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Professor Tailson Pires Costa Arts. 121 até 234, CP + CF + legislação complementar. dos crimes contra a vida 1° NORMA CRITÉRIO DE VALORAÇÃO Quando o nosso Código Penal foi pensado, o legislador adotou o critério do valor. Isso significa que ele estabeleceu valores para os bens jurídicos e criou uma ordem de "hierarquia" entre esses bens. Quanto maior o valor do bem jurídico atingido, maior será a resposta do Estado (ou seja, maior será a sanção imposta ao infrator da norma). VIDA É o maior bem jurídico tutelado, por isso a vida está no primeiro capítulo da parte especial do Código. PROTEÇÃO LEGAL? Esse direito encontra limitação quando há confronto com outros interesses do Estado (exemplo: a Constituição prevê que em tempo de guerra pode haver pena de morte). - O direito à vida tem seu fundamento na Constituição Federal, art. 5°, caput. Artigo 5°, caput, CF: a vida humana é protegida desde o início (desde o produto da concepção, que é a fecundação de um óvulo por espermatozoide). CONCEITO? O direito à vida é considerado um direito fundamental em sentido material, ou seja, indispensável ao desenvolvimento da pessoa humana. VIDA EXTRAUTERINA A vida é igualmente protegida pelo ordenamento jurídico desde o instante da concepção. Enquanto está em fase intrauterina, trata-se de aborto matar o ser humano em gestação. Quando a vida fora do útero materno principia, é natural tratar-se de homicídio – ou infanticídio, conforme a situação. Entretanto, há polêmica acerca do início da vida extrauterina para efeito de diferenciar o homicídio (ou infanticídio) do aborto. Esse fenômeno é passível de prova pericial, que pode se dar de duas formas: DOCIMASIA HIDROSTÁTICA DE GALENO Quando a criança morre no momento do parto, o médico legista retira o pulmão e coloca em uma bacia com água. Se o órgão boiar e houver bolhas, significa que a criança respirou e, portanto, houve vida. O médico vai, então, verificar qual foi o momento do parto para descobrir há quanto tempo a criança morreu. Desta forma, é possível saber se a interrupção da vida foi antes, durante ou depois do parto e, desta forma, saber qual foi o crime (aborto, homicídio ou infanticídio). PULSÕES CARDÍACAS / MOVIMENTOS CIRCULATÓRIOS Caso não seja possível realizar a docimasia hidrostática de galeno, o médico vai verificar as pulsões cardíacas e os movimentos respiratórias. MORTE PROVA: NECRÓPSIA Para quem é doador de órgãos e tecidos, vale o que está na lei 9.434/97: a morte jurídica ocorre com a morte encefálica irreversível, que deve ser atestada por dois médicos diferentes. - Para quem não é doador, o sujeito só será considerado juridicamente morto com a paralisação, ao mesmo tempo, - Quando alguém pode ser considerado juridicamente morto? Atualmente, há duas formas de morrer juridicamente 1° bimestre Página 1 de Penal II das três funções vitais (função cardíaca ou respiratória, função pulmonar ou respiratória e função encefálica ou cerebral). Esse exame realizado no Instituto Médico Legal quando a pessoa morre é chamado de necrópsia. homicídio CONCEITO O conceito de homicídio se encontra no caput do artigo 121, CP. - "Art. 121, CP, caput. Matar alguém. Pena - reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos." No direito brasileiro, homicídio é sinônimo de assassinato. - Homicídio é, portanto, a suspeição da vida de um ser humano causada por outro. Constituindo a vida o bem mais precioso que o homem possui, trata-se de um dos mais graves crimes que se pode cometer. Esse conceito impede qualquer confusão com a prática do aborto, já que o aborto é a destruição da vida intrauterina. - Também não se confunde com suicídio, que é a eliminação da vida própria, e não de outrem. - Matar alguém: destruição da vida extrauterina de outrem. Não se confunde com genocídio, que é um crime contra a humanidade, considerado hediondo. O genocídio é previsto no artigo 1° da Lei 2.889/56 e possui várias condutas alternativas. O principal fundamento da existência do genocídio consiste na intenção do agente, que é eliminar, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. - Homicídio é a supressão da vida de um ser humano causada por outro. A vida é considerada o bem mais precioso que o homem possui, de modo que o homicídio é considerado um dos mais graves crimes. Trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); material (delito que exige resultado naturalístico, consistente na morte da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“matar” implica em ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado “morte” se dá de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico tutelado); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); progressivo (trata-se de um tipo penal que contém, implicitamente, outro, no caso a lesão corporal); plurissubsistente (via de regra, vários atos integram a conduta de matar); admite tentativa. HOMICÍDIO SIMPLES O homicídio simples só vai acontecer se nenhuma outra espécie de homicídio ocorrer (se dá por exclusão). - O caput do artigo 121, CP é chamado é "homicídio simples" e tem uma pena base de 6 a 20 anos. Portanto, eliminar a vida de outro ser humano, sem qualquer circunstância especial, provoca a aplicação de uma pena de 6 a 20 anos de reclusão. - Sob a denominação de simples, estabelece a lei penal um dos tipos mais singelos e de fácil compreensão que o Código Penal prevê. Trata-se de um tipo meramente descritivo, que não traz nenhum elemento normativo ou subjetivo, não contém componentes de ilicitude, nem de culpabilidade. Homicídio simples hediondo (art. 1° da lei 8.072/90): o homicídio simples é hediondo "quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente". §1° HOMICÍDIO PRIVILEGIADO "Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço." Lembrar: todo crime privilegiado vai beneficiar o réu. O crime de homicídio se torna privilegiado quando o réu preenche algum dos requisitos que se encontram nesse parágrafo. Página 2 de Penal II A atividade típica de grupo de extermínio sempre foi considerada pela jurisprudência majoritária um crime cometido por motivo torpe. O sujeito que se intitula "justiceiro" e atua por conta própria eliminando várias vidas humanas age com desmedida indignidade. Eventualmente, é possível, por exemplo, que o agente mate outra pessoa, em atividade típica de grupo de extermínio, pra preservar um bairro de um deplorável traficante de drogas; se assim for, sua motivação faz nascer o relevante valor social, que privilegia o homicídio, aplicando-se a regra do §1° do artigo 121, e não a figura básica do caput. Relevante valor (a pessoa deve matar acreditando que o seu ato tem relevante valor social ou moral).- -> social (traficante / patriota): o sujeito mata acreditando que a sua conduta de homicídio vai fazer bem não só para ele, mas para toda a coletividade. ∟exemplo: um pai tem seus filhos estudando em uma escola que está localizada onde há muitas ações de traficantes. Então o pai mata o traficante, acreditando que está fazendo o bem para seus filhos e para os filhos das outras pessoas também (é mais ou menos como fazer justiça pelas próprias mãos). -> moral (eutanásia): o sujeito mata acreditando que está fazendo o bem para uma única pessoa, que é a pessoa que ele está matando. ∟exemplo: filho está com sua mãe muito doente, sobrevivendo apenas por aparelhos. O filho desliga os aparelhos acreditando que está ajudando sua mãe, acabando com o sofrimento dela. Dominado de violenta emoção(maus tratos, adultério). Neste caso, a pessoa perde o controle da razão diante de determinado fato (é um estado de ânimo ou de consciência caracterizado por uma viva excitação do sentimento”, podendo levar alguém a cometer um crime.) Entretanto, neste caso, o homicídio deve acontecer no momento da violenta emoção, e não depois. - ∟exemplo: pai que chega em casa e encontra sua filha sendo estuprada. Requisitos: A palavra "pode" deve ser interpretada como um dever do Estado (afinal, trata-se de um direito do réu). - Consequência: o juiz "pode" reduzir... §2° HOMICÍDIO QUALIFICADO (LEI 8.072/90, art. 1°) "Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo futil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossivel a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de doze a trinta anos." Lembrar: todo crime qualificado prejudica a situação do réu. O homicídio qualificado é praticado com circunstâncias legais que integram o tipo penal incriminador, alterando para mais a faixa de fixação da pena. Portanto, da pena de reclusão de 6 a 20 anos, prevista para o homicídio simples, passa-se ao mínimo de 12 e ao máximo de 30 para a figura qualificada. Considera-se crime hediondo. Motivação do homicídio (motivo banal).- Forma que o homicídio é praticado (formas cruéis). - O homicídio pode ser qualificado por duas situações: Ele não esteve lá desde sempre, foi inserido nessa lei após a morte da atriz Daniela Perez. - O homicídio qualificado também se encontra na lei dos crimes hediondos (lei 8.072/90). Paga ou promessa de recompensa (motivo torpe): homicídio com intuito financeiro. - I. matador de aluguel / herança / invalidade profissional Motivo fútil: é tão banal quanto o motivo torpe, mas não tem caráter financeiro. - II. Marido X esposa / briga de trânsito / rompimento de namoro III. Menor periculosidade / dificuldade de defesa / risco à várias pessoas Página 3 de Penal II Emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum: aqui, o homicídio é cometido com requinte de crueldade. Ou seja, o agente revela elevado grau de periculosidade. Pode ocorrer, ainda, quando o sujeito mata e coloca em risco a vida de várias pessoas. - Traição, emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. Exemplo: amigo que mata o outro. - IV. Boa-fé... / covardia... Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime. - V. matar testemunhas... Contra a mulher por razões da condição de sexo feminino. Entretanto, deve-se observar que nem toda morte de mulher é feminicídio. - -> observar §2°-A: haverá feminicídio quando a mulher for morta em uma relação familiar ou em uma relação doméstica. ∟ I. violência doméstica. VI. Feminicídio ∟ II. menosprezo. Contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição. - -> observar que esse crime se estende aos familiares dos policiais. VII. Matar autoridades... Pena de 12 a 30 anos. - Consequência: aumento de pena. §3° HOMICÍDIO CULPOSO "Se o homicídio é culposo: Pena - detenção, de um a três anos." Negligência, imprudência ou imperícia Trata-se da figura típica do caput ("matar alguém"), embora com outro elemento subjetivo: culpa. É um tipo aberto, que depende, pois, da interpretação do juiz para poder ser aplicado. A culpa, conforme o artigo 18, II, do CP é constituída de imprudência, negligência ou imperícia. Se este parágrafo fala em homicídio culposo, isso significa que os homicídios dos §§1° e 2° são dolosos. Não pode haver, em momento algum, dolo (intenção de matar). §4° "No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos." Aumenta a pena do homicídio culposo (previsto no §3°). - 1° parte: culposo qualificado A pena será aumentada se a pessoa deixar de prestar socorro, fugir do local ou deixar de observar regras técnicas e a vítima morrer. ECA (8.069/90)- EI (10.741/03)- 2° parte: agravante Nos casos de crime doloso, a pena será aumentada em razão da vulnerabilidade da vítima (menor de 14 anos/maior de 60 anos). Página 4 de Penal II A pessoa faz aniversário as 00horas do dia do seu nascimento. - §5° PERDÃO JUDICIAL "Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária." Exemplo: pai que provoca a morte do próprio filho, num acidente fruto de sua imprudência, já teve punição mais do que severa. - O perdão judicial é a clemência do Estado, que deixa de aplicar a pena prevista para determinados delitos, em hipóteses expressamente previstas em lei. Essa é uma das situações que autoriza a concessão do perdão. Somente ao autor de homicídio culposo pode-se aplicar a clemência, desde que ele tenha sofrido com o crime praticado uma consequência tão séria e grave que a sanção penal se torne desnecessária. O legislador volta a falar em homicídio culposo. Neste caso, o juiz deixa de aplicar a pena na hora da condenação. Fundamentos jurídicos As consequências do homicídio devem atingir o sujeito ativo de tal forma que o Estado não tem interesse em agravar seu sofrimento. O homicídio deve ser culposo.- Laços afetivos (afinidade) entre o agente e a vítima.- Exigências legais §6° AUMENTO DE PENA "A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio." Exemplo: Beltrano comete um homicídio por meio cruel, em grupo de extermínio. Qualifica-se o crime com base no § 2.º, III, associando-se ao § 6.º. A faixa de fixação da pena estabelece-se de 12 a 30 anos (por conta da qualificadora do inciso III), usando-se o aumento de um terço até metade na terceira fase da fixação do quantum da pena. Esse mecanismo é juridicamente viável porque, quando o homicídio é dupla ou triplamente qualificado, a primeira circunstância serve para qualificar, enquanto a(s) outra(s) funciona(m) como agravante(s). Havendo causa de aumento, que predomina sobre agravante, deve-se utilizar a elevação de um terço até metade. - Estabeleceu-se uma causa de aumento de um terço até a metade. Entretanto, o disposto neste parágrafo, na realidade, pode ser inaplicável. O crime de homicídio, praticado por grupo de extermínio ou milícia privada, sempre foi considerado como qualificado, fundado no inciso I do § 2.º: paga, promessa de recompensa ou outro motivo torpe. Desconhece-se a figura do homicídio simples cometido por exterminadores. Diante disso, não se pode aceitar o indevido bis in idem. Se a atividade paramilitar ou vigilante é torpe, por natureza, provocando a qualificação do delito, deixa de incidir a causa de aumento. Porém, há uma hipótese em que tal causa de aumento torna-se aplicável. Se o homicídio qualificar-se por outro fundamento, de caráter objetivo (incisos III e IV do § 2.º), pode-se utilizar o aumento deum terço até a metade. Não há definição legal para o número de integrantes da milícia privada ou do grupo de extermínio. Milícias são associações criminosas que agem através da força e da grave ameaça para intimidar determinadas comunidades e corromper essas pessoas (obrigar que essas pessoas paguem por segurança, por exemplo). Com isso, essas associações tomam conta de todo o comércio e o morado acaba ficando refém disso. Se as pessoas não pagarem, elas morrem. - a) milícia privada... Pode ser praticado por um único agente, o grupo é o que vai ser atingido (ou seja, o agente escolhe determinados grupos para exterminar). - -> exemplo: matança de moradores de rua. b) grupo de extermínio §7° AUMENTO DE PENA "A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência; II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças Página 5 de Penal II degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental; III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima. III - na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima; IV - em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 ." Contra mulher gestante ou cujo filho ainda não atingiu mais do que três meses;- Vulnerabilidade da vítima (menor de 14 anos, maior de 60 anos ou que seja incapaz por qualquer problema física ou mental); - Cometido na presença de ascendentes ou descendentes; - Praticado desrespeitando medidas protetivas. - Feminicídio Homicídio doloso, tentado ou consumado: competência do tribunal do júri. A ação penal pública é a ação penal incondicionada (que deverá ser promovida pelo MP). induzimento ao suicídio Art. 122, CP. CONCEITO Suicídio é a morte voluntária. No Brasil, não se pune o autor da tentativa de suicídio por motivos humanitários: afinal, quem atentou contra a própria vida, por conta de comoção social, religiosa ou polícia, estado de miserabilidade, desagregação familiar, doenças graves, causas tóxicas, efeitos neurológicos, infecciosos ou psíquicos e até por conta de senilidade ou imaturidade, não merece punição, mas compaixão, amparo e atendimento médico. Pune-se, entretanto, aquele que levou outra pessoa ao suicídio, ainda que nada tenha feito para que o resultado se desse, tendo em vista ser a vida um bem indisponível, que o Estado precisa garantis, ainda que contra a vontade do seu titular. De outra parte, fica nítido que o suicídio é ato ilícito - embora não seja penalmente punido, até mesmo porque, quando se consuma, não teria sentido algum aplicar sanção à família Automutilação é a conduta de causar lesões em si próprio. Vale recordar, até mesmo pelo princípio da transcendentalidade ou da alteridade, o qual veda a punição de condutas que não ultrapassem o âmbito de disponibilidade do agente, que a autolesão, por si só, não é punida. Assim como o suicídio não é punido, o que o legislador veda é o induzimento, a instigação ou o auxílio material a que alguém suicide ou que se mutile. INDUZIMENTO, AUXÍLIO E INSTIGAÇÃO "Art. 122, caput, CP. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça: Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. §1º Se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 129 deste Código: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. §2º Se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos." Induzir: induzir significa dar a ideia a quem não possui, inspirar, incutir. Portanto, nessa primeira conduta, o agente sugere ao suicida que dê fim à sua vida. Instigação: instigar é fomentar uma ideia já existente. Trata-se, pois, do agente que estimula a ideia suicida que alguém anda manifestando. Exemplo: o agente fornece a arma utilizada pela pessoa que se mata. Nesse caso, deve dizer respeito a um apoio meramente secundário, não podendo, jamais, o autor, a pretexto, "auxiliar" o suicida, tomar parte ativa na ação de tirar a vida, tal como aconteceria se alguém apertasse o gatilho da arma já apontada para a cabeça do próprio suicida. Responde, nessa hipótese, por homicídio. - Auxílio: trata-se da forma mais concreta e ativa de agir, pois significa dar apoio material ao ato suicida. Não se admite, pois a expressão contida no tipo penal menciona "prestar auxílio", implicando em ação.A) Auxílio por omissão: trata-se de questão controversa na doutrina e jurisprudência, havendo duas correntes: Página 6 de Penal II Admite-se, desde que o agente tenha o dever jurídico de impedir o resultado. B) Sujeitos ativo e passivo: qualquer pessoa. No caso do sujeito passivo, é preciso ter um mínimo de discernimento ou resistência, pois, do contrário, trata-se de homicídio. Elemento subjetivo: dolo, não se admitindo a forma culposa. Por outro lado, o agente que, brincando, sugere à vítima que se mate não pode ser punido. Trata-se, neste caso, de verdadeira