os decretos municipais tentaram regular e controlar. Ferreiros, 
sapateiros, costureiras, bombeiros, operários de fábricas, 
vendedores ambulantes de todo o tipo, desempregados, 
mendigos e os chamados vagabundos transitavam pelas 
ruas, bairros e praças antes reservados aos antigos 
habitantes. Em meio a tais transformações, criou-se o 
pânico das massas, das multidões sem identidade própria, 
imediatamente identifi cadas com a desordem. Para manter 
o controle sobre o processo de alargamento das fronteiras 
do espaço público, as autoridades criavam uma série de 
políticas públicas, alicerçadas por uma enorme literatura, 
sobretudo médica e jurídica, que a mídia se encarregava de 
divulgar. Textos e imagem compunham a nova linguagem 
destinada a domesticar o espaço em diferentes metrópoles 
da Europa e América. (BORGES, 2003, p. 69).
Prezado estudante, estas informações nos ajudam a compreender 
a propaganda da Kodak, mostrada anteriormente, que se apropriava do 
imaginário ligado ao trabalho do detetive, ou melhor, dos métodos de 
investigação científi ca, os quais fazem uso da ciência e da tecnologia para 
desvendar crimes, integrando o sistema de regulamentação e controle social. 
A fotografi a servia, assim, como um instrumento privilegiado para o exercício 
da observação e da vigilância. “Ela será um dos instrumentos privilegiados 
para o exercício de uma ‘disciplina’ do olhar sobre a experiência quotidiana” 
(MEDEIROS, 2009, p. 3). Neste sentido, podemos comparar o uso da fotografi a 
no século XIX com “Sorria, você está sendo fi lmado!” 
A fotografi a nasceu com a Revolução Industrial, ao mesmo tempo em que 
a ciência se afi rmava e novas tecnologias surgiam. Como, por exemplo, a luz 
elétrica, o telefone, a geladeira e o automóvel. A fotografi a, neste contexto, 
serviu de ferramenta à ciência, uma vez que era tida como mecanismo de 
registro fi el da realidade. As imagens capturadas pelas máquinas “afi rmavam” 
que era possível reproduzir a realidade tal como ela é. A fotografi a nasceu, 
assim, como uma forma de olhar realístico que ressaltava a objetividade do 
registro imagético. 
São diversos os usos da fotografi a no século XIX. Além de seu uso como 
instrumento policial (visto acima), vejamos duas outras utilidades científi cas. 
A primeira foi o estudo do movimento realizado por Etienne-Jules Marey 
(1804-1879), que se dedicou à análise minuciosa do movimento do corpo no 
espaço. Por meio de sequências fotográfi cas ele procurou decompor e estudar 
a mecânica da locomoção de pessoas e animais. Um exemplo é seu famoso 
estudo do galope do cavalo, baseado nas fotografi as de Eadweard James 
Muybridge (1830-1904). A fotografi a também serviu à criminologia técnica que, 
por meio da frenologia e da antropometria (fi gura 7), procurava identifi car 
a natureza do comportamento criminoso através da análise da imagem 
A fotografi a também 
serviu à criminologia 
técnica que, por 
meio da frenologia 
e da antropometria, 
procurava identifi car 
a natureza do 
comportamento 
criminoso através da 
análise da imagem 
fotográfi ca.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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fotográfi ca. Se pensarmos nos estudos de Foucault sobre os dispositivos de 
controle inventados na modernidade, veremos que as técnicas empregadas 
na criminologia fazem parte das estratégias de poder na sociedade de massa 
pós-Revolução Industrial.
Frenologia: “Doutrina segundo a qual cada faculdade mental 
se localiza em uma parte do córtex cerebral e o tamanho de cada 
parte é diretamente proporcional ao desenvolvimento da faculdade 
correspondente, sendo este tamanho indicado pela confi guração 
externa do crânio.” (HOUAISS, 2002).
Antropometria: “Parte da antropologia que trata da 
mensuração do corpo humano ou de suas partes. Técnica de 
identifi cação de indivíduos, especialmente criminosos, com base 
na descrição do corpo humano (fotografi as, medidas, impressões 
digitais etc.).” (HOUAISS, 2002).
