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1 A PSICOLOGIA NOS CENÁRIOS DE ATENDIMENTO À SAÚDE-HOSPITALAR OU AMBULATORIAL 1 SUMÁRIO FACULESTE ............................................................................................ 2 Introdução ................................................................................................ 3 A Psicologia e a interface com a equipe .............................................. 7 Bioética: da reflexão à prática ............................................................ 10 Especificidades da prática do psicólogo hospitalar ............................ 13 A Psicologia Atuando em Políticas Públicas de Saúde: Formação e Pertencimento .................................................................................................. 21 REFERÊNCIAS ..................................................................................... 28 2 FACULESTE A história do Instituto FACULESTE, inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a FACULESTE, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A FACULESTE tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 Introdução A psicologia da saúde pode ser entendida como um campo de estudo e de atuação que investiga as influências psicológicas na saúde, abrangendo não apenas hospitais, mas também centros de saúde ou programas que tenham por objetivo enfocar a saúde coletiva e que englobem tanto a saúde física como a mental. Na definição de Matarazzo (1980, p. 815, apud Pires & Braga, 2009), psicologia da saúde é: Assim, a grande importância da psicologia da saúde está na aplicação de métodos, modelos e procedimentos da psicologia científica ao contexto da saúde em geral, buscando-se uma redução dos crescentes custos associados a tratamentos, por meio da alteração de comportamentos e estilos de vida dos pacientes, bem como – e principalmente – uma melhor qualidade de vida para 4 os indivíduos que deste serviço se beneficiam (Miyazaki; Domingos; Caballo, 2001). Nesse contexto, o papel do psicólogo da saúde se encontra bem estabelecido, principalmente devido às mudanças nas principais causas de morbidade e de mortalidade, que passaram de doenças infectocontagiosas para patologias relacionadas ao estilo de vida e aos padrões de comportamento. Além disso, os já mencionados crescentes custos dos serviços de saúde fazem do profissional psicólogo um elemento de suma importância na educação sobre práticas saudáveis e comportamentos preventivos, na tentativa de se reduzir a vulnerabilidade para doenças e aumentar a adesão a tratamentos. Ressalta-se ainda que, com o desenvolvimento tecnológico dos recursos médicos e, portanto, o aumento da complexidade dos atendimentos, surge a demanda para o trabalho interdisciplinar, devido à preocupação com a qualidade de vida dos pacientes e com os impactos da doença sobre o funcionamento global do indivíduo (Amaral, 1999). Amaral (1999) preconiza que devem fazer parte do repertório do psicólogo da saúde habilidades de observação clínica e de relacionamentos interpessoais para o trabalho em equipe interdisciplinar. O psicólogo da saúde, além disso, deve ser treinado para demonstrar resultados, uma vez que uma área profissional se define por sua validade social. Uma das ferramentas com as quais a psicologia da saúde conta é a análise do comportamento, que é baseada no desenvolvimento de técnicas experimentalmente validadas e utilizadas apenas após o uso sistemático e a comprovação de sua eficácia. Algumas das principais técnicas são listadas a seguir (Rangé, 1998): • reforçamento positivo; • extinção; • modelagem; • reforçamento diferencial; • modelação; 5 • discriminação; • generalização; • dessensibilização sistemática; • relaxamento muscular progressivo; • exposição gradual; • treinamento assertivo; role-playing; e • treinamento de habilidades sociais. Quando a experiência do terapeuta que atende ou supervisiona o caso o habilita para tanto, também são utilizadas técnicas da Terapia Cognitiva, como as seguintes (Guimarães, 2001): • identificação de pensamentos disfuncionais • identificação de crenças • identificação de distorções cognitivas • teste de realidade • reatribuição • descatrastofização • autoinstrução • resolução de problemas A intervenção clínica comportamental ou cognitivo-comportamental abarca todas as atividades no atendimento psicológico. Seu objetivo está relacionado com a busca de alterações do comportamento e das cognições, as quais proporcionem maior bem-estar psicológico ao paciente. É importante ressaltar que o momento da intervenção clínica sucede ao da avaliação diagnóstica, mas se entremeia a esta para buscar os resultados terapêuticos. Os objetivos de tal avaliação consistem em auxiliar na identificação dos comportamentos problemáticos e das condições que os mantêm para, então, definir estratégias e avaliar o tratamento planejado. Assim, a avaliação 6 diagnóstica está inter-relacionada com o processo de tratamento, pois ela é necessária durante toda a intervenção e mesmo após o seu término, para a verificação de sua eficácia. A American Psychological Association (2010) indica o hospital como um dos possíveis locais de atuação do psicólogo da saúde. Com relação a este tema, Chiattone (2000) refere que a psicologia hospitalar é apenas uma estratégia de atuação em psicologia da saúde, e que, portanto, deveria ser denominada “psicologia no contexto hospitalar”, posicionamento com o qual alguns autores concordam plenamente. O objetivo principal da psicologia no ambiente hospitalar consiste na “minimização do sofrimento provocado pela hospitalização” (p. 