aberração. Se cada uma delas ingerir veneno, de per si, por exemplo, aquela que sobreviver responderá por participação em suicídio, tendo por sujeito passivo a outra (ou as outras) que morreram. A) Caso uma ministre o veneno para as demais, se sobreviver, responderá por homicídio consumado de todos os que morreram (e tentativa de homicídio, com relação aos que sobreviverem), tendo em vista que o delito previsto no artigo 122, CP não admite qualquer tipo de ato executório, com relação a terceiros. B) Na hipótese de cada pessoa administrar veneno a outra (exemplo: José dá veneno à Maria, que fornece a Pedro, que o ministra a Ana, etc.), todas sobrevivendo, responderá cada uma por tentativa de homicídio, tendo como sujeito passivo a pessoa a quem deu o tóxico. C) Se cada pessoa ingerir, sozinha, o veneno, todas sobrevivendo, com lesões leves ou sem qualquer lesão, o fato é atípico, pois o crime do artigo 122, CP é condicionado à ocorrência de lesões graves ou morte. D) Na hipótese de uma pessoa administrar veneno a outra, ao mesmo tempo em que recebe a peçonha desta, aquele que sobreviver responderá por homicídio consumado; se ambos sobreviverem, configurará tentativa de homicídio para as duas (como na alternativa C). E) Caso quatro pessoas contratem um médico para lhes ministrar o veneno, tendo por resultado a morte de duas pessoas e a sobrevivência de ouras duas. Estas, que ficaram vivas, sem lesões graves, responderão por participação em suicídio, tendo por sujeitos passivos as que morreram. O médico, por sua vez, responderá por dois homicídios consumados e duas tentativas de homicídio. Adaptando-se o pacto de morte à roleta russa (passar um revólver entre vários presentes, contendo uma só bala no tambor, que é girado aleatoriamente, para que a arma seja apontada por cada um na direção de seu corpo), dá se o mesmo. Quem sobreviver responde por participação em suicídio, tendo por vítima aquele que morreu. Finalmente, acrescente-se a hipótese, no contexto da roleta russa, do participante que der um tiro em si mesmo, sofrendo lesões graves, no entanto sobrevivendo. Ele não deve ser penalmente responsabilizado, pois o direito brasileiro não pune a autolesão. Os outros, sem dúvida, responderão por participação em suicídio. F) Pacto de morte: é possível que duas ou mais pessoas promovam um pacto de morte, deliberando morrer ao mesmo tempo. Neste caso, várias hipóteses podem se dar, tais quais: FORMAS MAJORADAS "§3° A pena é duplicada: I - se o crime é praticado por motivo egoístico, torpe ou fútil; II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquercausa, a capacidade de resistência." Exemplo: induzir alguém a se matar para ficar com a herança ou para receber valor de seguro. - Motivo egoístico: trata-se do excessivo apego a si mesmo, o que evidencia o desprezo pela vida alheia, desde que algum benefício concreto advenha ao agente. Logicamente, merece maior punição. Motivo torpe: é o motivo repugnante, vil, abjeto, desprezível. A vingança vem sendo compreendida pelo STJ como um motivo torpe, no caso de homicídio. Entretanto, o STJ já decidiu que a vingança pode ou não configurar motivo torpe, a depender do caso concreto. Motivo fútil: é aquele que demonstra desproporção em relação ao crime praticado. Caracteriza-se quando o delito consubstancie razão frívola, mesquinha, insignificante. E se o crime for praticado com ausência de motivo, existe divergência doutrinária, mas o STJ tem entendido não ser admissível a configuração do crime praticado sem motivo como qualificado por motivo torpe. Vítima menor de idade: como vimos, não pode se tratar de pessoa sem capacidade de compreender aquilo que faz, como uma criança. Vítima com diminuição da capacidade de resistência: é aquela que, por qualquer motivo, está mais suscetível ao induzimento ou à instigação, como aquela que padece de alguma enfermidade, como uma depressão. "§4° A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por meio da rede de computadores, de rede social ou Página 7 de Penal II É importante recordar que a conduta típica, para a configuração do delito em estudo, deve se voltar a uma pessoa determinada ou a pessoas determinadas. Haverá, portanto, o aumento da pena, até o dobro, no caso de o agente se utilizar, por exemplo, de chamar de vídeo ou mesmo o serviço de mensagens do Facebook. - transmitida em tempo real." A fração de aumento deve ser até o dobro, devendo o juiz adotar como critério, o maior potencial de dano da conduta. Com efeito, o aumento deve ser menor se houver o uso de uma chamada de vídeo entre duas pessoas já conhecidas, sendo o uso da internet apenas um instrumento que possibilita sua ação à distância. Por outro lado, a majoração deve ser mais elevada se o agente procura suas vítimas em uma rede social, transmitindo sus mensagens a uma dezena de pessoas, escolhidas a partir de um grupo de apoio por abuso de álcool, por exemplo. - Neste caso, a lei fixa a fração em até metade, ao contrário do parágrafo anterior ("até o dobro", naquele caso). O maior desvalor da conduta reside no fato de o sujeito ativo ter uma posição de liderança ou de coordenação em grupo ou rede virtual, ou seja, com formação realizada pela internet, a rede mundial de computadores. Com isso, sua conduta possui maior probabilidade de eficácia e menor controle, já que sua própria posição demanda dele tal responsabilidade no grupo. - "§5° Aumenta-se a pena em metade se o agente é líder ou coordenador de grupo ou de rede virtual."´ HIPÓTESES DE CONFIGURAÇÃO DE CRIME MAIS GRAVE "§6° Se o crime de que trata o § 1º deste artigo resulta em lesão corporal de natureza gravíssima e é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime descrito no §2º do art. 129 deste Código." §7° Se o crime de que trata o §2º deste artigo é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. 121 deste Código." Menor de 14 anos de idade: a lei presume de forma absoluta a incapacidade do menor de 14 anos a resistir a uma ideia de suicídio ou automutilação. Deste modo, se a vítima com referida idade se mata ou se mutila, neste último caso com configuração de lesão de natureza gravíssima, o agente responderá pelo crime de homicídio ou de lesão corporal gravíssima, respectivamente. - Vítima que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento contra a prática do ato: cuida-se de vítima que, por enfermidade (como esquizofrenia) ou deficiência mental (como quem nasceu com microcefalia), não tem capacidade de decidir, de forma consciente e livre, sobre o fim de sua própria vida ou sobre a automutilação. - Vítima que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência: a última hipótese abarca qualquer causa que torne o sujeito passivo mais vulnerável, sem possibilidade de resistir ao induzimento, à instigação ou ao auxílio material ao suicídio ou à automutilação. É o caso de alguém que abusou do consumo de bebida alcoólica ou que usou cocaína a ponde de não ter domínio de sua própria vontade. - Configura lesão corporal gravíssima ou homicídio se o crime qualificado for praticado contra: Lesão corporal gravíssima: se o resultado for uma lesão corporal gravíssima, sendo a vítima uma das acima mencionadas, o agente deve responder nos termos do artigo 129, §2°, do CP. A lesão corporal de natureza gravíssima, como denominada pela doutrina, se configura se ensejar incapacidade permanente para o trabalho; enfermidade incurável; perda ou inutilização do membro, sentido ou função; deformidade permanente ou aborto. - Morte: se a vítima for uma das destacadas pelo §7° do artigo 121 e lhe sobrevier a óbito como consequência da conduta típica, haverá a configuração do homicídio, por expressa previsão legal, afastando-se a forma qualificada do §2° do artigo 122 do CP. - Quanto à punição, a lei determina que, caso o sujeito passivo seja algum dos elencados acima, a punição deve ocorrer de acordo com o resultado obtido: infanticídio Art. 123, CP. CONCEITO Página 8 de Penal II "Art. 123, CP. Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de dois a seis anos." O sujeito ativo deve, necessariamente, ser a mãe sob influência do estado puerperal. - Trata-se do homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-nascido, sob a influência do estado puerperal. É uma hipótese de homicídio privilegiado em que, por circunstâncias particulares e especiais, houve por bem o legislador conferir tratamento mais brando à autora do delito, diminuindo a faixa de fixação da pena (mínimo e máximo). Embora formalmente tenha o legislador eleito a figura do infanticídio como crime autônomo, na essência não passa de um homicídio privilegiado, como já observamos. DISTINÇÃO ENTRE INFANTICÍDIO E ABORTO Menciona a lei penal que o infanticídio pode ter lugar durante o parto ou logo após. Nesta última hipótese, não há dúvida: inexiste aborto. Entretanto, o problema mais sensível é descortinar o momento em que a criança deixa de ser considerada feto para ser tratada como nascente. O início do parto se dá com a ruptura da bolsa, pois a partir daí o feto se torna acessível às ações violentas (por instrumentos ou pela própria mãe do agente). Assim, iniciado o parto, torna-se o ser vivo sujeito ao crime de infanticídio. Antes, é hipótese de aborto. ANÁLISE DO NÚCLEO DO TIPO Observa-se que o verbo "matar" é o mesmo do homicídio, razão pela qual a única diferença entre o crime de infanticídio e o homicídio é a especial situação