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1 Jéssica N. Monte Radiologia RADIOGRAFIA DE TÓRAX: PROJEÇÕES, SISTEMATIZAÇÃO E QUALIDADE PROJEÇÕES PA X AP O ideal é que a parte anterior do tórax do paciente fique em contato com a chapa e que suas costas fiquem voltadas para o aparelho que emite os raios, para que estes percorram o trajeto póstero-anterior (PA). A distância entre o paciente e o tubo de raio x é padronizada e deve ser equivalente a 1,8 metros. A variação dessa distância interfere na formação da imagem. É de extrema importância que o paciente, no mo- mento da emissão dos raios, esteja em inspiração profunda máxima, pois assim os campos pulmona- res se expandem e é possível uma boa visualização do parênquima pulmonar. Na imagem ao lado, a radiografia à esquerda apre- senta inspiração adequada, profunda, enquanto a radiografia à direita apresenta inspiração insufici- ente. Outro fator importante é a lateralidade do exame. Exames de imagem devem ser interpretados como se o paciente estivesse de frente para o observador. Assim, o lado direito do observador corresponde ao lado esquerdo do paciente, enquanto o lado esquerdo do observador corresponde ao lado direito do paciente. No Brasil, é convencionada a marcação do lado direito do paciente na radiografia. Dessa forma, apesar de o coração na radiografia ao lado estar aparentemente “ao contrário”, a sua lateralidade está correta, com o lado direito marcado cor- retamente. A partir disso, por mais que possamos achar que este exame está virado, o paciente é, na verdade, dextrocárdico, ou seja, apresenta o coração virado para a direita. Isso mostra como não podemos não basear no lado do coração para determinação da lateralidade do exame. Entre os fatores de preferência para a utilização da projeção em PA, e não da projeção em AP (ante- roposterior), estão o tamanho de estruturas como o coração e o mediastino. Uma vez que essas estru- turas se encontram mais distantes do filme na projeção em AP, sua imagem se torna amplificada. No entanto, esse aumento não é real. Esse é um dos motivos pelos quais não se deve calcular o índice 2 Jéssica N. Monte Radiologia cardiotorácico (IC) de pacientes com radiografia em anteroposterior, pois o coração estará, automatica- mente, aumentado. Apesar disso, é importante lembrar que não são todos os pacientes que conseguirão fazer o exame em PA, pois para isso é preciso ficar em pé. Dessa forma, a projeção em AP é utilizada em pacientes em estado grave, por exemplo, que precisam fazer a radiografia deitados. Ambas as radiografias ao lado perten- cem ao mesmo paciente, no entanto a radiografia da direita foi feita com pro- jeção em PA, enquanto a da esquerda foi feita com projeção em AP. Na radiografia feita em AP, deve-se no- tar o marcante aumento tanto do área cardíaca quanto do mediastino. No en- tanto, esses aumentos não são reais, e sim artefatos da projeção utilizada. O índice cardiotorácico deve ser calculado somente nas projeções realizadas em PA, e seu cálculo é feito pela divisão entre a maior distância entre as margens do coração (linha vermelha) e a maior distância entre as faces internas do tórax (linha preta). Corações de tamanhos normais, ou seja, que não estão aumentados, apresentam IC inferior a ½ ou 0,5. Na prática, isso significa que, para conside- rarmos que o coração do paciente não está aumentado, este deve caber no espaço de um hemitórax. Se não couber, estamos diante de aumento da área cardíaca (radiologistas não costumam utilizar o termo cardiomegalia, uma vez que este é um termo fisiopatológico). Outra diferença trazida pela comparação entre radiografias em PA e em AP são as marcas vasculares. Exames realizados em AP podem deixar as mar- cas vasculares mais acentua- das (apontadas pelas setas amarelas), podendo levar o ob- servador a confundi-las com in- filtrado pulmonar. Ademais, quando o paciente realiza o exame em PA ele consegue se posicionar de tal forma que as escápulas não fiquem no campo da imagem. Isso auxilia o observador a não confundir as escápulas com um pneumotórax, por exemplo, e também previne que as escápulas impe- çam o observador de enxergar alguma alteração no parênquima pulmonar. 