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Constipação intestinal

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Constipação intestinal
Tatiane Lira – MED UFPE
· 
· Introdução:
· Distúrbio + comum da defecação.
· Epidemiologia:
○ Há grande variabilidade nos números de prevalência devido aos diferentes critérios diagnósticos adotados pelos diferentes estudos.
○ Um desses estudos realizado no Brasil (2000) mostra cerca de 14,7 a 38,4% de prevalência.
○ Em 17 a 40% das crianças o início é no 1° ano de vida.
○ Em + de 1/3 das crianças a constipação torna-se crônica.
○ 90-95% dos casos são de natureza funcional:
▪ Não tem alteração orgânica que justifique a dificuldade de evacuar.
▪ Não há causa anatômica, metabólica, neurológica etc.; é multifatorial.
○ Devido dificuldade no diagnóstico, foram criados os critérios de Roma:
▪ P/ doenças gastrointestinais funcionais.
▪ Atualmente está usando o IV.
▪ São constantemente reavaliados p/ atualizações.
· Fisiologia da defecação: 
· P/ entender a constipação, é preciso entender a fisiologia da defecação.
· Refeições → chegada do alimento principalmente no estômago → desencadeia reflexo gastrocólico (contrações colônicas de propulsão do bolo alimentar).
· Movimentação do cólon é p/ que bolo fecal entre em contato c/ a parede e haja absorção de água e eletrólitos, está constantemente acontecendo.
· Mas a propulsão do bolo fecal p/ chegar no reto (reservatório) não acontece sempre: habitualmente acontecem 2-3 ondas de propulsão (e geralmente pós-refeição).
· Fezes no reto → relaxamento do esfíncter anal interno (EAI): “reflexo retoanal” (ocorre quando o reto se preenche; movimento involuntário).
· Relaxamento do esfíncter anal externo (EAE) → movimento voluntário.
· Percepção da vontade de evacuar ocorre c/ sensação de preenchimento do reto e relaxamento do EAI.
· P/ que haja evacuação, é necessário uma série de processos que fazemos s/ perceber ao contrair a musculatura abd:
○ Inspiração profunda → fechamento da glote → rebaixamento do diafragma → contração da musculatura abdominal → contração do m. elevador do ânus → permite relaxamento da musculatura glútea e EAE → fezes saem.
· Incontinência: pcte não consegue manter a contração por não ter tônus muscular adequado, então há perdas fecais.
· Anismo: incontinência fecal de longa data c/ ↑ quantidade de fezes no reto; incoordenação que promove relaxamento inadequado da musculatura, s/ força propulsiva adequada; ao tentar relaxar, faz o inverso, contrai a musculatura + ainda.
· Definição:
· Aumento no intervalo entre as evacuações (< 3 evacuações / sem).
· > 1 episódio de incontinência fecal / sem.
· Presença de fezes volumosas no reto ou palpáveis no abdomen.
· Eliminação de fezes endurecidas e volumosas que obstruem o vaso sanitário.
· Ocorrência de comportamento retentivo:
○ Manobras realizadas pela criança pela contração, que pode chegar à exaustão do esfíncter anal externo e da musculatura glútea.
○ Prende as fezes cruzando as pernas, se esconde, chora… P/ evitar a evacuação.
· Defecação dolorosa, desconfortável (c/ dificuldade ou esforço).
· Pode ocorrer também:
· Incontinência fecal secundária à retenção de fezes (fecaloma):
○ Também chamada escape fecal ou soiling.
○ Perda involuntária de conteúdo retal fecaloide consequente à presença de fezes impactadas no reto e/ou colo.
○ Não é completa, geralmente só mela a roupa íntima.
· Dor abdominal crônica.
· Laivos de sangue na superfície das fezes em consequência de fissura anal.
· Sinais de alerta:
· Retardo na eliminação de mecônio (deve acontecer nas primeiras 72h; chama atenção p/ megacólon congênito ou Doença de Hirschsprung). 
· Distensão abdominal volumosa (pensa em doença que inclusive curse c/ pseudo-obstrução intestinal). 
· Déficit de crescimento pondero-estatural (não é normal que constipação cause isso). 
· Posição anormal do ânus. 
· Idade de início precoce (< 6m).
· Ausência de comportamento de retenção. 
· Ausência de escape fetal (pode significar que pcte está c/ ampola retal vazia, devido obstrução anterior ao reto: estreitamento de passagem, estenose / pressão aumentada da musculatura antes do reto: não permite a passagem das fezes). 
