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1 2 Complementação Pedagógica Coordenação Pedagógica – IBRA 3 SUMÁRIO Apresentação Unidade I – Base Conceitual Definições de avaliação Caracterização Global da Avaliação Educativa Unidade II – Critérios de avaliação Concepção curricular e prática de avaliação - a coesão desejável Preocupação com a prática Mudar as práticas, mudar a mentalidade Avaliar para reconhecer, avaliar para aprender Unidade III – O Interesse pela prática formativa A avaliação a serviço de quem aprende Com os erros também se aprende A importância das perguntas para a ação reflexiva e crítica Unidade IV – Funções da avaliação Instrumentos de avaliação; Auto Avaliação; 4 Unidade V – Planejamento e Avaliação ........................................... Princípios Universais da avaliação Mediadora. - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 5 APRESENTAÇÃO A diversidade dos textos aqui reunidos, nos permite dizer que tal iniciativa pretende significar um “salto” para a avaliação do Ensino e da aprendizagem, pelo seu caráter inovador. Através dessas leituras, convidamos o educador a situar e a contextualizar a avaliação em termos de áreas específicas do conhecimento e da Pedagogia de Projetos; tais reflexões são fundamentadas no caráter formativo, democratizador e ético do processo avaliativo. Focalizamos a avaliação em educação como princípio ético, que deve respeitar sobretudo, as diversidades dos contextos educacionais e os diferentes jeitos de ser e de aprender de educandos e educadores. Este Curso pretende fornecer meios para o educador tornar a avaliação escolar mais justa, abrangente, cooperativa, dinâmica e voltada para o aluno. 6 UNIDADE I BASE CONCEITUAL Todos falam de avaliação, mas cada um conceitua e interpreta esse termo com significados distintos. Sem dúvida, cada um age em nome de uma avaliação de qualidade e defenderá que a sua é uma boa avaliação. Em termos precisos, deve-se entender que avaliar com intenção formativa não é o mesmo que medir, nem qualificar e nem sequer corrigir; Avaliar tampouco é classificar, examinar, aplicar testes. A avaliação tem a ver com atividades de qualificação, medição, correção, classificação, exame, aplicação de prova, mas não se confunde com elas. São atividades que desempenham um papel funcional e instrumental, porém dessas atividades artificiais não se aprende. Em relação a elas, a avaliação transcende, pois justamente onde elas não alcançam é que a avaliação educativa começa. Para que ela ocorra, é necessária a presença de sujeitos. Não pode ocorrer a avaliação sem o sujeito avaliado, dando por suposta a presença do sujeito avaliador. A tarefa conjunta, orientada por princípios morais, distingue igualmente o que representa o enfoque prático, a partir do que falo, de outro que seja racionalista, identificando com a racionalidade técnica ou instrumental. No primeiro, o professor é chamado a desempenhar autônoma e responsavelmente a profissão docente, participando da esfera na qual 7 são tomadas as decisões sobre o currículo e o que representa em sua implementação. No segundo, o professor vem a ser um aplicador de técnicas e recursos cuja elaboração ele não participa diretamente, mas lhe são assegurados altos níveis de eficiência e de eficácia raramente demonstrável no emprego de técnicas de programação e avaliação. No âmbito educativo, a avaliação deve ser entendida como atividade crítica de aprendizagem, porque se assume que a avaliação é aprendizagem no sentido de que por meio dela adquirimos conhecimento. O professor aprende para conhecer e para melhorar a prática docente em sua complexidade, bem como para colaborar na aprendizagem do aluno, conhecendo as dificuldades que deve superar o modo de resolvê-las e as estratégias que coloca em funcionamento. O aluno aprende sobre e a partir da própria avaliação e da correção, da informação contrastada que o professor oferece-lhe, que será sempre crítica e argumentada, mas nunca desqualificada, nem punitiva. Necessitamos aprender sobre e com a avaliação. Ela atua, então, a serviço do conhecimento e da aprendizagem, bem como dos interesses formativos aos quais essencialmente deve servir. Aprendemos com a avaliação quando a transformamos em atividades de conhecimento e em ato de aprendizagem o momento da correção. Apenas quando asseguramos a aprendizagem, também podemos assegurar a avaliação – a boa avaliação que forma – transformada ela mesma em meio de aprendizagem e em expressão 8 de saberes. Só então poderemos falar com propriedade em avaliação formativa. Consciente de que o fracasso escolar está aí, o professor que age com rigor e razoavelmente a favor de quem aprende, trabalha com o ânimo de superá-lo. Nesse sentido, não o aceita como inevitável devido a causas que obedeceram unicamente e de um modo determinante às capacidades naturais dos sujeitos – questão de dons inatos – sem levar em conta fatores socioculturais, econômicos, sem também descartar os fatores didáticos e os institucionais. Entendida a educação como o acesso à cultura e à ciência – bens comuns historicamente construídos, o desafio de cada professor é não deixar ninguém de fora. Tomar consciência desse fato é comprometer-se com modos razoáveis de agir com cada sujeito que se encontre nessa situação delicada para não excluir ninguém da participação do saber. Definições de Avaliação “A avaliação educativa é um processo complexo, que começa com a formulação de objetivos e requer a elaboração de meios para obter evidência de resultados, interpretação de resultados, para saber em que medida os objetivos foram alcançados e formulação de um juízo de valor”. ( Sarabbi, 1971) “Avaliação é processo de delinear, obter e fornecer informações úteis para julgar decisões alternativas”. (Apud silva, 1977) 9 “Avaliação é um processo contínuo, sistemático, compreensivo, comparativo, cumulativo e global, que permite avaliar o conhecimento do aluno”. ( Juracy C. Marques, 1976) “A avaliação é a coleta sistemática de dados, por meio da qual se determinam as mudanças de comportamento do aluno e em que medida essas mudanças ocorrem”, ( Bloom ) Nas definições selecionadas sobre avaliação, constatamos a unanimidade dos autores em considerá-la um processo e consequentemente deve ser percebida como aquela condição que imprime dinamismo ao trabalho escolar, pois diagnostica uma situação e permite modificá-la de acordo com as necessidades detectadas. Concluindo: Avaliação é um processo pelo qual se procura identificar, aferir, investigar e analisar as modificações do comportamento e rendimento do aluno, do educador, do sistema, confirmando se a construção do conhecimento se processou, seja este teórico, mental ou prático. Constatamos também que, como processo, apresenta características de continuidade, temporalidade, totalidade, organicidade e orientação para um fim, ou seja, se fundamenta em pressupostos, como: É dinâmica, não é estática; É contínua, não é terminal; É integrada, não é isolada do ensino; É progressiva, não é estanque; É voltada para o aluno, não para os conteúdos; É abrangente, não é restrita a alguns aspectos da personalidade do aluno; É cooperativa, não realizada somente pelos professores; É versátil, não se efetiva sempre da mesma forma. CARACTERIZAÇAO GLOBAL DA AVALIAÇAO EDUCATIVA Entre os traços referentes à avaliação educativa da aprendizagem escolar, destaco o seguinte: Democrática: Faz alusão à necessária participação de todos os sujeitos que se vêem afetados pela avaliação, principalmente professor e aluno, não como meros espectadores ou sujeitos passivos “que respondem”, mas que reageme participam das decisões que são adotadas e que lhes afetam. A avaliação é uma excelente oportunidade para que, quem aprende ponha em prática seus conhecimentos e sinta a necessidade de defender suas ideias, suas razões, seus saberes.Também deve ser o momento no qual, além das aquisições, aflorem as dúvidas, as inseguranças, o desconhecimento, se realmente há intenção de superá-los. Ocultá-los é uma artimanha pela qual se paga um preço muito alto em etapas posteriores ou no futuro. Expressá-los, com suas imprecisões, erros, confusões, acertos, certezas, sem o temor de subir ou baixar pontos em escalas tão confusas como os da qualificação, 10 11 abrirá caminho para avançar junto no conhecimento, na apropriação, na formação do próprio pensamento, que se está formando. Deve estar sempre, e em todos os casos, a serviço dos alunos e dos professores que aprendem com o processo de ensino e de aprendizagem. A avaliação que aspira a ser formativa deve estar continuamente a serviço da prática, para melhorá-la, e a serviço dos que dela participam e dela se beneficiam. A avaliação que não forma e da qual os que dela participam não aprendem, deve ser descartada. Ela mesma deve ser recurso de formação e oportunidade de aprendizagem. A negociação de tudo o que a avaliação abarca é condição essencial nessa interpretação. Se a vontade de entendimento é aceita, negocia-se tudo. Desde a justificativa da própria avaliação até as formas nas quais serão realizadas e o papel que cada um deve assumir responsavelmente. É muito importante a negociação entre todos os envolvidos nos critérios que serão aplicados no momento da correção, da qualificação e do modo como será dada a informação, das possibilidades de recorrer nas decisões sobre correção e qualificação e dos critérios a serem seguidos no caso de não se chegar a um acordo na pontuação. Não se trata de ceder diante dos alunos, e sim de trabalhar com eles e em seu benefício, que terminará sendo aprendizagem, porque da avaliação também se aprende. 