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Analgesia Epidural com Opióides em Cães e Gatos Epidural Analgesia with Opioids in Dogs and Cats Lanucha Fidelis da Luz Moura* Emerson Antonio Contesini** Moura LFL, Contesini EA. Analgesia Epidural com Opióides em Cães e Gatos. MEDVEP - Rev Cientif Vet Pequenos Anim Esti 2006;4(12):104-10 Embora a dor seja um processo natural de defesa do organismo, ela pode se tornar responsável por distúrbios sistêmicos nocivos, caso não seja feito tratamento adequado. Muitas estratégias terapêu- ticas podem ser empregadas no intuito de controlar a dor nos animais de forma segura e efetiva e nesta realidade os opióides surgem como fármacos de alta eficácia e segurança. Recentemente, novos métodos de administração dos opióides têm sido adotados na prática veterinária, dentre eles, a via epidural, sendo especialmente indicada para pacientes de alto risco. O trabalho objetiva revisar a lite- ratura disponível no assunto, abordando a administração de fármacos opióides pela via epidural para controle da dor em cães e gatos, as indicações, a técnica, as doses e outros pontos relevantes. Palavras-chave: analgesia; opióides; epidural; cães; gatos INTRODUÇÃO Embora a dor seja um processo natural de defesa do organismo, uma vez não tratada ela se torna responsável por distúrbios sistêmicos nocivos ao animal. Neste processo, a dor fisiológica passa a se chamar patológica, caracterizando-se pela presença de alodinia (sensibilidade dolorosa), hiperalgesia (resposta exagerada a estímulos) e hiperalgesia secundária (aumento da área de hipersensibilidade) (1). Estas alterações, por sua vez, levam a importantes distúrbios comportamentais e emocionais que atrasam o processo de cura do paciente (2). Atualmente existem muitas estratégias terapêuticas que podem ser empregadas no intuito de controlar a dor nos animais de forma segura e efetiva, e neste contexto os opióides se destacam como fármacos de alta eficácia e grande segurança (3). Novos métodos de administração dos opióides têm sido adotados na prática veterinária, dentre eles a via epidural (4). Assim, uma agulha penetra no canal espinhal sem, no entanto, atingir as meninges, e a solução injetada percorre o canal por fora da dura-máter (5). As complicações sistêmicas resultantes da administração epidural são bastante previsíveis e, em sua maioria, tratáveis (6). Dessa forma, a administração de opióides por via epidural é vista como uma forma bastante segura de tratar a dor em animais, sendo especialmente indicada para pacientes de alto risco (7). O presente trabalho tem por objetivo revisar a literatura disponível no assunto, de modo que seja possível delinear a utilização de fármacos opióides pela via epidural para controle da dor em cães e gatos, demonstrando os preceitos, as técnicas e as questões mais relevantes quando da escolha deste método. MECANISMO DE AÇÃO DOS FÁRMACOS OPIÓIDES A ligação do agonista opióide e conseqüente ativação de seu receptor inicia uma cascata de eventos que resulta em efeitos biológicos variados (8). O papel dos opióides melhor estudado é no controle da dor, no qual sabe-se que eles inibem a liberação de neurotransmissores no gânglio da raiz dorsal no corno dorsal da medula espinhal (9). * Acadêmica do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul ** Médico Veterinário, Doutor, Professor Adjunto da Faculdade de Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul RE V IS Ã O D E LI TE RA TU RA 105Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2006; 4(12):104-10 Entretanto, o mecanismo de ação pelo qual os opióides exercem efeitos analgésicos quando administrados por via epidural não está totalmente elucidado, mas parece envolver a difusão do fármaco através das meninges e no interior do cordão espinhal (10). Pesquisas levaram inicialmente à identificação de três distintos receptores opióides: mu, sigma e kappa, cada um possuindo propriedades farmacológicas e fisiológicas únicas (11). Embora a International