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Direito Penal Homicídio • Introdução: A vida é um direito fundamental do ser humano protegido pela Constituição Federal no art. 5º. Trata-se de direito formal e materialmente constitucional, com caráter supra-estatal. Há raros casos em que o homicídio é permitido, tanto de forma intrauterina ou extra-uterina, tempos de guerra (CF, art. 5°, XLVII, a), a legítima defesa (CP, art. 25) e o aborto em determinadas situações legalmente previstas (CP, art. 128). Há diversos tipos de homicídio, tais: simples (art. 121, caput); privilegiado (§1°); qualificado (§2°); culposo simples (§3°) e culposo agravado/circunstanciado (§4º, 1ª parte). • Objetos: é tudo aquilo que incide o Direito, neste caso, a vida e o ser humano. A. Objeto jurídico: a vida humana, direito fundamental assegurado pela Constituição Federal. B. Objeto material: é o ser humano que suporta a conduta criminosa. • Núcleo do tipo: matar. É um crime de forma livre, pode ser praticado por ação ou omissão (art. 13, §2°,do CP). A. Forma direta: meio de execução manuseado diretamente pelo agente. Ex.: arma de fogo. B. Forma indireta: meio de execução manuseado indiretamente pelo homicida. Ex.:deixar de dar remédios a alguém em estado de enfermo. C. Meio material: estes são os que assolam a integridade física da vítima. D. Meio moral: a morte é produzida por um trauma psíquico na vítima como, por exemplo, a depressão que acarreta a morte em face do uso excessivo do medicamento. • Sujeito: qualquer pessoa, pode ser o agente homicida ou vítima. A. Sujeito ativo: qualquer pessoa. B. Sujeito passivo: qualquer pessoa, após o nascimento e desde que esteja viva. • Elemento subjetivo: é o dolo (animus necandi ou animus accidendi), direto ou eventual. Admite-se a modalidade culposa. A embriaguez ao volante pode caracterizar dolo eventual ou culpa consciente, dependendo da análise do concreto. • Consumação: no momento da morte da vítima, que se verifica com a cessação da atividade encefálica (art. 3°, caput, da Lei 9.434/1997). Trata-se de crime material ou casual. • Tentativa: há dois tipos, a tentativa branca ou incruenta é aquela em que a vítima não é atingida, enquanto a tentativa vermelha ou cruenta é aquela em que a vítima sofre ferimentos. • Ação penal: pública incondicionada, em todas as modalidades do delito. • Competência: é do Tribunal do Júri (CF, art. 5º, XXXVIII, d), exceto no tocante ao homicídio culposo, de competência do juízo comum. Cabe a suspensão condicional do processo unicamente no homicídio culposo, desde que presentes os demais requisitos exigidos pelo art. 89 da Lei 9.099/1995. • Genocídio: é a destruição total ou parcial de grupo nacional, étnico, racial ou religioso (art. 2º da Convenção contra o Genocídio, ratificada pelo Decreto 30.822/1952 c.c. art. 1°, a, da Lei 2.889/1956). A competência é do juízo comum, e não do Tribunal do Júri. Trata-se de crime contra a humanidade, e não de crime doloso contra a vida, pois não foi catalogado no Capítulo I do Título I da Parte Espacial do Código Penal. • Homicídio simples: Trata-se de conduta desprovida de elementos normativos ou subjetivos. Em regra, não é crime hediondo, exceto quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que por um só agente. • Homicídio privilegiado: Denominação doutrinária e jurisprudencial. Cuida-se, na verdade, de causa de diminuição da pena (minorante). As hipóteses legais de privilégio apresentam caráter subjetivo, não se comunicando aos coautores ou partícipes (art. 30 do CP), se o crime for praticado em concurso de pessoas. Presente uma de tais hipóteses, o juiz deverá diminuir a pena, obrigatoriamente (trata-se de direito subjetivo do agente). O homicídio privilegiado não é crime hediondo, por ausência de previsão na Lei 8.072/1990. Circunstâncias que ensejam o reconhecimento do privilégio: A. Motivo de relevante valor social: aquele relacionado ao interesse da coletividade, e não apensa do agente individualmente considerado. B. Motivo de relevante valor moral: diz respeito a interesse particular do autor do homicídio, aprovado pela moralidade média e considerado nobre e altruísta, por exemplo: eutanásia. C. Dominação de violenta emoção, logo a injusta provocação da vítima: o agente dominado pela emoção, não se controla. O CP exige três requisitos cumulativos: 1. Domínio de violenta emoção: emoção intensa que deixa o agente descontrolado ou fora das suas faculdades mentais normais. 2. Injusta provocação da vítima: comportamento apto a desencadear a violenta emoção e a consequente prática do crime, não necessariamente com propósito de provocar, bastando que o agente sinta-se provocado, podendo, ainda, ser dirigida a terceira pessoa e até mesmo um animal. O crime é considerado como agressão injusta e legítima defesa (art. 25 do CP). 