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Aula4 - Princípio da Humanidade_bGVzc29uOjIyMTE3

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Curso	Ênfase	©	2019
EXECUÇÃO	PENAL	–	FELIPE	ALMEIDA
AULA4	-	PRINCÍPIO	DA	HUMANIDADE
1.	CONSIDERAÇÕES	INICIAIS
Na	 presente	 aula,	 serão	 analisados	 os	 Princípios	 Fundamentais	 do	 Direito	 de	 Execução
Penal,	que	são	rotineiramente	exigidos	nos	concursos	de	carreira	estadual.	Então,	tratando-se	das
questões	mais	 atuais	 no	 âmbito	 da	 execução	penal,	 serão	 analisados	 sob	 o	 viés	 da	 normativa
internacional.
Assim,	inicialmente,	verifica-se	o	Princípio	da	Humanidade.
2.	PRINCÍPIO	DA	HUMANIDADE
Conforme	sintetiza	o	professor	Zaffaroni,	o	princípio	da	humanidade	ou	humanização	das
penas,	em	 linhas	gerais,	é	o	não	esquecimento	de	que	o	condenado	é	pessoa	humana.	Assim,
mesmo	 que	 o	 sujeito	 ostente	 essa	 condição	 jurídica	 de	 condenado	 e	 esteja	 privado	 de	 sua
liberdade,	não	perde	a	sua	condição	de	ser	humano,	mantendo	direitos	inerentes	a	essa	condição.
Nesse	 contexto,	 rememore	 que,	 conforme	 determina	 o	 artigo	 3º	 da	 Lei	 de	 Execução
Penal,	o	preso	não	poderá	ter	mais	direitos	restringidos	do	que	aqueles	que	foram	limitados	pela
Lei	 e	 pela	 Sentença.	 Isso	 porque,	 o	 sujeito,	 enquanto	 ser	 humano,	 é	 titular	 de	 determinados
direitos	que	não	são	atingidos	pela	Sentença	e	pela	Lei,	os	quais	devem	ser	respeitados.
Logo,	toda	pena	privativa	de	liberdade	deve	ser	pautada	pelo	princípio	da	humanidade	das
penas,	de	acordo	com	o	qual	a	sanção	não	pode	desconhecer	que	o	condenado	é	pessoa	humana
e,	portanto,	titular	de	direitos	inerentes	a	essa	condição.
Desse	modo,	conforme	ensina	a	doutrina,	o	princípio	em	questão	determina	a	execução
humana	e	responsável	da	pena.
Ademais,	quando	se	fala	dos	princípios	fundamentais	e	coloca-se	o	princípio	da	humanidade
ou	humanização	das	penas	como	o	primeiro	deles,	não	é	por	acaso.	Modernamente,	em	todas	as
normativas	 internacionais	 que	 tratam	 das	 pessoas	 privadas	 de	 liberdade,	 o	 princípio	 mais
preservado,	valorizado	e	prestigiado	é	o	da	humanidade	das	penas.
Dessa	forma,	a	Declaração	Universal	dos	Direitos	Humanos,	no	artigo	5º,	veda	a	tortura,	o
tratamento	e	castigos	cruéis,	desumanos	ou	degradantes.	Observe:
Artigo	5º	Ninguém	será	submetido	a	tortura	nem	a	punição	ou	tratamento	cruéis,
desumanos	ou	degradantes.
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Nesse	sentido,	boa	parte	dos	diplomas	internacionais	que	versam	sobre	Direitos	Humanos
ou	sobre	o	Direito	de	Execução	Penal	estabelece	a	vedação	à	tortura	e	ao	tratamento	desumano,
cruel	e	degradante,	assim	como	o	faz	a	Declaração	Universal	dos	Direitos	Humanos.
Do	mesmo	modo,	as	Regras	de	Tratamento	Mínimo	do	Preso	da	ONU,	de	1955,	possuem
previsão	semelhante.	Tais	regras	foram	internalizadas	pela	Resolução	nº	14	do	Conselho	Nacional
de	Política	Criminal	e	Penitenciária	(CNPCP).