23). Portanto, o que norteia a atuação do psicólogo dentro do contexto hospitalar é a determinação de como processos biológicos e psicológicos interagem na saúde e na doença. Assim, o psicólogo deve desenvolver a habilidade de descrever em que condições as doenças foram adquiridas e as ações do sujeito a partir da doença. A atuação do psicólogo em um hospital pode ocorrer em três níveis (Romano, 1999): 1. psicopedagógico, quando se trata de fornecer informações ao paciente (referentes a fatores de risco e de proteção, ao seu estado geral de saúde, a procedimentos, a diagnósticos e a prognósticos); 2. psicoprofilático, em que o nível de atenção é primário (ou seja, em que o objetivo é a prevenção de doenças); e 3. psicoterapêutico, o qual envolve as intervenções psicoterápicas em si, com aplicação de técnicas e de procedimentos específicos. Vale salientar a importância da divulgação de conhecimentos científicos específicos que possibilitem a reprodução de estratégias eficazes e, principalmente, o reconhecimento do valor da ação do profissional psicólogo atuante em contextos médico-hospitalares. Assim, a conclusão de pesquisas que demonstrem que a psicologia pode: 7 O Ambulatóriode Psicologia presta atendimento aos pacientes que realizam tratamento médico nas dependências do hospital. Os pacientes chegam ao ambulatório para atendimento psicoterapêutico ambulatorial por meio de encaminhamento médico ou, em casos de atendimentos de pacientes que se encontram internados nas enfermarias, por meio de pedido de interconsulta. Além do trabalho de assistência, também são realizadas pesquisas, que priorizam estudar a população atendida e identificar maneiras de oferecer assistência efetiva e de qualidade. Outra atividade exercida pelo ambulatório consiste no ensino a psicólogos. Por meio dos Programas de Aprimoramento Profissional e da Residência Multiprofissional, psicólogos recém-formados realizam atendimentos, são supervisionados pelos psicólogos contratados e participam de aulas teóricas sobre psicologia clínica no ambiente hospitalar e políticas públicas. A Psicologia e a interface com a equipe Os hospitais são organizações complexas dentro do campo da saúde que se utilizam de novas e sofisticadas tecnologias, visando responder às transformações vivenciadas nesse campo. É um dos serviços destinados à produção de ações de saúde que atendam às necessidades dos pacientes e seus familiares. Para que as atividades sejam desenvolvidas nesse contexto, há extensa divisão de trabalho entre os profissionais e um sistema de coordenação de tarefas e funções. Isso pressupõe a existência de uma equipe multidisciplinar como salienta Gianotti: 8 Dentro do processo de trabalho para compor a atenção integral ao paciente e, por conseguinte, a sua família há espaço peculiar à(ao) Psicóloga(o). No XV Fórum de Psicologia Hospitalar, realizado em novembro de 2015, que abordou a temática “A Interface da Psicologia e as equipes multiprofissionais”; ao se tomar como base o que fora explanado pelas palestrantes Wael de Oliveira e Jandyra Kondera, o corpo que o médico trata é diferente do corpo compreendido pelo psicanalista, posto que a medicina recalcou o doente e ficou com a doença. O imperativo para a área da Psicologia, frente a essa realidade, é buscar sempre manter o sujeito. Para tanto, a ética da(o) Psicóloga(o) deve ser pensada para além de normas e regras, considerando a subjetividade do paciente. Entretanto, quando participamos da equipe multidisciplinar e trabalhamos na assistência, abrimos a possibilidade para emergir o doente com seus comportamentos e reações particulares concernentes à forma como acomodou a doença se é que a acomodou. Isso pode gerar ansiedade nos demais profissionais da equipe de saúde porque, por vezes, o paciente poderá reagir de forma diversa a por eles esperada, como por exemplo, não aderir ao tratamento. 9 À (o) Psicóloga(o) caberá, então, saber lidar com as diferenças para sustentar a manutenção da subjetividade em meio ao universal da instituição. E, para fazê-lo, se deve propor a reflexões éticas por meio de seu trabalho pessoal, de estudo constante e de supervisão. Barleta (2015) trouxe outra contribuição concernente à supervisão na formação de equipes de saúde. Nesse viés, a supervisão caracteriza-se por ser clínico-territorial considerando os sujeitos, o espaço, as Políticas Públicas, entre outros aspectos. O supervisor funciona como um mediador, fazendo interrogações. Pretende--se que o trabalho promova mudanças nos sujeitos e que o grupo produza algo que venha a favorecer o seu fazer diário. As possíveis conquistas daí decorrentes podem compor com outros dispositivos na facilitação da complexa comunicação da tríade paciente-família-equipe de saúde, bem como aclarar aos demais membros de tal equipe do que se ocupa a(o) Psicóloga(o). Prestes (2015), em adição, apontou que a construção de protocolos, rotinas e indicadores também é um dispositivo que favorece o trabalho da(o) Psicóloga(o) na instituição hospitalar. Essa sistematização traduz a tecnicidade e cientificidade da prática psicológica e assegura a assistência ao paciente e seus familiares, assim como, contribui para sustentar a especificidade do discurso psicológico. Isso permite dimensionar para as equipes de saúde a complexidade da instância emocional e pontuar a forma peculiar de cada sujeito lidar com a doença. Além disso, a(o) Psicóloga(o) enfatiza a prática diária de reuniões 10 multidisciplinares para a integração dos discursos com o intuito de compartilhar decisões, monitorar os protocolos instituídos, planejar a sequência da assistência. Tudo