Figura 7 – Criminosos
 
Fonte: Disponível em: <http://www.centenariodarepublica.org/centenario/2009/04/28/
para-que-os-republicanos-mediam-os-cranios-dos-padres/>. Acesso em: 17 jul. 2009. 
Note, caro(a) pós-graduando(a), que estamos trazendo informações sobre 
o contexto histórico e cultural em que surgiu a fotografi a. Com isso podemos 
perceber que a fotografi a não é um registro “neutro” da realidade; ela revela a 
forma de pensar de homens e mulheres do passado. A fotografi a apresenta-se, 
então, como um objeto privilegiado de análise das ideias e crenças culturalmente 
construídas. Você não acha? 
Vimos até aqui a relação da fotografi a com a ciência, porém, a imagem 
fotográfi ca também foi considerada uma forma de expressão artística como 
veremos a seguir. 
61
FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
FOTOGRAFIA: ENTRE A ARTE E A TÉCNICA
A fotografi a é um divisor de águas na história do registro visual. A máquina 
fotográfi ca superou o artista que buscava registrar com perfeição as formas 
e cores do mundo visível. A representação realista na pintura tem como um 
de seus principais representantes o quadro “Vista de Delf” (1637) do pintor 
holandês Johannes Vermeer, considerado por Proust a pintura mais linda do 
mundo. Aliás, Proust não acreditava na fotografi a como obra de arte, mas sim 
enquanto simples reprodução técnica. 
Apesar das primeiras experiências ressaltarem a função técnica da 
fotografi a (de registro fi el do real), consideramosque a fotografi a desempenhou 
desde seu nascimento um duplo papel: A - Serviu de testemunho do real. B - 
Surgiu como representação sensível do mundo. No primeiro caso, a fotografi a 
é pensada simplesmente como resultado do processo mecânico da câmera. 
No segundo caso, entretanto, a fotografi a é considerada uma construção do 
fotógrafo sobre o mundo.
A fotografi a liberou as artes pictóricas do compromisso com a 
verossimilhança, já que os pintores não poderiam concorrer com a fotografi a 
na representação realista do mundo. Assim, com o advento da fotografi a a 
identidade da pintura foi posta em cheque, a pintura passou então a expressar 
o mundo interior do artista (coisa que a fotografi a não poderia fazer), tornando-
se mais subjetiva. Podemos dizer, então, que a pintura rompeu as amarras 
da descrição realista do mundo. Veja, por exemplo, as obras impressionistas 
da primeira metade do século XX; de Claude Monet, Auguste Renoir e Eliseu 
Visconti, ou mesmo as obras expressionistas do mesmo período; de Vicent Van 
Gogh, Paul Klee, Lasar Segall. Segundo Annateresa Fabris: “a fotografi a torna 
patente a diferença entre informação visual e expressão visual, permitindo que 
a arte rompesse seu compromisso com a verossimilhança, ao concentrar-se 
não na representação, mas nos meios expressivos”. (2006, p. 159-160).
Por outro lado, a fotografi a também foi considerada um objeto artístico. 
As fotos de estúdio (que fazem parte dos primeiros momentos da história da 
fotografi a), eram consideradas verdadeiras obras de arte, elas eram caríssimas 
e produzidas por poucos e célebres fotógrafos. 
Vejamos, então, os principais usos da fotografi a no século XIX:
A primeira etapa estende-se de 1839 aos anos 50, quando 
o interesse pela fotografi a se restringe a um pequeno 
número de amadores, proveniente das classes abastadas, 
que podem pagar os altos preços pelos artistas fotógrafos 
(Nadar, Carjat, Lê Gray, por exemplo). O segundo momento 
corresponde à descoberta do cartão de visita fotográfi co 
A fotografi a é um 
divisor de águas na 
história do registro 
visual. A máquina 
fotográfi ca superou o 
artista que buscava 
registrar com perfeição 
as formas e cores do 
mundo visível.