12 A avaliação deve ser um exercício transparente em todo seu trajeto, no qual seja garantida a publicidade e o conhecimento dos critérios que serão aplicados. Na avaliação, os critérios de valorização e de correção deverão ser explícitos, públicos e publicados, negociados entre os professores e os alunos. Maior transparência equivale a maior equanimidade e equidade. A avaliação faz parte de um continuum e, como tal, deve ser processual, contínua, integrada no currículo e, como ele, na aprendizagem. Não são tarefas discretas, descontínuas, isoladas, insignificantes. Avaliar somente no final, ou por unidade de tempo ou de conteúdo, é chegar tarde para garantir a aprendizagem contínua e oportuna. Neste caso e neste uso, a avaliação só chega a tempo para qualificar, condição para a classificação, que é o passo prévio para a seleção e para a exclusão do aluno. O caráter formativo da avaliação é um dos conceitos inequívocos em sua expressão que justificam práticas equívocas. Basta entendê-la na literalidade da expressão: que forme, intelectual e humanamente. À medida que forma, a avaliação é parte integral do pensamento crítico. Para dizer claramente: toda atividade e toda prática de avaliação educativa que não forme, que não eduque e da qual os sujeitos não aprendam deve ser descartada. 13 Se fazemos da avaliação um exercício contínuo, não há razão para o fracasso, pois sempre chegaremos a tempo para agir e intervir inteligentemente no momento oportuno, quando o sujeito necessita de nossa orientação e de nossa ajuda para evitar que qualquer falha detectada torne-se definitiva. A responsabilidade do professor é garantir que aquilo que os alunos estudam, lêem e aprendem vale a pena ser objeto de aprendizagem. A dos alunos consiste em conscientizar-se de que eles são os responsáveis máximos por sua própria aprendizagem, como exercício de vontade que é. Atividades: 1. O que você define por Avaliação da aprendizagem? ---------------------------------------------------------------------------------------------- ---------------------------------------------------------------------------------------------- ---------------------------------------------------------------------------------------------- 2. Avaliar somente no final, ou por unidade de tempo ou de conteúdo, é chegar tarde para garantir a aprendizagem contínua e oportuna. SIM ( ) NÃO ( ) Argumente a sua resposta. 14 UNIDADE II CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO: O critério de avaliação quer que o professor utilize questões dissertativas ou objetivas e terá que ser obrigatoriamente, um elemento para diagnosticar o rendimento escolar, verificando – se quais os alunos que necessitam de ajuda ou atendimento pedagógico específico. Jamais um aluno deverá ser comparado com outro, e sim com o seu próprio progresso. As verificações deverão ser constantes e contínuas. Os testes não mais deverão ser utilizados como uma arma contra o aluno, causando - lhe todo tipo de trauma. Deverão ser acima de tudo, um meio para confirmar o progresso do aluno, o alcance dos objetivos estabelecidos. Os critérios de avaliação deverão ser fundamentados na fidedignidade, validade e eficiência da avaliação. Para a correção das questões de dissertação, o professor deverá usar um critério próprio, tanto quanto possível objetivo, para não prejudicar algum aluno. Sugestões práticas para correção e interpretação: Evite identificar o aluno; Leia todas as respostas sobre a mesma questão; Atribua pontos para aspectos essenciais e guie-se por eles; 15 Após leitura de todas as provas, separe-as por grupos: ótimo, muito bom, bom, regular e só a partir daí atribua a nota; Corrija uma questão de cada vez; Assinale os erros de Português, sem descontá-los, a não ser que a prova seja de Português; A nota final poderá corresponder ou não à classificação inicial ( ótimo, bom etc.); Organize um sistema de codificação; Verifique a exatidão do conteúdo da matéria focalizada; Observe o grau de compreensão, segurança, domínio e objetividade que o aluno demonstra no tratamento do conteúdo; Considere a apresentação do trabalho quanto: originalidade, limpeza, legibilidade, riqueza ou pobreza de estilo literário; Assinale os erros ou omissões; Faça um levantamento estatístico do grau de aproveitamento da turma; A questão deve conter instrução ou ordem e o verbo, de preferência no infinitivo; deve ser utilizado de acordo com o objetivo estabelecido no plano, evitando-se assim, dificuldade na avaliação e julgamento muito subjetivo. 16 O número de questões desse tipo não deve ultrapassar a dez. Procure adequar o enunciado da questão ao desenvolvimento mental e conhecimento do aluno; Dose a liberdade concedida de modo a focalizar na resposta, os aspectos essenciais e de forma a não dificultar a avaliação da questão. Ex.: escreva uma dissertação sobre o reinado de Luiz XV. Prefira outra como “O que queremos dizer com a afirmação de que a França, antes de 1789, estava centralizada sem estar unida?” De acordo com a pergunta formulada, e para efeito de avaliação, elabore uma lista de tópicos considerados mais importantes e que devem constar da redação; Formule questões que exijam raciocínio ou conhecimento de importância; Evite instruções ambíguas como: “Escreva tudo o que sabe” “Disserte sobre.”... Prefira as seguintes perguntas: “explique o por quê...” “Compare com...” “Que conclusões podem ser deduzidas de ....” Quais são as diferenças fundamentais entre o governo do Brasil e o do Uruguai. Por que num dia quente sente-se menos o calor quando a umidade relativa do ar é baixa? Para que o trabalho do professor se torne mais objetivo, recomendamosa utilização de um quadro referencial que embase a operacionalização de alguns comportamentos. 17 Por exemplo: “Comportamentos que requerem Procedimentos de Avaliação que vão além de Provas ou Testes Escritos”. ( Grouminud, 1970) Habilidades Falar, escrever, leitura oral, realizar experimentos, desenhar, tocar instrumento musical, habilidade de trabalhar, de estudar e habilidades sociais. Hábitos de Trabalho Uso do tempo, uso de equipamentos, demonstra iniciativa, capacidade criadora e persistência. Atitudes Científicas Mente aberta, sensibilidade para as relações de causa e efeito, mente indagadora. Apreciação Sensação de satisfação e prazer que se expressa com o respeito pela natureza, música, arte, literatura, habilidades físicas, contribuições sociais notáveis. Ajustes Relação com os iguais, reação ante o que se pensa e a crítica; reação ante a autoridade, estabilidade emocional, adaptabilidade social. 18 CONCEPÇAO CURRICULAR E PRÁTICA DE AVALIAÇAO: A COESÃO DESEJÁVEL Se realmente são oferecidas ou apresentadas formas novas e distintas de aprender, se verdadeiramente se parte de uma idéia e de uma forma significativa de aprender ou, na expressão mais ampla, se tenta obter uma aprendizagem significativa, então, necessariamente, devem-se buscar novas idéias, formas originais, caminhos de ensinar distintos e inovadores. Também é necessário buscar formas ousadas e inéditas de avaliar que estejam em consonância com as idéias de que se parte e que, além disso, satisfaçam as exigências que implica a qualidade significativa da atividade de aprender, se é que realmente pretendemos manter viva, mais além das palavras, a intenção de produzir novas formas de aprender. Nesse sentido, precisamos “inventar” formas distintas que vão além das tradicionais, sejam exames, sejam provas tipo teste ou de pontuação. A razão parece simples: esses instrumentos tão ao uso tradicional não podem refletir nem representar as novas formas que a aprendizagem adquire, nem as relações que são estabelecidas entre os conteúdos de conhecimento, as atividades de ensino, os processos de aprendizagem O desafio consiste precisamente em que os professores devem enfrentar, de um modo ativo, novas formas de ensinar que possibilitem e provoquem um modo diferente de aprender e que o resultado seja relevante, além de significativo, para o sujeito que o busca. 19 Não apenas dentro da sala de aula, nem apenas restrito ao cognitivo, mas significativo em e para sua vida dentro e, sobretudo, fora da sala de aula. Nessa dinâmica, as formas tradicionais de avaliar ou de avaliação através de testes, de qualquer tipo que seja, não servem para desempenhar essas funções, nem para refletir aqueles atributos e critérios que definem a nova situação, nem as condições de qualidade que são proclamadas. Elas tampouco ajudam outras formas tão anunciadas de trabalhar em sala de aula, como, por exemplo, a aprendizagem cooperativa, o trabalho em equipe, a aprendizagem crítica e autônoma, traduzida ou concretizada no mágico lema de aprender a aprender. Ou mudamos as formas de fazer, ou então mudamos as formas nas quais se expressa o novo discurso educativo. PREOCUPAÇÃO COM A PRÁTICA Ensinar não é tão-somente uma questão de conhecimento, mas também de modos de raciocinar. Aprender não é tão-somente acumular conteúdos de conhecimentos, mas também modos de raciocinar com eles até aprendê-los, interiorizá-los e integrá-los à estrutura mental de quem aprende. A maneira como o sujeito aprende é mais importante que aquilo que aprende, porque facilita a aprendizagem e capacita o sujeito para continuar aprendendo permanentemente. Conscientes do modo como o sujeito aprende, descobriremos a forma de ajudá-lo. 20 Esse passo é essencial na formação e esclarece o campo de avaliação: os testes de rendimento ou os exames conhecidos como tradicionais carecem de interesse e de valor formativo, porque não nos dizem nada que nos ajude a entender esses processos. Os maus resultados são, às vezes, indícios de que algo não funciona, mas não nos dizem nada sobre as causas que os provocam, que podem ser muitas e nem todas devido à negligência ou à falta de habilidade de quem aprende. Eles tampouco nos dizem algo sobre a qualidade do processo que desemboca na aprendizagem, nem sobre a qualidade do que damos por aprendido. Outrossim, os professores não podem aprender muito com os resultados para melhorar suas práticas. Compreendendo os modos de aquisição e de assimilação, pode agir razoavelmente bem no plano didático. Uma questão-chave que os professores devem fazer-se ao falar de avaliação, como de tantos outros aspectos que a educação abrange, é sobre a sua própria concepção ou visão do conhecimento, da educação, do ensino, da aprendizagem, do desenvolvimento do currículo, da avaliação As mudanças no processo de avaliação devem ser parte de um programa muito mais amplo de inovação, abrangendo currículo e didática tanto quanto avaliação. 