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Gabriela Bordignon-T5 FARMACOLOGIA, BBPM III Betabloqueadores INTRODUÇÃO O assunto abordado será o papel dos betabloqueadores na insuficiência cardíaca (IC). OBS.: o sistema renina-angiotensina-aldosterona será abordado posteriormente. Inicialmente, iremos retomar alguns conceitos da aula de betabloqueadores. Chama-se a atenção para os subtipos do receptor adrenérgico Beta e seus efeitos, como exposto na tabela: SUBTIPO DE RECEPTOR TECIDO EFEITO Beta 1 Coração Inotropismo e cronotropismo positivos Coração Maior velocidade de condução AV Células justaglomerulares (rins) Maior secreção de renina Beta 2 Músculo liso Relaxamento Fígado Glicogenólise e gliconeogênese Músculo esquelético Glicogenólise e captação de K Beta 3 Tecido adiposo Lipólise O Beta 1 é a principal isoforma presente no coração e lá exerce um efeito de inotropismo positivo (lembrando que isso se refere ao receptor sendo ativado por uma catecolamina, como a noradrenalina). Ou seja, quando Beta 1 é ativado há um efeito inotrópico positivo, que seria o aumento da força de contração cardíaca, e um efeito cronotrópico positivo, que seria o aumento da frequência cardíaca, ao mesmo tempo, há o aumento da velocidade de condução AV, logo o efeito endógeno da catecolamina é de estimulante cardíaco. Além disso, um efeito importante, que será visto posteriormente e com mais detalhes na fisiologia e depois retomado na farmacologia, é o efeito do receptor Beta 1 nas células justaglomerulares, presentes nos rins, de aumento na secreção de renina, que participa do sistema renina- angiotensina-aldosterona. O receptor Beta 2 tem efeito de relaxamento no músculo liso, produzindo efeitos dilatadores nos leitos vasculares e efeito broncodilatador. E o receptor Beta 3 exerce efeito de lipólise. Ressalta-se os efeitos do receptor Beta 1 (principalmente) e do Beta 2. RESUMINDO OS TIPOS DE RECEPTORES DO SNA Adrenérgicos ⇨ noradrenalina (agonista natural) Miocárdio ⇨ receptores Beta 1 Musculatura lisa dos brônquios ⇨ receptores Beta 2 Musculatura lisa dos vasos ⇨ receptores Alfa 1 RESULTADO da ativação do SNA simpático nos receptores beta adrenérgicos: ⇧DÉBITO CARDÍACO ⇧FREQUÊNCIA CARDÍACA VASOCONSTRIÇÃO (alfa 1) E BRONCODILATAÇÃO (catecolaminas) EFEITO COMPENSATÓRIO DA IC Outro conceito importante, é que uma das características da IC, vista na fisiopatologia desse quadro, é a redução do débito cardíaco, ou seja, há um comprometimento da função cardíaca, o que leva a uma redução da pressão arterial (pois um dos parâmetros quando há a redução do débito cardíaco é a redução da pressão arterial). Quando o débito cardíaco é reduzido ocorre uma série de mecanismos compensatórios na tentativa de NA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA Gabriela Bordignon-T5 FARMACOLOGIA, BBPM III aumentar o débito cardíaco, e isso acontece por exemplo pelo reflexo barorreceptor, já que diminuindo o débito a pressão arterial é reduzida também, o que leva ao efluxo simpático, ou seja, uma maior atividade do sistema nervoso autônomo simpático, e o simpático atuando via receptores Alfa 1 adrenérgicos causa vasoconstrição, o que, por sua vez, aumenta a resistência vascular sistêmica, ou seja, aumenta a pós carga, consequentemente o coração precisa exercer uma maior pressão para que possa ejetar o sangue e isso aumenta o consumo de oxigênio do miocárdio, podendo agravar o quadro de IC, ao mesmo tempo, o sistema nervoso autônomo simpático, via receptores Beta 1 adrenérgicos, tem o efeito de aumentar a contratilidade, aumentar a frequência cardíaca e aumentar a produção de renina, que ativa o sistema renina-angiotensina- aldosterona, incluindo o aumento da renina, o aumento da produção da angiotensina II e o aumento da aldosterona. Destaca-se que o aumento da angiotensina II também causa vasoconstrição, tendo o mesmo efeito citado anteriormente na pós carga, enquanto que o aumento da secreção de aldosterona, retém sódio e, consequentemente, retém água, o que aumenta o volume de sangue dentro dos vasos, aumentando o parâmetro de pré carga e o volume de sangue que retorna ao coração na diástole e isso aumenta também o consumo de oxigênio no miocárdio. Logo, tem-se pela lei de Frank-Starling, maior estiramento pelo maior volume de sangue, resultando em uma maior força de contração e isso agrava a IC. Desse modo, o mecanismo compensatório da IC, envolvendo principalmente o sistema nervoso autônomo simpático, vem a curto