isso visando, em última análise, a segurança do paciente. Essa preocupação com o paciente também foi abordada por Fumagalli (2015) quanto às decisões compartilhadas nas limitações de suporte de vida. Frente a essas, parece haver uma mudança de paradigma passando do curar para o cuidar, pressupondo uma tendência ao modelo efetivo de compartilhamento de decisão. Porém, a realidade aponta ainda para a prevalência das decisões médicas e técnicas. Diante dessa circunstância, há que se ressaltar mais uma vez a importância de a(o) Psicóloga(o) lançar para os membros das equipes de saúde um olhar voltado a subjetividade do paciente e de sua família com vistas a atendê-los em suas necessidades individuais. Nesse ponto de singularidade, para além da assistência, a(o) Psicóloa(o) e os serviços de Psicologia se encontram com a acreditação hospitalar, certificação de qualidade preconizada nos hospitais na atualidade. Segundo sua prerrogativa, o olhar da equipe de saúde deve estar alinhado para garantir atenção integral, individualizada, princípios básicos de segurança e qualidade na prestação da assistência. Propor e exercitar um trabalho de colaboração em que as equipes atuem de forma interdependente, com comunicação horizontal para alcançar os objetivos comuns almejados, deve ser desafio acatado pelas(pelos) Psicólogas(os). Colocar o paciente no centro das atenções junto a sua família, assistindo-os à luz da humanização, por certo, favorecerá a qualidade do atendimento e também contribuirá para alcançar o reconhecimento da qualidade institucional, esse trabalho só será possível se as equipes atuarem de forma conjunta. Bioética: da reflexão à prática 11 A bioética pode ser entendida como o “estudo sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da saúde considerada à luz de valores e de princípios morais” (SGRECCIA, 1996). Com o objetivo de ampliar as discussões sobre bioética e as implicações no trabalho da(o) Psicóloga(o) Hospitalar, o XIV Fórum de Psicologia Hospitalar, realizado em novembro de 2014, apresentou o debate de diferentes temas, como interrupção da gravidez, definição do início da vida, dilemas sobre extremo do ciclo vital - em que profissionais e familiares se veem diante do fim da vida -, espaço para a religiosidade, entre outros. No contexto do Fórum, abordou-se que na atualidade a área da saúde está permeada pela tecnociência. Há a possibilidade de mais diagnósticos e acesso a uma maior diversidade de tratamentos. A ciência descobre e oferece a restituição da saúde, de deficiências ou o antienvelhecimento, por exemplo, e a sociedade demanda a perpetuação da juventude e a transformação do corpo em algo novo, como salientou Lazaretti (2014). Há, portanto, um misto do corpo da biologia com o corpo da tecnologia. A alta tecnologia pode, contudo, iatrogenizar o paciente, despersonalizando-o, uma vez que o corpo - como palco das tecnologias 12 recentes - pode ser transformável, tornando real aquilo que era fantástico, porém pode também ser efêmero. A possibilidade de gerenciar o corpo pode, então, objetalizar o sujeito. Verifica-se que essa realidade em torno da tecnologia e das práticas corporais contemporâneas pode instaurar uma crise na relação médico-paciente que pode ser transposta para a relação com os demais profissionaisdas equipes de saúde e com as instituições. Diz-se isso, pois, por um lado há a oferta de tratamento cada vez mais especializado e tecnológico, mas por outro, a ânsia, o desejo por acolhimento, por um olhar integrado dos profissionais, por um projeto terapêutico ampliado e por uma atuação interprofissional. Diante desse contexto, Machado (2014), destacou que a bioética não é um dogma, ela é prática, atingindo as relações e o posicionamento nos consultórios e nos hospitais. Todavia, as interrelações dentro do hospital são intrincadas. Há diferentes códigos de ética, assimetria na relação entre os profissionais (cultura medicocêntrica, hierarquização e controle do trabalho), assimetria na relação médico-paciente entre outras peculiaridades. Em adição consoante, Sanches (2014), apontou que o paciente não é mais tão paciente, ele é impaciente, propondo uma relação mais horizontal na busca de seu bem-estar. Sendo assim, atendendo ao pressuposto bioético da beneficência e para o bem do paciente há que se trabalhar em equipe interdisciplinar com uniformidade de objetivos almejados, considerando-se, no entanto, a complexidade das relações somadas às diversidades culturais, sociais, morais, religiosas e subjetivas. Não há que se buscar o que é certo, mas o que é mais adequado e o consenso das decisões e condutas devem ser sempre dialogados entre os membros da equipe/paciente/família. Na abordagem interdisciplinar e no exercício constante da reflexão e do diálogo, é imperioso garantir o respeito à pessoa, à sua vulnerabilidade, à sua dignidade e autonomia. Para tanto, se deve abordá-la não apenas como um corpo que vive, mas como um ser único com sua subjetividade. Cabe-nos acolher e não julgar, uma vez que isso o Direito faz, porém pela exterioridade dos fatos. Cabe-nos, também, refletir acerca das possibilidades do que tem sido denominado o corpo pós-humano, tanto para o paciente como para os 13 profissionais, haja visto que não se pode desvincular o fascínio que causam no sujeito as condições de intervenção sobre o corpo das fantasias que alimentam o sonho do corpo perfeito e da imortalidade. Há, também, que se incluir a família, não delegando unicamente a ela as decisões, mas sim a convidando a compor com a equipe de saúde. Democratizar informações para a família e abrir espaço para a