Prévia do material em texto
407.9 – ATENDIMENTO INICIAL AO GRANDE QUEIMADO Condutas no Paciente Grave – Elias Knobel. 4ª edição, 2016. ATLS 9ª edição, 2012. Cartilha para Atendimento de Emergência das Queimaduras – Min. da Saúde, 2012. Introdução ● Queimadura: lesão tecidual decorrente de trauma térmico, elétrico, químico ou radioativo, que destrói parcialmente ou totalmente a pele e seus anexos, podendo alcançar camadas mais profundas, como o tecido celular subcutâneo, músculos, tendões e ossos. ● Dentro do espectro das lesões traumáticas, é o paciente que sofre o maior estresse da terapia intensiva. ● Diferente das outras lesões traumáticas, podemos quantificar proporcionalmente à superfície corpórea queimada. ● EUA: 02 milhões de pacientes/ano são acometidos, resultando em 100 mil hospitalizações e 05 mil óbitos, principalmente nos extremos etários. ● Brasil (2017): 01 milhão de incidentes por queimaduras ao ano, sendo que 100 mil pacientes buscaram atendimento hospitalar e, destes, cerca de 2.500 pacientes irão a óbito direta ou indiretamente em função de suas lesões. ● Ultimamente vemos uma acentuada queda na mortalidade devida a uma abordagem cirúrgica mais agressiva, a uma estratégia de manejo multiprofissional, conjunto avanços na reposição volêmica + controle de infecção + suporte nutricional da resposta hipermetabólica. ● Resposta hipermetabólica é a grande responsável pela morbimortalidade ao potencializar riscos de infecção, deprimir taxa de cicatrização e alterar funções celulares e imunológicas. Classificação Existem aspectos que devem ser levados em consideração na hora de classificar uma queimadura e que ajudarão na escolha do tratamento e determinarão a gravidade do caso. São eles: ● Agente causal: o Escaldo: causa mais frequente; tende a ser mais grave nas regiões com roupas (líquido em contato por mais tempo) e com líquidos mais espessos (sopas, óleos, etc). o Chama: segunda causa mais frequente; quando atinge vestimentas, geralmente causa queimaduras mais profundas. o Flash burn: as explosões atingem temperaturas muito elevadas, causando queimaduras profundas; as roupas, quando não incendeiam, conferem boa proteção. o Contato: metais, plásticos e carvão, tende a ser restrito a pequenas áreas, mas profundas. o Queimaduras elétricas: alta intensidade de calor e da explosão das membranas celulares (diretamente proporcional à amperagem da corrente). Apesar da aparência da lesão da pele ser restrita, há grande destruição das estruturas abaixo e na proximidade. Requerem atenta monitorização cardíaca (arritmias) e urinária (acidose e mioglobinúria). o Queimaduras químicas: causadas mais frequentemente por ácidos ou bases em acidentes de trabalho; originam lesão progressiva até o agente ser totalmente removido, preferencialmente por água em abundância. Consideradas lesões profundas até que se prove o contrário. ● Extensão da área corporal queimada (ACQ): Existem diversos métodos para avaliar a extensão comprometida; o mais sensível é o esquema de Lund-Browder (fig. 210.1). Pode-se também usar a palma da mão do paciente, que corresponde a 1% da superfície corpórea. Pode-se usar a regra dos “nove”, que apresenta grande variação em função da idade do paciente, sendo fácil de confundir, mas é o mais prático e, por isso, utilizado. ACQ > 20% caracteriza uma grande queimadura. ● Profundidade da queimadura: as queimaduras podem ser classificadas; com essa classificação, determina-se o tratamento. o 1º grau (superficial): queimadura solar. Caracterizadas por eritema, dor e ausência de bolhas. o 2º grau superficial (espessura parcial): aparência vermelha ou