No	que	se	refere	às	Normas	de	Tratamento	Mínimo	do	Preso	da	ONU,	de	1955,	a	regra	de
nº	31	dispõe,	ipsis	litteris:
31.	Serão	absolutamente	proibidos	como	punições	por	faltas	disciplinares	os	castigos
corporais,	 a	 detenção	 em	 cela	 escura	 e	 todas	 as	 penas	 cruéis,	 desumanas	 ou
degradantes.
No	mesmo	 sentido,	 tem-se	o	 Pacto	 Internacional	 de	Direitos	Civis	 e	 Políticos	 (ou	Pacto
Internacional	de	Direitos	Civis	e	Políticos	de	Nova	Iorque),	internalizado	no	Brasil,	por	Decreto,	no
ano	de	1992.	Esse	diploma	determina	no	art.	10,	item	nº	1,	in	verbis:
Artigo	10
				1.	Toda	pessoa	privada	de	sua	liberdade	deverá	ser	tratada	com	humanidade	e
respeito	à	dignidade	inerente	à	pessoa	humana
Da	mesma	forma,	a	Convenção	Americana	de	Direitos	Humanos	(o	Pacto	de	São	José	da
Costa	Rica)	prevê,	no	artigo	5º,	o	Direito	à	Integridade	do	Preso,	nos	termos	seguintes:
ARTIGO	5
				Direito	à	Integridade	Pessoal
				1.	Toda	pessoa	tem	o	direito	de	que	se	respeito	sua	integridade	física,	psíquica	e
moral.
	 	 	 	 2.	 Ninguém	 deve	 ser	 submetido	 a	 torturas,	 nem	 a	 penas	 ou	 tratos	 cruéis,
desumanos	ou	degradantes.	Toda	pessoa	privada	da	liberdade	deve	ser	tratada	com
o	respeito	devido	à	dignidade	inerente	ao	ser	humano.
				3.	A	pena	não	pode	passar	da	pessoa	do	delinqüente.
	 	 	 	 4.	 Os	 processados	 devem	 ficar	 separados	 dos	 condenados,	 salvo	 em
circunstâncias	 excepcionais,	 a	 ser	 submetidos	 a	 tratamento	 adequado	 à	 sua
condição	de	pessoal	não	condenadas.
	 	 	 	 5.	 Os	 menores,	 quando	 puderem	 ser	 processados,	 deve	 ser	 separados	 dos
adultos	e	conduzidos	a	tribunal	especializado,	com	a	maior	rapidez	possível,	para	seu
tratamento.
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				6.	As	penas	privativas	da	liberdade	devem	ter	por	finalidade	essencial	a	reforma	e
a	readaptação	social	dos	condenados.
	Portanto,	a	Convenção	Americana	de	Direitos	Humanos	também	consigna	o	respeito	ao
princípio	da	humanidade	ou	humanização	das	penas.
Além	dessas,	as	Regras	de	Mandela,	de	2015,	trazem	previsão	semelhante.	O	diploma,	em
resumo,	 trata	 de	 regras	 mínimas	 das	 Nações	 Unidas	 para	 o	 tratamento	 inerente	 às	 pessoas
privadas	 de	 liberdade.	 No	 entanto,	 não	 se	 trata	 de	 um	 Tratado	 Internacional,	 mas	 de	 Regras
desenvolvidas	 pela	 Organização	 das	 Nações	 Unidas,	 que,	 atualmente,	 são	 observadas	 pela
maioria	das	legislações.
E,	nesse	ínterim,	a	Regra	de	Mandela	da	ONU	de	nº	01	dispõe	sobre	a	humanidade	das
penas,	nos	seguintes	termos:
Regra	1	Todos	os	presos	devem	ser	 tratados	com	respeito,	devido	a	seu	valor	e
dignidade	inerentes	ao	ser	humano.	Nenhum	preso	deverá	ser	submetido	a	tortura
ou	 tratamentos	 ou	 sanções	 cruéis,	 desumanos	 ou	 degradantes	 e	 deverá	 ser
protegido	 de	 tais	 atos,	 não	 sendo	 estes	 justificáveis	 em	qualquer	 circunstância.	 A
segurança	dos	presos,	dos	servidores	prisionais,	dos	prestadores	de	serviço	e	dos
visitantes	deve	ser	sempre	assegurada.