62
 Linguagem Visual na Historiografi a
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(carte-de-visite photographique) por Disdéri, que coloca ao 
alcance de muitos o que até aquele momento fora apanágio 
de poucos e confere à fotografi a uma verdadeira dimensão 
industrial, quer pelo barateamento do produto, que pela 
vulgarização dos ícones fotográfi cos em vários sentidos 
(1854). Por volta de 1880, tem início a terceira etapa: é o 
momento da massifi cação, quando a fotografi a se torna um 
fenômeno prevalentemente comercial, sem deixar de lado 
sua pretensão a ser considerada arte. (FABRIS, 1998, p. 17).
Assim, ao mesmo tempo em que a fotografi a libertou o pintor do 
compromisso de retratar o mundo de modo realístico, apresentou-se como 
um artefato de massifi cação da imagem. Ou seja, a fotografi a desempenhou 
um papel fundamental na popularização das artes visuais até então restritas 
ao universo cultural da elite: aos colecionadores e admiradores de pinturas, 
esculturas e objetos de arte de modo geral. 
A fotografi a também agiu como reprodutora de imagens consagradas pela 
arte pictórica. Isto quer dizer que o enquadramento do fotógrafo assemelhava-
se ao do pintor, tanto nos retratos (fotos de rosto), quanto nas fotografi as de 
paisagens naturais. Portanto, apesar da imagem fotográfi ca se diferenciar das 
formas tradicionais de arte (uma vez que ela é produzida por um aparelho 
mecânico), ela estabelece relações de semelhança com as representações da 
pintura. A busca do pitoresco, por exemplo, é a mesma na pintura, na literatura 
e na fotografi a. De acordo com Jacques Aumont: “a paisagem apreendida pelo 
olho do pintor de estudos, e depois pelo olho fotográfi co, continua a ser – é 
quase sua defi nição – um fragmento qualquer da natureza, cuja pictorialidade 
poderá ser aplicada em toda parte, descobrindo em toda parte o pitoresco”. 
(2004, p.49). Assim, apesar da fotografi a romper com a forma de registro 
visual (através de instantes é possível capturar a imagem em detalhes), ela 
continuou a produzir olhares consagrados por artefatos visuais mais antigos. 
SOBRE A NATUREZA DA FOTOGRAFIA
O que seria uma fotografi a, se não um fragmento do tempo e do espaço 
(estrutura espaço-temporal) gravado em uma superfície fotossensível? 
Segundo Boris Kossoy toda fotografi a “tem sua origem a partir do desejo de 
um indivíduo, que se viu motivado a congelar em uma imagem um aspecto 
dado do real, em determinado lugar e época” (2001, p. 36).
A fotografi a surge, então, como um recorte de um espaço em um tempo 
passado. A fotografi a é no fundo uma composição do fotógrafo que envolve 
escolhas pessoais. Peter Burke traz em seu livro “Testemunha ocular: história 
e imagem”, uma interessante comparação entre os trabalhos do historiador 
Ao mesmo tempo 
em que a fotografi a 
libertou o pintor do 
compromisso de 
retratar o mundo 
de modo realístico, 
apresentou-se 
como um artefato 
de massifi cação da 
imagem.
O que seria uma 
fotografi a, se não 
um fragmento do 
tempo e do espaço 
(estrutura espaço-
temporal) gravado 
em uma superfície 
fotossensível? 
63
FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
63
 Capítulo 3 
e do fotógrafo, que, de maneira similar, selecionam textos e imagens para 
compor suas obras. “Todos os fotógrafos, sentem-se livres para selecionar tema, 
moldura, lentes, fi ltros, emulsão e granulação de acordo com suas sensibilidades.” 
Os fotógrafos, assim como os historiadores “selecionam que aspectos do mundo 
real vão retratar”. Desta maneira, “no mesmo momento em que um fotógrafo 
seleciona um tema, ele está trabalhando na base de um viés paralelo ao viés 
expresso por um historiador.” (2004, p. 27-28). Sentimentos e conhecimentos 
técnicos se imbricam na produção imagética. Segundo Susan Sontag:
Ao decidir que aspectos deveria ter uma imagem, ao preferir 
uma exposição a outra, os fotógrafos sempre impõem 
padrões a seus temas. Embora em certo sentido a câmera 
de fato captura a realidade, e não apenas a interprete, as 
fotos são uma interpretação do mundo tanto quanto as 
pinturas e os desenhos. (2004, p.17).