· Ampola retal vazia. 
· Presença de sintomas extra-intestinais. 
· Febre, vômitos, diarreia c/ sangue. 
· Falta de resposta ao tto convencional.
· História familiar de D. de Hirschsprung:
○ Defeito na migração de céls ganglionares nervosas e a porção distal do intestino não as recebe.
○ Assim, tem contração fixa da musculatura: não consegue relaxar.
○ É necessariamente distal p/ proximal.
○ Quadro clínico:
▪ Retardo na eliminação de mecônio.
▪ Ampola retal vazia.
▪ Eliminação explosiva de fezes ao toque retal (toque causa relaxamento e as fezes que estavam sobre grande pressão no cólon dilatado saem de uma vez).
▪ Distensão abdominal e massa fecal abdominal volumosa.
▪ Eliminação de fezes em fita.
· Etiologia:
· Apesar da maioria dos casos de constipação intestinal crônica serem de natureza funcional, é importante que na avaliação clínica seja dada atenção especial à pesquisa de indícios de outras causas:
○ Causas orgânicas:
▪ Primárias:
☆ Anatômicas:
》Ânus imperfurado: têm orifício chamado de fístula, mas não é o ânus, é só uma maneira que intestino criou de colocar as fezes p/ fora.
》Estenose anal: tem fezes em fita.
》Ânus anteriorizado: + próximo à genitália, dificulta saída das fezes devido angulação diferente.
》Massa pélvica: comprimindo o cólon e impedindo passagem das fezes; ex.: teratoma sacral.
☆ Anormalidades de músculos ou nervos intestinais:
》Doença de Hirschsprung.
》Displasia neuronal intestinal: parecido c/ anterior, mas pode ter só ↓ daquelas céls, não necessariamente aganglionose; habitualmente não é por defeito na migração; pode ter alterações salteadas.
》Miopatias viscerais: doenças musculares que cursem c/ dificuldade de contratilidade colônica; não há motilidade intestinal adequada p/ empurrar as fezes.
▪ Secundárias:
☆ Metabólicas e endócrinas:
》Hipotireoidismo.
》Hipercalcemia.
》Hipocalemia.
》Diabetes mellitus.
☆ Condições neurológicas:
》Anormalidades da medula espinhal congênita (ex.: mielomeningocele) ou adquirida (trauma): promovem alteração de inervação do assoalho pélvico.
》Neurofibromatose.
》Encefalopatia crônica.
☆ Efeito colateral de drogas:
》Opiáceos (morfina, codeína).
》Anticonvulsivantes (fenobarbital): principais!!
》Antiácidos (hidróxido de alumínio: habitualmente vem junto c/ hidróxido de magnésio - usado como laxante - p/ ↓ seu efeito colateral constipante).
》Antidepressivos.
· Quanto às causas funcionais simples:
○ Resultado da interação de fatores biopsicossociais.
○ Multicausal:
▪ Alimentação:
☆ Introdução alimentar promove transitoriamente, até criança se adaptar.
☆ Alimentação rica em carboidratos simples (massa, trigo) e diminuição de fibras (não consome vegetais, casca dos vegetais; suco de frutas quebram a fibra) não favorecem um hábito intestinal saudável.
▪ Inatividade física: predispõe a um funcionamento intestinal lentificado.
▪ Disbiose intestinal: disrupção da microbiota está relacionada ao que já foi falado.
▪ Momento do treinamento esfincteriano (2,5-3a): criança está saindo da frauda, momento de aprendizagem.
▪ Evento desencadeador:
☆ Comeu pior num fds, teve um quadro infeccioso e ficou + quietinho.
☆ Evacuação dolorosa (pois juntou fezes de calibre maior) → retenção (então intestino grosso puxa água e eletrólitos: fezes ficam + endurecidas/ressecadas) → dor → retenção.
☆ "Ciclo vicioso de dor”: o constipado prende as fezes p/ evitar dor e as fezes ficam + endurecidas e volumosas, piorando os sintomas e perpetuando o quadro.
☆ Manutenção desse quadro:
》Ansiedade da criança, mãe, família.
》Ganhos da criança: começam a oferecer presentes pelo ato da evacuação.
》Desenvolvimento de comportamento retentivo: desencadeia constipação crônica.
· Complicações:
· Num quadro inicial de evacuação dolorosa de fezes endurecidas, já no 1° ano de vida, poderá ocorrer em fases posteriores:
○ Dificuldade de desenvolvimento do controle esfincteriano.