mosqueada, presença de edema e bolhas. Hipersensível à dor intensa e à correntes de ar. o 2º grau profundo (espessura parcial): presença de bolhas. Pele branca, rosada e aparência “lacrimejante” ou úmida. o 3º grau (espessura total): pele escura, aparência de couro, pode apresentar-se translúcida ou com aspecto de cera. Superfície indolor, geralmente seca. o 4º grau: acometimento de estruturas profundas. O termo grande queimado é usado para designar vítimas de queimaduras graves. Muitos serviços em nosso país empregam o termo para toda a vítima de queimadura que necessita de atendimento em UTQs. Por outro lado, a American Burn Association define uma grande queimadura quando observamos qualquer um dos seguintes: ● Envolvimento maior ou igual a 25% de ACQ em faixa etária de 10 a 40 anos; ● Envolvimento maior ou igual a 20% de ACQ em crianças com menos de dez anos ou em adultos com mais de 40 anos; ● Envolvimento de 10% ou mais de ACQ em queimaduras de terceiro grau; ● Qualquer queimadura envolvendo olhos, ouvidos, face, mãos, pés ou períneo que resulte em comprometimento funcional; ● Queimaduras elétricas de alta voltagem; ● Toda queimadura complicada por trauma grave ou lesão por inalação; ● Todos os pacientes queimados que apresentam comorbidades graves. CRITÉRIOS PARA TRANSFERÊNCIA PARA CENTRO DE QUEIMADOS 1. Queimadura espessura parcial e total (2º e 3º graus) comprometendo > 10% ASC em qualquer doente. 2. Queimaduras de espessura parcial e total (2º e 3º graus) envolvendo face, olhos, ouvidos, mãos, pés, genitália, períneo ou comprometendo a pele sobre as principais articulações. 3. Queimaduras de espessura total (3º grau) em qualquer extensão ou grupo etário 4. Queimaduras elétricas graves, incluindo raios 5. Queimaduras químicas importantes 6. Lesão por inalação 7. Doentes com comorbidades prévias que podem complicar atendimento 8. Trauma concomitante 9. Crianças com queimaduras 10. Necessidade de suporte especial, como social, emocional, reabilitação prolongada, suspeita de negligência ou abuso em crianças. Fisiopatologia AUMENTO DA PERMEABILIDADE CAPILAR ● A queimadura contribui para inflamação local e sistêmica ● Ao redor da lesão (zona de coagulação), há uma zona de isquemia cuja vasculatura está comprometida. ● Lesões complementares como hipoperfusão, hipóxia ou infecção podem converter essa área marginal viável em tecido morto. ● A zona de isquemia é circundada por tecido inflamatório (zona de hiperemia), responsável pela liberação de inúmeros mediadores (citocinas, cininas, histamina, tromboxano e radicais livres) que aumentam a permeabilidade localmente e à distância. ● Estabelece-se uma resposta inflamatória sistêmica, com resultante perda de fluidos ricos em proteína do intravascular para o extravascular. ● A hipovolemia soma-se à depressão miocárdica (provável ação de citocinas), o que contribui para uma instabilidade hemodinâmica inicial, que se reverte a partir do 2º dia de reposição volêmica agressiva. HIPERMETABOLISMO É uma recomendação que, no manejo do queimado, a nutrição enteral (por sonda) deva ser iniciada dentro de 24 horas do trauma e utilizada preferencialmente em relação ao suporte parenteral sempre que possível. Uma relação caloria/nitrogênio de 110:1 deve ser empregada em todo paciente com queimaduras de mais de 20% de sua superfície corpórea. A resposta metabólica ao trauma pode ser descrita em duas fases ● Fase ebb (vazante): caracterizada pela perda de volume plasmático, choque, diminuição da insulina sérica, do consumo de oxigênio, da temperatura corpórea, do gasto energético basal e do débito cardíaco.Após a ressuscitação, evolui-se