expressão de seus desejos são ações que encontram amparo ético e moral e ilustram a humanização no atendimento. O que se busca, enfim, é que a ciência que viabiliza a articula ção corpo-tecnologia, mas que incide também em sujeitos cuja identidade é contemporânea atue dentro de padrões éticos. Isso se refere a dizer que, se apaziguem as relações de poder e que se enfatize a participação do paciente e de sua família no processo saúde-doença, valorizando e respeitando a dignidade e a autonomia. Entretanto, num contexto com percepções e perguntas diferentes, com diversidade cultural, moral, social, de saberes, de relações multi e interdisciplinares, o que se vislumbra fazer e/ou atingir no campo da bioética ainda se apresenta como grande desafio. Especificidades da prática do psicólogo hospitalar O objetivo do trabalho em psicologia hospitalar é acompanhar a evolução do paciente quanto aos aspectos emocionais e subjetivos, resgatar dentro do contexto biomédico quem é aquele sujeito que sofre. Os locais do hospital diferem entre si quanto aos objetivos terapêuticos e a relação que o paciente estabelece com a instituição. Romano (1999) sugere que alguns locais do 14 hospital são, por si só, desencadeadores de quadros ou reações psicológicas. A vivência de uma internação prolongada em uma enfermaria difere muito de realizar consultas esporádicas em um ambulatório ou então ficar entre a vida e a morte em uma UTI. A figura a seguir mostra, de forma dinâmica, o fluxo de encaminhamento que um paciente pode ter em um hospital. As portas de entrada se dão pelo ambulatório ou PS; caso reconhecida a necessidade de uma internação, o paciente é transferido para a enfermaria ou UTI. Sendo que, comumente, um paciente grave de UTI retorna para a enfermaria antes da alta hospitalar a fim de completar seu tratamento. O pronto-socorro (PS) de um hospital é o lugar onde chegam não só urgências médicas e dor física mas também é permeado pela dor psíquica. Vieira (2010) explica que experiências únicas decorrentes desse ambiente de urgência e emergência apontam a necessidade de atuação da psicologia hospitalar, acolhendo e humanizando as ações que ali ocorrem, validando e propiciando um espaço para que as angústias ali presentes apareçam. A autora explica que o paciente que procura o PS, geralmente, vive momentos de desestruturação a partir da ocorrência abrupta de um processo mórbido, acidente ou uma descompensação de doenças já existentes. Nesse ambiente, deve-se priorizar questões relativas à perda de autonomia do sujeito, o deparar-se com o 15 desconhecido e imprevisível, que pode ser muito traumático para algumas pessoas, pacientes e familiares (VIEIRA, 2010, p. 513): A equipe de saúde, família e paciente pertencem a contextos diferentes, e o convívio entre eles é, de certa forma, forçado pelo evento da doença. Cada um desses grupos traz consigo expectativas distintas ou idealizações acerca do processo de hospitalização ou da passagem pelo PS, o que pode gerar conflitos ou frustrações maiores. O processo de acolhimento, como aponta Vieira (2010), possibilita regular essa assistência, diminuindo essas dificuldades e valorizando a autonomia dos sujeitos envolvidos, principalmente nos contextos de urgência e emergência. O acolhimento trabalha com a escuta valorizada das queixas do paciente/família, a identificação de suas necessidades com envolvimento e percepção recíproca. Vieira (2010) sugere como sendo fases características de um acolhimento genuíno: o acesso (receber o paciente e a família, proporcionando segurança e conforto), a escuta (incentivar o questionamento e a compreensão do que está se passando, permitir que dúvidas, medos e angústias sejam expressados), o diálogo (orientar familiares sobre o que está acontecendo com o paciente, facilitar a compreensão com uso de palavras adequadas), o apoio (identificar necessidades e procurar satisfazê-las, na medida do possível) e o vínculo (estar aberto ao contato com o outro desamparado). Muitos hospitais compõem sua assistência aos pacientes com um ambulatório clínico. O ambulatório é o local onde os pacientes não se encontram internados, mas vão para realizar consultas com a equipe, exames específicos, procedimentos para uma investigação detalhada de seu quadro clínico 16 (diagnóstica ou de acompanhamento) e tratamento específico (como nos casos de psicoterapia). Durante consultas no ambulatório clínico, podem ser realizadas indicações para internação. Nesse ambiente, a consulta com um especialista e a investigação do quadro clínico (que pode levar a resultados positivos ou negativos), ou até mesmo o retorno para acompanhamento de uma doença já estabelecida, podem desencadear, nos pacientes, reações de ansiedade quanto ao momento vivido. Dito de outra maneira, ir ao ambulatório de um hospital pode ser desencadeante de angústia ou questões emocionais. A psicologia hospitalar também pode realizar atividades no ambulatório clínico, como entrevistas com fins diagnósticos, psicoterapia, entrevistas pontuais, atividades psicopedagógicas, grupos informativos, grupos terapêuticos, entre outras. Segundo Almeida e Malagris (2011), o paciente de ambulatório vem ao psicólogo por indicação médica ou de outros profissionais durante as consultas, principalmente ao ser observado pela equipe algum problema emocional com relação ao adoecimento, entretanto, os pacientes também podem buscar espontaneamenteuma consulta psicológica no ambulatório, ou até mesmo serem encaminhados a ele após a alta hospitalar de uma internação anterior, como continuidade ao tratamento. No caso de uma psicoterapia de