em que se encontra o agente. Matar significa eliminar a vida de outro ser humano, de modo que é preciso que o nascente esteja vivo no momento em que é agredido. Trata-se de crime punido somente na forma dolosa. SUJEITOS ATIVO E PASSIVO Autora do delito só pode ser a mãe, enquanto a vítima é o ser nascente ou o recém-nascido. ELEMENTO SUBJETIVO É o dolo. Não se exige elemento subjetivo específico, nem se pune a forma culposa. ELEMENTOS JURÍDICO E MATERIAL O objeto jurídico protegido é a vida humana, enquanto o material é a criança, que sofre a agressão. ESTADO PUERPERAL É o estado que envolve a parturiente durante a expulsão da criançado ventre materno. Há profundas alterações psíquicas e físicas, que chegam a transtornar a mãe, deixando-a sem plenas condições de entender o que está fazendo. É uma hipótese de semi imputabilidade que foi tratada pelo legislador com a criação de um tipo especial. O puerpério é o período que se estende do início do parto até a volta da mulher às condições pré-gravidez. Como toda mãe passa pelo estado puerperal - algumas com graves perturbações e outras com menos -, é desnecessária a perícia. CIRCUNSTÂNCIA DE TEMPO O infanticídio exige que a agressão seja cometida durante o parte ou logo após, embora sem fixar um período preciso para tal ocorrer. Deve-se, pois, interpretar a expressão "logo após" com o caráter de imediatidade, pois, do contrário, poderão existir abusos. Após o parto ter se consumado, a presunção do estado puerperal vai desaparecendo e o correr dos dias inverte a situação, obrigando a defesa a demonstrar, pelos meios de prova admitidos (perícia ou testemunhas), que o puerpério, excepcionalmente, naquela mãe persistiu, levando-a a matar o próprio filho. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME É delito próprio (só pode ser cometido por agente especial, no caso a mãe); instantâneo (a consumação não se prolonga no tempo); comissivo (exige ação); material (que se configura com o resultado previsto no tipo, a morte do filho); de dano (o bem jurídico precisa ser efetivamente lesado); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); progressivo (passa, necessariamente, por uma lesão corporal); plurissubsistente (vários atos integram a conduta); de forma livre (não s encontra no tipo a descrição da conduta que determina o resultado); admite tentativa. Aliás, vários casos de agressões contra recém nascidos terminam não se consumando, visto que os recém nascidos tem menor necessidade de oxigênio. CONCURSO DE AGENTES Tendo o Código Penal adotado a teoria monista (artigos 29 e 30), pela qual todos os que colaborarem para o cometimento de um crime incidem nas penas a ele destinadas, no caso presente coautores e partícipes respondem igualmente por infanticídio. O mesmo se dá se a mãe auxilia, nesse estado, o terceiro que tira a vida do seu filho e ainda se ambos (mãe e terceiro) matam a criança nascente ou recém nascida. A doutrina é amplamente predominante nesse Página 9 de Penal II sentido. aborto Arts. 124 a 128, CP ABORTO PROVOCADO PELA GESTANTE OU COM SEU CONSENTIMENTO "Art. 124, CP. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque: Pena - detenção, de um a três anos." CONCEITO DE ABORTO Sentido etimológico: privação do nascimento. - É a cessação da gravidez, cujo início se dá com a nidação, antes do termo normal, causando a morte do feto ou embrião. O termo mais correto seria "abortamento": é a conduta criminosa, interrupção da gravidez. Entende-se que o início da gravidez se dá com a fecundação do embrião na parede uterina. - Quando se dá o início da gravidez? FORMAS DE ABORTO Aborto natural: é a interrupção da gravidez oriunda de causas patológicas, que ocorre de maneira espontânea (não há crime). Aborto acidental: é a cessação da gravidez por conta de causas exteriores e traumáticas, como quedas e choques (não há crime). Aborto criminoso: é a interrupção forçada e voluntária da gravidez, provocando a morte do feto. Aborto terapêutico ou necessário: é a interrupção da gravidez realizada por recomendação médica, a fim de salvar a vida da gestante. Trata-se de uma hipótese específica de estado de necessidade. - Aborto sentimental ou humanitário: é a autorização legal para interromper a gravidez quando a mulher foi vítima de estupro. Dentro da proteção à dignidade da pessoa humana em confronto com o direito à vida nesse caso, do feto), optou o legislador por proteger a dignidade da mãe, que, vítima de um crime hediondo, não quer manter o produto da concepção em seu ventre, o que lhe poderá trazer sérios entraves de ordem psicológica e na sua qualidade de vida futura. - Aborto permitido ou legal: é a cessação da gestação com a morte do feto, admitida por lei. Esta forma divide-se em: Aborto eugênico ou eugenésico: é a interrupção da gravidez, causando a morte do feto, para evitar que a criança nasça com graves defeitos genéticos. Há controvérsia se há ou não crime nessas hipóteses (como se verá no artigo 128). Aborto econômico-social: é a cessação da gestação, causando a morte do feto, por razões econômicas ou sociais, quando a mãe não tem condições de cuidar do seu filho, seja porque não recebe assistência do Estado, seja porque possui família numerosa, ou até por política estatal. No Brasil, é crime. SUJEITOS ATIVO E PASSIVO O sujeito ativo é a gestante, enquanto o passivo é o feto ou embrião. Secundariamente, o sujeito passivo é a sociedade, que tem interesse em proteger a vida do ser em formação no útero materno. OBJETOS JURÍDICO E MATERIAL O objeto jurídico protegido é a vida do feto ou embrião. Primordialmente, o objeto material é o feto ou embrião, que sofre a conduta criminosa, mas também pode ser a gestante, pois seu corpo pode ser protegido para provocar o aborto. ANÁLISE DO NÚCLEO DO TIPO "Provocar" significa dar causa ou determinar; "consentir" quer dizer dar aprovação, admitir, tolerar. O objeto das condutas Página 10 de Penal II é a cessação da gravidez, provocando a morte do feto ou embrião. ELEMENTO SUBJETIVO É o dolo. Não exige elemento subjetivo específico, nem se pune a forma culposa. PROVA DO ABORTO Em regra, faz-se por exame pericial. Excepcionalmente, por exame indireto. Nesse sentido: TJSP - "a prova de gravidez e de que o aborto foi provocado é assunto médico-legal, normalmente esclarecido no laudo pericial, cuja eventual deficiência não impedirá a pronúncia e até mesmo a condenação do acusado, desde que apoiada noutros elementos persuasivos de materialidade do crime." (HC 280.904-3, Cafelândia, 4°. C., rel. Haroldo Luz, 27.04.1999, v.u., JUBI 35/99). EXIGÊNCIA DE GRAVIDEZ COMPROVADA É preciso que a gestação seja, de algum modo, comprovada, pois “provocar” aborto implica em matar o feto ou embrião. Se este não existe ou já estava morto, trata-se de crime impossível. PARTICIPAÇÃO DE TERCEIRO Exemplo: aconselhar a gestante a cometer, sozinha, o aborto. - O delito admite a participação, desde que na forma secundária, consistente em induzimento, instigação ou auxílio. Se a pessoa atua diretamente para causar a interrupção da gravidez não é partícipe, mas autora do delito do art. 126. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME Trata-se de crime próprio (só a gestante pode cometer); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo); comissivo ou omissivo (provocar = ação; consentir = omissão); material (exige resultado naturalístico para sua configuração); de dano (deve haver efetiva lesão ao bem jurídico protegido, no caso, a vida do feto ou embrião); unissubjetivo (admite a existência de um só agente), mas na última modalidade (com seu consentimento) é plurissubjetivo, mesmo que existam dois tipos penais autônomos – um para punir a gestante, que é este, e outro para punir o terceiro, que é o do art. 126; plurissubsistente (configura-se por vários atos); de forma livre (a lei não exige conduta específica para o cometimento do aborto); admite tentativa. Pune-se somente a forma dolosa HIPÓTESES QUE AFASTAM A OCORRÊNCIA DE ABORTO Gravidez molar: desenvolvimento completamente anormal do ovo. Não há aborto, pois é preciso se tratar de "embrião de vida humana". Gravidez extrauterina: trata-se de um estado patológico, onde o embrião não tem condições de se desenvolver, atingindo vida própria de modo normal. Nesse caso, par haver aborto lícito, é necessário que não haja possibilidade médica de intervir para sanar o problema. ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO SEM CONSENTIMENTO "Art. 125, CP. Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, se três a dez anos." SUJEITOS ATIVO E PASSIVO Neste caso, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, emborao sujeito passivo não seja somente o feto ou embrião, mas também a gestante, pois a agressão foi dirigida contra a sua pessoa, sem o seu consentimento. Secundariamente, o sujeito passivo é a sociedade que tem interesse em proteger a vida do ser em formação no útero materno. OBJETOS JURÍDICO E MATERIAL Os objetos jurídico são a vida do feto ou embrião e a integridade física da gestante; os objetos materiais são igualmente o feto ou embrião ou a gestante, que sofreram a conduta criminosa. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME Trata-se de crime comum (que pode ser praticado por qualquer pessoa); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo); comissivo (provocar = ação) ou omissivo (quando houver o dever jurídico de impedir o resultado. Ex.: o médico que, contratado para acompanhar uma gestação problemática, não o faz deliberadamente); material (exige resultado naturalístico para sua configuração); de dano (deve haver efetiva lesão ao bem jurídico protegido, no caso, a vida do feto ou embrião e a integridade física da mãe); unissubjetivo (admite a existência de um só agente); Página 11 de Penal II plurissubsistente (configura-se por vários atos); de forma livre (a lei não exige conduta específica para o cometimento do aborto); admite tentativa. ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO COM CONSENTIMENTO "Art. 126, CP. Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de um a quatro anos. Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência Forma qualificada ." SUJEITOS ATIVO E PASSIVO Ativo é qualquer pessoa; passivo é o feto ou embrião. Secundariamente, o sujeito passivo é a sociedade, que tem interesse em proteger a vida do ser em formação no útero materno. OBJETOS JURÍDICO E MATERIAL O objeto jurídico é a vida do feto ou embrião; o objeto material é o feto ou embrião, que sofre a conduta criminosa. ANÁLISE DO TIPO Trata-se de uma exceção à teoria monística (todos os coautores e partícipes respondem pelo mesmo crime quando contribuírem para o mesmo resultado típico). Se existisse somente a figura do artigo 124, o terceiro que colaborasse com a gestante para a prática do aborto incidiria naquele tipo penal. Entretanto, o legislador, para puni mais severamente o terceiro que provoca o aborto, criou o art. 1126, aplicando a teoria dualista do concurso de pessoas. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME Trata-se de crime comum (que pode ser praticado por qualquer pessoa); instantâneo (cuja consumação não se prolonga no tempo); comissivo (provocar = ação); material (exige resultado naturalístico para sua configuração); de dano (deve haver efetiva lesão ao bem jurídico protegido, no caso, a vida do feto ou embrião); plurissubjetivo (necessita da participação de, pelo menos, duas pessoas, embora, neste caso, existam dois tipos autônomos); plurissubsistente (configura-se por vários atos); de forma livre (a lei não exige conduta específica para o cometimento do aborto); admite tentativa. Pune-se somente a forma dolosa. DISSENTIMENTO PRESUMIDO Quando a vítima é menor de 14 anos ou é alienada ou débil mental, não possui consentimento válido, levando à consideração de que o aborto deu-se contra a sua vontade. Esse dispositivo é decorrência natural do enfoque que a lei penal concede ao menor de 14 anos, incapaz de consentir validamente certos atos. DISSENTIMENTO REAL Quando o agente emprega violência, grave ameaça ou mesmo fraude, é natural supor que extraiu o consentimento da vítima à força, de modo que o aborto necessita encaixar-se na figura do artigo 125. FORMA QUALIFICADA "Art. 127, CP. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de 1/3 (um terço), se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte." APLICAÇÃO RESTRITA Somente se aplica a figura qualificada às hipóteses dos arts. 125 e 126, pois não se pune a autolesão no direito brasileiro. HIPÓTESES DA FIGURA QUALIFICADA Lesões graves ou morte da gestante e feto expulso vivo: tentativa de aborto qualificado. Aborto feito pela gestante, com lesões graves ou morte, havendo participação de outra pessoa: esta pode responder por homicídio ou lesão culposa (se previsível o resultado para a gestante) em concurso com autoaborto, já que não se aplica a figura qualificada à hipótese prevista no art. 124. CRIMES QUALIFICADOS PELO RESULTADO Trata-se de hipótese em que o resultado mais grave qualifica o originalmente desejado. O agente quer matar o feto ou embrião, embora termine causando lesões graves ou mesmo a morte da gestante. Entendem a doutrina e a Página 12 de Penal II jurisprudência majoritárias que as lesões e a morte só podem decorrer de culpa do agente, constituindo, pois, a forma preterdolosa do crime (dolo na conduta antecedente e culpa na subsequente). Entretanto, a despeito disso, não há restrição legal expressa para que o resultado mais grave não possa ser envolvido pelo dolo eventual do agente. Mas, se isso ocorrer, conforme posição predominante, costuma-se dividir a infração em duas distintas (aborto + lesões corporais graves ou aborto + homicídio doloso, conforme o caso). Em suma, o aborto com morte ou lesão grave para a gestante é um crime qualificado pelo resultado, que pode dar-se com dolo na conduta antecedente (aborto) e dolo eventual ou culpa na consequente (morte ou lesão grave para a gestante). Não se trata, pois, do autêntico crime preterdoloso, aquele que somente admite dolo na conduta antecedente e culpa na consequente. Por tal motivo, é possível a configuração da tentativa, isto é, o agente tenta praticar o aborto, não consegue, mas termina causando à gestante lesões graves. É uma tentativa de aborto com lesões graves para a mãe. ABORTO PRATICADO POR MÉDICO "Art. 128, CP. Não se pune o aborto praticado por médico: Aborto necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no caso de gravidez resultante de estupro II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal." ANÁLISE DA EXPRESSÃO "NÃO SE PUNE" Trata-se de um equívoco do legislador: pois fica parecendo ser uma escusa absolutória. Melhor teria sido dizer "não há crime". A) É correta a expressão: pois está a lei dizendo que não se pune o aborto, o que significa que o fato típico deixa de ser punível, equivalendo a dizer que não há crime. B) Há duas posições a respeito: CONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO Nenhum direito é absoluto, nem mesmo o direito à vida. Por isso, é perfeitamente admissível o aborto em circunstâncias excepcionais, para preservar a vida digna da gestante. Há, no entanto, uma posição contrária na doutrina, sustentando a absoluta impossibilidade de ser legitimado o aborto, pois seria ofensa à cláusula pétrea do art. 5°, CF, que é o direito à vida. SUJEITO QUE PODE PRATICÁ-LO Entende-se que somente o médico pode providenciar a cessação da gravidez nessas duas hipóteses, sem qualquer possibilidade de utilização da analogia "in bonam partem" para incluir, por exemplo, a enfermeira ou a parteira. A razão disso consiste no fato de o médico ser o único profissional habilitado a decidir, mormente na primeira situação, se a gestante pode ser salva evitando-se o aborto ou não. Quanto ao estupro, é também o médico que pode realizar a interrupção da gravidez com segurança para a gestante. Se a enfermeira ou qualquer outra pessoa assim agir, poderá ser absolvida por estado de necessidade ou até mesmo por inexigibilidade de conduta diversa, conforme o caso. ABORTO TERAPÊUTICO Trata-se de uma hipótese específica de estado de necessidade. Entre os dois bens que estão em conflito (vida da gestante e vida do feto ou embrião), o direito fez clara opção pela vidada mãe. Prescinde-se do consentimento da gestante neste caso. ABORTO HUMANITÁRIO OU PIEDOSO Em nome da dignidade da pessoa humana, no caso a mulher que foi violentada, o direito permite que pereça a vida do feto ou embrião. São dois valores fundamentais, mas é melhor preservar aquele já existente. Autoriza o aborto sentimental, pois está claramente prevista a hipótese em lei; A) Não autoriza, pois é impossível a "morte de um ser humano" em nome de uma ficção. B) ESTUPRO DECORRENTE DE VIOLÊNCIA FÍSICA ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR Após a edição da Lei 12.015/2009, o atentado violento ao pudor foi incorporado pelo estupro, de modo que tanto a conjunção carnal quanto outro ato libidinoso são, igualmente, considerados formas de estupro. Por isso, resultando de qualquer deles a gravidez, autoriza-se o aborto. Página 13 de Penal II EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO OU PROCESSO PELO DELITO DE ESTUPRO Prescindível, pois a excludente não exige a condenação do responsável pelo crime que deu origem à autorização legal. O importante é o fato e não o autor do fato. Por isso, basta o registro de um boletim de ocorrência e a apresentação do documento ao médico, que não necessita nem mesmo de autorização judicial. CONSENTIMENTO DA GESTANTE É imprescindível, pois é ela que pode saber o grau de rejeição à criança que existe em seu coração. Caso decida gerar o ser, permitindo-lhe o nascimento, este é direito seu. Em verdade, terá dado mostra de superior desprendimento e nenhum bem será ainda mais sacrificado, além do trauma que já sofreu em virtude de violência sexual. A QUESTÃO DO ABORTO EUGÊNICO EM CONFRONTO COM A ANENCEFALIA Algumas decisões de juízes têm autorizado abortos de fetos ou embriões que tenham graves anomalias, inviabilizando, segundo a medicina atual, a sua vida futura. Seriam crianças que fatalmente morreriam logo ao nascer ou pouco tempo depois. Assim, baseando-se no fato de que algumas gestantes, descobrindo tal fato, não se conformam com a gestação de um ser completamente inviável, abrevia-se o sofrimento e autoriza-se o aborto. o da gestante, não suportando carregar no ventre uma criança de vida inviável; - o do médico, julgando salvar a genitora do forte abalo psicológico que vem sofrendo. - O juiz invoca, por vezes, a tese da inexigibilidade de conduta diversa, por vezes a própria interpretação da norma penal que protege a “vida humana” e não a falsa existência, pois o feto ou embrião só está “vivo” por conta do organismo materno que o sustenta. A tese da