para a seguinte fase; ● Fase flow (fluxo): a transição para essa fase é dominada por alterações hormonais. Há um incremento nos hormônios catabólicos, como catecolaminas, glicocorticoides e glucagon. Há aumento do débito cardíaco e da temperatura corpórea, maior consumo energético, proteólise acelerada e gliconeogênese. São causas de hipermetabolismo nessa fase: O pico de demanda energética em pacientes queimados acontece por volta do 10º dia pós-trauma e retorna gradativamente ao normal com a reepitelização e enxertia, se não houver episódios de infecção e falência de múltiplos órgãos. Alguns autores utilizam betabloqueador para reduzir atividade beta-adrenérgica em pacientes gravemente queimados, a fim de diminuir o gasto energético basal e o catabolismo proteico de seus organismos, mas ainda não há consenso sobre essa conduta. RESPOSTA IMUNE Após a queimadura, ocorre rápida ativação das cascatas do ácido aracdônico e de citocinas, com translocação bacteriana e de endotoxinas. Com 24 a 48 horas de trauma, ocorrem as maiores alterações metabólicas, hormonais e celulares, com o 2º pico de endotoxemia ocorrendo depois de 03 a 04 dias. Ocorre: ● Déficit das imunidades celular e humoral, ● Diminuição da função de linfócitos T, ● Disfunção dos neutrófilos, ● Diminuição da capacidade bactericida, ● Alteração de receptores de membrana e ● Diminuição da IgG sérica. Até o momento, não há nenhuma terapêutica direta, de custo aceitável e eficiente que diminua as alterações imunológicas. A mais efetiva permanece a remoção precoce das escaras e a cobertura cutânea definitiva precoce. Condutas iniciais AVALIAÇÃO DO DOENTE QUEIMADO ● História: o Circunstâncias em que ocorreu a lesão; o Momento em que ocorreu a queimadura; o Doenças preexistentes, uso de medicamentos, alergias e vacinação contra tétano; o Avaliar compatibilidade da história e das lesões – atenção a abusos ● Exame físico: o Área corporal queimada (ACQ): regra dos nove. o Profundidade da queimadura. INTERRUPÇÃO DO PROCESSO DE QUEIMADURA ● Toda roupa deve ser removida para interromper o processo de queimadura; roupa aderida à pele não deve ser arrancada. ● Todo adorno deve ser retirado do doente para prevenir constrição por edema. ● Pó químico (seco) deve ser removido com cuidado pelo socorrista. ● A superfície corporal deve ser enxaguada com água corrente copiosamente. ● O doente deve ser coberto com lençóis quentes, limpos e secos para evitar hipotermia. A: VIA AÉREA Queimaduras podem causar grande edema e, por isso, a via aérea superior está em risco de obstrução. Fatores de risco para obstrução de vias aéreas: profundidade e extensão de queimaduras maiores, queimaduras na cabeça e na face, lesões inalatórias e queimaduras no interior da boca. Podem indicar lesão por inalação: presença de queimaduras de face e pescoço, dos cílios e de vibrissas nasais, depósito de carbono na boca, eliminação de escarro carbonáceo, inflamação aguda na orofaringe, rouquidão, história de confusão mental ou confinamento em incêndio, SatO2 < 90%,níveis de carboxihemoglobina > 10% doente envolvido em um incêndio. A presença de qualquer um desses achados sugere lesão inalatória aguda; indica transferência para um centro de queimados e necessita de intubação orotraqueal. Quando será feita precocemente? ● Se o tempo de transporte for prolongado; ● Presença de estridor é tardia, indica intubação imediata; ● Queimaduras circunferenciais do pescoço, pois podem gerar edema. Sinais e sintomas iniciais da inalação de fumaça (podem ser sutis e não aparecem nas primeiras 24 horas): taquipneia, tosse, dispneia, broncoespasmo e estridor. B: VENTILAÇÃO Lesão direta da via aérea inferior é rara e geralmente está associada à inalação de vapor superaquecido ou de gases inflamáveis. Preocupações com a ventilação estão relacionadas com três situações: hipóxia, intoxicação por monóxido de carbono e lesão por inalação de fumaça. HIPÓXIA: lesão inalatória, ventilação inadequada por queimaduras circunferenciais em tórax, lesões traumáticas torácicas. Deve-se administrar oxigênio suplementar com ou sem intubação. LESÃO POR INALAÇÃO DE FUMAÇA: exposição a um agente combustível e sinais de exposição à fumaça na via aérea inferior (broncoscopia). Realizar radiografia simples de tórax e gasometria arterial. Excluídas lesões de coluna, elevar a cabeça e tórax do paciente em 30º (auxilia na redução do edema do pescoço e da parede torácica). EXPOSIÇÃO A MONÓXIDO DE CARBONO: suspeitar em doentes queimados em ambientes fechados. A afinidade da hemoglobina ao CO é 200 a 250 vezes maior que a afinidade ao O2. Sintomas podem se desenvolver de 02 até 28 dias da intoxicação. Caso queimadura de terceiro grau das paredes anterior e posterior de tórax produzam restrição importante da sua movimentação, escarotomia pode ser necessária. C: CIRCULAÇÃO ACESSOS VENOSOS Qualquer doente queimado necessita de reposição de volume. Devem-se estabelecer imediatamente acessos venosos com cateter de grosso calibre introduzido em veia periférica, mesmo que não haja pele íntegra. Preferencialmente em membros superiores (alta incidência de flebite nas veias safenas). Iniciar infusão com cristaloide isotônico (preferencialmente Ringer lactato). REPOSIÇÃO VOLÊMICA O volume de líquido extravasado do espaço intravascular é extremamente elevado sempre que a queimadura atinge mais de 15% da superfície corpórea (SC). Essa perda se instala rapidamente e é constituída basicamente de água livre. Há perda de proteínas apenas após as primeiras oito horas de evolução e quando a queimadura é maior que 15% da SC. A reposição volêmica é um fator crítico para o tratamento do grande queimado. É necessário para atingir dois objetivos principais: dar o mínimo de volume necessário para manter a perfusão dos órgãos e repor a perda de sal extracelular. Os esquemas para reposição podem ser divididos em função da solução utilizada: No Hospital Albert Einstein, o esquema é constituído por administração de Ringer Lactato, 02 a 04 mL/kg/% ACQ ao longo de 24 horas. Metade desse volume deve ser infundida em 08 horas e o restante em 16 horas. Obrigatória sondagem vesical. ● A solução deve ser aquecida para evitar hipotermia. ● É importante entender que qualquer fórmula de reposição fornece apenas uma estimativa da necessidade inicial. Após essa quantidade inicial, o volume de líquido oferecido deve ser ajustado com base no débito urinário de 0,5 mL/kg/h em adultos e 1 mL/kg/h para crianças com menos de 30 kg. ● Devem ser monitorizados os níveis de lactato, creatinina sérica, pH e eletrólitos. ● Administração de coloides apenas para > 30% ACQ no 2º dia de evolução e/ou quando a albumina sérica for inferior a 02 g/dL (0,3 a 0,5 mL/kg/% ACQ). Possíveis efeitos da reposição excessiva: ● Redução na oferta de oxigênio aos tecidos; ● Hipertensão e edema pulmonar; ● Obstrução de vias aéreas; ● Maior rigidez da caixa torácica e maior trabalho respiratório; ● Menor mobilidade e síndrome compartimental nos membros; ● Retardo na cicatrização e menor resultado estético nas escarotomias; ● Maior possibilidade de sepse cutânea.Deve-se sempre lembrar que esses potenciais efeitos danosos são muito menos significativos que a reposição volêmica insuficiente; esta sim é indutora de