As fotografi as são, de fato, recortes metódicos dos espaços que revelam 
fragmentos do tempo contemporâneo ao fotógrafo. A fotografi a tem o poder de 
ordenar os elementos do mundo no momento em que o fotógrafo focaliza, sob 
um jogo de luz específi co, o quadro a ser perpetuado.
As imagens capturadas de aparelhos mecânicos serviram para registrar 
ângulos já consagrados do mundo por outras artes, mas também para 
apresentar novos quadros até então desconhecidos aos olhos (como a 
ampliação de uma fotografi a). A fotografi a é um ícone de um tempo marcado 
fortemente pela cultura visual. Acelerou-se, com esse mecanismo, o processo 
de mapeamento e de descoberta do mundo através do olhar. 
O conceito de cultura ganhou fôlego na década de 1980, em função 
da popularização dos estudos sobre imagem virtual. As ciências sociais, de 
maneira geral, passaram a estudar os fenômenos sociais relacionados a 
visualidade. A imagem passou então a ser problematizada e estudada como 
sempre se fez com os textos, enquanto discursos social e culturalmente 
construídos. Segundo Ulpiano Meneses:
A voga dos estudos de “cultura visual” assinala com clareza, 
no campo das ciências sociais — para o bem e para o mal —, 
aquilo que já foi chamado de pictorial turn, em seqüência ao 
linguistic turn de décadas anteriores, que chamara a atenção 
para o texto antropológico ou sociológico na produção do 
conhecimento. (2003, p. 23).
64
 Linguagem Visual na Historiografi a
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Para entender melhor a noção de “cultura visual” sugiro que 
você leia na íntegrao texto de Ulpiano Meneses, intitulado: “Fontes 
visuais, cultura visual, história visual. Balanço provisório, propostas 
cautelares”. Originalmente publicado na Revista Brasileira de 
História. Para isso acesse o texto através do seguinte endereço 
eletrônico:
http://www.scielo.br/pdf/rbh/v23n45/16519.pdf
A fotografi a anônima, por exemplo, apesar de não trazer a autoria que 
nos permite obter informações sobre o fotógrafo, apresenta-se como fonte de 
conhecimento sobre a cultura visual de um determinado período. A difi culdade 
em trabalhar com imagens anônimas está justamente na falta de informações 
sobre as circunstâncias que envolveram a produção fotográfi ca. Porém, 
este tipo de fotografi a nos coloca em contato com determinados olhares, o 
que permite ao pesquisador estudar determinados hábitos socioculturais do 
passado. Vejamos o que Miriam Moreira Leite diz sobre as fotografi as que não 
trazem o registro pessoal de autoria. 
A fotografi a anônima é única e jamais semelhante. É 
encontrada sem legenda e sem dedicatória e tem de se 
exprimir sem palavras complementares. Como não pode 
ser identifi cada obriga os historiadores ofi ciais a aprender a 
olhar, a sentir e a captar com modéstia diante do acaso, que 
leva o invisível ao domínio do visível.
A fotografi a anônima pode conter estereótipos que 
constituem o verdadeiro território da história em matéria 
de documento, através de atitudes consideradas justas ou 
verdadeiras, de elementos furtivos ou de unidades isoladas, 
referentes à história do cotidiano.
A boa foto condensa o olhar; nela cada parte refl ete o todo, 
enquanto a anônima tolera a dispersão pelas margens, 
multiplicidade de interesses e leituras, é rica de informações 
que rompem o estético, sem precisar negá-lo, e suas leituras 
ligam-se e sofrem a pregnância do tempo e dos hábitos 
socioculturais. É constituída de imagens isoladas e dispersas 
de comportamento fotográfi co diferente, embora não menos 
complexo, de amadores ou profi ssionais desconhecidos. 
Feita para recordar atos da vida, em sua continuidade, está 
carregada de conotações tanto mais fortes quanto mais 
condicionadas pelo mundo exterior (atos sexuais, violência, 
dramas e confl itos) podem unir o cotidiano e ser da maior 
65
FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
65
 Capítulo 3 
importância para a história dos costumes, da indumentária, 
das técnicas e cobrir manifestações sociais desde as mais 
humildes e medíocres. (2000, p. 164-165). 