inexigibilidade, nesse caso, teria dois enfoques: As únicas hipóteses de aborto legal são as previstas no art. 128, e não se pode dizer que interromper a gestação de um ser anômalo irá “salvar a vida da gestante”. Abalos psicológicos não podem ser causa para a interrupção da gestação, mesmo porque a medicina evolui a passos largos dia após dia, o que significa que a perspectiva de vida e de cura pode alterar-se a qualquer instante. A inexigibilidade da conduta diversa é uma causa supralegal de exclusão da culpabilidade, presente em nosso ordenamento, embora, em muitos casos, não estejam presentes os seus requisitos. A disseminarmos tal conduta, nada impede, no futuro, que a eugenia – aprimoramento da raça humana – volte a imperar em nossa sociedade, permitindo que pais escolham qual tipo físico de criança desejam, provocando o aborto daquelas que, em padrões questionáveis, sejam “inviáveis”. - A medicina, por ter meios, atualmente, de detectar tais anomalias gravíssimas, propicia ao juiz uma avaliação antes impossível. Até este ponto, é razoável a invocação da tese de ser inexigível a mulher carregar por meses um ser que, logo ao nascer, perecerá. Mas não se pode dar margem a abusos, estendendo o conceito de anomalia fatal para abranger fetos ou embriões que irão constituir seres humanos defeituosos ou até monstruosos. Afinal, nessa situação, o direito não autoriza o aborto. Lamentavelmente, tem-se observado que nem todas as decisões autorizadoras do aborto ligam-se ao feto ou embrião plenamente inviável. Algumas, levando em conta o sofrimento dos pais de terem em gestação um feto ou embrião anormal, física ou mentalmente, mas com possibilidade de viver, ainda que com características monstruosas, acabam autorizando o aborto para fazer cessar a angústia dos genitores. Não podemos acolher a tese de que o feto ou embrião, com anomalias, que irá constituir-se em ser vivo monstruoso, ou com curta expectativa de vida, possa ser exterminado, enquanto, se os pais não o fizerem durante a gestação, não mais poderão assim agir quando o mesmíssimo ser monstruoso nascer. Se a vida humana deve ser protegida de qualquer modo, seja de ser monstruoso ou não, necessita-se estender essa proteção tanto à criança nascida quanto àquela que se encontra em gestação. E diga-se mais: a eventual curta expectativa de vida do futuro recém-nascido também não deve servir de justificativa para o aborto, uma vez que não se aceita, no Brasil, a eutanásia, vale dizer, quem está desenganado não pode ser morto por terceiros, que terminarão praticando homicídio (ainda que privilegiado). Entretanto, se os médicos atestarem que o feto ou embrião é verdadeiramente inviável, vale dizer, possui malformação que lhe impedirá a vida fora do útero materno, não se cuida de “vida própria”, mas de um ser que sobrevive à custa do organismo da gestante. - Se o direito protege, como é doutrina e jurisprudência predominantes, qualquer tipo de pessoa, mesmo a monstruosa (deformada ou de conformação anômala), não se compreende a razão pela qual, em alguns casos, leve-se em conta a possibilidade de a gestante optar pela morte do feto ou embrião, encaixado na mesma situação. Ou seja: fetos ou embriões que se constituirão em seres monstruosos ou de vida relativamente inviável, no futuro, podem ser sacrificados de imediato; recém-nascidos monstruosos, no entanto, não podem. Página 14 de Penal II lesão corporal "Art. 129, CP. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano. Lesão corporal de natureza grave: § 1º Se resulta: I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias; II - perigo de vida; III - debilidade permanente de membro, sentido ou função; IV - aceleração de parto: Pena - reclusão, de um a cinco anos. § 2º Se resulta: I - Incapacidade permanente para o trabalho; II - enfermidade incurável; III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função; IV - deformidade permanente; V - aborto: Pena - reclusão, de dois a oito anos. Lesão corporal seguida de morte: § 3º Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo: Pena - reclusão, de quatro a doze anos. Diminuição de pena: § 4º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Substituição da pena § 5º O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis: I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior; II - se as lesões são recíprocas. Lesão corporal culposa: § 6º Se a lesão é culposa: Pena - detenção, de dois meses a um ano. Aumento de pena: § 7º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4º e 6º do art. 121 deste Código. § 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121. Violência Doméstica: § 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. § 10. Nos casos previstos nos §§ 1 o a 3 o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9 o deste artigo, aumenta- se a pena em 1/3 (um terço).§ 11. Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência. § 12. Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços." CONCEITO DE LESÃO CORPORAL Trata-se de uma ofensa física voltada à integridade ou à saúde do corpo humano. Para a configuração do tipo é preciso que a vítima sofra algum dano ao seu corpo, alterando-se interna ou externamente, podendo, ainda, abranger qualquer modificação prejudicial à sua saúde, transfigurando-se qualquer função orgânica ou causando-lhe abalos psíquicos comprometedores. - Não é indispensável a emanação de sangue ou a existência de qualquer tipo de dor. Tratando-se de saúde, não se deve levar em consideração somente a pessoa saudável, vale dizer, tornar enfermo quem não estava, mas ainda o fato de o agente ter agravado o estado de saúde de quem já se encontrava doente. - Não se enquadra neste tipo penal qualquer ofensa moral. Página 15 de Penal II Exemplo: agente que ameaça gravemente a vítima, provocando-lhe uma séria perturbação mental, ou transmite- lhe, deliberadamente, uma doença através de um contato sexual consentido. - A lesão pode ser cometida por mecanismos não violentos. AUTOLESÃO Não é punida no direito brasileiro, embora seja considerada ilícita, salvo se estiver vinculada à violação de outro bem ou interesse juridicamente protegido, como ocorre quando o agente, pretendendo obter indenização ou valor de seguro, fere o próprio corpo, mutilando-se. Nessa hipótese, aplica-se o disposto no art. 171, §2°, V do CP, tendo em vista a proteção a proteção ao patrimônio da empresa seguradora. ANÁLISE DO NÚCLEO DO TIPO "Ofender" significa lesar ou fazer mal a alguém ou a alguma coisa. O objeto da conduta é a integridade corpora (inteireza do corpo humano) ou a saúde (normalidade das funções orgânicas, físicas e mentais do ser humano). SUJEITOS ATIVO E PASSIVO Como exemplo de sujeito passivo qualificado ou especial, pode-se mencionar a mulher grávidas, no caso de lesão corporal com aceleração de parto (§1°, IV) ou de aborto (§2°, V). - Qualquer pessoa, salvo em algumas figuras qualificadas. ELEMENTO SUBJETIVO Na figura prevista no caput, que é a lesão corporal simples, somente o dolo, sem exigir-se elemento subjetivo específico ou dolo específico. OBJETOS MATERIAL E JURÍDICO O primeiro é a pessoa que sofre a lesão; o segundo é o bem jurídico protegido, que é a incolumidade física. CLASSIFICAÇÃO É crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); material (exige resultado naturalístico, consistente na lesão à vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“ofender” implica em ação) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado ocorre de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); de dano (consuma-se apenas com efetiva lesão a um bem jurídico tutelado); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (em regra, vários atos integram a conduta de lesar); admite tentativa. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA OU BAGATELA É viável não considerar fato típico a lesão ínfima causada à vítima, pois o Direito Penal não deve ocupar-se de banalidades, dependendo, naturalmente, do caso concreto. Assim, exemplificando, pequenas lesões causadas culposamente em acidentes de trânsito podem ser consideradas atípicas. LESÕES LEVES PROVOCADAS POR CÔNJUGES Costumava-se, como medida de política criminal, defender o arquivamento do inquérito policial ou até mesmo a absolvição da pessoa acusada quando o casal se reconciliava, visando à preservação da família. Uma condenação poderia provocar maiores danos à estabilidade conjugal, já alcançada pela recomposição de ambos. Ocorre que, atualmente, cuida-se da hipótese de violência doméstica (art. 129, §9°), cuja ação é pública incondicionada. Por isso, não é o caso de continuar a aplicar a política criminal de preservação dos laços familiares, pois o interesse público em buscar a punição do agente é superior à pretensa preservação do matrimônio. CONSENTIMENTO DO OFENDIDO É perfeitamente aplicável, no contexto das lesões corporais, o consentimento da vítima como causa supralegal de exclusão da ilicitude. Não se pode mais conceber o corpo humano como bem absolutamente indisponível, pois a realidade desmente a teoria. É verdade que o Estado deve zelar pela vida humana, indisponível que é, além da integridade física, embora sem jamais desconhecer que a evolução dos costumes e da própria ciência traz modificações importantes nesse cenário. Atualmente, as práticas demonstram que o ser humano dispõe, no dia a dia, de sua integridade física, colocando-se em situações