taxas elevadas de morbimortalidade. Perdas de líquido resultantes de fatores associados à queimadura frequentemente são subestimadas. A lesão pulmonar associada à inalação de gases aquecidos ou tóxicos determina perdas líquidas adicionais muito grandes, assim como queimaduras elétricas extensas. Alguns trabalhos inclusive mostram que a perda pulmonar pode ser maior que a determinada pela queimadura da pele. Infusões adicionais devem ser feitas na presença de lesão pulmonar, em danos teciduais extensos e na redução do emprego de drogas vasoativas. Condutas secundárias MONITORIZAÇÃO HEMODINÂMICA As principais variáveis a serem monitorizadas nestes pacientes incluem: ● Pressão arterial média; ● Pressões de enchimento cardíacas [pressão venosa central (PVC) e pressão de oclusão da artéria pulmonar (POAP)]; ● Débito cardíaco (DC); ● Saturação venosa mista de oxigênio (SvO2); ● Lactato sérico; ● Gradientes de CO2. Adequação da volemia: infundem-se 500 mL de SF a 0,9% a cada 30 minutos, e observam-se essas duas variáveis. Quando incrementos adicionais da pressão de oclusão da artéria pulmonar (POAP) não implicarem aumentos do DC, pode-se considerar, a princípio, finalizada a reposição volêmica (Lei de Frank-Starling). Se hipotenso após adequada reposição, utilizar drogas vasoativas. A principal falha conceitual nos esquemas de hidratação é não empregar como meta terapêutica um índice adequado de oxigenação tecidual. Ao hidratar esse paciente, pretende-se otimizar a oferta de oxigênio à demanda metabólica dos tecidos queimados e íntegros. A normalização de parâmetros clínicos são indicadores do sucesso inicial na ressuscitação volêmica, mas as metas terapêuticas finais devem ser os parâmetros de oxigenação globais e regionais. Análise de distribuição de fluxo e da oxigenação tecidual: as variáveis utilizadas para tal são DC, saturação venosa mista de oxigênio (SvO2), lactato sérico e gradientes de CO2, sempre analisadas à luz de alterações do DC. Sempre que instituir alguma terapêutica que aumente DC, observar SvO2: ● Inalterada: aumento do consumo de O2. o Queda do lactato sérico e do gradiente venoarterial de CO2 houve diminuição da hipóxia tecidual. o Manutenção do lactato sérico e do gradiente venoarterial de CO2 DC não está adequado à demanda metabólica ou pode haver hipóxia citopática secundária à presença de mediadores inflamatórios. EXAMES COMPLEMENTARES ● Hemograma ● Tipagem sanguínea ● Provas cruzadas ● Carboxi-hemoglobina ● Glicemia ● Eletrólitos ● Teste de gravidez (mulheres em idade fértil) ● Gasometria arterial ● Dosagem de HbCO ● Radiografia de tórax (intubados, suspeita de lesão por inalação e lesões associadas). MANUTENÇÃO DA CIRCULAÇÃO PERIFÉRICA EM QUEIMADURAS CIRCUNFERENCIAIS DE EXTREMIDADES A avaliação da circulação periférica no doente queimado visa excluir a síndrome compartimental. Causada pelo aumento da pressão dentro do compartimento muscular, interferindo na perfusão da musculatura. Apesar de precisar de uma pressão maior que a PAS para perder o pulso distal, pressão > 30 mmHg pode causar necrose do músculo. Sinais de síndrome compartimental: ● Piora da dor com movimentação passiva; ● Tensão do membro; ● Dormência; ● Eventualmente, ausência de pulso. A dificuldade circulatória advinda de queimadura circunferencial pode ser aliviada por escarotomia (não costuma ser necessária nas primeiras 06 horas após queimadura). Fasciotomia raramente necessária, exceto em trauma ósseo associado, lesões por esmagamento, lesão elétrica de alta voltagem ou queimaduras acometendo tecido abaixo da aponeurose. SONDAGEM GÁSTRICA Colocada e mantida em sucção se