Portanto,	os	reclusos	devem	ser	tratados	com	respeito,	inerente	ao	valor	e	à	dignidade	do
ser	humano,	de	modo	que	é	vedada	a	tortura	e	outros	tratamentos	cruéis	ou	degradantes.
Em	essência,	verifica-se	que	todas	essas	normativas	internacionais	visam	banir	e	afastar	o
tratamento	 desumano,	 cruel	 ou	 degradante,	 bem	 como	 vedar	 toda	 de	 forma	 a	 tortura.	 Isso
porque,	é	sabido	que	em	ambientes	de	privação	de	liberdade,	de	certa	maneira,	é	mais	comum	se
verificar	essa	violação.	Por	essa	razão,	observa-se	a	preocupação	dos	países	de	vedar	esse	tipo
de	prática	que	é	 absolutamente	nefasta	 e	não	 se	 compatibiliza	 com	o	Estado	Democrático	de
Direito.
Para	mais,	com	relação	à	normativa	interna	do	país,	o	Princípio	da	Humanidade	das	Penas
é	trabalhado	em	diversos	dispositivos	da	Constituição	da	República,	observe:
a)	 inicialmente,	 no	 artigo	 1º,	 inciso	 III,	 da	 Constituição,	 que	 trata	 dos	 princípios
fundamentais	da	República,	in	verbis:
Art.	 1º	 A	 República	 Federativa	 do	 Brasil,	 formada	 pela	 união	 indissolúvel	 dos
Estados	e	Municípios	e	do	Distrito	Federal,	constitui-se	em	Estado	Democrático	de
Direito	e	tem	como	fundamentos:
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I	-	a	soberania;
II	-	a	cidadania;
III	-	a	dignidade	da	pessoa	humana;
(...)
b)	da	mesma	maneira,	no	artigo	4º,	que	dispõe	relações	internacionais	e	os	princípios	da
República,	observe:
Art.	4º	A	República	Federativa	do	Brasil	 rege-se	nas	 suas	 relações	 internacionais
pelos	seguintes	princípios:
I	-	independência	nacional;
II	-	prevalência	dos	direitos	humanos;
[...]
c)	 Além	 disso,	 o	 artigo	 5º	 da	 Constituição	 consagra	 o	 princípio	 da	 humanidade	 ou
humanização	das	penas	em	diversos	dispositivos.
Nesse	 contexto,	 o	 inciso	 III,	 do	 art.	 45º,	 da	 CF,	 apresenta,	 talvez,	 a	 vedação	 mais
contundente	com	relação	ao	princípio	da	humanidade	das	penas:
Art.	5º.
[...]
III	-	ninguém	será	submetido	a	tortura	nem	a	tratamento	desumano	ou	degradante;
Trata-se,	 da	 mesma	 redação	 encontrada	 nos	 diplomas	 internacionais	 e	 denota	 a
preocupação	 do	 constituinte	 originário	 em	 consagrar	 a	 questão	 da	 vedação	 datortura,	 do
tratamento	desumano,	cruel	e	degradante.
Ademais,	quando	se	fala	do	Direito	de	Execução	Penal,	o	princípio	da	humanidade	ganha
uma	 importância	muito	maior,	 pois	 é	 o	 instrumento	 que	melhor	 combate	 a	 irracionalidade	 do
sistema	 punitivo	 estatal.	 E,	 por	 esse	motivo,	 o	 artigo	 5º,	 da	 CF,	 apresenta	 vários	 dispositivos
constitucionais	que	consagram	esse	princípio.
Nesses	termos,	o	artigo	5º,	XLVII,	da	CF,	por	exemplo,	determina:
Art.	5º
[...]