 
Assim, a fotografi a é uma fonte passível de análise tanto das práticas 
cotidianas que retrata, quanto das visões estereotipadas de mundo que 
enquadra. A análise da fotografi a anônima se fundamenta, contudo, na 
própria leitura da imagem que nos chega aos olhos. A análise da composição 
da imagem é o único meio de decifração da foto-documento. O estudo da 
fotografi a sem autoria exige do leitor de imagens sensibilidade para interpretar 
os elementos visíveis. Isto quer dizer que o intérprete da foto precisa “ler” os 
elementos, assim como a forma com que estes elementos surgem da imagem. 
Em suma, é necessário problematizar a construção da cena. 
Por fi m, gostaria de reforçar o que foi dito acima: a fotografi a é um artefato, 
e enquanto tal é resultado da ação de um fotógrafo que “em determinado 
espaço e tempo optou por um assunto em especial e que, para seu devido 
registro, empregou os recursos oferecidos pela tecnologia” (KOSSOY, 2001, 
p.37). A montagem fotográfi ca é uma forma de expressão da realidade: objetiva 
e subjetiva, que determinada sociedade faz do meio em que está inserida. 
FOTOGRAFIA E HISTORIOGRAFIA
Vimos, anteriormente, que a fotografi a é uma fonte documental ao 
historiador. Sua utilização, no entanto, é uma prática relativamente recente, 
uma vez que os documentos escritos compunham, até a segunda metade 
do século XX, as fontes privilegiadas da historiografi a. Não estamos dizendo 
que as fontes visuais passaram a concorrer com as escritas, pelo contrário, 
ambas, a fotografi a e o texto, servem de objetos ao pesquisador que busca 
uma interpretação mais completa do passado. 
A fotografi a, neste sentido, não deve ser vista como ilustração de texto, e 
sim como documento que traz informações sócio-culturais sobre determinado 
contexto histórico. Isto porque a fotografi a é, como estudamos anteriormente, 
um recorte de determinado espaço-tempo. As pessoas e as paisagens 
que são enquadradas pela câmera trazem traços culturais de um período 
histórico. Pensado desta maneira, ampliaremos nossa noção de documento e 
ultrapassaremos a visão tradicional que considera documento histórico apenas 
as fontes escritas ofi ciais. Assim passamos a entender como documento todo 
artefato cultural passível de análise historiográfi ca. 
A fotografi a faz parte do universo das fontes visuais e serve como uma 
alternativa a mais de compreensão do passado. Devemos considerá-la 
uma produção do fotógrafo, que utiliza determinada tecnologia para fi xar 
A fotografi a e o texto, 
servem de objetos ao 
pesquisador que
busca uma 
interpretação mais 
completa do passado.
A fotografi a é uma 
fonte passível de 
análise tanto das 
práticas cotidianas que 
retrata, quanto das 
visões estereotipadas 
de mundo que 
enquadra.
66
 Linguagem Visual na Historiografi a
66
um aspecto do mundo. Cabe então ao historiador-pesquisador o papel de 
identifi car o contexto histórico que envolveu a produção da fotografi a, para, em 
seguida, iniciar a análise do que a imagem traz de visível (aspectos internos), 
assim como das relações sociais, políticas e/ou econômicas que envolveram 
sua produção (aspectos externos). 
Os historiadores que estudam a fotografi a enquanto documento, 
situam-se nos caminhos abertos pela nova história, em particular pela 
Escola dos Annales, que a partir dos anos 1960 e 1970 passou a defender 
o estudo da imagem. A fotografi a, neste caso, passou a representar um 
traço cultural do passado. 
Para compreender melhor a importância que a Escola dos 
Annales tem na nova historiografi a sugiro a leitura do seguinte livro:
BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989). São Paulo : 
UNESP, 1991. 
Os estudos historiográfi cos dos franceses Jacques Le Goff e Pierre 
Nora, ligados a Escola dos Annales, estão entre os primeiros que levaram em 
conta a fotografi a como documento. Vejamos a seguir como o historiador Ivo 
Canabarro se refere aos estudos de Le Goff e Nora. 