seguimento no ambulatório hospitalar, seja ela de curta, média ou longa duração (o que pode variar de acordo com os critérios de cada instituição e com a demanda de tratamento do paciente), vale salientar que as instituições hospitalares procuram se ater às questões emocionais decorrentes ou que influenciam, de alguma maneira, o adoecimento. Romano (1999) sugere que apenas esses pacientes com questões emocionais/ psicológicas que tenham estreita ligação com sua patologia orgânica sejam atendidos nos ambulatórios hospitalares, ainda que esse ponto possa ser subjetivo e de difícil avaliação. Almeida e Malagris (2011) flexibilizam esse ponto diante da escassez de atendimentos clínicos ambulatoriais disponíveis para a população, o que nos leva a uma postura ética ideal de sempre avaliar a demanda que aquele paciente traz à instituição, a relação que é estabelecida com ela (de confiança, de expectativas, de cuidados) e, no caso de 17 encaminhamento para outros serviços, realizá-lo da maneira mais cuidadosa possível, garantindo a integralidade de cuidados para o paciente. Pinheiro e Vilhena (2003) realizam uma interessante discussão acerca das semelhanças ou disparidades entre o trabalho psicoterápico realizado em um ambulatório de uma instituição hospitalar e a clínica privada de um consultório. A priori podemos pensar acerca da questão do adoecimento orgânico que, como colocado anteriormente, perpassa a demanda de acompanhamento psicológico, e a procura pelo serviço por parte do paciente, muitas vezes, a necessidade do atendimento pode nem sequer ser reconhecida pelo paciente, que apenas procura o serviço “sob ordens médicas”. No trabalho psicanalítico, que norteia o pensamento das autoras, a questão da psicoterapia em um ambulatório hospitalar também ganha um caráter de importância uma vez que: 18 As unidades de internação ou enfermarias são a essência de um hospital. Como sugere o próprio nome, é um ambiente com leitos, no qual o paciente ficará internado com fins diagnósticos (para realização de exames e outros procedimentos), para tratamento ou recuperação do estado de saúde. Esses ambientes abrigam diversos pacientes, separados em quartos, os quais podem ser individuais ou compartilhados, geralmente com dois ou três leitos por quarto, separados por um biombo ou até mesmo sem divisões. Tem-se ainda a questão da rotina nas enfermarias, que usualmente começa muito cedo pela manhã, com os banhos, e que ocupa boa parte do dia com exames, administração de medicamentos, procedimentos médicos, curativos, entre outros. Alguns hospitais se organizam em enfermarias de acordo com alguns critérios, como: enfermaria de adultos ou pediátrica, enfermarias de acordo com a doença ou tratamento em questão (enfermaria de queimados, enfermaria psiquiátrica etc.), ou enfermarias pré e pós-cirúrgica (OLIVEIRA; RODRIGUES, 2014). A experiência de estar internado em uma enfermaria difere subjetivamente entre os pacientes. Questões envolvidas, como tempo de internação, gravidade da doença e dos sintomas experenciados, vínculo com a equipe e apoio familiar, devem ser levadas em consideração ao se avaliar o impacto que a internação tem sobre os pacientes. Aspectos inerentes da enfermaria, como rotina hospitalar, horário rígido, natureza do tratamento ou exames realizados, também devem ser considerados. Sobre a vivência de internação em uma enfermaria, Almeida e Malagris (2011, p. 196) discorrem que: 19 Nessas unidades, o psicólogo tem a oportunidade de trabalhar de maneira mais próxima com o paciente e sua família, visto que o contato pode ser diário, além de acompanhar e observar mudanças de comportamentos e atitudes e realizar uma avaliação constante acerca da vivência de hospitalização. Pela proximidade diária, existe a possibilidade de se trabalhar o vínculo com os pacientes e os aspectos de sua história de vida que possam estar envolvidos com o adoecimento, propor uma reavaliação de suas vidas. Segundo Almeida e Malagris (2011), as questões psicológicas a serem abordadas nesse momento devem ser focais, levando em consideração a possibilidade de alta hospitalar, visando a aspectos relacionados com a doença, dificuldades adaptativas ao hospital, o processo de adoecer e os meios diagnósticos e de tratamento propostos. Também é importante ressaltar que, nessa unidade, o psicólogo comumente trabalha atendendo a pedidos de interconsulta ou ele próprio procurando o paciente, oferecendo atendimento psicológico e ficando disponível aos pacientes e familiares. Jugend e Jurkiewicz (2012) explicam que, na assistência psicológica aos pacientes internados, é muito comum surgirem conteúdos dramáticos associados a perdas significativas: pessoas próximas falecidas ou adoentadas, preocupações com trabalho e problemas financeiros, questões conjugais ou dificuldades de relacionamento, aposentadoria ou outros eventos marcantes que acabam associados com a hospitalização na subjetividade do paciente. No entendimento das autoras, a internação desencadeia uma vivência de perdas que se articula com outros momentos semelhantes vividos pelo paciente e como eles foram elaborados, resolvidos ou não. 20 Podemos dizer que a oferta de escuta psicológica durante a internação é uma possibilidade de elaboração não só dessas vivências atuais, mas do que também é reatualizado pelo paciente nesse momento referente às vivências passadas. O processo de elaborar é decorrente, neste caso, de um trabalho mental que requer tempo e depende das condições subjetivas de cada um; elaborar significa ressignificar experiências sob a luz da fala do paciente e da escuta profissional (JUGEND; JURKIEWICZ, 2012). Segundo Barbosa et al. (2007), as equipes assistenciais das diversas unidades hospitalares, mas principalmente no PS, apontam o grande número de pacientes inseguros, com constantes solicitações, demonstração de insatisfação perante os cuidados recebidos, irritabilidade ou comportamentos agressivos. Os autores compreendem essas reações como decorrentes de um processo regressivo, que remete o paciente a buscar a repetição de cuidados (os quais podem ter sido insuficientes ao longo de sua história de vida), mobilizando a equipe para uma busca incessante da satisfação dessas necessidades, as quais não, necessariamente, podem ser racionalmente compreensíveis para os profissionais, mas decorrentes do momento de fragilidade extrema. Delfini, Roque e Peres (2009) apontam a dificuldade em reconhecer e atuar sobre a ocorrência de sintomas de ansiedade e depressão em adultos com adoecimento somático. Os autores mostram que 50% a 80% dos pacientes ambulatoriais e 30% a 60% dos pacientes internados em hospitais gerais sofrem de algum tipo de distúrbio psiquiátrico ou psicológico, sendo que a depressão e a ansiedade se situam entre os mais frequentes. Em contrapartida, é estimado que apenas 35% desses pacientes em instituições hospitalares recebem atendimento especializado em saúde mental durante o período em que são assistidos institucionalmente. Os estudos que levantam a ocorrência de sintomatologia psicológica (nem sempre tratada adequadamente) nos contextos hospitalares propõem que o atendimento psicológico individual poderia ser complementado por intervenções grupais. As intervenções grupais configuram uma situação adequada para se trabalhar a elaboração dos pacientes acerca das informações obtidas sobre a doença e o tratamento médico recebido, assim como também favorecem a elaboração das vivências relacionadas à hospitalização. 21 Segundo Delfini, Roque e Peres (2009), os grupos de apoio parecem serespecialmente favoráveis à redução dos níveis de ansiedade e depressão nos hospitais, além de possibilitarem alívio dos sintomas psíquicos, eles também auxiliam nas estratégias de enfrentamento e recursos adaptativos mediante o compartilhamento de situações vitais semelhantes entre os participantes. Segundo a literatura da área (DELFINI; ROQUE; PERES, 2009; KLEIN; GUEDES, 2006), os grupos de apoio tendem a ser mais eficazes quando possuem alguma característica homogênea, a qual promove identificação entre os pacientes; o caráter homogêneo pode ser atingido ao se trabalhar com pacientes que possuem características clínicas, sintomatologia ou diagnósticos em comum; ou até mesmo com familiares que passam por experiências parecidas quanto ao fato de serem cuidadores dos pacientes. A homogeneidade favorece a troca de experiências e promove a universalidade, importante fator terapêutico e de vinculação nas intervenções grupais; ela promove uma sensação de alívio, compartilhamento de estratégias de enfrentamento e dissipação de crenças errôneas ou negativas. Por fim, o profissional que se propõe a trabalhar com grupos (sejam de apoio, informativos, psicoterapêuticos, de psicoprofilaxia etc.) no contexto hospitalar deve pautar sua formação e seus estudos não apenas nas questões relativas à hospitalização mas também em critérios bem definidos sobre os fenômenos de campo grupal ou específicos do trabalho psicológico em grupos. A Psicologia Atuando em Políticas Públicas de Saúde: Formação e Pertencimento De acordo com Franzese (2011), para atuar em políticas públicas devem ser consideradas ao menos quatro etapas: formação de agenda, formulação da política, implementação das ações e avaliação. Cabe ao profissional da Psicologia atuar em todas as etapas: para o psicólogo, o campo das políticas públicas de Saúde é amplo, com diferentes modos de inserção no SUS. Da gestão em Saúde aos trabalhos de assistência, da organização de campanhas de Saúde e avaliação de seus indicadores à formação de lideranças 22 comunitárias e de agentes de saúde, há espaço para o psicólogo na construção de agendas que sejam coerentes com as reais necessidades e demandas dos sujeitos e das coletividades. O psicólogo pode propor ações que fortaleçam vínculos e redes, dando vigor a fatores de proteção, melhorando a comunicação e potencializando o cuidado de profissionais e de usuários. Entretanto, apesar de reconhecidas mudanças, ainda se visualizam profissionais que não sabem e/ou, muitas vezes, se recusam a interdisciplinar com seus próprios pares e com outras áreas no interior da política do SUS, construída sob o pilar da transdisciplinaridade e da horizontalidade nas ações. Se essa política preconiza e se processa inclusive no rompimento com as desigualdades sociais, acredita-se que as práticas do psicólogo e seu compromisso social precisam se fazer presentes. Uma demarcação ética para esse protagonismo social tem sido muito bem estabelecida na área dos Direitos Humanos, no âmbito da Reforma Psiquiátrica, do SUS, dos direitos psicossociais dos usuários dos serviços, dentre outros. Neste ínterim, os profissionais da Psicologia enfrentam o grande desafio de redimensionamento de suas práticas: a necessidade é de complementação e de uma efetiva flexibilização das tecnologias para o desenvolvimento de saberes e de fazeres psicológicos condizentes com o campo. Desta forma, o diálogo das políticas públicas de Saúde com as questões e as limitações da Psicologia precisa estar atrelado à própria formação do psicólogo, que necessita urgentemente potencializar a inclusão do SUS no cotidiano dos estudantes desde cedo, bem como de temas como Cidadania, Direitos Humanos e Movimentos Sociais, ampliando também possibilidades de intervenção e de trabalho em equipe. Kastrup (1999) aponta como alternativa para um novo estilo de fazer Psicologia a possibilidade de produzir, com os estudantes, uma política de invenção do aprender a aprender, em que o saber transmitido não se separa de repetidas problematizações, não se processa pelo imediatismo e pela instantaneidade, mas pelo movimento do tateio e da experimentação, da composição e da recomposição incessantes, até que se constitua a formação por outros modos de trabalho e de subjetivação. 