de risco de propósito ou submetendo-se a lesões desejadas. Do mesmo modo, não deve o Estado imiscuir-se na vida íntima das pessoa, resolvendo punir, por exemplo, lesões corporais consentidas cometidas durante a prática de ato sexual desejado entre adultos. Assim, conforme a sociedade for assimilando determinados tipos de lesão corporal, deve o Estado considerar válido o consentimento do ofendido para eliminar a ilicitude do fato. Tudo está a depender, naturalmente, da evolução dos costumes, pois não devem ser aceitas Página 16 de Penal II condutas que ofendam a moral e a ética social. LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE CONCEITO DE LESÃO CORPORAL GRAVE Sob a mesma rubrica, o legislador tipificou dois modelos distintos de lesão corporal: a grave e a gravíssima. Enquanto no § 1° encontram-se os casos de lesão corporal grave, no §2°estão os casos de lesão corporal gravíssima. A diferença entre ambas as denominações emerge cristalina a partir da análise da pena cominada: reclusão de 1 a 5 anos para a hipótese grave e reclusão de 2 a 8 anos para a gravíssima. Assim, a lesão corporal grave (ou mesmo a gravíssima) é uma ofensa à integridade física ou à saúde da pessoa humana, considerada muito mais séria e importante do que a lesão simples ou leve. Ontologicamente, inexiste diferença entre quaisquer tipos de lesão corporal dolosa, embora, para efeito de punição, leve-se em consideração a espécie de dano causado à vítima. OCUPAÇÃO HABITUAL Compreende-se como toda e qualquer atividade regularmente desempenhada pela vítima, e não apenas a sua ocupação laborativa. Assim, uma pessoa que não trabalhe, vivendo de renda ou sustentada por outra, deixando de exercitar suas habituais ocupações, sejam elas quais forem - até mesmo de simples lazer -, pode ser enquadrada nesse inciso, desde que fique incapacitada por mais de 30 dias. A única exigência é que a atividade exercida pela vítima seja lícita, pois não teria cabimento considerar presente a qualificadora no caso de um delinquente que deixasse de cometer crimes por período superior ao trintídio porque foi ferido por um comparsa. Por derradeiro, deve-se destacar que o termo "habitual" tem a conotação de atividade frequente, não se podendo reconhecer a lesão corporal grave quando a vítima ficar incapacitada para ocupações que exercia raramente (exemplo: o ofendido, por conta da lesão corporal, foi obrigado a adiar por mais de 30 dias uma viagem de lazer, algo que costumava fazer esporadicamente). Perícia Torna-se indispensável a realização de laudo pericial para atestar o comprometimento da vítima para seu mister habitual por mais de 30 dias, devendo ser elaborado tão logo decorra o trintídio - embora possa subsistir a tolerância de alguns dias. O exame complementar pode ser suprido por prova testemunhal, como expressamente prevê o art. 168, §3° doCPP. PERIGO DE VIDA É a concreta possibilidade de a vítima morrer em face das lesões sofridas. Não bastam conjecturas ou hipóteses vagas e imprecisas, mas um fator real de risco inerente ao ferimento causado. Trata-se de um diagnóstico, e não de um prognóstico. Por isso, torna-se praticamente indispensável o laudo pericial, sendo muito rara a sua substituição por prova testemunhal, salvo quando esta for qualificada, ou seja, produzida pelo depoimento de especialistas (como o médico que cuidou da vítima durante a sua convalescença). A doutrina e a jurisprudência pátrias, majoritariamente, consideram que, neste caso, somente pode haver dolo na conduta antecedente (lesão corporal) e culpa no tocante ao resultado mais grave (perigo de vida), pois, havendo dolo em ambas as fases, estar-se-ia diante de uma tentativa de homicídio. Perícia Em sentido contrário: "STF - 'a ausência de laudo pericial não impede seja reconhecida a materialidade do delito de lesão corporal de natureza grave por outros meios.' (HC 114.567/ES, 2° T., Rel. Gilmar Mendes, 16.10.2012, v.u.)." - Diversos autores entendem que é indispensável. O perigo de vida é uma situação médica, que precisa ser convenientemente atestada e, sem dúvida, deixa vestígio. Desse modo, mesmo que não seja possível o exame pericial direto, pode-se buscar o indireto, feito por meio da análise das fichas clínicas da vítima. DEBILIDADE PERMANENTE Trata-se de uma frouxidão duradoura no corpo ou na saúde, que se instala na vítima após a lesão corporal provocada pelo agente. Não se exige que seja uma debilidade perpétua, bastando ter longa duração. Perícia Nesse prisma: "TJSP - 'Lesão Corporal Grave – Absolvição – Impossibilidade – Provas seguras da autoria que levam à condenação. Qualificadora prevista no inciso I do § 1.º do artigo 129 – Afastamento por ausência de exame complementar – Inadmissibilidade – Laudo complementar que somente seria necessário para se dar a correta - É indispensável, mas basta um laudo, não sendo necessário o exame complementar. Página 17 de Penal II tipificação do delito, que no presente caso é explicita (grave), pela perda permanente da visão do olho esquerdo – Apelação do réu não provida. (...) O laudo de fls. 09 descreve que a vítima informou que sofreu agressão recebendo atendimento médico e apresentando relatório com diagnóstico de trauma lácero-contuso do olho esquerdo e explosão do olho esquerdo. Os médicos peritos foram categóricos em atestar, após análise do ferimento, que a lesão é de natureza grave pela incapacidade para as atividades habituais por mais de 30 dias e pelo resultado, qual seja, debilidade permanente do sentido da visão. A corroborar, a vítima, em Juízo, confirmou que ficou mais de um mês sem trabalhar (fls. 42). Vale lembrar que a realização de exame complementar é necessária para que se possa dar a correta tipificação da natureza da infração penal. No presente caso, a lesão é grave, explicitada pela perda permanente da visão do olho esquerdo, sendo dispensável complementação de laudo.' (Ap. 990.10.226337-1, 16.ª C., rel. Pedro Menin, 01.03.2011, v.u.)." Membro Obs.: os dedos são apenas partes dos membros, de modo que a perda de um dos dedos não constitui-se em debilidade permanente da mão ou do pé. - Os membros do corpo humano são os braços, as mãos, as pernas e os pés. Sentido Exemplificando: perder a visão em um dos olhos é debilidade permanente. - Possui o ser humano cinco sentidos: visão, olfato, audição, paladar e tato. Função Exemplo: função respiratória, função excretória, função circulatória. - A perda de um dos rins é debilidade permanente e não perda da função, pois se trata de um órgão. - Trata-se da ação própria de um órgão do corpo humano. ACELERAÇÃO DE PARTO Há possibilidade de haver o nascimento com vida, mas, em razão da lesão corporal sofrida pela mãe, que tenha atingido o feto, venha a morrer a criança; alguns autores opinam que, nesse caso, responderia o agente por lesão corporal gravíssima, equiparando-se a situação à lesão corporal seguida de aborto; outros, porém, sugerem que, havendo morte após o nascimento, caracteriza-se apenas a lesão corporal grave. - Significa antecipar o nascimento da criança antes do prazo normal previsto pela medicina. Nesse caso, é indispensável o conhecimento da gravidez pelo agente. Se, em virtude da lesão corporal praticada contra a mãe, a criança nascer morta, terá havido lesão corporal gravíssima (art. 129, §2°, V). INCAPACIDADE PERMANENTE PARA O TRABALHO Trata-se da inaptidão duradoura para exercer qualquer atividade laborativa lícita. Nesse contexto, diferentemente da incapacidade para as ocupações habituais, exige-se a atividade remunerada, que implique em sustento, portanto, acarrete prejuízo financeiro para o ofendido. ENFERMIDADE INCURÁVEL É a doença irremediável, de acordo com os recursos da medicina na época do resultado, causada na vítima. Não configura a qualificadora simples debilidade enfrentada pelo organismo da pessoa ofendida, necessitando existir uma séria alteração na saúde. Embora a vítima não seja obrigada a submeter-se a qualquer tipo de tratamento ou cirurgia de risco para curar- se, também não se deve admitir a recusa imotivada do ofendido para tratar-se. Se há recursos suficientes para controlar a enfermidade gerada pela agressão, impedindo-a de se tornar incurável, é preciso que o ofendido os utilize. Não o fazendo por razões injustificáveis, não deve o agente arcar com o crime na forma agravada. Por outro lado, uma vez condenado o autor da agressão por lesão gravíssima, consiste em ter gerado ao ofendido uma enfermidade incurável, não cabe revisão criminal caso a medicina evolua, permitindo a reversão da doença. Caberia a revisão criminal apenas se tivesse havido erro quanto à impossibilidade de cura no momento da condenação, ou seja, a enfermidade era passível de controle e tratamento, mas tal situação não foi percebida a tempo. Transmissão do vírus da AIDS nos debates havidos no julgamento do HC 98.712/RJ, o eminente Min. Ricardo Lewandowski, ao excluir a possibilidade de a Suprema Corte, naquele caso, conferir ao delito a classificação de ‘Perigo de contágio de moléstia grave’ (art. 131, do Código Penal), esclareceu que, ‘no atual estágio da ciência, a enfermidade é incurável, quer dizer, ela não é só grave, nos termos do art. 131’. Na hipótese de transmissão dolosa de doença incurável, a conduta deverá será apenada com mais rigor do que o ato de contaminar outra pessoa com moléstia grave, conforme previsão clara do art. 129, § 2.