	XLVII	-	não	haverá	penas:
	a)	de	morte,	salvo	em	caso	de	guerra	declarada,	nos	termos	do	art.	84,	XIX;
	b)	de	caráter	perpétuo;
	c)	de	trabalhos	forçados;
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	d)	de	banimento;
	e)	cruéis;
Aqui,	 o	 constituinte	 criou	 um	 rol	 de	 penas	 que	 não	 são	 compatíveis	 com	 o	 princípio	 da
humanidade	ou	da	humanização	das	penas,	quais	sejam:
a)	a	pena	de	morte;
De	pronto,	verifica-se	que	a	pena	de	morte	é	vedada	de	 forma	 relativa	no	país,	 já	que
admitida	em	caso	de	guerra	declarada,	nos	termos
•	dos	artigos	55	e	56,	do	Código	Penal	Militar;	e
•	dos	artigos	707	e	708,	do	Código	Penal	Militar;
Trata-se,	 portanto,	 de	 vedação	 relativa	 pois,	 embora	 não	 seja	 permitida	 em	 tempos	 de
paz,	admite-se	a	pena	de	morte	em	caso	de	guerra	declarada.
Ademais,	a	pena	de	morte	 já	era,	há	muito	tempo,	criticada	em	territórios	brasileiros.	E,
por	meio	de	um	apanhado	histórico,	nota-se	que	a	pena	de	morte:
•	foi	vedada	pela	Constituição	Imperial	de	1824;
•	mas	reproduzida	no	Código	Imperial	de	1830;
•	no	Código	de	1890,	foi,	finalmente,	abandonada	(embora	estivesse	em	desuso	desde	o
Segundo	Reinado).
Em	síntese,	a	ideia	de	pena	de	morte	foi	reconsiderada	em	razão	de	vários	falhas	judiciais.
No	Rio	de	 Janeiro,	por	 exemplo,	 ocorreu	 um	dos	maiores	 erros	 judiciais	 envolvendo	 a	 pena	 de
morte,	no	século	XIX,	no	caso	conhecido	como	"A	Fera	de	Macabu".
Além	disso,	o	próprio	imperador	Dom	Pedro	II	já	era	um	crítico	das	penas	de	morte.
Nesses	 termos,	 tal	 modalidade	 de	 pena	 entrou	 em	 desuso,	 sendo	 abandonada,
definitivamente,	no	Código	Penal	da	Primeira	República	de	1890.
Outrossim,	no	Brasil,	as	penas	de	caráter	perpétuo	também	são	vedadas.
b)	penas	perpétuas;
Inicialmente,	 recorde	 que,	 de	 acordo	 com	 o	 artigo	 75	 do	 Código	 Penal,	 o	 máximo	 de
cumprimento	 ininterrupto	 de	 pena	 privativa	 de	 liberdade	 é	 30	 anos.	 Então,	 após	 30	 anos	 de
cumprimento	 ininterrupto,	 sem	 que	 tenha	 havido	 uma	 nova	 reunificação	 de	 pena,	 o	 sujeito	 é
libertado	compulsoriamente.
c)	trabalho	forçado;
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Tal	 modalidade	 de	 pena	 já	 foi	 utilizada	 no	 país,	 principalmente	 pelas	 galés	 (que	 é
modalidade	de	punição	na	qual	calcetas	de	ferro	eram	colocadas	nas	pernas	dos	condenados	ao
trabalho	forçado).
Em	suma,	todas	essas	penas	são	vedadas,	assim	como	as	de	banimento	e	ad	cruéis.	E,	ao
referir-se	 às	 penas	 cruéis,	 o	 constituinte	 veda	 genericamente	 qualquer	 sanção	 que	 atinja	 a
dignidade	da	pessoa	humana.
Por	 seu	 turno,	 a	 pena	de	 banimento,	 embora	 já	 tenha	 sido	muito	 utilizada	 no	 passado,
atualmente	é	vedada.