○ Formação de fecaloma.
○ Incontinência fecal por retenção no pré-escolar.
○ Dor abdominal crônica no escolar.
· Quadro clínico:· Lactente:
○ Evacuação de fezes endurecidas, em cíbalos, eliminadas c/ dor, esforço e dificuldade.
○ É comum fissura anal.
○ Nem sempre há ↑ intervalo entre evacuações.
○ DD: D. de Hirschprung e a alergia à proteína do leite de vaca.
· Pré-escolar e escolar:
○ Incontinência fecal por comportamento de retenção.
○ Ampliação do intervalo entre as evacuações → fezes de maior calibre e consistência (que levam ao entupimento do vaso).
○ Perdem conteúdo fecaloide na cueca ou na calcinha.
○ Observar discriminação até mesmo pelos pais.
· Outras manifestações possíveis:
○ Dor abdominal crônica reversível c/ o controle da constipação.
○ Enurese noturna.
○ Falta de apetite.
○ Sintomas de infecção urinária atual ou pregressa.
· Constipação crônica funcional de difícil manejo:
· Geralmente ocorre em adolescentes: típico pcte de 12/13a, c/ constipação de longa data e nunca tratada.
· Quadro:
○ Trânsito colônico lento;
○ Disfunção do assoalho pélvico:
▪ Anos de constipação condicionaram a estar constantemente fazendo contração.
▪ Dissinergia: pcte tenta evacuar, mas ao invés de relaxar o esfíncter, contrai.
▪ Ocasiona obstrução de via de saída.
○ Sensibilidade anorretal diminuída:
▪ Devido muitos anos de distensão de reto e relaxamento do EAI pela pressão aumentada que as fezes causam.
▪ Isso é avaliado por manometria (mede a pressão): faz lavagem, passa sonda c/ balão, vai ↑ seu volume.
▪ Num reto normal, c/ distensão de sua parede, deve ser percebido relaxamento do EAI p/ acomodar.
▪ Nesses pctes, não há esse reflexo de relaxamento (perdem a vontade de evacuar, não conseguem saber quando têm fezes no reto p/ ir ao banheiro evacuar).
· Prognóstico:
· Longa duração da sintomatologia precedendo o tto: pior prognóstico.
○ Por isso, a constipação crônica funcional em adolescentes é considerada de difícil manejo.
· 80% dos pctes tratados c/ precocidade: recuperam-se e ficam livres de laxantes após 6m (30% naqueles pctes c/ diagnóstico + tardio).
· Após 1a de tto, em cerca de ½ dos pctes está controlada, s/ necessidade de laxante.
· No prazo de 5a, 50% apresenta uma recidiva.
· Anamnese:
· Queixa: tempo, frequência das fezes, características das fezes, sintomas associados, uso de medicamentos laxativos.
· Momento de eliminação de mecônio.
· Antecedentes familiares (atopia, constipação).
· Alimentação (LM, hábito alimentar, líquidos).
· Treinamento esfincteriano (pré-escolar).
· Uso de medicamentos.
· Sintomas intestinais (dor à evacuação, escape fecal, comportamento retentivo) e extraintestinais (ITU).
○ Constipação intestinal e ITU muitas vezes estão associadas. 
○ Algumas justificativas:
▪ Bolo fecal comprime e impede o esvaziamento adequado na bexiga (resto de urina na bexiga = evolui c/ infecção urinária).
▪ Alteração de musculatura de todo assoalho pélvico.
· Fatores emocionais.
○ Ganhos, recompensas, traumas etc.
○ Constrangimento na escola.
· Exame físico: 
· Estado geral e desenvolvimento pondoestatural.
· Exame neurológico e da região lombossacra (não precisa ser completo).
· Exame da região anal e toque retal:
○ Procurar ânus imperfurado (ver se tem impressão anal, prega anal, relaxamento do esfíncter quando criança faz força)
○ Pode se deparar c/ fissura anal.
○ No toque, avalia tônus e procura preenchimento da ampola retal c/ fezes endurecidas.
· Busca ativa por achados característicos de doenças específicas.
· Massa fecal palpável no abdome e distensão abdominal:
○ Em geral, localiza-se em fossa ilíaca esquerda, entretanto, pode ocupar toda a extensão do colo nos casos + graves.
○ Habitualmente não se deve palpar fezes em reto.