Para Le Goff, a fotografi a está entre os grandes 
documentos para se fazer história, por consistir de 
provas de que algo aconteceu. O autor observa que a 
fotografi a permite conhecer a riqueza da vida, mesmo 
sendo realista, porque o próprio realismo é também uma 
criação. A fotografi a representa uma inegável expressão 
do indivíduo, da face, do retrato e, também, expressão 
da vida cotidiana do camponês. A imagem mostra toda 
a riqueza do simples ato de ver, por ser um texto visual 
que exprime a plenitude do humanismo. O autor fi naliza 
salientando que se existem provas concretas do passado 
a fotografi a é uma delas. 
O historiador Pierre Nora observa que a partir dos anos 70 do 
século XX, o texto visual, principalmente a fotografi a, passa 
a fazer parte da escrita da história. O autor salienta que o 
alargamento da história, propiciado pela “nouvelle histoire”, 
infl uencia a valorização do arquivo visual. Paralelo a isso, a 
noção de testemunha passa a ser entendida como noção de 
traço e o não escrito começa a dilatar o domínio da história. 
Nora entende a fotografi a como um instantâneo extraído do 
Jacques Le Goff e 
Pierre Nora, ligados a 
Escola dos Annales, 
estão entre os 
primeiros que levaram 
em conta a fotografi a 
como documento.
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FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
movimento permanente, uma mostra representativa de uma 
realidadedistante, um analogon do que foi o passado e uma 
relação de descontinuidade decorrente de uma mistura de 
distância e aproximação. Deste modo cabe ao historiador 
perceber o valor de diferença do que se apresenta e o 
movimento que continua a existir. Naturalmente este é um 
longo trabalho que exige muita erudição na restituição de um 
objeto histórico. (2005, p. 27-28).
Por outro lado, o estudo da fotografi a ganhou fôlego no Brasil nas últimas 
décadas do século XX. Boris Kossoy (2001, p. 31) fez um levantamento 
e constatou que em 1970 foram escritos quatro trabalhos acadêmicos 
(dissertação ou tese) sobre fotografi a, em 1980 o número subiu para doze e 
em 1999 para setenta e três. Atualmente além do próprio Kossoy temos em 
nosso país historiadores de renome que se dedicam ao estudo da fotografi a, 
entre eles: Ana Maria Mauad de Souza Andrade Essus (UFF), Miriam Lifchitz 
Moreira Leite (USP) e Annateresa Fabris (USP). 
 
Atividades de Estudos: 
1) Explique os motivos que levaram os historiadores a 
desconsiderarem a fotografi a como fonte histórica.
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2) Em que medida a fotografi a contribui para o trabalho do 
historiador? 
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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PARA UMA ANÁLISE DA FOTOGRAFIA
As interpretações das imagens fotográfi cas seguem métodos distintos de 
análise. Porém, de maneira geral, elas não escapam de uma abordagem dos 
aspectos internos e externos da fotografi a. Ou seja, a análise da fotografi a trata 
tanto da composição da foto (confi guração dos elementos da fotografi a), quanto 
os fatores sociais, políticos e econômicos que envolveram sua produção, 
assim como o circuito que envolve seu consumo (ou apropriação). No primeiro 
e segundo caso temos as interpretações iconográfi cas e iconológicas, que 
tratam em decodifi car os signifi cados da composição da fotografi a. Na análise 
iconográfi ca, o estudioso procurará
1. a reconstituição do processo que originou o artefato, 
a fotografi a: pretende-se, assim, determinar os elementos 
que concorreram para sua materialização documental, 
(seus elementos constitutivos: assunto, fotógrafo, 
tecnologia) em dado lugar e época (suas coordenadas de 
situação: espaço, tempo);
2. a recuperação do inventário de informações decodifi cadas 
na imagem fotográfi ca: trata-se de obter uma minuciosa 
identifi cação dos detalhes icônicos que compõe seu 
conteúdo. (KOSSOY, 2002, p. 58).
Esta é considerada a primeira etapa de análise, que consiste em levantar 
as informações básicas sobre a imagem e identifi car os elementos que a 
compõem. Neste caso, busca-se simplesmente levantar o maior número de 
informações sobre os aspectos visíveis da imagem. 