Union of Pharmacology (IUPHAR) tenha reclassificado os receptores opióides como OP1 (delta), OP2 (kappa) e OP3 (mu), esta mudança não foi aclamada universal- mente, e muitos autores ainda utilizam a classificação original pelo alfabeto grego (12), de forma que tal nomenclatura será utilizada no presente trabalho. Ainda que muitos autores relatem a existência de receptores sigma e epsilon, o receptor sigma não é mais considerado como opióide por natureza, uma vez que não apresenta afinidade por naloxona, mas sim pelo haloperidol e pelos derivados da fenciclidina. A existência de receptores opióides epsilon, por sua vez, tem sido tema de ainda maior controvérsia. Eles ainda não foram clonados e não possuem agonistas ou antagonistas seletivos (13). Os receptores mu existem em três subtipos: mu1, de alta afinidade, mu2, de baixa afinidade, e o recen- temente descrito mu3 14. Dentre os principais efeitos da estimulação de receptores mu encontram-se a analgesia, a depressão respiratória e a euforia (15). Existem até a atualidade três subtipos de recep- tores kappa: kappa1, kappa2 e kappa3. A estimulação de kappa1 envolve analgesia espinhal, enquanto que a de kappa3 envolve a analgesia supraespinhal. O papel de kappa2 é ainda desconhecido (16). Dois subtipos dos receptores delta têm sido iden- tificados. Em animais, agonistas delta relativamente específicos produzem analgesia nos sítios supraespi- nhais e antinocicepção para estímulos térmicos nos sítios espinhais (14). CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS A medula espinhal é a porção do Sistema Nervo- so Central (SNC) caudal ao cérebro que está contida no interior do canal vertebral. Nos diferentes animais domésticos a região final caudal da medula espinhal varia em relação à última vértebra lombar e o sacro (17). No cão, o fim da medula ocorre em L6-L7 18. No gato, porém, o cordão espinhal termina mais caudal- mente (tão distante quanto S1), de modo que o risco de lesão é maior quando da realização da técnica epidural (19). As meninges, por sua vez, são membranas fibrosas que envolvem e protegem o cérebro e a medula espinhal, sendo em número de três: dura- máter, aracnóide e pia-máter (17). A dura-máter apresenta um rico suprimento sanguíneo e essa rede capilar atua retirando uma parte do opióide que se difunde do espaço epidural para o espaço subarac- nóide. Como os fármacos hidrofóbicos têm muito maior permeabilidade através das células endoteliais capilares do que os fármacos hidrofílicos, eles são mais rapidamente eliminados. O sítio de ação dos fármacos opióides administrados por via epidural en- contra-se na substância cinzenta do corno dorsal do cordão espinhal, a qual encontra-se circundada pela substância branca. Assim, para alcançar seu sítio de ação, um opióide administrado por via epidural deve atravessar o espaço epidural, as meninges espinhais, o fluido cefalorraquidiano e a substância branca da medula (20). TÉCNICA EPIDURAL A administração epidural de fármacos mos- tra-se um procedimento tecnicamente fácil quando realizado por um anestesista relativamente experiente (21). Embora nos cães a técnica seja amplamente descrita, nos gatos apenas ocasionalmente surgem referências à sua realização, no entanto o procedi- mento é basicamente o mesmo. Nesta espécie, po- rém, a injeção epidural é mais desafiadora, devido ao seu pequeno tamanho e ao cordão espinhal terminar mais caudalmente (22). Apesar de ser quase que in- variavelmente realizada no espaço lombo-sacro, em cães de grande porte a técnica de injeção epidural pode eventualmente ser executada no espaço sacro- coccígeo (23). A sedação ou tranqüilização do animal é ge- ralmente necessária para diminuir o sofrimento e a ansiedade durante a realização do procedimento (24). O animal pode ser posicionado em decúbito esternal ou lateral e os membros posteriorespodem ser esten- didos cranialmente no intuito de separar ao máximo as vértebras lombares (25), sendo uma alternativa posicioná-los pendentes de uma