23 O psicólogo firma seu lugar como agente social, (des)/(re)construindo e sendo construído, na condição de aprendiz, durante o processo desta prática. Este paradigma de formação deve passar, necessariamente, pela gestão compartilhada em Saúde com gestores, trabalhadores e usuários do SUS. É justamente este cenário de movimento e de transformação que coloca a Psicologia frente aos desafios e às demandas do SUS, colaborando, de diversas formas e espaços, para sua consolidação e para seu desenvolvimento, e capacitando o psicólogo, inclusive, a estar disponível e ser capaz de contribuir para a melhoria de políticas já existentes, e para a formulação e a implantação de novas políticas (BÖING; CREPALDI, 2010). É preciso ressaltar que, em larga escala, as ferramentas de trabalho (teóricas e técnicas) enfatizadas na formação acadêmica em Psicologia ainda se apresentam limitadas para esta atuação, reflexo de antigos conceitos e de antigas formas de intervenção, como já descrito, que foram criadas e se desenvolveram no trabalho com a camada alta da população. Valores e formas de pensar e viver a realidade social, muitas vezes, são muito diferentes da forma com que a população encara a vida. Há que se indagar, defronte a este horizonte formativo, qual a pertinência da utilização de determinados escopos teóricos- metodológicos, de determinados conceitos e de determinadas práticas terapêuticas, para dar visibilidade à realidade dos sujeitos e às suas demandas (BOCK, 2012). Assim, é relevante ressaltar a importância da criação e do desenvolvimento de espaços de aprendizagem, de pesquisa e de produção científica que espelhem o crescente pertencimento do psicólogo ao SUS (BENEVIDES, 2005; DIMENSTEIN, 2001; GONÇALVES, 2010); espaços estes que funcionem, também, como norteadores de uma profunda reformar curricular, inserindo na formação, por excelência e não por exceção, o adentramento das políticas públicas de Saúde pela Psicologia. Tendo sido sublinhada a necessidade de discutir e de reformular os lugares da formação, é crucial também considerar que muito se discute acerca de que outros lugares a Psicologia tem ocupado na configuração das políticas públicas de Saúde, levando em consideração sua presença nos serviços de saúde, nas secretarias, nos conselhos e nas supervisões (NASCIMENTO et al., 24 2001). É possível perceber, por estas dinâmicas, que estar no campo das políticas públicas de Saúde é estar imerso em um espaço de conflitos, avanços e retrocessos; contudo, a Psicologia tem conseguido fomentar e manter a discussão sobre a questão coletiva, tanto nas áreas de atuação, quanto na ampliação desta pauta para as dimensões ética e política em que está implicada. Exemplos disto são a participação integrada da Psicologia no desenvolvimento e na consolidação de processos inclusivos em variados serviços do SUS, e também seu trabalho na tessitura de vínculos necessários à fluidez e à eficácia da rede de Saúde e à co-criação dos espaços de Saúde entre gestores, profissionais e usuários em todos os níveis de atenção e de cuidado. Ademais, é pertinente enfatizar as contribuições da Psicologia nas políticas que agem com base na Redução de Danos e também na Atenção Básica, pelo Apoio Matricial. O tema da inclusão, de modo geral, ganha cada vez mais expressão na realidade do País, determinando a elaboração e a implementação de políticas públicas de Saúde com a perspectiva de engajamento nos espaços sociais e na vida comunitária de sujeitos que, pela condição particular da sua constituiçãofísica, psíquica ou social, eram submetidos a destinos como a internação em instituições totais ou a submissão a confinamento doméstico. No modelo da clínica ampliada, que será abordado em outros capítulos, posto pelas atuais políticas públicas de Saúde, o deslocamento do espaço fechado das instituições para o contexto aberto da cidade incide sobre a atuação do psicólogo em uma ampla gama de situações, gerando demandas que ultrapassam as estratégias da Saúde, com alcance no campo das políticas sociais, das políticas de Educação, de Cultura e de Trabalho. Assim, fica claro como a Psicologia tem a possibilidade de assumir papéis estratégicos na elaboração e no fazer da rede: na assistência direta e na regulação dos serviços de Saúde, no trabalho em conjunto na Atenção Básica com as equipes de Saúde da Família e Agentes Comunitários de Saúde, na promoção da vida comunitária e da autonomia dos usuários, a Psicologia tem como contribuir na articulação de recursos existentes de teias inter-setoriais, como nas parcerias com a Assistência Social, a Educação, as cooperativas de trabalho, as escolas, dentre outras. A Psicologia também é chamada a assumir um espaço de cuidado nas ruas e fora das instituições formais, repensando relações, preconceitos e 25 estratégias de vinculação e de promoção de saúde, comprometendo-se com os princípios do SUS em sua multiplicidade de formas de busca de garantia de acesso à saúde, e também em seu reconhecimento das necessidades dos sujeitos e das