apresentar náusea, vômito, distensão abdominal, ACQ > 20%. NARCÓTICOS, ANALGÉSICOS E SEDATIVOS O paciente queimado pode estar ansioso e agitado devido à hipoxemia ou à hipovolemia mais do que à dor. Responde melhor ao oxigênio e reposição volêmica do que a analgésicos, narcóticos e sedativos. Estes devem ser administrados em doses pequenas e frequentes, somente por via IV. A avaliação da dor deve ser contínua e, de preferência, usando o mesmo método. Devem ser excluídos deste esquema aqueles com ACQ > 60%, crianças menores de 12 anos ou com insuficiência respiratória ou septicemia. NUTRIÇÃO A avaliação de risco nutricional deve ser realizada na admissão. O estado nutricional e os riscos de depleção deverão ser considerados para a determinação do plano de cuidados, do tipo de terapia nutricional a ser empregada e da monitorização do paciente. LESÕES ESPECÍFICAS QUEIMADURAS QUÍMICAS: retirar causador, irrigar com água corrente em abundância, por, no mínimo, 20 a 30 minutos. QUEIMADURAS ELÉTRICAS: maior investigação de órgãos internos, monitorização eletrocardiográfica (arritmias na primeira hora pós-lesão), lesões musculoesqueléticas, rabdomiólise. LESÕES POR FRIO Crestadura ou frostnip: mais leve, dor, palidez, diminuição da sensibilidade. É reversível por aquecimento e não resulta em perdas teciduais. Congelamento: formação de cristais de gelo dentro das células e por oclusão microvascular que resulta em anóxia tecidual. Primeiro grau: hiperemia e edema sem necrose. Segundo grau: vesículas grandes e conteúdo claro acompanha hiperemia, edema, há necrose parcial da pele. Terceiro grau: necrose espessura total, vesículas conteúdo hemorrágico. Quarto grau: inclui necrose muscular e óssea com gangrena. Lesão não congelante: comprometimento do endotélio microvascular, estase e oclusão vascular. Alternância vasoespasmo e vasodilatação arterial. Podem surgir complicações locais como celulite, linfangite, gangrena. Tratamento: colocar a parte afetada em água quente circulante 40ºC, até que ocorram perfusão e coloração rosada (20 a 30 min). Ingestão de líquidos quentes. Analgésicos e monitorização cardíaca durante o reaquecimento. Profilaxia antitetânica caso necessário. CIRURGIA A identificação das queimaduras de 2º grau profundo e de 3º grau, seguidas de sua excisão e cobertura definitiva (enxertia de pele), afetou dramaticamente o prognóstico dos pacientes vítimas de grandes queimaduras. Tem como principal objetivo restabelecer o isolamento do meio externo do interno, definitiva ou temporariamente, e evitar infecções. Dessa forma, diminui-se a mortalidade, colonização da ferida, incidência de sepse e resposta inflamatória sistêmica. ● Limpeza cirúrgica simples: realizada em todos os pacientes, desde a admissão até o último curativo. Clorexidina degermante a 0,5%, retirada com SF aquecida a 36ºC. ● Desbridamento cirúrgico e escarectomias: após lavagem, realiza-se o desbridamento de tecidos como bolhas, restos dérmicos, necroses e escaras. Escarectomia é a retirada de toda a necrose tecidual com o propósito de se obter um tecido viável para a colocação de cobertura definitiva. Indicada em queimaduras de 2º e 3º grau. Deve ser realizada com paciente hemodinamicamente estável, em até 72 horas após queimadura. ● Escarotomias descompressivas: queimaduras de 2º e 3º grau emmembros, pescoço ou tórax pode levar à diminuição da perfusão dos membros e da cabeça e restrição ventilatória com insuficiência respiratória restritiva. A causa é o edema da região associado à perda da elasticidade da pele queimada e até mesmo contração da pele em queimaduras profundas. ● Enxertia de pele: lâmina de pele parcial ou total, completamente separada de sua origem e que depende do desenvolvimento de um suprimento sanguíneo e de um processo biológico com mecanismos celulares e mediadores químicos para se integrar. Autógena (retirado do próprio paciente), a enxertia pode ser em lâmina ou enxerto expandido. ASSISTÊNCIA FISIOTERÁPICA E TERAPÊUTICA OCUPACIONAL Os objetivos gerais são a prevenção de contraturas, as deformidades e as aderências cicatriciais, manutenção da função respiratória, a amplitude de movimento articular e força muscular, o restabelecimento de capacidade cardiovascular e independência nas atividades de vida diária. Complicações clínicas INFECÇÃO Principal causa de mortalidade do grande queimado. Acontece devido à quebra da barreira cutânea decorrente da necrose tecidual (quanto maior a ACQ, maior a propensão à infecção) e o uso de dispositivos invasivos para administrar medicamentos, monitorizar o paciente e cateterização vesical. Muito comum pneumonia associada à ventilação mecânica nas UTQ. Para prevenção de infecção, enfatizar a antissepsia das mãos com gel alcoólico ou clorexidina degermante, uma vez que muitos pacientes precisam de cuidados de equipe multidisciplinar. O paciente grande queimado deve ficar em quarto privativo, em isolamento de contato. Antibioticoterapia sistêmica profilática: evitar bacteremia após manipulação cirúrgica (cefalosporina de 1ª ou de 2ª). Pomada se infecção. De fundamental importância é o desbridamento cirúrgico, que remove as áreas desvitalizadas e, com isso, permite melhor ação da terapia antimicrobiana. INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA AGUDA Complicações respiratórias acontecem em aproximadamente um terço dos pacientes que sofrem grandes queimaduras, estando relacionadas com a maioria das mortes. Também pode ocorrer secundariamente à inalação de fumaça, independentemente de haver lesões externas. Sinais e sintomas de suspeita de intoxicação por gás cianídrico: convulsão, depressão respiratória e acidose metabólica persistente. Intubação: queimaduras extensas, queimaduras envolvendo face e pescoço e na suspeita de lesão inalatória. INTOXICAÇÃO POR MONÓXIDO DE CARBONO A afinidade da hemoglobina ao CO é 200 a 250 vezes maior que a afinidade ao O2. Sintomas podem se desenvolver de 02 até 28 dias da intoxicação. DELIRIUM As síndromes psiquiátricas agudas após queimadura incluem delirium por abstinência às drogas, encefalopatia do queimado, dor aguda, síndrome pós-trauma. O objetivo do tratamento de delirium consiste na diminuição das alterações cognitivas, estresse subjetivo, minimizar risco de interrupção de suporte de vida pela agitação (acesso venoso, tubo orotraqueal), comprometimento da enxertia de pele. Importante descobrir a etiologia: hipóxia, convulsões, hipoglicemia, TCE, etc.). INJÚRIA RENAL AGUDA Pode se desenvolver nos pacientes que apresentam extensas áreas de queimadura de 2º e/ou 3º grau. Incidência varia de 0,5 a 30%. Ocorre em padrão bimodal: ● IRA PRECOCE (1ª semana do evento): hipovolemia em virtude da reposição volêmica inicial insuficiente, rabdomiólise e hemólise. ● IRA TARDIA (após 5 a 10 dias): instabilidade hemodinâmica associada à sepse e ao emprego de drogas nefrotóxicas (antibióticos), geralmente culminando em disfunção de múltiplos órgãos. A reposição volêmica agressiva inicial, a detecção e a erradicação de focos infecciosos, a cirurgia precoce, o uso de antibióticos tópicos e a monitorização rigorosa do emprego de drogas nefrotoxicas são medidas que colaboraram para a diminuição da incidência de IRA e melhora na sobrevida do paciente grande queimado.