21 MUDAR AS PRÁTICAS, MUDAR A MENTALIDADE: NOVOS DESAFIOS, NOVOS COMPROMISSOS Para efetuar uma renovação, uma inovação, é tão necessário conhecer os obstáculos que devem ser vencidos, as dificuldades que devem ser superadas, quanto as forças, os princípios e as convicções com os quais cada um conta. Como destaca Risvi, “não podemos contemplar formas alternativas de vida, porque continuamos valorizando a ordem, a eficiência e a uniformidade acima dos ideais de espontaneidade, reciprocidade, variedade e flexibilidade”. Uma mudança na concepção do currículo implica, ao mesmo tempo, uma mudança na concepção do ensino e da aprendizagem. Consequentemente, implica variações no tratamento dos conteúdos – sem eles, não há currículo – e também nas formas de entender a avaliação e nos critérios pelos quais deve ser avaliado aquele que se ensina e aquilo que se aprende. São assuntos práticos que justificam a intervenção didática. Precisamos estabelecer quais as exigências apresentadas por essas novas formas de entender o currículo e o que ele abrange neste caso restrito ao aspecto mais imediato da sala de aula. Se considerarmos que a aprendizagem é construção, é participação, é compreensão, é assimilação, é apropriação e integração dos próprios esquemas de raciocínio, e não mera verbalização de palavra emprestada conservada em forma de memória insignificante, é porque por trás disso há uma visão clara do que é o conhecimento. 22 Se isso é aceito, a avaliação que valorizará aquele conhecimento deve ser necessariamente respeitosa com o que este é e com a maneira de construí-lo. Do contrário, à confusão que invade a avaliação educativa, devemos acrescentar a pouca vontade para entendê-la e propor soluções ousadas que rompam tamanha burocracia que vai contra toda a força que possa surgir da compreensão desse fenômeno social que é a avaliação. AVALIAR PARA RECONHECER, AVALIAR PARA APRENDER: Os motivos que justificam a avaliação (educativa) estão estreitamente relacionados com a sua natureza. A idéia que se tem do cidadão educado e do conhecimento marcará a direção a seguir. Uma educação entendida como processo de seleção e de exclusão, restringe as possibilidades de se ter acesso ao conhecimento e acarreta consequências diretas sobre o currículo e sua implementação. Contrariamente, se a educação é entendida como um processo de acesso democrático ao conhecimento e à ascensão das pessoas, o enfoque muda de origem. Somente a miopia intelectual pode confundir essas proposições e as consequências que implica; somente o desconhecimento desse marco global poderá levar a práticas contraditórias no exercício da avaliação. Uma questão de especial importância – e que incide na avaliação – é saber que objetivosmarcam a educação transmitida e o ensino que a concretiza: 23 Seleção/exclusão ou ascensão das pessoas pelo acesso ao saber via aprendizagem e melhoria e aperfeiçoamento da competência individual. A que tipo de objetivos serve a avaliação? A todos ao mesmo tempo, sem estabelecer prioridades? Persegue os mesmos objetivos em todas as matérias? Pretende cobrir apenas o programa de cada matéria de estudo? Discrimina entre alguns objetivos considerados significativos por seu poder formativo – desenvolvimento de capacidades que preparam para novas aprendizagens dadas ou a serem descobertas – ou pretende abranger um número tão amplo que perde em uma gama de metas que asseguram êxitos parciais em prejuízo das grandes finalidades que justificam tal processo como educativo e como fenômeno social e atividade legítima? Objetivam e asseguram mais o êxito de todos ou simplesmente se limitam a certificar êxitos parciais e a excluir os fracassos pontuais? A avaliação torna-se um ponto da colocação em prática de conhecimento no desenvolvimento do docente em seu exercício profissional. Em cada atividade de avaliação, é o saber posto em jogo como conhecimento (formação científica básica) e o saber fazer como 24 projeção prática (formação didática) para tomar decisões justas e agir inteligentemente a favor de quem aprende. Para agir razoavelmente, segundo tal premissa, necessitamos transformar o exercício de avaliação em atividade de conhecimento sobre a qual asseguramos a formação contínua, tanto de quem aprende quanto da tarefa própria da profissão docente. Na medida em que ocorre uma, ocorre a outra. Isoladas, simplesmente nos servem para “encher o expediente”, que é o mesmo que negar a própria atividade docente. Ao integrá-las, a avaliação torna-se uma atividade didática que busca prioritariamente o conhecimento. Nessa perspectiva, avaliar é conhecer, é contrastar, é dialogar, é indagar, é argumentar, é deliberar, é raciocinar, é aprender. Em termos gerais, realmente comprometidos com a racionalidade prática e crítica, quem avalia quer conhecer, valorizar, ponderar, discriminar, discernir, contrastar o valor de uma ação humana, de uma atividade, de um processo, de um resultado. Avaliar é construir o conhecimento por vias de descobrimento. Quem avalia com intenção formativa quer conhecer a qualidade dos processos e dos resultados obtidos pelos seus alunos. Em educação, no ensino, quem avalia quer conhecer os processos que produzem determinados resultados para valorizá-los. Do mesmo modo, o avaliador deseja conhecer os resultados aos quais se chega depois de seguir sequencialmente um processo, idealizado e inspirado em princípios didáticos nos quais o componente moral está permanentemente presente. Por meio da avaliação, queremos conhecer a qualidade dos processos e dos resultados. E, em educação, queremos conhecer 25 para valorizarmos processos que produzem certos resultados e intervir a tempo, se necessário, com a sincera intenção de assegurar o êxito dos que participam do mesmo processo educativo – decisão que brota da própria atividade avaliadora. Este deverá ser o sentido da avaliação formativa, que também será necessariamente contínua e pessoal. Queremos conhecer para comprovar o que faz com que certos processos ocorram com garantia de qualidade e sejam satisfatórios para todas as partes. Pela mesma razão, queremos conhecer para aprender porque ocorrem certos resultados que não foram previstos ou desejados em processos pensados para assegurar a compreensão e a aprendizagem. Na avaliação de aprendizagens, percebe-se tradicionalmente uma tendência em avaliar sempre com a intenção de corrigir, penalizar, sancionar, qualificar. Precisamos recuperar o sentido positivo da avaliação educativa e deparamo-nos com ela tornando-a como uma atividade que convida a continuar aprendendo. Precisamos acercar-nos dela com uma atitude construtiva e torná-la sempre, e em todos os casos, um modo de aprendizagem, uma parte da aprendizagem. Assim, poderá agir a serviço da prática docente. Precisamos descartar a idéia de que a avaliação é um apêndice do ensino que “se anexa” à aprendizagem e que só tem a ver com a aprendizagem acumulada. Não tem sentido falar da avaliação educativa se não está a serviço da melhoria da prática de formação. Quem aprende conteúdos concretos, aprende simultaneamente a valorizar aquele conhecimento. Como a avaliação mais comum e mais centrada em técnicas tradicionais ou do tipo teste, como são as 26 provas objetivas, não chega a níveis de pensamento complexo nem a habilidades mentais superiores, a capacidade de avaliar nunca entra nos planos de ensino e nem faz parte das tarefas de aprendizagem. Foca a atenção em preocupações que requerem – e premiam – a memória mais episódica, a lembrança parcelada sobre o imediato, a repetição automática. Por isso mesmo, é tão fácil programar e delinear segundo técnicas precisas. Basta prescindir dos interesses, da situação na qual se aplicam e dos sujeitos aos quais se destina, que são tratados como recipientes – educação bancária na expressão de Paulo Freire -, e não como pessoas de comunicação que reagem e posicionam-se em relação às mensagens que lhes chegam, quando lhes é dada a oportunidade. Precisamos aprender de e com a avaliação. A avaliação age, então, a serviço do saber e das pessoas que aprendem. Ela deveria ser o momento no qual quem ensina e quem aprende encontram-se com a sã intenção de aprender. Avaliamos para conhecer e aprendermos com a avaliação. Somente assegurando a aprendizagem podemos assegurar a avaliação, isto é, a boa avaliação, que forma continuamente, que seria também significativa e catalisadora de novas aprendizagens. Avaliamos enquanto aprendemos, aprendemos enquanto avaliamos. Quando a avaliação e aprendizagem ocorrem simultaneamente, quem é avaliado produz, cria, discrimina, imagina, analisa, duvida, necessita contrastar, erra e corrige, elabora resposta, formula perguntas quando surgem dúvidas, pede ajuda, busca em outras fontes, avalia. Ou seja, põe em prática o conhecimento e a sua 27 capacidade de argumentar. Age de um modo consciente e responsável sobre sua própria aprendizagem. O objetivo é que quem aprende, utilize em suas avaliações os critérios destinados a justificar a sua própria valorização, o seu próprio juízo. Ao fazê-lo, necessariamente deverá pôr em prática o seu conhecimento. A partir dessa proposta, as finalidades e os objetivos da avaliação adquirem outro sentido e devem levar, necessariamente, a outras formas de ação. Atividades: 1. Quais os desafios que os professores enfrentam na dinâmica de avaliar o aluno? 