coletividades e, assim, deixando cada vez mais de se identificar com a faceta legitimadora da normatização e repressora das singularidades que um dia compôs seu principal modelo de pensamento e de ação. No cenário da promoção da saúde, as práticas da Psicologia são importante espaço de promoção e manutenção da saúde, de prevenção e tratamento das doenças, tendo implicação direta com a percepção que se tem de saúde. Cabe esclarecer que Promoção da Saúde está envolvida em um processo de habilitação da comunidade, que transcende a concepção de prevenção e visa a fusão da saúde e bem-estar em geral. Suas estratégias visam melhores condições de vida biopsicossociais, e a responsabilidade pela busca do bem-estar universal deve ser dos diversos setores da política. A Psicologia pode se inserir na Política de Promoção da Saúde pela via do cuidado, da humanização e da qualificação da atenção à saúde, pela sua ligação à prática educativa. O SUS preconiza as ações de tal política como aquelas orientadas para a melhoria da qualidade de vida. No âmbito da Atenção Básica, essas ações muitas vezes ficam a cargo dos profissionais psicólogos, e devem buscar a autonomia dos sujeitos e das coletividades, procurar estabelecer possibilidades crescentes de saídas coletivas e solidárias para problemas que também são coletivos. Nesse sentido, essas ações visam à melhoria das condições de vida, e se sustentam pela articulação intersetorial e a consecução do direito à saúde. Vale frisar que, dentre outros lugares nas políticas públicas de Saúde, a Psicologia marcou e marca seu lugar na construção e na consolidação da Política de Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas, a partir da diretriz da Redução de Danos (RD), nos vários patamares de intervenção – primário, secundário e terciário – em programas e em ações voltados para a prevenção de riscos e de danos sociais e à saúde, bem como na Política Nacional de Promoção da Saúde. A importância da Psicologia está presente na própria história da Redução de Danos no Brasil, na desconstrução de preconceitos e de engessamentos, no desmonte de relações de poder, no trabalho de reflexão, nos atos simbólicos envolvidos, na produção de discursos 26 democráticos e de garantia de direitos dos sujeitos – inclusive o de continuar o uso –, enfim, todo um universo sobre que a ciência psicológica tem muito a dizer. A Psicologia, em seu novo estilo de pensar e de se relacionar com o usuário de drogas, faz relevante presença na Redução de Danos enquanto diretriz de trabalho nas políticas públicas sobre drogas na Saúde, seja no aspecto da prevenção e da educação para a saúde, seja no aspecto político. Ao assumir seu lugar como redutor de danos, tanto no espaço institucional – nos CAPS ad, nos hospitais gerais, nas Unidades de Acolhimento – quanto na rua – em conjunto com os Consultórios na Rua da Atenção Básica ou com outras equipes de abordagem social – o psicólogo proporciona à pessoa em abuso de drogas experiências de valores, antes distantes de sua realidade; oferece um espaço de atenção e de cuidados integrais, de inserção social, de exercício político e de novas formas de estar no mundo, mesmo com a continuidade do uso. Sendo a Redução de Danos uma abordagem baseada na aceitação e na empatia, é amplo seu encontro com a Psicologia ao lidar com o sofrimento físico, psíquico e social. Além da Redução de Danos, outro campo de inserção que tem-se constituído para o psicólogo é o Apoio Matricial às equipes de Saúde da Família na cobertura da Atenção Básica. Este contexto abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde (BRASIL, 2012), empreendendo ações integrais com a função de organizar todo o sistema de Saúde. Desta forma, a partir do conhecimento e da prática transdisciplinares, bem como da participação ativa dos usuários e, portanto, a partir de uma atuação amplamente amparada nas implicações sociais do/no território em que ocorre, o princípio da integralidade do SUS convoca novos atores, e torna imprescindíveis ao primeiro nível de atenção equipes interdisciplinares que desenvolvam ações intersetoriais, segundo Böing e Crepaldi (2010), a partir da revisão de diversos autores. Cabe lembrar que a atuação da Psicologia não se restringe apenas às práticas clínicas, mas abarca todas as potencialidades que a atuação em Políticas públicas nos apresenta. É, portanto, fundamental contribuir ainda com o desenvolvimento de pesquisas e produção científica que espelhe o crescente interesse pela atuação do psicólogo da saúde no eixo de intervenção voltado 27 para o melhoramento do sistema de saúde e formulação de Políticas Públicas (BENEVIDES, 2005; DIMENSTEIN, 2001; GONÇALVES, 2010). Por fim, considerando que o psicólogo, em seu compromisso ético- político-social, orienta-se a participar e a intervir intensamente em diversos aspectos da relação consigo mesmo, com o outro, com o mundo e com a vida, torna-se claro que a relevância da Psicologia brasileira no século XXI depende de seu investimento na ressignificação de seus papéis, e de sua disponibilidade em ocupar os espaços que se apresentam como demandas e como desafios para a produção de novos caminhos e de novos resultados para a contemporaneidade. 28 REFERÊNCIAS ALMEIDA, R. A. de; MALAGRIS, L. E. N. A prática da psicologia da saúde. Revista da SBPH, Rio de Janeiro, v. 14, n. 2, p. 183-202, 2011. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516- 08582011000200012&lng=pt&nrm=iso>. AMARAL, V.L.A.R. (2001). Análise funcional no contexto terapêutico da instituição. In D. R. Zamignani (Org.). 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