prazo na tentativa de aumentar o débito cardíaco e melhorar a função cardíaca em um paciente com IC, mas o problema é justamente o efeito persistente/crônico dessa estimulação simpática. Isso ocorre porque o efeito crônico da estimulação simpática em quadros de IC contribui para a progressão da disfunção do ventrículo esquerdo, ou seja, agrava a doença levando a um prognóstico desfavorável, pois, a longo prazo leva a um remodelamento cardíaco. JUSTIFICATIVA DO USO DE BETABLOQUEADORES NA IC Em suma, o efeito crônico da ação do simpático irá piorar o desfecho da IC, por meio da sua atuação elevando a frequência cardíaca, aumentando o consumo do oxigênio, aumentando a renina, auxiliando na apoptose dos cardiomiócitos e exercendo um papel arritmogênico. É isso que, basicamente, justifica o uso de betabloqueadores na IC. Esse uso pode parecer um tanto contraditório, já que, por qual motivo se usaria um fármaco betabloqueador se é preciso que haja o papel do simpático (muitas vezes um paciente com IC opera e depende de um aporte simpático para a manutenção do débito cardíaco), por que se usaria um fármaco que é um betabloqueador que terá um efeito oposto ao desejado, já que vai reduzir o débito cardíaco, pois vai competir com as catecolaminas? Há alguns anos atrás estudos e ensaios clínicos com o uso de betabloqueadores em pacientes com IC puderam constatar um efeito benéfico com o uso desses fármacos no longo prazo, com um efeito de redução de mortalidade, configurando esses fármacos como importantes aliados no tratamento da IC na atualidade. É relevante que se tenha em mente o porquê do uso de betabloqueadores na IC. O betabloqueador é um fármaco que vai ter um efeito redutor no papel do simpático (papel esse, que a curto prazo ajudaria a manter o débito cardíaco), mas se intervém com o uso de um fármaco que reduz o débito cardíaco em um paciente que já possui um coração comprometido. Gabriela Bordignon-T5 FARMACOLOGIA, BBPM III Isso aparenta ser muito paradoxal, mas o que ocorre é que a redução do débito cardíaco e a redução da contratilidade miocárdica, faz com que se tenha uma ativação do simpático, e o simpático, como já foi visto, de modo persistente favorece a necrose, apoptose, fibrose e hipertrofia do coração, fazendo o remodelamento cardíaco e levando a piora do prognóstico do paciente com IC. O coração de um paciente com IC que está sob um estímulo persistente do SNA simpático sofre uma regulação diferenciada (remodelamento cardíaco) que envolve uma série de alterações gênicas, como por exemplo, uma infra regulação de receptores adrenérgicos, redução da cálcioATPase no retículo sarcoplasmático (o papel dessa enzima é retirar o cálcio do citosol colocando dentro do retículo sarcoplasmático), ou seja, há um aumento da concentração de cálcio no citoplasma, a participação nas correntes de potássio, tendo como um dos efeitos finais do simpático o aumento da propensão do paciente com IC a arritmias, o que se configura como uma das grandes causas de óbito nesses pacientes. Logo, deve ficar claro que a persistência do sistema nervoso autônomo simpático no coração de um paciente com IC é deletério, já que é uma resposta fisiológica compensatória que vem na tentativa de melhorar o débitocardíaco, mas que, entretanto, a longo prazo promove um agravamento da IC, dessa maneira, o uso dos betabloqueadores possibilita a atenuação desse efeito crônico de catecolaminas/ativação do simpático, exercendo talvez até um remodelamento reverso ao passo que enquanto o sistema simpático promove um remodelamento cardíaco que piora o quadro da doença, o betabloqueador vem no sentido de reduzir esse remodelamento cardíaco e até revertê-lo e é justamente por isso que se justifica o uso de betabloqueadores na IC. Um exemplo importante é o METOPROLOL. Inicialmente um paciente que faz uso de um betabloqueador na IC, tem um efeito inicial de redução da função sistólica (lembrando que o betabloqueador é um fármaco capaz de reduzir o débito cardíaco, contratilidade e frequência cárdica), e isso deve ser monitorado em pacientes com IC, logo, o paciente deve estar clinicamente estável para poder utilizar o fármaco, é observado que ao longo de alguns meses haverá a recuperação dessa função sistólica, provavelmente decorrente do remodelamento reverso causado pelos betabloqueadores. Por reduzirem a frequência cardíaca, os betabloqueadores reduzem o risco de arritmias, reduzindo a mortalidade de pacientes com IC. E também, por