2. O que significa para você: O processo de ensinar O processo de aprender 28 UNIDADE III O INTERESSE PELA PRÁTICA FORMATIVA Nos níveis básicos de educação, avaliamos porque queremos conhecer. Com essa intencionalidade essencial, a avaliação educativa pode desempenhar as funções formativas que é chamada a desempenhar, longe de outras intenções menos explicitas, que acabam transformando a avaliação em um instrumento de seleção, e de exclusão. Enquanto funções tão antagônicas não se desligarem, tudo o que se relacione com a avaliação, estará imbuído e condicionado por um sentimento negativo de que pouco podemos aprender. O uso mais comum, de caráter pragmático e o mais ostensível dos exercícios de avaliação na prática atual pedagógica identificados com técnicas de exames, consiste em ‘dar notas’ qualificar algumas tarefas ou alguns resultados, supondo-se artificialmente que representam graus ou níveis de rendimento diferenciado. Com o interesse pela prática formativa da pessoa, isso deixa de ser relevante pelo pouco que representa a longo prazo.O que se deseja é transformar a avaliação em um instrumento para fazer com que todos adquiram o saber e apropriem-se dele reflexivamente, bem como não eliminar aquele que, depois de deixar a escola, não consiga adquiri-lo devido a fatores presentes principalmente na própria escola. Precisamos conceber e praticar a avaliação como outra forma de aprender, de ter acesso ao conhecimento, e como uma oportunidade a mais de aprender e de continuar aprendendo. Precisamos transformá- 29 la em um meio pelo qual os sujeitos que aprendem expressam seu saber não sobre o imediato, mas sim sobre o saber acumulado e integrado habitualmente aos modos de raciocinar e de agir em um estudo (de formação) que é dinâmico, variável, aberto, inseguro, imaturo, provisório, cheio de dúvidas e de contradições, de sobressaltos, de curiosidades. A avaliação deve constituir uma oportunidade real de demonstrar o que os sujeitos sabem e como o sabem. Somente assim o professor poderá detectar a consistência do saber adquirido e a solidez sobre a qual vai construindo seu conhecimento. Quando este se manifesta, o professor poderá intervir inteligentemente, seja para reorientá-lo, seja para estimulá-lo ou assegurá-lo, seja para corrigi-lo e valorizá-lo. Em todos os casos, e se aceitamos o tempo de escolarização como tempo de formação contínua, será sempre com intenção formativa. Evidenciar erros, e também penalizá-los, não serve para esse propósito; este modo de agir equivale a deter, e inclusive romper, a própria dinâmica do processo. Quando esse processo não ocorre, o fato de averiguar as razoes do bloqueio faz da tarefa docente um importante trabalho de investigação. 30 A AVALIAÇAO A SERVIÇO DE QUEM APRENDE Parto do seguinte princípio, que assumo como premissa inevitável quando falamos de avaliação educativa: avaliamos para conhecer, com o objetivo fundamental de assegurar o progresso formativo dos que participam do processo educativo - principal e imediatamente de quem aprende, bem como de quem ensina. Nesse procedimento, a avaliação transforma-se em atividade contínua de conhecimento. Avaliamos para conhecer quando corrigimos construtiva e solidariamente com quem aprende, não para confirmar ignorâncias, desqualificar esquecimentos, penalizar aprendizagens não-adquiridas. Quando os professores agem como corretores que explicam e comunicam razoavelmente, são fontes de aprendizagem mediante a informação compreensível e argumentada que devem fornecer nessa tarefa. Também aprende quem trabalha com eles e aos que ensinam, sobre e a partir dos acertos e dos erros, das dúvidas e das certezas, das opiniões e dos argumentos, dos saberes e das ignorâncias, das atitudes e das capacidades. Aprendem com a ajuda que lhes oferece o professor através da informação educativamente significativa, esclarecedora e argumentada, nas correções de tarefas e de exercícios, ou de exames. A própria correção torna-se texto de aprendizagem. 31 Avaliamos para conhecer, em qualquer contexto e em todos os casos. Nos processos educativos de ensino e de aprendizagem, queremos conhecer para agir intencionalmente de um modo que consideramos correto, moral e intelectualmente valioso. Porque queremos conhecer, e quem aprende conosco precisa conhecer, necessitamos avaliar de forma educativa, que é a intenção honestamente formativa. Nessa dinâmica, a avaliação converte-se em atividade de aprendizagem estreitamente ligada à pratica reflexiva e crítica, atividade da qual todos saem beneficiados precisamente porque a avaliação é – e deve ser – fonte de conhecimento e impulso para conhecer. Porque participa de um exercício intencional que trata de e com pessoas, precisamos avaliar de um modo justo, que não convém confundir com um desejo desmedido em ser objetivos. Quando avaliamos um trabalho ou um exame com o intuito de apreciar a qualidade da resposta e o saber sobre a matéria de quem o realiza, o que devemos buscar é conhecer o processo de elaboração que o aluno seguiu, compreender a utilização das estratégias de resolução que põe em jogo, a capacidade de argumentação que mostra as causas e os motivos que provocam os erros. Devemos considerar igualmente os acertos para discriminar entre as respostas elaboradas e aquelas que obedecem a acertos casuais, questão de azar. Se agirmos apenas com a intenção de qualificar o trabalho ou o exame para quantificar aquele saber, introduzimos elementos ou critérios que desviam a atenção do que vale a pena ser considerado em processo de formação intelectual e alteramos o valor da própria correção e da interpretação que o autor 32 tenha feito do trabalho. Conhecemos – ou imaginamos que conhecemos – porque pretendemos ajudar, que é a tarefa que honestamente nos deve caracterizar como professores que intencionalmente formam. Quando avaliamos apenas para confirmar ignorância e, como consequência, qualificamos negativamente, aquele conhecimento torna-se fiscalizador, episódico, superficial, encobridor das próprias fragilidades e empobrecedor de uma atividade que em si deveria ser gratificante, além de estimulante para novas aprendizagens, para novas descobertas de conhecimentos. Com o conhecimento adquirido podemos tomar decisões justas e razoavelmente fundamentadas. Aí está a base que justifica a escolha das técnicas que podemos empregar no momento de avaliar. Por esse motivo é tão importante reconhecer o que, como professores, precisamos saber além da tarefa habitual de ensinar. Precisamos saber o que os alunos estão aprendendo e o modo como o estão fazendo, as estratégias de raciocínio, de argumentação e de aplicação que utilizam. Precisamos saber se o que aprendem está relacionado com o que ensinamos e de que modo podemos ensinar com formas que estimulem e potencializem suas próprias qualidades de aprendizagem: uma avaliação que vise mais aos aspectos em que o aluno vai obtendo êxito do que o que vai deixando de lado, mais o que aprende do que o que não sabe, ou ignora, ou esquece. Precisamos conhecer quais os procedimentos, quais as técnicas entre as disponíveis, servem-nos para tais propósitos, quais os métodos ou recursos de avaliação podemos criar para responder as nossas próprias idéias sobre o que é uma boa aprendizagem e uma 33 boa avaliação. Podemos descobrir por esse caminho, que muitos dos procedimentos que são considerados normais não nos servem para esses fins, tais como as provas objetivas de tipo teste, sejam provas de múltipla escolha, sejam de verdadeiro/falso, sejam de preencher espaços. COM OS ERROS TAMBÉM SE APRENDE: Do ponto de vista crítico, a avaliação deve ser uma oportunidade real de demonstrar o que os alunos aprendem, o que sabem e o que podem fazer aplicando o conhecimento adquirido e o seu próprio. É muito importante a qualidade da informação fornecida pela correção dos trabalhos e das tarefas de aprendizagem para quem está aprendendo. Não é o caso de aprovar ou reprovar – na intenção formativa, não é essa a questão. O ponto crucial está na qualidade e na clareza da informação que é dada aos alunos sobre a correção. Com ela, o professor deve contribuir para encontrar as soluções a tempo, antes que a reprovação anunciada seja cumprida. Informação essa que realmente dê conta o suficiente do estado em que se encontra o sujeito, dos motivos que provocam a situação analisada, das possíveis soluções que garantam a aprendizagem correta, de tal forma que o valor do que foi aprendido esteja sempre acima do fracasso e que, pela informação recebida, o sujeito possa melhorar e aperfeiçoar sua aprendizagem. Qual é a relevância das anotações e das explicações que corrigem com o intuito de que quem aprende melhore seu aproveitamento, avance em 34 seu desenvolvimento pessoal, enriqueça o seu processo de aprendizagem,se é que existe? QUAL