Dessa	 forma,	 a	 doutrina	 costuma	 apresentar	 como	 fundamento	 do	 princípio	 da
humanidade	das	penas	o	artigo	5º,	inciso	XLVII,	da	Constituição	Federal.
Ademais,	ainda	sobre	o	princípio	da	humanização	ou	da	humanidade	das	penas,	o	artigo	5º,
inciso	XLVIII,	da	Constituição	Federal,	trata	de	outro	aspecto	muito	importante,	observe:
Art.	5º
[...]
XLVIII	 -	 a	 pena	 será	 cumprida	 em	 estabelecimentos	 distintos,	 de	 acordo	 com	 a
natureza	do	delito,	a	idade	e	o	sexo	do	apenado;
Por	conseguinte,	além	de	dispor	sobre	a	humanidade	da	penas,	o	dispositivo	disciplina	a
individualização	da	pena,	que	é	princípio	que	se	verificará	posteriormente	[1].
Nota	do	monitor
[1]	 o	 professor	 pontua	 que,	 na	 prática,	 boa	 parte	 das	 penitenciárias	 brasileiras	 são
definidas	de	acordo	com	a	organização	criminosa	que	predomina	no	interior	do	estabelecimento.
E,	acrescenta	que	o	Estado	compactua	com	a	criação	e	o	fomento	dessas	facções	criminosas,	na
medida	 em	 que	 destina	 certas	 unidades	 para	 a	 acautelar	 presos	 da	 facção	 A,	 B	 ou	 C,	 por
exemplo.
Outrossim,	o	 inciso	XLIX,	do	art.	5º,	da	Constituição	da	República,	é,	 talvez,	o	dispositivo
mais	 discutido	 no	 âmbito	 do	 Direito	 de	 Execução	 Penal,	 atualmente,	 em	 razão	 das	 recentes
decisões	da	Corte	Interamericana	de	Direitos	Humanos.
Nesse	contexto,	houve	um	caso	recente,	envolvendo	o	Brasil	e	a	Corte	 Interamericana,
sobre	quatro	estabelecimentos	prisionais	localizados	nos	Estados	de	Rondônia,	Pernambuco	e	Rio
de	Janeiro.
Por	seu	turno,	o	artigo	5º,	inciso	XLIX,	da	Constituição	Federal	estabelece	que:
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Art.	5º
[...]		
XLIX	-	é	assegurado	aos	presos	o	respeito	à	integridade	física	e	moral;
Assim,	trata-se	de	dispositivo	normalmente	utilizado	para	tratar	da	ideia	da	superlotação
(que	é	provavelmente	o	problema	mais	caótico	enfrentado	pelo	sistema	penitenciário	brasileiro),
já	que	assegura	aos	presos	o	respeito	à	integridade	física	e	moral.	Acerca	da	matéria,	as	próprias
Regras	 de	 Tratamento	 Mínimo	 do	 Preso	 da	 ONU,	 de	 1955,	 estabelecem	 que	 a	 hipótese	 de
superlotação	caracteriza	tortura.
Contudo,	 sabe-se	 que,	 no	 Brasil,	 há	 um	 déficit	 gigantesco	 de	 vagas	 no	 sistema
penitenciário,	 o	 que	 viola	 o	 princípio	 da	 humanização	 das	 penas.	 E	 foi	 justamente	 com	 essa
escalada	de	presos,	sem	locais	adequados	para	sua	privação	de	liberdade,	que	o	Brasil	alcançou	a
posição	de	3º	país	do	mundo	com	maior	população	carcerária	[2].
Nota	do	monitor
[2]	ou,	de	acordo	com	alguns,	o	4º	lugar.
Nesse	âmbito,	a	superlotação	carcerária	representa	ofensa	ao	princípio	da	humanidade	das
penas,	 pois,	 para	 além	 da	 situação	 propriamente	 dita,	 culmina	 em	 outros	 problemas,	 como
epidemias	(por	exemplo,	de	tuberculose	e	sarna),	que	se	proliferam	nas	unidades	de	privação	de
liberdade.	 Ademais,	 tal	 situação	 representa	 risco	 à	 segurança	 dos	 agentes	 penitenciários	 e	 da
sociedade	como	um	todo	[3].