A etapa seguinte consiste na análise iconológica, em que o estudioso 
centrará sua atenção em
1. resgatar, na medida do possível, a história própria do 
assunto, seja no momento em que foi registrado, seja 
independentemente da mesma representação;
2. buscar a desmontagem das condições de produção: o 
processo de criação que resultou na representação em 
estudo. (KOSSOY, 2002, p. 58).
Esta segunda etapa compreende o estudo dos aspectos externos 
envolvidos na produção da imagem. Nesta etapa, o historiador irá desenvolver 
verdadeiramente sua habilidade interpretativa, a partir de sua sensibilidade e 
erudição. Pois, a análise iconológica tem como objetivo analisar a memória 
social e as ideias acerca do assunto representado, assim como as relações 
ideológicas envolvidas na construção da imagem. Portanto, concluímos que 
a análise iconográfi ca, como nos ensinou Panofsky, dedica-se à descrição da 
imagem, enquanto a análise iconológica age no sentido de interpretá-la. 
A análise iconográfi ca, 
como nos ensinou 
Panofsky, dedica-se à 
descrição da imagem, 
enquanto a análise 
iconológica age no 
sentido de
interpretá-la. 
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FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
Não existe, neste caso, uma fórmula defi nitiva de análise da fotografi a. 
Podemos considerar as noções apresentadas anteriormente, no entanto, como 
a base de diferentes métodos que se dedicam a decifrar as imagens fotográfi cas. 
Podemos considerá-las como a teoria clássica de interpretação. Muitos 
historiadores que se dedicam ao estudo da fotografi a, desenvolvem seus próprios 
métodos de análise, tendo como base as teorias da iconografi a/iconologia, ou 
então, da semiótica. 
Apresentaremos, a seguir, um exemplo de análise iconográfi ca e iconológica 
desenvolvida por Boris Kossoy (2001, p. 118-121). A foto analisada pelo autor é 
um postal e tem como tema a colheita do café (fi gura 8). 
Figura 8 – A colheita do café
Fonte: Disponível em: <http://www.oselo.com.br/images/
e12103.jpg>. Acesso em: 29 jul. 2009. 
INTERPRETAÇÃO ICONOGRÁFICA
Grupo de colonos – provavelmente imigrantes – em plena colheita num 
cafezal, em uma fazenda da região de Araranguá.
Na época próxima à colheita, que ocorre geralmente em maio, são 
executadas as tarefas de preparação. Durante o período da colheita toda 
a família do colono participa do trabalho, inclusive as crianças, como se 
vê na foto. A colheita é feita por derriça; as cerejas derriçadas, juntamente 
com folhas e pedacinhos de galhos, são rasteladas para fora das saias dos 
cafeeiros. Limpas as cerejas com as peneiras, são conduzidas para o lavrador 
ou diretamente para o terreiro. A colheita no pano, registrada ao centro, evita 
que o café derriçado entre em contato com a terra. 
Além da informação que nos apresenta, por assim dizer, o fato da colheita, 
tal como se dá no campo, trata-se, por outro lado, de uma foto bastante 
elaborada sob o prisma estético. Os colonos – no momento da foto também 
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 Linguagem Visual na Historiografi a
70
personagens de Gaensly (autor da foto) – são registrados “naturalmente”, em 
plena harmonia com o carro de bois e o restante da paisagem montanhosa, ao 
fundo, por onde se estende o cafezal: uma perfeita composição. 
INTERPRETAÇÃO ICONOLÓGICA
A serenidade que esta imagem romântica do trabalho nas fazendas de 
café transmite mascara, no entanto, uma dura realidade escondida além da 
imagem. [...].
Em 1902, o governo italiano, através do decreto Prinetti, proibia a imigração 
subsidiada para São Paulo, baseado em denúncias contidas nos relatórios 
de observadores que para aqui vieram. Constataram eles as péssimas 
condições de vida e trabalho a que estavam submetidos seus compatriotas 
nas fazendas de café. 