○ Às vezes pode palpar em hipogástrio, pelo ↑ do tamanho do sigmóide que, como não tem como crescer p/ cima, vai p/ lado.
· Critérios de Roma IV:
· Criado devido falta de uniformidade no diagnóstico dos distúrbios funcionais gastrointestinais.
· Valoriza as manifestações clínicas p/ estabelecimento do diagnóstico.
· Pode retardar o diagnóstico no lactente por não considerar o formato e a consistência das fezes.
· Exige menor duração dos sintomas nos menores de 4a (1m) em relação aos 2m exigidos p/ crianças maiores e adolescentes.
· Diagnóstico:
· Constipação intestinal funcional:
○ Clínico.
○ Anamnese + EF + critérios de Roma são suficientes, não precisa solicitar exames.
○ Fundamental definir se há fecaloma: pesquisar massa fecal na palpação abdominal (sobretudo em hipogástrio esquerdo e sigmoide).
○ Iniciar tto e observar resposta.
· Constipação intestinal orgânica: na sua suspeita, uma série de exames pode ser solicitada
○ Radiografia simples de abdome, coluna lombo-sacra:
▪ Pode contribuir nos casos em que a palpação abdominal é difícil (obesos) e o toque retal não pode ser realizado.
○ Enema opaco (radiografia contrastada do cólon).
○ Avaliação do trânsito intestinal (RX, cintilografia).
○ Manometria anorretal (passa sonda e avalia pressão0.
○ Defecografia.
○ Biopsia retal.
○ Exames laboratoriais.
· Estratégias de tto:
· Educação:
○ Orientação sobre alimentação, treinamento de toilet, comportamentos que a criança apresenta por causa da constipação.
○ Informações sobre necessidade de atender o desejo de evacuar, evitando atitudes protelatórias. 
○ Aproveitar o reflexo gastrocólico e tentar evacuar uma vez ao dia, após uma das refeições principais.
○ Medidas promotoras da saúde em geral (ex.: stimular a prática de atividade física).
○ Alterações comportamentais: desmistificação, explicações e ajuda p/ desfraude (em crianças > 4a).
· Desimpactação:
○ Precisa retirar as fezes impactadas, se não, não adianta dar medicamento p/ formar fezes + macias e criança não sentir dor.
○ Pode fazer por:
▪ PEG: polietilenoglicol 3350 ou 4000
☆ Laxante oral osmótico.
▪ Enemas:
☆ Soluções p/ fazer por via retal.
☆ Enema fosfatado, solução glicerinada, minienema de sorbitol.
· Recondicionamento do hábito intestinal normal:
○ Deixar a criança voltar a ter um hábito intestinal normal.
· Prevenção da reimpactação: 
○ A manutenção objetiva prevenir formação de fecaloma.
○ Iniciado quando se obtém plena desimpactação (eliminação de fezes amolecidas s/ dor ou dificuldade e redução expressiva na frequência da incontinência fecal por retenção).
○ Pelo menos 3m.
○ É utilizado um laxante por via oral, diariamente, na dose individualizada p/ regularização do hábito intestinal:
▪ Osmóticos: 
☆ PEG (1a linha) / Lactulose / Leite de Magnésia.
☆ Puxa água p/ luz, se misturando c/ fezes p/ elas ficarem + amolecidas.
▪ Emolientes: 
☆ Óleo mineral.
☆ Serve como um óleo que lubrifica e permite saída do conteúdo fecal por deslizamento.
☆ Não deve ser prescrito nos 2 primeiros anos de vida e p/ pctes c/ comprometimento neurológico, pelo risco de aspiração e desenvolvimento de pneumonia lipoídica.
▪ Estimulantes: 
☆ Bisacodil, sene.
☆ Pouco recomendados.
☆ Causam contração colônica importante.
☆ Como criança tem fezes volumosas e endurecidas: dói p/ sair.
· Seguimento:
○ Sintomas resolvidos por pelo menos 1m.
○ Diminuição gradual (retirar progressivamente).
○ Crianças em desfralde: manter até controle esfincteriano adquirido.
OBS.: P/ tto da impactação estão contraindicados:
· Probióticos e prébioticos: uso como rotina não é recomendado.
· Fibras: s/ evidências de seu uso como tto de forma isolada.
· Fluídos (água, sucos, chás): s/ evidências p/ ↑ do consumo como tto isolado.
· Terapia comportamental c/ protocolos bem estabelecidos.

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