Nota	do	monitor
[3]	o	professor	pontua	que	as	prisões	hoje	são	consideradas	verdadeiros	barris	de	pólvora.
Relata	 que	 unidades	 prisionais	 com	 capacidade	 para	 1200	 presos,	 estão	 com	 3.800	 ou	 4.000
internos,	 assistidos,	 muitas	 vezes,	 por	 5	 ou	 6	 agentes	 penitenciários.	 E	 esclarece	 que	 essas
situações	colocam	em	risco	o	funcionamento	do	estabelecimento	prisional,	os	profissionais	que	ali
desenvolvem	as	suas	atividades	laborativas	e	a	própria	sociedade.
Por	 isso,	 a	 Corte	 Interamericana	 de	 Direitos	 Humanos,	 em	 2018,	 prolatou	 diversas
decisões,	 através	 de	 Resoluções,	 para	 que	 o	 Estado	 brasileiro	 remediasse	 essa	 situação	 de
superlotação	carcerária	[4].
Nota	do	monitor
[4]	A	questão	envolveu	as	seguintes	unidades	carcerárias:	(a)	Urso	Branco,	em	Rondônia;
(b)	Aníbal	Bruno,	no	Recife;	e	o	(c)	Instituto	Penal	Plácido	de	Sá	Carvalho,	no	Rio	de	Janeiro.
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Naquela	 oportunidade,	 o	 Instituto	 Penal	 Plácido	 de	 Sá	 Carvalho,	 no	 Rio	 de	 Janeiro,	 foi
visitado	pelos	Juízes	da	Corte	Interamericana	de	Direitos	Humanos,	a	qual	editou	Resolução,	em
novembro	de	2018,	determinando	a	contagem	de	prazo	diferenciada	para	os	presos	que	estavam
e	permanecem	naquela	unidade.
Em	resumo,	a	Corte	propôs	que	os	internos	do	Instituto	Plácido	de	Sá	Carvalho	tenham	o
prazo	contado	de	forma	diferenciada,	em	uma	espécie	de	remissão	in	natura,	para	que	a	cada	dia
de	 cumprimento	 de	 pena	 sejam	 computados	 dois,	 em	 razão	 da	 situação	 de	 tratamento
degradante	a	que	os	presos	são	submetidos	naquela	unidade	[5].
Nota	do	monitor
[5]	o	professor	ressalta	que	as	más	condições	da	unidade	prisional	culminam,	porvezes,
em	óbitos.	Surgindo,	então,	o	dever	de	indenizar	do	Estado,	ante	a	culpa	in	custodiando.
Ademais,	 o	 Supremo	 Tribunal	 Federal	 já	 se	 manifestou	 declarando	 o	 Estado	 de	 Coisas
Inconstitucional	 do	 Sistema	 Penitenciário	 Brasileiro,	 com	 base	 na	 decisão	 da	 Corte	 Suprema
Colombiana,	e	enfrentou,	 também,	a	questão	envolvendo	a	 reparação	pecuniária	daqueles	que
suportaram	o	cumprimento	de	pena	nessas	condições.
Nesse	âmbito,	o	Ministro	Luís	Roberto	Barroso,	à	época,	embora	tenha	sido	voto	vencido,
propôs	uma	espécie	de	remição	 in	natura,	 pontuando	que	a	 reparação	pecuniária	 nem	sempre
atenderia	ao	 interesse	do	preso	que	 suportou	ou	 suporta	o	 cumprimento	de	pena	degradante.
Isso	porque,	muitas	vezes,	essa	indenização	seria	recebida	apenas	pelos	netos	do	preso.
Por	 conseguinte,	 a	 remição	 in	 natura,	 enquanto	 cômputo	 de	 pena	 diferenciado	 para
aqueles	 que	 suportaram	 essas	 condições	 do	 cárcere,	 seria	mais	 atrativa	 do	 ponto	 de	 vista	 do
preso	do	que	uma	prestação	pecuniária,	que	muitas	vezes	não	recebe	em	vida.