3. Reação imediata: é indispensável seja o fato praticado logo após a injusta provocação da vítima. • Homicídio privilegiado e erro na execução (aberratio ictus): se o agente erroneamente supõe a existência do motivo, induzido por circunstâncias de fato, incide o privilégio. A. Eutanásia em sentido estrito (homicídio piedoso, compassivo, médico, caritativo ou consensual): é o modo comissivo de abreviar a vida de pessoa portadora de doença grave, em estado terminal e sem previsão de cura ou recuperação;Ortotonásia (eutanásia omissiva, moral ou terapêutica): eutanásia por omissão, o médico deixa de adotar as providências necessárias para prolongar a vida de doente terminal, portador de moléstia incurável e irreversível. • Homicídio qualificado: Os incisos I e II trazem qualificadoras relacionadas aos motivos do crime. Os incisos III e IV dizem respeito aos meios e modos de execução do homicídio. O inciso V refere-se à conexão, caracterizada por uma especial finalidade almejada pelo agente. As qualificadoras previstas nos incisos I, II e V são de índole subjetiva (pertencem à esfera interna do agente), não se comunicando aos coautores ou partícipes em caso de concurso de pessoas (art. 30 do CP). As qualificadoras descritas pelos incisos III e IV (meios e modos de execução) são de natureza objetiva (relacionam-se ao fato praticado) e comunicam-se no concurso de pessoas, desde que conhecidas por todos os envolvidos, sob pena de responsabilidade penal objetiva. Pela mesma razão, devem ainda integrar o dolo do responsável pelo homicídio. • Mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe (inc. I): Homicídio mercenário ou homicídio por mandato remunerado, motivado pela cupidez (ambição desmedida). Na paga o recebimento é prévio, enquanto na promessa o pagamento é convencionado para momento posterior à execução do crime. Não é necessário que o sujeito efetivamente receba a recompensa. O pagamento, em ambos os casos, pode ser em dinheiro ou qualquer outra espécie de bem, não sendo a vantagem necessariamente econômica. Cuida-se de crime plurissubjetivo, plurilateral ou de concurso necessário, pois devem existir ao menos duas pessoas: o mandante e o executor. Não se aplica a qualificadora ao mandante, por se tratar de circunstância manifestamente subjetiva (art. 30 do CP), exceto se restar comprovado que o motivo que o levou a encomendar o homicídio também é torpe (torpeza genérica). Motivo torpe é o vil, repugnante, abjeto, moralmente reprovável. A vingança não caracteriza automaticamente a torpeza. O ciúme não é considerado motivo torpe. • Por motivo fútil (inc. II): Motivo fútil é o insignificante, de pouca importância, desproporcional à natureza do crime praticado. Deve ser apreciado no caso concreto. A ausência de motivo não deve ser equiparada ao motivo fútil, assim como o ciúme. A embriaguez é incompatível com o motivo fútil, pois o embriagado não tem pleno controle do seu modo de agir. Motivo fútil e motivo injusto não se confundem: todo crime é injusto, pois o sujeito passivo não é obrigado a suportá-lo, embora nem sempre seja fútil. O motivo não pode ser simultaneamentefútil e torpe – uma motivação exclui a outra. Não se aplica essa qualificadora quando a razão do crime é uma acirrada discussão entre autor e vítima, ainda que decorrente de causa desproporcional ao resultado produzido. • Com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum (inc. III): Veneno é a substância de origem química ou biológica capaz de provocar a morte quando introduzida no organismo humano. Determinadas substâncias podem ser tratadas como veneno quando aptas a levar a vítima à morte, em razão de alguma doença ou como resultado de eventual reação alérgica (ex.: glicose para vítima diabética), desde que o autor do homicídio tenha ciência da incompatibilidade entre o organismo da vítima e a substância por ele ministrada, sob pena de responsabilidade penal objetiva. Quando empregado sem o conhecimento do ofendido, representará meio insidioso (uso de fraude para cometer o crime sem que a vítima o perceba), mas se utilizado com violência estará caracterizado o meio cruel (aquele que causa à vítima intenso e desnecessário sofrimento físico ou mental). Quando o meio cruel é empregado após a morte da vítima caracteriza-se, em regra, o crime de homicídio (simples ou com outra qualificadora), em concurso com o crime do art. 211 do CP (destruição, subtração ou ocultação de cadáver). A reiteração de golpes isoladamente considerada não configura a qualificadora do meio cruel. O homicídio praticado com emprego de veneno é denominado de venefício, e depende de prova pericial (exame toxicológico). A. Fogo é o resultado da combustão de produtos inflamáveis, da qual decorrem calor e luz. Trata-se, em geral, de meio cruel, mas se inúmeras pessoas forem expostas ao perigo de dano, o crime será qualificado pelo meio de que possa resultar perigo comum. Explosivo é o produto com capacidade de destruir objetos em geral, mediante detonação e estrondo. Caracteriza, normalmente, meio de que possa resultar perigo comum, mas pode configurar meio cruel (exemplo: amarrar uma bomba de grandes proporções junto ao pescoço da vítima). Nesses dois meios de execução – fogo e explosivo –, se destruídas coisas alheias, o crime de dano qualificado pelo emprego de substância inflamável ou explosiva será afastado, por tratar-se de hipótese de subsidiariedade expressa (art. 163, parágrafo único, II, do CP). B. Asfixia é a supressão