É O SENTIDO DA RECUPERAÇÃO DA APRENDIZAGEM ? Quanto mais informação relevante e dada com intenção formativa é oferecida a quem aprende, mais poderá aumentar a compreensão da situação de aprendizagem por parte de quem decide aprender. Com os erros também se aprende quando a correção informa, significativamente, sobre as suas causas, transformada, ela mesma, em texto de aprendizagem. Quando são apenas qualificados, que por esse fato o serão sempre negativa e inoportunamente, um professor desperdiça uma boa ocasião, com graves repercussões para quem aprende de exercer seu próprio magistério à luz da ética da responsabilidade, que sempre visará à perspectiva e aos interesses do jeito que se forma. Quanto mais qualidade tiver a informação que é oferecida, mais poderá aumentar a qualidade da aprendizagem que parte da correção bem informada. Quanto menos qualidade tiver essa informação, menos poderá ajudar ou animar o sujeito a quem é dirigida tal informação. Qualidade na informação também significa clareza, persuasão fundamentada e guiada por intenções morais. Um Exemplo: Imaginemos a informação que um doente possa receber, ao qual nada dizem as palavras técnicas que supostamente orientam o 35 tratamento médico necessário. Imaginemos os diferentes graus de informação que possam ser dados a ele, desde a mais completa e razoável até a mais incompreensível e “desinformadora”, passando por aquela que diz sem explicar, descreve sem indicar caminhos a serem seguidos, prescreve sem dar razões, deixa dito sem possibilidades de que o destinatário compreenda a mensagem. Além da sensação de vazio, invade-lhe uma sensação de ignorância, quando não de estupidez, porque, diante da falta de compreensão do que sente e padece, não lhe sobram mais opções do que a de acreditar e de obedecer cegamente ao que lhe é indicado. Sendo ator, transforma-se em espectador de sua própria representação. Se investirmos o conhecimento que obtemos para melhorar nossas práticas e para melhorar a aprendizagem de quem aprende conosco, então a avaliação desempenhará a função formativa – uma das funções mais enfatizadas nos discursos, que tão frequentemente se deixa escapar ou se oculta na pratica. Ou, então, o que é mais grave, é dada como função desempenhada, embora a evidência do fracasso ou a comprovação das disfunções que produz, mostrem que não contribui para a formação dos sujeitos envolvidos. Avaliamos para conhecer. Com tal fim, precisamos coletar uma informação valiosa, argumentada e fundamentada, na qual os sujeitos que são fontes dos dados analisados, conheçam, por sua vez, os seus conteúdos e os usos que serão feitos dela. Será uma informação valiosa se aquele conhecimento provier de bases sólidas; a partir daí, tomaremos decisões fundamentadas. Para isso, é imprescindível assumir como valor moral o dever de informar aos alunos tudo o que lhes corresponde, que lhes afete e que 36 lhes interesse para poderem melhorar e assegurar seu progresso contínuo na apropriado saber. Por um lado, evita-se ou previne-se contra o uso e o abuso irracionais do poder; por outro lado, garantimos com isso o exercício ético e justo da autoridade. As decisões serão de valor educativo se beneficiarem prioritariamente quem aprende e quem ensina. Esse deve ser o mérito da avaliação que pretenda desempenhar funções essencialmente formativas, que estarão sempre, e em todos os casos, a serviço da prática de ensino e de aprendizagem. Os dois estão incluídos em um mesmo processo dinâmico, já que o êxito de um (ensino) representa o êxito da outra (aprendizagem). É necessário entender que, ao dever de aprender que o aluno tem, assiste-lhe (segue-lhe) o direito de errar no mesmo processo quando, honestamente, tenta desenvolver seu próprio pensamento, que é produzido no mesmo momento que se vai fazendo. Penalizá-lo por atrever-se a comprometer seu pensamento com uma resposta própria é cortar pela raiz qualquer possibilidade de fortalecer e de configurar a autonomia intelectual de que precisa para conviver em sociedade dignamente. Quando a resposta não está devidamente sustentada em razões, a correção indicará o caminho adequado. Uma vez que a resposta é reelaborada com as indicações pertinentes dadas pelo professor, não há motivo para reprovar, nem sequer para baixar pontos. Se o que realmente importa é que o aluno aprenda, este seria um bom momento para comprovar que a aprendizagem já aconteceu. 37 IMPORTÂNCIA DAS PERGUNTAS PARA A AÇÃO REFLEXIVA E CRÍTICA Para recuperar o valor formativo dos exames, é necessário fazer perguntas inteligentes como condição de qualidade nas exigências de aprendizagem. Se realmente pretendemos desenvolver a inteligência, é necessário fazer perguntas que a estimulem e não que a paralisem ou a limitem a tarefas que não exigem reflexão, tarefas de repetição e de memória sem sentido. O ponto crucial consiste em saber quando perguntar o que. Tenta-se discernir sobre a oportunidade e a prudência na escolha do momento, sobre conteúdos verdadeiramente relevantes e significativos para quem deve elaborar reflexivamente uma resposta que desafia o seu pensamento; conteúdos relevantes e significativos, porque vêem além do imediatismo do exame, de qualquer forma de exame. Formular perguntas que estimulem a inteligência e que coloquem à prova o conhecimento, é a essência da arte do ensino, que repousa, “em compreender quando formular uma boa pergunta que estimule o estudante a avançar até os níveis mais altos de pensamento e quando abster-se de fazer perguntas”. Como saber quais perguntas vale à pena responder e quando não? Contrastar e compartilhar com outros colegas o tipo de perguntas que podem ser formuladas e o seu valor, podem resultar em uma tarefa estimulante, que reforça a consciência de grupo e também é formativa por si só, tanto intelectual como profissionalmente. Como sugestão e a título de exemplo, podem ser 38 critérios indicadores os fornecidos, sem outra intenção se não a de incentivar a reflexão sobre práticas e críticas de avaliação. Exemplo: Aquelas perguntas que têm a mesma resposta entre os alunos podem ser descartadas, pelo fato de que costumam basear-se nos mesmos apontamentos, na mesma fonte de informação e só requerem o esforço da memória comum, circunstancial, mínima, a curto prazo e não-significativa. Além disso, correm o risco de que, se o que os alunos transcreveram em seus apontamentos não está correto, uma porcentagem elevada deles pode fornecer o mesmo erro multiplicado. Também evidenciam que, por trás desse tipo de respostas, cabe apenas um pensamento simples, além de único, que chega a soluções simples, descartando a elaboração de respostas próprias, elaboradas, comparadas, argumentadas. Se forem perguntas cujas respostas os alunos podem copiar mecanicamente uns dos outros, deve-se revisá-las: desenvolvem mais as habilidades próprias de fraude do que as que exigem o desenvolvimento das capacidades do pensamento autônomo fundamentado ou as que requerem entendimento ou aplicação de saberes adquiridos, ou as possibilidades que têm de iniciativa, de pesquisa, de exploração e de descoberta. Somente quando são esperadas respostas uniformes e repetidas das perguntas, há a possibilidade de cópia. Aumenta, então, o risco de fraude, que supõe dar uma resposta que não seja de elaboração própria, que seja copiada diretamente de outros alunos, que seja 39 automatizada ou armazenada mecanicamente na memória a curto prazo do aluno, que a “despeja” irrefletidamente sobre o papel. Quando a pergunta obriga a reflexão, desafia a capacidade de raciocínio de quem deve responder e exige elaboração de pensamento, então cada resposta obedece a formas diferentesde argumentar, de pensar e de mostrar o que cada um realmente sabe ou interpreta, isto é, estilos distintos na expressão das próprias idéias. A cópia, nesses casos, é impossível ou, se ocorre, será mais difícil de ser sustentada e justificada argumentativamente. Se você pretende desenvolver o pensamento criativo, crítico, autônomo, formule perguntas que “obriguem” a argumentar as respostas de um modo criativo, crítico e autônomo. Consequentemente, não espere respostas uniformes. Reconhecemos que, para ter acesso ao conhecimento, não há um único caminho válido, como também devemos reconhecer que não deve haver uma única resposta válida expressa ou redigida nos mesmos termos. Quando isso acontece, só podemos garantir que quem responde simplesmente copia, seja a partir do baú de recordações ou da memória mais insignificante, seja a partir de qualquer outra fonte. Como avaliador, você deverá centrar seus esforços em analisar criticamente o valor implícito de cada resposta, argumentando seus pontos de vista de um modo razoável. Se o que pretende é desenvolver a inteligência de quem aprende com você, formule perguntas que a estimulem, não que a adormeçam, ou a obriguem a um exercício de obediência a palavras emprestadas ou a simplesmente transmitidas. Você também poderá testar fórmulas que 40 consistem não tanto em dar respostas a questões formuladas, mas que seja o próprio sujeito da aprendizagem que formule as perguntas. A ciência avança movida pelas perguntas e é a natureza delas que os cientistas se propõem a resolver. Sem dúvida, quem está capacitado para perguntar é porque conhece o terreno no qual se move; então, poderá comprovar que vale a pena responder a perguntas estimulantes, perguntas inteligentes que desafiam as certezas que repousam em respostas alheias. Pela mesma razão, poderá comprovar como perguntas triviais revelam um conhecimento medíocre, pouco sustentado, mal copiado, deficiente