3 Jéssica N. Monte Radiologia A radiografia ao lado foi feita em AP e nela, consequentemente, as escápulas se tornam visíveis sob o campo pulmonar. Outra diferença entre as proje- ções em PA e em AP consiste no fato de que as projeções em PA são realizadas com o paciente ereto. Isso permite a distribuição mais adequada de gases, líquidos e vasos. Quando o paciente faz a radiografia em pé, torna-se mais fácil a visualização da existência de gás fora do lugar, ou seja, a existência de pneumotórax ou de pneumoperitônio. Devido à força da gravidade, quando o paciente fica em pé, os gases sobem, permitindo a visuali- zação de pneumotórax abaixo dos arcos costais na região do ápice pulmonar e de pneumoperitônio abaixo das cúpulas diafragmáticas. Para não confundir o pneumoperitônio com a bolha gástrica, é preciso ficar atento ao fato de que a bolha gástrica fica sempre localizada à esquerda do paciente e que ela tem um formato mais arredondado. Já o pneumoperitônio tem um formato mais laminar, que se molda à cúpula diafragmática, e muito frequentemente aparece do lado di- reito. Na radiografia ao lado, o pneumoperitônio à direita está marcado com a cor azul, enquanto a bolha gástrica, à esquerda, está marcada com a cor vermelha. Quanto ao pneumotórax, a sua visualização pode ser mais difícil, principalmente quando se ainda é prin- cipiante. No entanto, sua imagem consiste em uma região onde não se visualiza a trama vascular pulmonar. Na radiografia abaixo, o limite do parênquima pulmonar está marcado pelas setas brancas. Acima delas, não se enxerga mais nenhum tipo de trama vascular. Essa região está totalmente preenchida por ar, configurando pneumotórax. 4 Jéssica N. Monte Radiologia Em relação à distribuição de líquidos, estes também se acumulam em- baixo, conforme à força da gravidade, quando o paciente se encontra ereto. Assim, o líquido que se acumula no espaço pleural, quando o paciente está de pé, precisa se moldar ao formato do pulmão. Com isso, o derrame pleural acaba formando uma parábola, chamada de parábola de Demoiseau, que na imagem ao lado se localiza no seio cos- tofrênico direito. Por outro lado, a radiografia abaixo foi realizada em AP. Nela, não se consegue enxergar a parábola, pois como o paciente se encontra dei- tado, o líquido escorreu por debaixo do pulmão. Nessa imagem, torna- se mais difícil identificar o derrame pleural, pois só se consegue enxergar um redução difusa da trans- parência no hemitórax direito. Quanto à distribuição dos vasos na radiografia realizada com o paciente ereto, esta posição auxilia a não perder alterações dos vasos pulmonares e também a não con- fundir vasos normais com patologias. Com o paciente ereto (imagem à direita), de- vido ao efeito da força da gravidade, os vasos que se direcionam às bases pulmonares fi- cam mais grossos, mais visíveis, enquanto aqueles que se direcionam aos ápices pulmonares se tornam mais finos, mais discretos. Quando o paciente está dei- tado (imagem à esquerda), perde-se o gradiente gravitacional, e os vasos pulmonares supe- riores se tornam mais calibrosos. Se não prestarmos atenção a isso, podemos confundir este artefato com insuficiência cardíaca, por exemplo, que é uma patologia que aumenta o calibre das mar- cas vasculares nos segmentos superiores. PERFIL A projeção lateral, ou em perfil, permite a melhor visualização de algumas estru- turas e também as suas localizações mais precisas, especialmente daquelas mais posteriores. Deve-se pedir a projeção em perfil sempre que possível, juntamente com o raio x feito em PA. 5 Jéssica N. Monte Radiologia Na imagem ao lado, percebe-se na radiografia em PA que há perda do contorno da margem cardíaca esquerda (sinal da silhueta), mas não conseguese definir exatamente o que está causando isso, e onde está localizado. Já na radiografia em perfil, é possível identificar que a perda do contorno da margem cardíaca esquerda se dá por uma opaci- dade localizada entre o lobo superior e a língula do pulmão esquerdo. Já na imagem abaixo, é possível verificar no perfil um aumento da densidade dos corpos vertebrais inferiores devido a uma opacidade localizada no lobo inferior do pulmão esquerdo. O normal é que os corpos vertebrais superiores sejam mais densos do que os corpos vertebrais inferiores, uma vez que superiormente existem mais estruturas para atenuar o feixe (ombros, braços, partes moles), e inferi- ormente existe basicamente apenas parênquima pulmonar. À essa inversão encontrada na imagem se dá o nome de sinal da perda do gradiente da coluna, estando os corpos vertebrais inferiores mais densos que os superiores. OUTRAS PROJEÇÕES PROJEÇÃO ÁPICO-LORDÓTICA A projeção ápico-lordótica não costuma ser solicitada, mas sua função é uma melhor visualização dos ápices pulmonares, uma vez que, na projeção em PA, as cla- vículas ficam sob a região dos ápices, prejudicando sua visualização. Antigamente, diante da indisponibilidade da tomografia, essa projeção costumava ser solicitada em casos de suspeita de tuberculose. 