mesa (26). As pro- eminências ilíacas em ambos os lados da coluna são palpadas usando o polegar e o dedo médio de uma das mãos, e o processo espinhoso da sétima vértebra lombar (L7) pode ser localizado com o uso do dedo A N A LG ES IA E PI D U R A L C O M O PI Ó ID ES E M C Ã ES E G A TO S 106 Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2006; 4(12):104-10 indicador, como demonstrado na Figura 1. O espaço lombo-sacro encontra-se imediatamente caudal ao processo espinhoso de L7, situando-se sobre a linha média dorsal (25). Imediatamente após ultrapassar o ligamento flavo, a agulha penetra no espaço epidural. Isso geralmente ocorre a uma profundidade de 1 a 3cm, dependendo do tamanho do animal. A confirmação da localização pode ser realizada pelo teste de perda de resistência. Para isso, utiliza-se a injeção de ar ou solução salina através da agulha, não devendo ser sentida qualquer resistência caso o posicionamento esteja correto. Este procedimento é facilitado pela utilização de uma seringa de vidro, o que permite uma maior sensibilidade. A injeção de ar fora do es- paço epidural possibilita, ainda, que se perceba certa crepitação subcutânea (25). Não existe um consenso quanto à escolha de ar ou solução salina para rea- lização do teste, contudo existem muitos relatos de casos descrevendo uma variedade de complicações relacionadas à utilização do ar (28). O estilete deve ser removido e cuidadosamente inspecionado quanto à presença de líquido cefalorra- quidiano (LCR) ou sangue. Não sendo observada a presença de sangue ou LCR, a agulha deverá ser as- pirada para detectar esses líquidos (5;19). A presença de LCR indica punção subaracnóide, sendo indicada a retirada da agulha e abandono da técnica. A presença de sangue, por sua vez, indica a penetração do plexo venoso ventral, sendo necessário retirar a agulha e posteriormente proceder a nova tentativa de posicio- namento (25). A Figura 3 ilustra a administração da solução no interior do espaço epidural. Figura 1: Localização do sítio de inserção lombo-sacro. A região deve ser cirurgicamente preparada, com re- alização de tricotomia e anti-sepsia cuidadosa, visto que a maioria dos abscessos epidurais é causada por organismos da pele, geralmente do gênero Staphylococcus. Clorexi- dine em álcool é reconhecidamente melhor do que iodo povidine para a preparação da pele durante a colocação de cateteres vasculares (25) e esta indicação possivelmente pode ser estendida aos cateteres epidurais. A escolha da agulha varia conforme o tamanho do animal, devendo ser inserida perpendicular à superfície da pele, na linha média do espaço lombo- sacro, direcionando-a ventralmente em um ângulo levemente cranial ou caudal, como se fizer necessá- rio, tomando-se o cuidado de não desviá-la para um dos lados (Figura 2). Uma vez alcançado o ligamento flavo, uma sensação peculiar pode normalmente ser sentida, descrita pela maioria dos autores como um “pop” (25). No gato, porém, a passagem do ligamento é difícil de ser percebida (22). Figura 2: Inserção da agulha epidural. Figura 3: Injeção da solução no espaço epidural. Se a escolha for pela realização de uma analgesia contínua, opióides podem ser administrados utilizan- do-se um cateter epidural através de uma agulha de Tuohy de calibre 18 ou 17, ou uma agulha de Crawford de calibre 18. Os princípios da colocação da agulha de A N A LG ES IA E PI D U R A L C O M O PI Ó ID ES E M C Ã ES E G A TO S 107Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2006; 4(12):104-10 Tuohy são semelhantes aos da agulha epidural. Uma vez posicionada a agulha de Tuohy, o cateter deve ser avançado pelo interior do espaço epidural, sendo que uma certa resistência é normalmente sentida quando o cateter passa através da extremidade da agulha. Havendo falha do cateter em avançar, o cateter e a agulha devem ser retirados simultaneamente. Ne- nhuma tentativa de retroceder com o cateter pelo interior da agulha deve ser realizada, sob risco de seccioná-lo (25). A administração