em sua formulação, pobre em interpretação e nulo em integração nos esquemas do próprio conhecimento de quem aprende. Ao contrário, também poderá dar-se conta da capacidade para gerar idéias criadoras, características de quem aprende de modo significativo, seja no contexto de sala de aula, seja para aplicá-lo fora dela, incorporando-as às formas habituais de ser inteligente. Nessa maneira crítica de agir, todos acabam aprendendo, porque avançam sobre caminhos nos quais a compreensão é estimulada e reforçada. A única forma de “corrigir” um exame que responde a esse tipo de perguntas é falando com cada um dos alunos que responde. A autoridade do professor é exercida por sua capacidade de argumentar e fundamentar respeitosamente com quem participa de, e na atividade de aprender, nunca, e em nenhum caso, contra ele ou enfrentado-o. Todos e cada um terão a oportunidade de escutar, contrastar, debater, criticar, contra-argumentar, expor dúvidas, 41 afirmar certezas, divergir fundamentalmente e valorizar (avaliar) as próprias respostas e as que são dadas pelos demais componentes do grupo de trabalho. A própria atividade de avaliar torna-se, assim, uma aprendizagem de atividade compartilhada e solidária que traduz em mais aprendizagem e em aprendizagens novas. O diálogo, como já indiquei, desempenha uma função formativa importante quando facilita a descoberta do conhecimento que, pouco a pouco, vai sendo construído. É a razão pela qual, nas palavras de Morin, “temos necessidade de um diálogo permanente com a descoberta”. Como destaca Elliott, a diferença consiste no enfoque: enquanto a avaliação dos alunos deve centrar-se na qualidade de sua aprendizagem da matéria que se trate, a avaliação dos professores deve centrar-se na qualidade de sua aprendizagem sobre o ensino dessa matéria. A proposta deste Curso é por uma avaliação centrada em primeiro lugar no aluno que aprende e, em segundo lugar, no docente, ambos são chamados a compartilhar e a desenvolver responsabilidades. Centrada no aluno, porque é o primeiro beneficiado, mas também porque participa da própria avaliação como igual e, evidentemente, participa de sua aprendizagem, desenvolvendo suas próprias capacidades de valorização; por isso, de sua participação surge a responsabilidade. 42 Centrada no docente, porque faz suas as responsabilidades que derivam de sua profissão. Como bem menciona Nevo, ao falar de avaliação de programas, “ninguém pode ter a autoridade para avaliar se não está disposto a compartilhar a responsabilidade pelas consequências da avaliação. 43 UNIDADE IV FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO Tomando por base a definição de J. L. Mursell, “a avaliação é um sistema intencional e discriminatório de verificação que tem por objetivo tornar a aprendizagem mais efetiva”, concluímos que esta, como processo, objetiva melhorar a aprendizagem; a validade deste posicionamento, embora parcial, é significativa quanto à ênfase dada à avaliação como processo educativo. Considera-se a avaliação dos resultados do ensino-aprendizagem de grande relevância, porque permite: Oferecer informações fundamentais para o processo de tomada de decisões quanto ao programa curricular; Melhorar o processo ensino-aprendizagem. Segundo Robert Stalze, a avaliação educacional tem seu aspecto formal e informal. O aspecto informal se evidencia em sua dependência aos objetivos implícitos, as normas intuitivas e julgamento subjetivos. O aspecto formal decorre de objetivos bem formulados, de comparações bem controladas de instrumentos fidedignos. Um programa de avaliação se constitui por funções gerais e específicas. São funções gerais de avaliação: Fornecer as bases para o planejamento 44 Possibilitar a seleção e a classificação de pessoal (professores, alunos e especialistas) Ajustar políticas e práticas curriculares. São funções específicas de avaliação: Facilitar o diagnóstico Melhorar a aprendizagem e o ensino Estabelecer situações individuais de aprendizagem Promover, agrupar alunos (classificação) FUNÇÕES DA AVALIAÇÃO Diagnóstica Formativa Classificatória Propósi- tos Determinar a presença ou ausência de habilidades e/ou pré-requisitos. Informar professor e aluno sobre o rendimento da aprendizagem durante o desenvolvimento das atividades escolares Classificar os alunos ao fim de um semestre, ano ou curso, segundo níveis de aproveitamento. Identificar a causa de repetidas dificuldades na aprendizagem. Localizar deficiências na organização do ensino de modo a possibilitar reformulações. Objeto de Comportamento Comportamento Geralmente comportamento cognitivo, às vezes 45 Medida Cognitivo e Psicomotor cognitivo, afetivo e psicomotor comportamento psicomotor e ocasionalmente comportamento afetivo. Época No inicio de um semestre, ano letivo ou curso; Durante o Ensino Ao final de um semestre, ano letivo ou curso. Durante o ensino, quando o aluno evidencia incapacidade em seu desempenho escolar. Instru- mentos Pré-teste Instrumentos especificamente planejados de acordo com os objetivos propostos. Exame, prova ou teste final. Teste padronizado de rendimento Teste diagnóstico Ficha de observação 46 Instrumento elaborado pelo professor INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO Caracterização Conselho de Classe: Instrumento que visa traçar o perfil de cada aluno e do grupo. Pré-teste: teste aplicado para averiguar pré-requisitos para aquisição de novos conhecimentos. Auto-Avaliação: Instrumento capaz de conduzir o aluno a uma modalidade de auto-conhecimento que se põe em prática a vida inteira. Observação: Contemplamo-nosdo mesmo modo pelo qual os outros nos vêem é uma das mais confortadoras dádivas. E não menos importante é o dom de vermos os outros tal como eles mesmos se encaram. Inquirição: “Se desejamos saber como as pessoas se sentem – qual sua experiência interior, o que lembram, como são suas emoções e 47 seus motivos, quais as razões para agir como o fazem – por que não perguntar a elas?” Relatório: Constitui-se pelo registro de dados que expressam a comunicação dos resultados de planejamentos concretizados. AUTO-AVALIAÇÃO A auto-avaliação é capaz de conduzir o aluno a uma modalidade de apreciação que se põe em prática durante a vida inteira. Graças a ela os alunos adquirem uma capacidade cada vez maior de analisar suas próprias aptidões, atitudes, comportamento, pontos fortes, necessidades e êxito na consecução de propósitos. Eles desenvolvem sentimento de responsabilidade pessoal ao apreciar a eficácia dos esforços individuais e de grupo. Aprendem a enfrentar corajosamente as competências necessárias em várias tarefas. Uma vez que se espera do aluno a responsabilidade por sua própria aprendizagem, é importante que se considere que isto somente ocorrerá se ele tiver uma visão clara do que está tentando obter e de como está agindo a respeito. Quando o desejo de melhorar ocorre como decorrência de suas percepções e análises, ocorrerão melhores condições para se aperfeiçoar. Propiciar condições para ajudar o aluno a pensar sobre si mesmo e o que tem realizado, é prepará-lo para uma aprendizagem significativa na caminhada da vida. Para que a auto-avaliação tenha êxito é preciso que o professor acredite no aluno e ofereça condições 48 favoráveis à aprendizagem, pois só assim este se sentirá seguro, confiante e manifestará autenticidade. Quanto à forma, a auto-avaliação poderá ser expressa livremente ou obedecendo critérios que podem ser registrados em fichas. 49 UNIDADE V PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO O planejamento é indissociável da prática de avaliação, mesmo que não sistematicamente, todo professor faz uma avaliação do processo. Nesse processo de planejar e avaliar, os primeiros elementos a se buscar uma explicação, são os objetivos da prática docente em termos de competências, habilidades e atitudes a se desenvolver e de conceitos e procedimentos a se construir. Além dos objetivos de aspecto cognitivo, precisam ser consideradas outras competências, tal como a competência para o desenvolvimento de trabalhos em grupo de forma colaborativa. Em matemática, sempre foi bastante valorizado o desenvolvimento individual do aluno. Porém, para viver em sociedade, saber trabalhar em grupo é essencial. O planejar exige a explicitação prévia dos objetivos de ensino, com subsequente reflexão quanto às expectativas das atividades para o desenvolvimento desejado. A análise da produção do aluno, também é um momento essencial para o processo de planejar e avaliar. Muitas vezes a análise da produção das estratégias corretas e erradas dos alunos nos leva a refletir sobre a adequação do planejamento aos objetivos. 