da função respiratória, com origem mecânica ou tóxica. A asfixia mecânica pode ocorrer pelos seguintes meios:a) estrangulamento;b) esganadura;c) sufocação;d) enforcamento;e) afogamento;f) soterramento; e g) imprensamento. A asfixia tóxica pode verificar-se pelas seguintes formas: a) uso de gás asfixiante ou inalação; e b) confinamento. A asfixia pode constituir meio cruel (ex.: afogamento) ou insidioso (ex.: uso de gás tóxico, inalado pela vítima sem notá-lo). C. O homicídio qualificado pela tortura caracteriza-se pela morte dolosa – o agente utiliza a tortura (meio cruel) para provocar a morte da vítima, causando-lhe intenso e desnecessário sofrimento físico ou mental. Não se confunde com o crime definido na Lei 9.455/1997, em que o sujeito tem o dolo de torturar a vítima, e da tortura resulta culposamente sua morte (crime preterdoloso). No homicídio qualificado pela tortura o dolo é de matar. D. Meio de que possa resultar perigo comum é aquele que expõe, além da vítima, um número indeterminado de pessoas a uma situação de probabilidade de dano. Restando provado este perigo, ao agente serão imputados os crimes de homicídio qualificado e de perigo comum (CP, arts. 250 a 259), em concurso formal (art. 70 do CP). • À traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido (inc. IV): Homicídio qualificado pelo modo de execução. A traição pode ser física (exemplo: atirar pelas costas) ou moral (atrair a vítima para um precipício). Nessa qualificadora, o agente se vale da confiança que o ofendido nele previamente depositava para o fim de matá-lo em momento em que ele se encontrava desprevenido e sem vigilância. Não será aplicada se a vítima teve tempo para fugir. No ataque frontal e repentino, poderá ser caracterizada a surpresa (meio genérico que dificulta a defesa do ofendido). Na traição a relação de confiança preexiste ao crime e o sujeito dela se aproveita para executar o delito. Se o agente, para se aproximar da vítima, faz nascer esse vínculo de confiança, haverá dissimulação. O homicídio qualificado pela traição é conhecido como homicídio “proditorium”. • Emboscada é a tocaia. O agente aguarda escondido, em determinado local, a passagem da vítima, para matá-la quando ali passar. Dissimulação é a atuação disfarçada, hipócrita, que oculta a real intenção do agente – pode ser material (emprego de algum aparato, tal como uma farda policial) ou moral (demonstração de falsa amizade ou simpatia pela vítima). • Outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa da vítima é fórmula genérica indicativa de meio análogo à traição, à emboscada e à dissimulação, como a surpresa, estado de embriaguez da vítima, superioridade numérica de agentes etc. A surpresa é incompatível com o dolo eventual, pois o sujeito deve dirigir sua vontade em uma única direção: matar a vítima de modo imprevisível. Cumpre destacar que não ocorre surpresa se o crime foi precedido de desavença. A superioridade de armas, ou então o emprego de arma contra vítima desarmada, por si só, não qualifica o homicídio. Exige-se também a surpresa no ataque. A. Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime (inc. V): Qualificadora de natureza subjetiva, relacionada à motivação do agente. A doutrina convencionou chamá-la de conexão, em face da ligação entre dois ou mais crimes. Há duas espécies de conexão: teleológica (homicídio praticado para assegurar a execução de outro crime) e consequencial (homicídio cometido para assegurar a ocultação, a impunidade ou a vantagem de outro crime). Na ocultação o agente pretende impedir que se descubra a prática de outro crime e na impunidade deseja evitar a punibilidade do crime anterior. O outro crime pode ter sido praticado por terceira pessoa. A vantagem é tudo o que se auferiu com o outro crime. Em todas as hipóteses é irrelevante o tempo decorrido entre o homicídio e o outro crime. A extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação da pena resultante da conexão (art. 108, 2.ª parte, do CP). • Homicídio privilegiado-qualificado (homicídio híbrido): Admite a compatibilidade entre o privilégio e as qualificadoras, desde que sejam de natureza objetiva. • Homicídio culposo: O sujeito realiza uma conduta voluntária, com violação do dever objetivo de cuidado a todos imposto, por imprudência, negligência ou imperícia, e assim produz um resultado naturalístico (morte) involuntário, não previsto nem querido, mas objetivamente previsível, que podia com a devida atenção ter evitado. A imprudência (culpa positiva) consiste na prática de um ato perigoso. Negligência (culpa negativa) é deixar de fazer aquilo que a cautela recomenda. A imperícia (culpa profissional) é a falta de aptidão para o exercício de arte, profissão ou ofício para a qual o agente, em que pese autorizado a exercê-la, não possui conhecimentos teóricos ou práticos para tanto. O crime culposo (ressalvada a culpa imprópria) é incompatível com a tentativa. O homicídio culposo praticado na direção de veículo automotor é delito definido pelo art. 302 da Lei 9.503/1997 – Código de Trânsito Brasileiro (princípio da especialidade).
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