de opióides cronicamente por via epidural envolve a manutenção do cateter por um a vários dias. A freqüência de complicações associa- das com a cateterização epidural temporária em cães parece ser baixa, e as complicações geralmente não são sérias. Assim, os cateteres podem ser mantidos por até sete dias de forma segura (7). OPIÓIDES EMPREGADOS POR VIA EPIDURAL A escolha do opióide dependerá do grau de analgesia necessário, da velocidade com que o fármaco desenvolve seus efeitos e do tempo de ação requerido, bem como dos efeitos adversos que poderão ser tolerados nessa circunstância (5). Muitos opióides apresentam conservantes em suas formulações, e segundo (23) uma possível neurotoxicidade deles tem sido testada, embora não extensivamente. Assim, preconiza-se que todo fármaco injetado no espaço epidural ou intratecal deva ser livre de conservantes (19). Morfina A morfina é considerada o protótipo dos analgé- sicos opióides e correlatos, com a qual todos os outros agentes são comparados (15;7). Por ser hidrofílica e ionizada, a morfina apresenta um lento início de ação, no entanto permanece por um longo período no líquido cefalorraquidiano, promovendo uma anal- gesia bastante prolongada. Contudo, isso possibilita uma grande dispersão cranial, devido à difusão e distribuição no líquido cefalorraquidiano e, enquanto permite analgesia distante do local de injeção, tam- bém aumenta a chance de efeitos sistêmicos (29). Para administração epidural, alguns autores indicam uma dose de 0,07 a 0,1mg.kg-1, associada ou não a um anestésico local3. Os dados referentes ao uso da morfina epidural em gatos, porém, são mais escassos. Estudos demonstraram que, por esta via, o lofentanil é mais potente que a morfina (30). Meperidina A meperidina é um opióide sintético, agonista puro, com afinidade pelos receptores mu. O efeito analgésico da meperidina é bem menor que o da morfina (23). O uso da meperidina por via epidural ainda é controverso. O potencial para acumulação de seu metabólito tóxico, a normeperidina, torna a meperidina desaconselhada para tudo, exceto o uso epidural de curta duração (20). Além disso, leve ataxia e incoordenação podem ser observadas nos animais recebendo meperidina por via epidural, visto que, além de uma atividade opióide, esse agente possui, ainda, propriedades anestésicas locais, atuando nas raízes nervosas espinhais (23). Fentanil O fentanil é um opióide agonista mu, sintéti- co, de curta ação e latência em razão da sua alta lipossolubilidade. Devido a esta última característica físico-química, o fármaco sofre rápida ligação ao tecido nervoso espinhal e gordura epidural, bem como maior absorção pelos vasos epidurais. A conseqüência é uma ação segmentar com duração de ação menor do que outros opióides lipossolúveis (31). Enquanto alguns autores acreditam que seu sítio de ação após injeção epidural seja na medula espinhal, outros afirmam que é na região supra- espinhal, devido a sua alta lipossolubilidade, com conseqüente absorção sistêmica e distribuição para o encéfalo (3, 21) recomendam a administração de 1 a 10mg.kg-1 de fentanil diluídos em 0,26 mL.kg- 1 de solução fisiológica, produzindo alívio da dor entre 15 e 20 minutos depois, com analgesia por 3 a 5 horas. Buprenorfina A buprenorfina é um opióide semi-sintético que possui longa ação e é lipossolúvel, sendo um opióide agonista-antagonista (ela atua como agonista par- cial nos receptores mu, e antagonista nos receptores kappa) (33). Experimentos realizadosem animais têm relatado que a buprenorfina pode ser tão po- tente quanto a morfina, o que foi demonstrado por estudos utilizando a via epidural. Adicionalmente a buprenorfina é um fármaco com menor potencial para abuso do que a morfina. Assim, a buprenorfina oferece a teórica vantagem de ser menos proble- mática quando múltiplas pessoas necessitam de acesso a substâncias controladas (10). A N A LG ES IA E PI D U R A L C O M O PI Ó ID ES E M C Ã ES E G A TO S 108 Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2006; 