A construção estética da foto, onde se tem um forte apelo às composições 
românticas da pintura, tem uma fi nalidade: a de atrair colonos para as fazendas 
do Estado de São Paulo, como de fato foram utilizadas pelos agentes de 
recrutamento de trabalhadores, na Europa. Comprova isso o fato de que o 
fotógrafo era contratado pela Secretaria de Agricultura, Comércio e Obras 
Públicas do Estado de São Paulo, para documentar as fazendas do interior, 
justamente entre os anos 1902 e 1903, época em que foi tirada a foto. As fotos 
de Gaensly foram continuamentemultiplicadas pelas primeiras publicações, 
ilustradas num contexto claramente promocional. Eis, pois, o verdadeiro 
signifi cado da foto. Uma imagem que utiliza o realismo fotográfi co da aparência, 
enquanto testemunho fi el, enquanto “prova” que pode conduzir o receptor 
desavisado a imaginar uma situação verdadeira, que não existe, para criar, 
enfi m, no imaginário dos receptores uma (pseudo)realidade. Concretamente, 
o que de fato temos, é uma cilada sedutora, uma fi cção documental. Algumas 
conceituações podem ser estabelecidas a partir desta categoria de imagens:
1. A proximidade que pode existir entre a fotografi a documental e a 
propaganda;
2. A ideologia determina a estética de representação: os mecanismos de 
produção e de recepção da imagem são governados por este princípio. 
71
FOTOGRAFIA E HISTÓRIA
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 Capítulo 3 
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 
Um dos objetivos deste caderno de estudos é justamente apresentar 
noções sobre interpretação de imagens. Assim, o(a) professor(a) de história - 
ou de disciplinas afi ns - terá uma base para planejar suas aulas, caso trate da 
imagem enquanto fonte de refl exão e conhecimento.
Uma sugestão é que o professor inicie o estudo a partir da interpretação 
iconográfi ca coletiva, para depois planejar pesquisas sobre a imagem 
em questão. Para que possamos compreender as condições matériais e 
ideológicas envolvidas na produção fotográfi ca, precisamos desconstruir 
a fotografi a, ou seja, realizar um trabalho de interpretação. Este trabalho, 
por sua vez, só é possível mediante a utilização de outras fontes: textos ou 
relatos orais. Para isso, é preciso ter sempre em mente que a fotografi a é uma 
construção datada; só assim manteremos o distanciamento necessário para 
uma refl exão crítica sobre a imagem. 
 
Quando empreendemos a análise de uma fotografi a, é preciso pensá-la 
como uma representação, ou, como afi rma Kossoy, uma segunda realidade, 
visto que a realidade presente na foto é uma realidade “construída, codifi cada, 
sedutora em sua montagem, em sua estética, de forma alguma ingênua, 
inocente, mas que é, todavia, o elo material do tempo e espaço representado, 
pista decisiva para desvendarmos o passado”. (KOSSOY, 2002, p. 22). 
Cabe então ao professor, que se propõe trabalhar com a imagem em sala 
de aula, elaborar um plano para decifrar a imagem. Como o detetive que 
deseja desvendar um crime, professor e aluno devem se unir neste instigante 
exercício de interpretação. Para isso, é necessário perseguir as pistas contidas 
na imagem, mas também coletar o maior número possível de informações 
sobre o contexto em que ela se insere. Pense a fotografi a como um vestígio 
que deve estimular o espírito investigativo dos alunos! 
O estudo da fotografi a é particularmente rico ao professor de história, já 
que a fotografi a envolve fundamentalmente refl exões acerca da memória. A 
fotografi a tem um papel ativo na construção de imagens de memória. Vale 
a pena pensar sobre seu papel na construção de memórias familiares, por 
exemplo; mas também como construtora de memórias sociais e nacionais. 
Por outro lado, estudar a fotografi a auxiliará o professor a pensar, junto 
como seus alunos, o próprio processo de construção do texto histórico, feito 
de escolhas e recortes. Lembre-se de que, tanto no ato fotográfi co quanto 
na historiografi a, são dadas ênfases a determinados assuntos e excluídos 
tantos outros. 
Pense a fotografi a 
como um vestígio 
que deve estimular o 
espírito investigativo 
dos alunos! 
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REFERÊNCIAS
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