6 Jéssica N. Monte Radiologia PROJEÇÃO OBLÍQUA A projeção oblíqua costuma ser solicitada para a avali- ação de fratura de costelas, especialmente quando não se tem à disposição o exame de tomografia. QUANDO PEDIR RADIOGRAFIA EM PA EXPIRATÓRIA? A radiografia em PA expiratória auxilia diante de suspeita de pneumotórax e de obstrução brônquica. Quanto ao pneumotórax, durante a inspiração (radio- grafia à esquerda) o pneu- motórax pode se mostrar muito discreto, enquanto na expiração (radiografia à di- reita), com a redução do parênquima pulmonar, o ar do pneumotórax se torna mais evidente. Já em relação à obstrução brônquica, du- rante a expiração o lado que está obstruído não reduz de volume (linhas vermelhas), en- quanto o lado normal reduz (linhas amare- las). QUANDO PEDIR PERFIL EM DECÚBITO? Diante da suspeita de obstrução brônquica em cri- anças muito pequenas, que não obedecem ou não conseguem executar o método expiratório, pode- se realizar o exame em decúbito lateral (de ambos os lados), pois isto funciona como uma expiração 7 Jéssica N. Monte Radiologia passiva. No lado da obstrução, o pulmão não sofrerá redução. Na imagem anterior, a radiografia em decúbito lateral direito (rx à esquerda) apresenta redução do pulmão direito, enquanto a radiografia em decúbito lateral esquerdo (rx à direita) não apresenta redução do pulmão esquerdo, permanecendo cheio de ar devido à obstrução brônquica. Além disso, diante da suspeita ou dificuldade de visualiza- ção de um derrame pleural, ou ainda diante da indisponibi- lidade de uma tomografia, pode-se realizar o exame com a chamada projeção de Laurell, que consiste no decúbito lateral com raios horizontais. Essa posição permite a visu- alização de derrame pleural duvidoso, pois com o decúbito lateral o líquido acumulado no espaço pleural escorre e re- trai o parênquima pulmonar. SISTEMATIZAÇÃO E QUALIDADE A descrição inicial do exame pode ser sintetizada pelos “4Qs”: que, quem, quando e qualidade. “Que” se refere a qual exame é (raio x de tórax em PA, por exemplo), “quem” diz respeito a quem é o paciente do exame, “quando” se refere à data em que o exame foi realizado, e “qualidade” diz respeito à como o exame foi feito – pode ser sintetizada pela sigla “RIP”: rotação, inspiração e penetração. ROTAÇÃO Para saber se um exame está com a rotação adequada, pode-se traçar um linha entre os processos espinhosos e medir a distância dessa linha em relação às clavículas. Se essa distância for equivalente, o exame foi feito com a rotação adequada (imagem abaixo, radiografia à esquerda); se uma clavícula estiver mais perto dos processos espinhos do que a outra, o exame está rodado (imagem abaixo, radiografia à direita) Exames rodados não permitem uma correta análise da área cardíaca e do mediastino do paciente. 8 Jéssica N. Monte Radiologia INSPIRAÇÃO Para saber se um exame está com a inspiração adequada, deve-se contar os arcos costais. Sugere-se a contagem dos arcos anteriores, que são mais oblíquos e não são vistos completamente, uma vez que antes de se unirem ao esterno existe cartilagem. Exames inspirados corretamente apresentam ao menos 6 arcos costais anteriores visíveis acima do diafragma. A visualização de menos de 6 arcos costais evidencia que a inspiração está insuficiente, e o exame se torna inadequado para análise da área cardíaca, do mediastino e até mesmo do parênquima pulmonar, pois as marcas vasculares ficam mais acentuadas. PENETRAÇÃO A penetração pode ser avaliada por meio dos processos espinhosos. Deve-se obter uma boa visualização dos processos espinhosos até mais ou menos a altura do arco aórtico. Quando o exame está pouco penetrado (A), mal se consegue visualizar os processos espinhosos, nem acima do arco aórtico. Já no exame muito penetrado (B) visualiza-se a coluna, até demais. Ambos os exames são inadequados para análise e avaliação.