4(12):104-10 Butorfanol O butorfanol é um opióide semi-sintético aproxi- madamente cinco vezes mais potente do que a mor- fina. Suas principais ações resultam de sua atividade agonista nos receptores kappa e antagonista nos re- ceptores mu. O grau de analgesia promovido pelo bu- torfanol não é tão profundo quanto aquele produzido pelos agonistas puros e, portanto, deve ser utilizado apenas em pacientes com dor moderada (7). Tramadol A utilização do tramadol pela via epidural tem se mostrado promissora. Estudos em humanos de- monstraram sua eficácia em promover analgesia com mínimo de efeitos adversos (34). Na prática veteri- nária, estudos relataram que a utilização de tramadol por via epidural em cães submetidos à substituição do ligamento cruzado cranial não causou interferência significativa na função hemodinâmica (35). Metadona A metadona é um agonista sintético, aproxi- madamente equipotente com a morfina em relação a analgesia, porém, produzindo menos sedação em cães (5). A metadona é mais um opióide que tem mostrado possuir moderada seletividade espinhal após administração epidural, contudo sua meia-vida plasmática muito longa resulta em acúmulo no plas- ma e muitos efeitos supraespinhais (20). Nos gatos, uma dose de 0,7-1mg.kg-1 tem rápido início da ação, mas com duração de efeitos de apenas uma hora. Informações sobre o uso da metadona em cães são escassas (23). Sufentanil O sufentanil apresenta duração de ação infe- rior àquela apresentada pelo fentanil, entretanto, sua potência é cerca de 100 vezes maior que a da morfina (36). Devido à sua hidrofobia signifi- cativamente maior que a do fentanil, o sufentanil tem sido sugerido como uma melhor opção para analgesia epidural pós-operatória. A injeção de sufentanil no interior do espaço epidural produz analgesia, contudo o efeito analgésico é mediado pela captação sistêmica e redistribuição do fármaco aos receptores do tronco cerebral. Até a atualidade, não existe qualquer estudo demonstrando um sítio de ação espinhal para o sufentanil administrado pela via epidural (20). CONTRA-INDICAÇÕES Dentre as contra-indicações absolutas às técnicas de anestesia epidural estão as infecções no sítio da punção lombo-sacra, hipovolemias não corrigidas, desordens hemorrágicas, anticoagulação fisiológica ou terapêutica e anormalidades anatômicas que dificultem a técnica (25). As contra-indicações relativas à técnica, porém, incluem algumas condições particulares, como bacteremias e terapias com baixas doses de heparina (23). COMPLICAÇÕES E EFEITOS ADVERSOS O efeito adverso mais preocupante com o uso epidural de opióides é a depressão respiratória. Devido à natureza hidrofílica de alguns opióides, como a morfina, há um aumento na tendência de que a droga permaneça no SNC, particularmente no líquido cefalorraquidiano, resultando em uma possível dispersão cefálica e em depressão respiratória tardia (37). Os opióides interferem nos centros da ponte e da medula que regulam a ritmicidade respiratória (38). Embora rara, a depressão respiratória pode ocorrer nos animais, sendo por vezes bastante tardia e ocorrendo em um momento no qual o paciente não está sob rigorosa observação (5). A depressão respi- ratória precoce ocorre nas primeiras 2 horas após a injeção epidural do opióide e é resultante da captação e redistribuição do fármaco. A depressão respiratória tardia ocorre 6 a 12 horas após a injeção espinhal ou epidural, e é conseqüência da migração cranial do opióide no líquido cefalorraquidiano. O tratamento imediato de uma depressão respiratória severa deve ser o suporte da ventilação (38). O prurido não segmentário é mais um possível efeito indesejado induzido pela administração de mor- fina, provavelmente sendo dose-dependente. Embora ainda não se tenha uma explicação para o fenômeno, acredita-se que ele seja causado por uma alteração da modulação do sistema sensorial cervical, causada pela difusão cranial do opióide (39). Retenção urinária tem sido relatada após analge- sia