50 Princípios Universais da Avaliação Mediadora Finalizando, sem concluir o tema, considero importante insistir em relação ao caráter multidimensional de uma prática avaliativa mediadora, em todas as disciplinas do currículo, apontando alguns princípios fundamentais: Conhecer a avaliação como um projeto de futuro. Garantir a todas as crianças e jovens uma aprendizagem para toda a vida. Para tanto, é preciso acreditar que não existe o “não aprender”, mas jeitos e tempos diferentes de aprender a aprender e de aprender sobre a vida. É preciso, sobretudo, respeitar a diversidade dos educandos se pretendemos formar para a cidadania, reconhecendo todos como dignos de educação, atenção e respeito. Entender que valor e/ou qualidade da aprendizagem são parâmetros sempre subjetivos e arbitrários. E que, portanto, devem ser sempre temas de reflexão e consenso pelo coletivo dos educadores. Tais parâmetros precisam ser considerados mutáveis, contextuais, éticos e condizentes com as concepções defendidas em cada área de conhecimento 51 Acreditar que toda a aprendizagem se dá na relação de saber consigo mesmo, com os outros e com os objetos do saber. E isso concomitantemente. Portanto, desenvolver uma prática avaliativa de modo a privilegiar a expressão própria do pensamento dos alunos, a oportunizar-lhes vivências em ambientes interativos, a tornar disponíveis múltiplas e ricas fontes de informação sobre os objetos do saber. Avaliação Mediadora: Uma Relação Dialógica na Construção do Conhecimento O paradigma de avaliação que se opõe ao paradigma sentencioso, classificatório é o que denomino de "avaliação mediadora". "O que pretendo introduzir neste texto é a perspectivada ação avaliativa como uma das mediações pela qual se encorajaria a reorganização do saber. Ação, movimento, provocação, na tentativa de reciprocidade intelectual entre os elementos da ação educativa. Professor e aluno buscando coordenar seus pontos de vista, trocando idéias, reorganizando-as."(HOFFMANN) Tal paradigma pretende opor-se ao modelo do "transmitir-verificar- registrar" e evoluir no sentido de uma ação avaliativa reflexiva e desafiadora do educador em termos de contribuir, elucidar, favorecer a troca de idéias entre e com seus alunos, num movimento de superação do saber transmitido a uma produção de saber enriquecido, construído a partir da compreensão dos fenômenos estudados. 52 E, de fato, o que se observa na investigação da prática avaliativa dos três graus de ensino é, ao contrário de uma evolução, um fortalecimento da prática de julgamento de resultados alcançados pelo aluno e definidos como ideais pelo professor. Alguns fatores parecem contribuir para a manutenção de tal concepção: a autonomia didática dos professores, decorrente de suas especializações em determinadas disciplinas e/ou áreas de pesquisa, que dificulta a articulação necessária entre os docentes, a ponto de suscitar uma reflexão conjunta sobre essa questão; a estrutura curricular, por exemplo, do 3° Grau, com o regimento de matrícula por disciplinas que, desobrigando à seriação conjunta dos alunos, impede os professores de avaliarem a trajetória do estudante em seu curso superior, em termos do acompanhamento efetivo de seus avanços e de suas dificuldades; além desses, a natureza da formação didática dos professores, que se revela, na maioria das vezes, por um quadro de ausência absoluta de aprofundamento teórico em avaliação educacional. Tomando ainda mais grave a postura conservadora dos professores, observamos que a avaliação é um fenômeno com características seriamente reprodutivistas, ou seja, a prática que se instala nos cursos de Magistério e Licenciatura é o modelo que vem a serseguido no 1° e 2° Graus. Muito mais forte do que qualquer influência teórica que o aluno desses cursos possa sofrer, a prática vivida por ele enquanto estudante passa a ser modelo seguido quando professor. O que tal fenômeno provoca é, muitas vazes, a reprodução de práticas avaliativas ora permissivas (a partir de cursos de formação 53 que raramente reprovam os estudantes), ora reprovativas (a partir de cursos, como os de Matemática, que apresentam abusivos índices de reprovação nas disciplinas). Muitos professores nem mesmo são conscientes da reprodução de um modelo, agindo sem questionamento, sem reflexão, a respeito do significado da avaliação na Escola. Aponto, então, algumas perguntas relacionadas à complexidade dessa questão: Como superar o descrédito de muitos professores relativo a sua perspectiva de avaliação enquanto ação mediadora? Quais serão as questões emergências na discussão dessa perspectiva, levando-se em contaa superficialidade da formação dos professores nessa área? Em que medida prevalece uma visão de conhecimento positivista fortalecedora da concepção classificatória da avaliação? O que se pretende é refletir sobre as origens desse descrédito e sobre o impacto que tal postura pode causar nas relações que se estabelecem entre professor e aluno e em todas as estruturas do ensino. "Uma vez estabelecidos os procedimentos de avaliação, os instrumentos e as medidas, a atribuição de conceitos e sua aplicação, ou seja, as classificações segundo determinados padrões, passam (esses procedimentos) a ser vistos como atividades técnicas e neutras ao invés de formas interpretativas e expressivas das relações sociais que estão incorporadas dentro da própria idéia de avaliação."(BARBOSA) 54 Considero reveladoras de tal postura de resistência dos professores algumas perguntas formuladas por eles em seminários e encontros para discussão do tema Avaliação. Algumas questões, repetidamente formuladas, serão ponto de partida dessa análise: Não estaremos nós, professores, sendo responsabilizados pelo fracasso de alunos desinteressados e desatentos? Como é possível alterar nossa prática, considerando o número de alunos com que trabalhamos e o reduzido tempo em que permanecemos com as turmas? Não é necessário, nessa proposta, uma enorme disponibilidade do professor para atendimento aos alunos? Em que medida formaremos um profissional competente sem uma prática avaliativa exigente e classificatória (competitiva)? Será possível alterar o paradigma da avaliação diante das exigências burocráticas do sistema? Não se deveria começar por alterá-las? Pretendo, inicialmente, analisar o conteúdo das perguntas que vêm sendo formuladas pelos professores e refletir sobre suas concepções. É preciso dizer que serão apontadas algumas hipóteses sobre concepções implícitas às perguntas formuladas como tentativa preliminar de análise do seu significado. Outras hipóteses, sem dúvida, poderão ser sugeridas, ampliando-se essa discussão. A primeira pergunta e a hipótese apontada poderiam introduzir a análise da relação entre a concepção de avaliação e a visão de conhecimento do professor. Ou seja: em que medida o repensar sobre a avaliação exigiria investigar como o professor concebe a relação sujeito-objeto na produção de conhecimento? 55 Se concebe a aprendizagem do ponto de vista comportamentalista, o professor define como uma modificação de comportamento produzida por alguém que ensina em alguém que aprende. O conhecimento do aluno vem dos objetos e cabe ao professor organizar os estímulos com os quais o aluno entrará em contato para aprender. A prática pedagógica consistirá, então, na transmissão clara e explícita dos conteúdos pelo professor, apresentando exemplos concretos (organização de estímulos). Essa situação, por si só, promoverá a aprendizagem, desde que o aluno entre em contato com tais estímulos, esteja atento às situações. Assim, se o professor oferecer explicações claras, textos explicativos consistentes e organizar o ambiente pedagógico, o aluno aprenderá, exceto se não estiver presente, ou se não estiver atento às explicações, ou não memorizar os dados transmitidos pelo professor, ou não cumprir as tarefas de leitura solicitadas. A hipótese que anuncio é que uma tal visão de conhecimento positivista vincula-se a uma prática avaliativa de observação e registro de dados. Assim como supervaloriza as informações que transmite ao aluno e exige que ele permaneça alerta a tais informações, o professor também o toma como seu objeto de conhecimento, ou seja, permanece atento aos "fatos objetivos": o aluno passa a ser um objeto de estudo do professor, que o capta apenas em seus atributos palpáveis, mensuráveis, observáveis. Sua prática avaliativa revela intenções de coleta de dados em relação ao aluno, dele registrando dados precisos e fidedignos. Dessa forma, o professor não assume absolutamente a responsabilidade em relação ao fracasso do aluno. Em primeiro lugar, 56 porque representaria assumir sua incompetência na organização do trabalho pedagógico, uma apresentação inadequada de estímulos à aprendizagem. Em segundo lugar, porque aquilo que faz geralmente se traduz em resultados positivos. Ou seja, alguns alunos, ou a maioria, aprendem. Se a ação produz modificação de comportamentos em alguns alunos, então o problema está nos alunos e não na ação do professor. Sem ultrapassar a visão comportamentalista de conhecimento, nenhuma outra hipótese é levantada pelo professor sobre as dificuldades que os alunos apresentam, senão a sua desatenção e desinteresse. Em terceiro lugar, porque, coerente com tal visão de conhecimento, o avaliar reduz-se, para ele, à observação e ao registro dos resultados alcançados pelos alunos ao final de um período. Tal visão não absorve uma perspectiva reflexiva e mediadora da avaliação. O que pretendo argumentar é que a visão comportamentalista dos professores parece manifestar-se de forma radical em sua prática avaliativa, e é muito grave a sua resistência em perceber o autoritarismo inerente a tal concepção. Sem considerarem possíveis outras explicações para o fracasso dos estudantes que não o comprometimento deles (o que também é importante, mas não razão absoluta), não podem evoluir no sentido de dois princípios presentes a uma avaliação enquanto mediação: o do acompanhamento reflexivo e o do diálogo. Introduzindo esses princípios, estaríamos, assim, analisando as concepções implícitas às seguintes perguntas dos professores: 57 Como é possível alterar nossa prática, considerando o número de alunos com que trabalhamos e o reduzido tempo em que permanecemos com as turmas? Não é necessário, nessa proposta, uma enorme disponibilidade do professor para atendimento aos alunos? As hipóteses que aponto dizem respeito a uma percepção de que os professores estariam considerando a perspectiva de avaliação mediadora uma prática