reduzirem o efeito persistente do sistema nervoso autônomo simpático, reduzem o tamanho da câmara do VE, principalmente inibindo a proliferação celular que pode ser desencadeada pela ativação persistente do simpático. No longo prazo, há alguns efeitos benéficos dos betabloqueadores, porém se deve ter atenção para o efeito de redução inicial da função sistólica que deve ser monitorado com cautela nesses pacientes. Gabriela Bordignon-T5 FARMACOLOGIA, BBPM III Exemplos de fármacos utilizados em ensaios clínicos na IC são o CARVEDILOL, METOPROLOL e BISOPROLOL, foi constatado que com o uso deles nessa doença, houve uma redução de mortalidade e hospitalizações por IC nos pacientes. CUIDADOS Alguns cuidados devem ser tomados, pois se sabe que os pacientes devem ser clinicamente estáveis para o uso dos betabloqueadores. Na insuficiência cardíaca descompensada e/ou de início recente (insuficiência cardíaca aguda) o papel desses fármacos ainda não é definido e por isso eles não devem ser utilizados, já que causam uma redução inicial da função sistólica. Além disso, até nos pacientes clinicamente estáveis deve haver um monitoramento cuidadoso. Se um paciente estável entrar em uma descompensação da IC, o uso de betabloqueadores deve ser revisto. A dosagem inicial deve ser bem baixa, devido ao risco de redução do débito cardíaco em pacientes que já têm um débito cardíaco reduzido. Desse modo, geralmente, a dose inicial é 1/8 da dose-alvo final, sendo que a dose deve ir sendo aumentada progressivamente a longo prazo. DOSE INICIAL=1/8 DA DOSE-ALVO FINAL Lembrando que efeitos colaterais podem surgir devido a utilização desses fármacos, como a broncoconstrição/broncoespasmo (pacientes asmáticos não podem usar betabloqueadores), piora inicial da IC, bradicardia (pela redução da frequência cardíaca) e hipotensão (devido à queda da pressão arterial, principalmente, se os betabloqueadores tiverem também função vasodilatadora). EFEITOS COLATERAIS: BRONCOESPASMO, PIORA INICIAL DA IC, BRADICARDIA E HIPOTENSÃO RESPOSTAS CARDIOVASCULARES AOS BETABLOQUEADORES Algumas respostas cardiovasculares ao tratamento com betabloqueadores incluem a redução da frequência cardíaca (lembrando que a noradrenalina via receptor Beta 1 aumenta a automaticidade do nodo sinoatrial, aumentando a despolarização diastólica lenta, usando o betabloqueador ocorre a redução da frequência cardíaca), bloqueio AV com o uso de betabloqueadores (principalmente em pacientes que possuem algum distúrbio de condução preexistente se deve ter muita cautela, pois a noradrenalina aumenta a velocidade de condução AV e um betabloqueadores vai diminuir essa velocidade de condução AV), broncoconstrição (pois a noradrenalina faz broncodilatação via receptores Beta 2, então um betabloqueador que bloqueia esses receptores Beta 2 pode causar broncoconstrição, logo, a asma é uma contraindicação ao uso de betabloqueadores, no caso da DPOC alguns consideram como contraindicação, outros consideram um uso mais cauteloso com o uso de betabloqueadores Beta 1 seletivos). Enfatizando que de qualquer forma, qualquer doença respiratória deve ser avaliada com muita cautela quanto ao uso desses fármacos, já que mesmo no uso de betabloqueadores seletivos para Beta 1 não há a garantia da existência de 100% de seletividade. Há também, inicialmente, uma vasoconstrição periférica (extremidades frias) que a longo prazo acaba se tornando um efeito vasodilatador. Então, no início existe um efeito vasoconstritor periférico, talvez até pelo próprio bloqueio de receptores Beta 2 (que fazem vasodilatação), mas se sabe que a longo prazo os betabloqueadores fazem um efeito vasodilatador. Porém, de qualquer modo, por conta desse efeito vasoconstritor periférico, são fármacos que devem ser usados com cautela em pacientes com doença arterial periférica e outras doenças arteriais. Portanto, conclui-se que a lógica do uso de um betabloqueador em pacientes com IC, levando em consideração que são pacientes que já possuem um agravamento da função cardíaca e redução do débito cardíaco, é que os betabloqueadores são fármacos que reduzem a função cardíaca, pois também reduzem frequência e contratilidade, mas que a longo prazo têm um efeito benéfico, redutor de mortalidade, e que principalmente reduzem frequência cardíaca e promovem um combate ao efeito persistente do simpático, que é deletério a longo prazo e que agravaria o quadro de um paciente com IC.
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