º inciso II, do Código Penal. A alegação de que a Vítima não manifestou sintomas não serve para afastar a configuração do delito previsto no art. 129, § 2.º, inciso II, do Código Penal. É de notória sabença que o contaminado pelo vírus do HIV necessita Página 18 de Penal II de constante acompanhamento médico e de administração de remédios específicos, o que aumenta as probabilidades de que a enfermidade permaneça assintomática. Porém, o tratamento não enseja a cura da moléstia” (HC 160982 -DF, 5.ª T., rel. Laurita Vaz, 17.05.2012, v.u.). PERDA OU INUTILIZAÇÃO Perda implica em destruição ou privação de algum membro (exemplo: corte de um braço), sentido (exemplo: aniquilação dos olhos) ou função (exemplo: ablação da bolsa escrotal, impedindo a função reprodutora). Inutilização quer dizer falta de utilidade, ainda que fisicamente esteja presente o membro ou o órgão humano. Assim, inutilizar um membro seria a perda de movimento da mão ou a impotência para o coito, embora sem remoção do órgão sexual. Cirurgia de mudança de sexo Atualmente é admissível, não só pela evolução dos costumes, mas sobretudo pelo desenvolvimento da medicina, constatando a necessidade da cirurgia, para a melhoria de vida do transexual, possa o sexo ser alterado. Formalmente, no entanto, não deixa de ser uma lesão corporal gravíssima, que inutiliza, permanentemente, a função sexual e também reprodutora. Pode-sedizer, em alguns casos, que os órgãos sexuais estavam atrofiados e não aptos à reprodução, embora existam e façam parte da constituição física do indivíduo. E justamente porque não são mais desejados, o caminho é muda-los, por meio da intervenção médica. DEFORMIDADE PERMANENTE Deformar significa alterar a forma original. Configura-se a lesão gravíssima quando ocorre a modificação duradoura de uma parte do corpo humano da vítima. Salienta a doutrina, no entanto, estar essa qualificadora ligada à estética. Por isso, é posição majoritária a exigência de s er a lesão visível, causadora de constrangimento ou vexame à vítima, e irreparável. Citam-se como exemplos as cicatrizes de larga extensão em regiões visíveis do corpo humano, que possam provocar reações de desagrado ou piedade (tais como as causadas pela vitriolagem, isto é, o lançamento de ácido no ofendido), ou a perda de orelhas, mutilação grave do nariz, entre outros. Entretanto, existem discordâncias dessa postura, afinal, o Código Penal não exige, em hipótese alguma, que a deformidade seja ligada à beleza física, nem tampouco seja visível. Desde que o agente provoque na vítima uma alteração duradoura nas formas originais do seu corpo humano, é de se reputar configurada a qualificadora. Chega-se a levantar, como critério de verificação desta qualificadora, o sexo da vítima, sua condição social, sua profissão, seu modo de vida, entre outros fatores extremamente subjetivos, por vezes nitidamente discriminatórios e sem adequação típica. Uma cicatriz no rosto de uma atriz famosa seria mais relevante do que a mesma lesão produzida numa trabalhadora rural? Poderia ser, para o terceiro que não sofreu a deformidade - já que a análise desbancaria para o campo estético -, embora, para a vítima, possa ser algo muito desconfortável. Deste modo, pouco importa seja a deformidade visível ou não, ligada à estética ou não, passível de causar impressão vexatória ou não, exigindo-se somente seja ela duradoura, ou seja, irreparável pelos recursos apresentados pela medicina à época do resultado. E acrescente-se possuir essa qualificadora caráter residual, isto é, quando houver lesão passível de alterar a forma original do corpo humano, não se configurando outras hipóteses de deformidade - debilidade ou perda de membro, sentido ou função - deve ela ser aplicada. ABORTO É a interrupção da gravidez, causando a morte do feto. Neste caso, exigem a doutrina e a jurisprudência majoritárias que o resultado qualificador (aborto) ocorra na forma culposa. Nessa visão, se o agente, ao agredir a gestante, tivesse agido com dolo (direto ou eventual) com relação à morte do feto, deveria responder pelo delito de aborto (absorvendo-se a lesão provocada na gestante), para alguns, ou por aborto em concurso com o crime de lesões corporais, para outros. Entretanto, nada exige, na lei penal, seja essa a conclusão, pois o tipo penal, em momento algum, estabelece a forma preterdolosa para a lesão corporal seguida de aborto, ou seja, não há a exigência (como existe no art. 129, §3°) de que o aborto somente possa ser punido a título de culpa. O crime é qualificado pelo resultado (uma figura híbrida por excelência), admitindo dolo no antecedente e dolo no consequente, bem como dolo no antecedente e culpa no consequente. Se a pena for considerada insuficiente, não opinião de alguns, para punir o agente que tiver manifestado o dolo nas duas fases, dever-se-ia alterar a parte sancionadora do tipo penal, mas não criar uma forma de punição alternativa. Se no roubo seguido de morte (latrocínio) admite-se, majoritariamente, a existência de dolo no antecedente (roubo), bem como dolo no subsequente (morte), o mesmo deve ocorrer neste e em outros casos de crimes qualificados pelo resultado. Por outro lado, parte da doutrina crê ser possível a incidência da lesão corporal gravíssima quando o agente agredir a mulher grávida, provocando-lhe o aborto, ainda que tenha atuado com dolo no tocante ao resultado qualificador. Caso o legislador desejasse uma consequência diversa, isto é, a punição do aborto, neste caso, somente se houvesse culpa por parte do agente, deveria ter deixado isso bem claro, como o fez na lesão corporal seguida de morte. Página 19 de Penal II LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE CRIME PRETERDOLOSO Trata-se da única forma autenticamente preterdolosa prevista no Código Penal, pois o legislador deixou nítida a exigência de dolo no antecedente (lesão corporal) e somente a forma culposa no evento subsequente (morte da vítima). Ao mencionar que a morte não pode ter sido desejada pelo agente, nem tampouco por ele ter assumido o risco de produzi - la, está se fixando a culpa como único elemento subjetivo possível para o resultado qualificador. Justamente por isso, neste caso, havendo dolo eventual quanto à morte da vítima, deve o agente ser punido por homicídio doloso. Sob o nexo causal: "STJ - 'não há a configuração do crime de lesão corporal seguida de morte se a conduta do agente não foi a causa imediata do resultado morte, estando ausente o necessário nexo de causalidade.' (AgRg no Resp 1.094.758/RS, 6° T., rel. Vasco Della Giustina, 01.03.2012, m.v.)." Tentativa Inadmissível, pois o crime preterdoloso envolve a forma culposa e esta é totalmente incompatível com a figura da tentativa. Se o agente não quer, de modo algum, a morte da vítima, é impossível obter a forma tentada da lesão seguida de morte. Ademais, ou a morte ocorre e o crime está consumado, ou não ocorre e trata-se apenas de uma lesão corporal. DIMINUIÇÃO DE PENA LESÃO CORPORAL PRIVILEGIADA Estabelece a lei o grau de redução, variando de um sexto a um terço, devendo o juiz ater-se, exclusivamente, à causa em si, não levando em consideração fatores estranhos, vinculados a outras fases da aplicação da pena, como as circunstâncias judiciais. Portanto, tratando-se de relevante valor social ou moral, deve focar o quão importante esse valor apresentou-se ao réu e à sociedade no momento doas fatos. Embora de cunho subjetivo, a avaliação judicial deve ser fundamentada e calcada nas provas dos autos. Maior diminuição (um terço) para a mais aguda relevância; menor diminuição (um sexto), para relevância ordinária. No tocante à violenta emoção, mensura-se a intensidade desse sentimento exacerbado, conforme o grau de provocação injusta da vítima. Maior redução para a violentíssima emoção fundada em provocação de cristalina injustiça; menor, para a violenta emoção calcada em provocação de injustiça ordinária, sem qualquer destaque. Esta hipótese é aplicável às lesões grave, gravíssima ou seguida de morte. Para a lesão leve, reservou-se o próximo parágrafo. SUBSTITUIÇÃO DA PENA LESÃO CORPORAL PRIVILEGIADA Esta é uma autêntica hipótese de privilégio, embora conectada ao parágrafo anterior (como se vê no inciso I), acarretando a substituição da pena privativa de liberdade pela pecuniária. Aplica-se somente à hipótese de lesão corporal leve e desde que haja relevante valor social ou moral ou o domínio de violenta emoção, logo após injusta provocação da vítima. Lesões recíprocas Não se trata de uma situação de legítima defesa, ou seja, se o ofendido agredir o agente apenas para se defender não deve este receber o privilégio. Ao referir-se a "lesões recíprocas", dá a norma a entender que as duas partes entraram em luta injustamente. Não teria cabimento algum conceder o privilégio ao agressor cuja vítima, para dele se desvencilhar, tenha sido obrigada a agredi-lo e não conceder o benefício ao agente quando o ofendido tenha sofrido lesões, conseguindo soltar-se do agressor sem fazer uso da força. Ora, se a vítima está em atitude lícita (agindo em legítima defesa), não pode esta situação servir de motivação para o atacante conseguir um benefício legal considerável, que é a substituição da pena privativa de liberdade por multa. Entretanto, se ambos são igualmente culpados e agressores um do outro, pode o juiz levar tal hipótese em consideração para aplicar o
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