impossível, ou difícil, porque tal perspectiva exigiria deles uma relação intensa em tempo com seus alunos e direta, a partir de um atendimento que se processaria individualmente e através de uma comunicação verbal por meio de explicações, orientações e encaminhamentos. Tal prática seria dificultada, assim, pelo panorama da Escola atual: número de alunos por turma, carga horária das disciplinas, tempo disponível do professor para atendimento individual aos alunos etc. É preciso investigar, então, a compreensão pelos professores dos termos acompanhamento e diálogo. O termo diálogo, por exemplo, pode significar simplesmente conversa, não querendo,contudo, dizer que haja entendimento entre as pessoas que conversam. Ora, se compreendido dessa forma, o princípio do diálogo como linha norteadora de uma avaliação mediadora pode provocar um sentimento de impossibilidade nos professores, principalmente a partir da 5ª série. Isto porque é impossível haver tempo para conversar com todos os alunos de todas as turmas, sobre todas as questões que levantam. Suspeito daí que alguns professores considerariam possível tal prática apenas no 1° 58 Grau, nas séries iniciais por exemplo, pelo contato permanente dos professores com suas crianças. Da mesma forma, o significado do termo acompanhar também pode ser o de estar junto a, caminhar junto de. E isto exigiria igualmente do professor maior tempo com seus alunos. Estes dois termos, atrelados a uma visão de conhecimento positivista, podem estar sendo utilizados de forma reducionista. Através do diálogo, entendido como momento de conversa com os alunos, o professor despertaria o interesse e a atenção pelo conteúdo a ser transmitido. O acompanhamento significaria estar junto aos alunos, em todos os momentos possíveis, para observar passo a passo seusresultados individuais. O que significa que tanto o acompanhamento quanto o diálogo, assim concebidos, não conduziriam o professor, obrigatoriamente, a uma prática avaliativa mediadora. Em uma investigação sobre o significado do termo acompanhar, 29 professores de 1º Grau, dentre 32 respondentes, disseram que acompanhavam os alunos todos os dias, continuamente, em todas as situações de sala de aula. Entretanto, todos os 32 professores definiram avaliação por verificação de resultados alcançados (através de enunciados diversos). Quero dizer que se os professores disseram acompanhar os alunos, o sentido do seu acompanhar pode ter sido o de observar e registrar todo o tempo o que o aluno é capaz de demonstrar. Estudos buscam contrapor-se a essa perceptível resistência de muitos professores, hipoteticamente justificada por uma compreensão 59 reducionista e positivista de alguns princípios essenciais da avaliação mediadora. A avaliação, enquanto relação dialógica, vai conceber o conhecimento como apropriação do saber pelo aluno e também pelo professor, como ação-reflexão-ação que se passa na sala de aula em direção a um saber aprimorado, enriquecido, carregado de significados, de compreensão. Dessa forma, a avaliação passa a exigir do professor uma relação epistemológica com o aluno - uma conexão entendida como reflexão aprofundada a respeito das formas como se dá a compreensão do educando sobre o objeto do conhecimento. "O confronto que se passa na sala de aula não se passa entre alguém que sabe um conteúdo (o professor) e alguém que não sabe (o aluno) mas entre pessoas e o próprio conteúdo, na busca de sua apropriação." (CHAUÍ, 1980, in: WACHOWICZ, 1991,) O diálogo, entendido a partir dessa relação epistemológica, não se processa obrigatoriamente através de conversa enquanto comunicação verbal com o estudante. É mais amplo e complexo e, até mesmo, dispensa a conversa. “Antes de mais nada, penso que deveríamos entender o diálogo não como uma técnica, apenas que podemos usar pare conseguir bons resultados. Também não podemos, não devemos entender o diálogo como uma tática que usamos para fazer dos alunos nossos amigos. Isso faria do diálogo uma técnica para a manipulação, em vez de iluminação. 60 Ao contrário, o diálogo deve ser entendido como algo que faz parte da própria natureza histórica dos seres humanos. É parte de nosso progresso histórico, do caminho para nos tornarmos mais humanos. (...) o diálogo é o momento em que os humanos se encontram pare refletir sobre sua realidade tal como a fazem e re- fazem". (SHOR, FREIRE). Em que medida o professor reflete sobre as tarefas dos seus alunos? Como se dá tal reflexão? Percebe-se que as tarefas produzidas pelos alunos são solicitadas apenas ao final dos períodos letivos. Qual o significado desse procedimento? É possível encaminhar o aluno a uma reflexão crítica sobre seus posicionamentos, após concluídos os períodos? Justificam-se trabalhos, provas e relatórios que jamais serão discutidos ou analisados em conjunto pelo educador e educando? "Como bem o expressa P. Meirieu, a aprendizagem supõe duas exigências complementares: é preciso que o mestre se adapte ao aluno, se faça epistemólogo de sua inteligência, estando atento às eventualidades de sua história pessoal, e é precisamente porque o mestre terá gasto tempo para isso que ele estará à altura de ajudar o aluno a se superar." (ASTOLFI,1990) Se o aluno é considerado um receptor passivo dos conteúdos que o docente sistematiza, suas falhas, seus argumentos incompletos e inconsistentes serão considerados algo indesejável e digno de um dado de reprovação. Contrariamente, se introduzimos a problemática do erro numa perspectiva dialógica e construtivista, então o erro é fecundo e 61 positivo, um elemento fundamental à produção de conhecimento pelo ser humano. A opção epistemológica está em corrigir ou refletir sobre a tarefa do aluno. Corrigir para ver se aprendeu reflete o paradigma positivista da avaliação. Refletir a respeito da produção de conhecimento do aluno para encaminha-lo à superação, ao enriquecimento do saber significa desenvolver uma ação avaliativa mediadora. O termo acompanhamento, conforme o entendermos, complementa ou não esse significado. Acompanhar pode ser definido por favorecer, e não simplesmente por estar junto a. Ou seja, o acompanhamento do processo de construção de conhecimento implica favorecer o desenvolvimento do aluno, orientá-lo nas tarefas, oferecer-lhe novas leituras ou explicações, sugerir-lhe investigações, proporcionar-lhe vivências enriquecedoras e favorecedoras à sua ampliação do saber. Não significa acompanhar todas as suas ações e tarefas para dizer que está ou não apto em determinada matéria. Significa, sim, responsabilizar-se pelo seu aprimoramento, pelo seu "ir além". De forma alguma é uma relação puramente afetiva ou emotiva; significa uma reflexão teórica sobre as possibilidades de abertura do aluno a novas condutas, de elaboração de esquemas de argumentação, contra-argumentação, para o enfrentamento de novas tarefas. Complementando a análise das falas dos professores, restam- nos duas últimas perguntas apontadas no início deste estudo: Em que medida formaremos um profissional competente sem uma prática avaliativa exigente e classificatória? 62 Será possível alterar a prática avaliativa diante das exigências burocráticas do sistema? Não se deveria começar por alterá- las? Parece-me que a concepção positivista de Educação, aliada a uma função capitalista e liberal da sociedade, reforça a prática avaliativa em sua feição de "competência", através das armas da classificação e da competição. Os professores dizem perseguir uma "Escola de qualidade", sendo exigentes na avaliação; no entanto, contribuem sobremaneira para o afastamento de milhares de crianças e jovens da Escola e da Universidade através do fator de reprovação continuada. Escolas públicas de 1°. Grau iniciam seu ano letivo com dez turmas de 1ª série e, concomitantemente, com turmas únicas de 8ª série (com poucos alunos). Há uma discrepância enorme entre o número de escolas públicas de 1a. Grau e a oferta de vagas no 2°- Grau. A reprovação no vestibular, por sua vez, é maciça, além de ocorrer um alto índice de evasão nos cursos universitários. Esse panorama é representativo de um "ensino de qualidade"? As exigências avaliativas, desprovidas muitas vezes de significado quanto ao desenvolvimento efetivo das crianças e dos jovens, favorecem a manutenção de uma Escola elitista e autoritária. Os pronunciamentos dos professores formam um todo vinculado e consistente em torno de um mesmo significado liberal. No aprofundamento desse fenômeno, proponho a tomada de consciência dos educadores quanto ao sentido da avaliação na Escola. Hoje é difícil até mesmo iniciar essa discussão. Muitos 63 professores nem chegam a participar dessas discussões, porque não se sentem sequer incomodados diante desse panorama. As questões e considerações deste estudo pretendem, justamente, delinear uma investigação que julgo necessária. Ou seja, sobre a força da relação entre concepções do aprender e do avaliar nos três graus de ensino; uma relação que ainda não percebo em sua total complexidade, mas que se refere essencialmente ao descrédito que se estabelece quanto a uma perspectiva de avaliação mediadora devido à postura comportamentalista e conservadora dos educadores. O que busco enunciar é uma necessária investigação no que diz respeito ao significado da avaliação enquanto relação dialógica na construção do conhecimento, privilegiando a feição de mediação sobre a de informação na avaliação do aluno e buscando a compreensão da prática avaliativa dos professores. 64 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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