epidural, e pode requerer intervenção se grandes volumes de fluido forem administrados, através de compressão manual ou cateterização vesical (23). Ela tem sido relacionada à perda do tônus do músculo detrusor por ocorrência de um bloqueio parassimpá- tico40, uma vez que a morfina se liga aos receptores mu e delta da medula e inibe os axônios parassim- páticos eferentes do nervo pélvico (9). A N A LG ES IA E PI D U R A L C O M O PI Ó ID ES E M C Ã ES E G A TO S 109Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Estimação 2006; 4(12):104-10 Uma vez colocada no espaço epidural, a ponta do cateter pode sofrer deslocamento para o espaço intratecal ou mesmo uma migração intravenosa. Ambos devem ser considerados antes que uma dose em bolus seja administrada através do cateter, de forma que deve ser realizada cuidadosa aspiração previamente à injeção do fármaco (37). Infecção pode ser introduzida no espaço epidural por uma via exógena, como equipamentos ou fárma- cos contaminados, bem como através de uma fonte endógena, geralmente uma bacteremia que alcança o cateter e germina. O resultado desta infecção pode ser a formação de um abscesso epidural, resultan- do na compressão do cordão espinhal. A punção de vasos epidurais pode ocorrer durante a colocação do cateter, contudo o subseqüente desenvolvimento de um hematoma espinhal causando dano neurológico é uma complicação rara (37). Outros possíveis efeitos indesejáveis da administração de opióides por via epidural compreendem o retardo da motilidade in- testinal e o vômito, além de problemas relacionados ao cateter, como sua oclusão (21). CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora muitos profissionais ainda apre- sentem receio quanto ao emprego de técnicas mais elaboradas e por vezes mais dispendiosas, como a analgesia epidural, as vantagens de sua utilização são facilmente perceptíveis e boa parcela dos clínicos reconhece a viabilidade de sua aplicação. Sua utili- zação, entretanto, vem acompanhada de rigorosas exigências para que se obtenha o sucesso, muitas das quais podem ser vistas como empecilhos ao seu emprego na realidade da veterinária. Dessa forma, a utilização dos opióides por via epidural em cães e gatos mostra-se uma técnica altamente vantajosa que deve ser, entretanto, cercada de cuidados quando de sua realização, visto que as complicações decorrentes de seu emprego, embora raras, podem ser catastróficas. Moura LFL, Contesini EA. Analgesia Epidural com Opióides em Cães e Gatos. MEDVEP - Rev Cientif Vet Pequenos Anim Esti 2006;4(12):104-10 Although the pain is a natural organism defense, it can be responsible for noxious systemic disturbs, if it doesn´t receives the adequate treatment. Many therapeutical strategies can be used with the intention of control animals pain by safe and effective ways, and in this reality the opioids appear as high efficiency and safe drugs. Recently new administration methods of opioids has been adopted in the veterinary practice, amongst them, the epidural route, being indicated for high risk patients. The paper seeks to revise the subject available literature, approaching the administration of opioid drugs thought theepidural route to pain control in dogs and cats, the indications, the technique, the doses and other excellent points. Keywords: analgesia; opioids; epidural; dogs; cats. REFERÊNCIAS 1 - FANTONI DT, MASTROCINQUE S. Analgesia preemptiva: mito ou fato? Clín Vet 2004; 49:24-32. 2 - PINTO JM, CORTOPASSI SR, MACHADO A. Analgesia transo- peratória induzida pela morfina ou meperidina em gatos submetidos a osteossíntese. Ciênc Rural 2002; 32(1):67-72. 3 - FANTONI DT, MASTROCINQUE S. Fisiopatologia e controle da dor. In: FANTONI DT, CORTOPASSI SRG. Anestesia em cães e gatos. São Paulo: Roca; 2002. p.323-36. 4 - BRUECKER KA. A practical review of recent advances in small animal orthopedics. Calif Vet 1998;52:18-22. 5 - HALL LW, CLARKE KW. Veterinary anaesthesia. 9.ed. 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