Então,	todas	essas	questões	têm	relação	com	o	princípio	da	humanidade.
Para	mais,	é	importante	observar	que	o	art.	88,	parágrafo	único,	"b",	da	Lei	de	Execução
Penal	determina	que,	na	penitenciária,	o	preso	tem	direito	a	6	m²	per	capita.	Entretanto,	sabe-se
que	tal	realidade	que	não	é	encontrada	nas	unidades	prisionais	brasileiras.
Para	mais,	a	superlotação,	além	dos	espaço	mínimo,	compromete	as	condições	de	aeração
e	 térmicas,	 o	 fornecimento	 ininterrupto	 de	 água,	 bem	 como	 a	 vestimenta	 e	 alimentação
adequada.	 E,	 por	 consequência,	 tal	 situação	 compromete	 o	 princípio	 da	 humanização	 ou	 da
humanidade	 das	 penas.	 Por	 esses	 motivos,	 o	 Brasil	 vem	 tendo	 problemas	 com	 a	 Corte
Interamericana	 de	 Direitos	 Humanos	 (em	 razão	 do	 quadro	 de	 superlotação	 carcerária	 que	 se
enfrenta).
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Além	disso,	é	importante	mencionar	os	chamados	Princípios	de	Boas	Práticas	e	Proteção
das	Pessoas	Privadas	de	Liberdade,	elaborados	pela	OEA.
Nesse	 âmbito,	 a	 Resolução	 nº	 1,	 de	 2008,	 da	 Comissão	 Interamericana	 de	 Direitos
Humanos	 dispõe	 sobre	 os	 princípios	 e	 as	 boas	 práticas	 de	 proteção	 das	 pessoas	 privadas	 de
liberdade.	E,	tal	diploma,	é	o	fundamento	para	parcela	considerável	das	questões	que	são	objetos
de	denúncia	internacional	envolvendo	o	Brasil,	em	consequência	da	superlotação	carcerária.
Outrossim,	há	de	se	destacar	que	as	mulheres	privadas	de	 liberdade	também	merecem
proteção	específica	em	decorrência	do	princípio	da	humanidade	das	penas.	E,	 sobre	a	matéria,
deve	se	verificar	o	disposto	no	artigo	5º,	inciso	L,	da	Constituição	Federal,	ipsis	litteris:
Art.	5º
[...]
L	-	as	presidiárias	serão	asseguradas	condições	para	que	possam	permanecer	com
seus	filhos	durante	o	período	de	amamentação;
Desse	modo,	a	Lei	de	Execução	Penal,	ao	tratar	da	penitenciárias,	traz	previsão	expressa
para	as	mulheres	privadas	de	liberdade,	no	artigo	89,	in	verbis:
Art.	89	Além	dos	requisitos	referidos	no	art.	88	[6],	a	penitenciária	de	mulheres	será
dotada	 de	 seção	 para	 gestante	 e	 parturiente	 e	 de	 creche	 para	 abrigar	 crianças
maiores	de	6	(seis)	meses	e	menores	de	7	(sete)	anos,	com	a	finalidade	de	assistir	a
criança	desamparada	cuja	responsável	estiver	presa.	
Parágrafo	único	[7].	 São	 requisitos	básicos	da	 seção	e	da	 creche	 referidas	neste
artigo:		
I	–	atendimento	por	pessoal	qualificado,	de	acordo	com	as	diretrizes	adotadas	pela
legislação	educacional	e	em	unidades	autônomas;	e			
II	 –	horário	de	 funcionamento	que	garanta	a	melhor	assistência	à	criança	e	à	sua
responsável.						
	Nota	do	monitor
[6]	o	art.	88	dispõe	sobre	o	conjunto	arquitetônico	das	penitenciárias.	
[7]	o	parágrafo	único	estabelece	como	será	feita	essa	unidade	materno-infantil	(unidade
de	creche),	que	deve	contar	com	leitos	próprios	para	as	crianças,	principalmente	em	período	de
lactação.	Isso	porque,	as	lactantes	têm	direito	de	amamentar	os	seus	filhos,	embora	privadas	de
liberdade.
Para	 mais,	 o	 Supremo	 Tribunal	 Federal	 tem	 enfrentado	 questões	 relativas	 às	 presas
gestantes	e	lactantes,	como	ocorreu,	por	exemplo,	no	habeas	corpus	coletivo	apreciado	em	2018.
Execução	Penal	–	Felipe	Almeida
Aula4	-	Princípio	da	Humanidade
10
Curso	Ênfase	©	2019
Então,	o	princípio	da	humanidade	das	penas	ocupa-se,	também,	de	questões	particulares	à
condição	das	mulheres	privadas	de	liberdade.
Nesse	âmbito,	há	normativa	internacional	específica	tratando	de	questões	pertinentes	às
mulheres	em	cárcere,	 trata-se	das	Regras	de	Bangkok.	Em	essência,	o	diploma	dispõe	sobre	o
princípio	da	humanidade	das	penas	aplicado,	especificamente,	às	mulheres	privadas	de	liberdade,
tendo	em	vista	a	especial	situação	de	vulnerabilidade
Por	fim,	é	importante	observar	as	alguns	apontamentos	sobre	ações	coletivas	que	tratam
do	princípio	da	humanidade	das	penas[8].
Nota	do	monitor
[8]	o	professor	destaca	que	é	uma	questão	muito	discutida	nos	Tribunais	e	que	vem	sendo
objeto	de	questionamento	em	prova	com	uma	certa	frequência.
Nesse	cenário,	é	muito	comum	haver	ações	coletivas,	promovidas	pelo	Ministério	Público	e
pela	 Defensoria	 Pública,	 visando	 interdição	 de	 unidades	 prisionais,	 total	 ou	 parcialmente,	 bem
como	 a	 transferência	 de	 parcela	 do	 efetivo	 carcerário,	 dentre	 outras	 questões,	 como:	 para	 a
contratação	 de	 equipes	 técnicas	 (médicos,	 assistentes	 sociais	 e	 psiquiatras),	 compra	 de
equipamentos,	 contratação	 de	 professores	 no	 ambiente	 prisional,	 contratação	 de	 agentes,
reformas	estruturais,	etc.
Assim	há	discussão	sobre	esse	descumprimento	do	princípio	da	humanidade	das	penas	e	a
possibilidade	do	Poder	Judiciário	impor	ao	Executivo	condenações	dessa	natureza.
Discute-se,	portanto,	se	essas	questões	integrariam	o	(a)	mérito	administrativo,	de	modo
que	 caberia	 ao	 Executivo	 definir	 como	 alocaria	 as	 suas	 verbas,	 bem	 como	 (b)	 a	 reserva	 do
possível.
Então,	 normalmente,	 a	 reserva	 do	 possível	 e	 o	 mérito	 administrativo	 são	 questões
suscitadas	pela	Advocacia	Pública	do	Estado	em	defesa	nas	ações	coletivas	dessa	natureza.
Nesse	 contexto,	 o	 Supremo	 Tribunal	 Federal,	 enfrentando	 a	 matéria,	 entendeu	 que	 o
mínimo	existencial	e	o	princípio	da	humanidade	das	penas	se	sobrepõem	à	tese	estatal	do	mérito
administrativo	e	da	reserva	do	possível.
Isso	porque,	na	medida	em	que	constitucionalmente	previsto,	o	mínimo	existencial	relativo
ao	princípio	da	humanidade	das	penas	deve	se	sobrepor	a	toda	e	qualquer	defesa	do	Estado,	seja
pela	 reserva	do	possível,	 seja	 pelo	mérito	 administrativo.	 Ademais,	 o	 Supremo	Tribunal	 Federal
pauta	essas	condenações	nos	Tratados	Internacionais,	ratificados	pelo	Brasil,	sobre	o	princípio	da
humanidade	das	penas.

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