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Ética e Estética Hedonista

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UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA
 CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS
 
 
 Tarefa de Investigação sobre o Tema: Hedonismo
 Tiago de Kermenguy Serpa Pimentel Ramos
 Luiz Felippe Araujo de Souza
 Ana Beatriz de Melo Pinto
 
 A Ética e Estética Existencial Hedonista
 Orientador: Dr. Joaquim Ramalho
 Porto, 2021
 
 
 
A Ética e Estética Existencial Hedonista
 
 ÍNDICE
1 RESUMO ------------------------------------------------------------------------ 7
2 INTRODUÇÃO ----------------------------------------------------------------- 7
3 PRIMÓRDIO E ESSÊNCIA PRÁTICA DO HEDONISMO --------------- 10 
3.1.1 Primórdios ------------------------------------------------------------------ 10
3.1.2 O Hedonismo Na Era Cristã --------------------------------------------- 12
3.1.3 O Radicalismo Cínico ----------------------------------------------------- 12
3.1.4 A Natureza Pragmática Do Cinismo ---------------------------------- 14
3.1.5 A Ética Hedonista Cirenaica -------------------------------------------- 15
3.1.6 Ética Libertina Cínica E Ética austera Cirenaica ------------------- 17
4 A SABEDORIA EPICURISTA -------------------------------------------------- 18
4.1.1 A Arte De Viver Em Paz E Em Amizade ----------------------------- 18
4.1.2 Influências E Divergências Entre O Hedonismo Cirenaico E O
Hedonismo Epicurista ---------------------------------------------------------- 20
5 IRMÃOS E IRMÃS DO LIVRE ESPÍRITO ----------------------------------- 21
6 GNOSTICISMO ----------------------------------------------------------------- 22
7 ESTOICISMO -------------------------------------------------------------------- 22
7.1.1 A Arte Da Harmonia Existencial -------------------------------------- 22
8 CRÍTICA À DIVERGÊNCIA ENTRE EUDEMONISMO E HEDONISMO-24
9 ÉTICA CRISTÃ E A RADICALIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS ASCÉTICOS - 24
9.1.1 Condenação Do Prazer -------------------------------------------------- 25
9.1.2 Dualismo Platônico ------------------------------------------------------ 25 
11 Crítica À Genealogia Dos Valores Cristãos ---------------------------- 26
12 FILÓSOFOS HEDONISTAS DO PERÍODO ILUMINISTA --------------- 29
12.1.1 La Mettrie ---------------------------------------------------------------- 29
12.1.2. Marquês De Sade ------------------------------------------------------ 30
13 NIETZSCHE E ÜBERMENSCH, COMO POTÊNCIA DE VIDA --------- 30
13.1.1 Nietzsche E Os Passos Para A Felicidade ------------------------- 31
14 MATERIALISMO HEDONISTA ATUAL E A SOCIEDADE CHARVAKA - 32
14.1.1. Crítica Ao Materialismo Hedonista E Consequências Práticas-32
14.1.2. Crítica À Sociedade Atual Charvaka --------------------------------- 34
15 CONCLUSÃO --------------------------------------------------------------------- 35
16 CONSIDERAÇÕES FINAIS ----------------------------------------------------- 36
17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS -------------------------------------------- 38
17.1.1. Obras ------------------------------------------------------------------------ 38 
17.1.1. Artigos / Fontes Científicas -------------------------------------------- 39
 
 Resumo
 O hedonismo é algo de atemporal. Sempre foi, é-lho e nunca deixará de ser. Relacioná-lo a uma filosofia é um atentado contra a vida em si. Tal tentativa faz reduzi-lo simplesmente a mais um sistema de perspetiva; a mais uma coisa do mundo.
 Ser hedonista é sinônimo de ser um verdadeiro ser humano, de ser um apologista à vida, de ter uma mente suficientemente aberta para perceber que tudo é o que é porque nunca deixou de ser como é nem nunca deixará de ser o que é.
 O hedonismo não leva nada de novo à consciência humana, simplesmente, sensibiliza o ser humano a reconhecer essa consciência, há muito tempo perdida; a não se esquecer da sua essência de ser, de si mesmo, perante toda uma décadence que o mundo tem vindo a passar, ao longo dos tempos.
 Com este trabalho propomos demonstrar esse Modus Vivendi do prazer com base nas demais escolas filosóficas existentes, e que ainda o continuam nos corações humanos. Quiçá, fazê-lo relembrar de quem ele é.
PALAVRAS-CHAVE: Hedonismo. Atemporal. Verdadeiro. Prazer. Escolas Filosóficas. Consciência.
 Introdução
 O que é o Hedonismo? Quais, e de que modo as suas raízes se expandiram até ao momento presente? Qual a ética hedonista, e em que medida esta se relaciona a uma estética bela da existência, a uma visão artística do mundo? Quais têm sido as forças opressoras que têm vindo acremente a condenar o ser humano? Em que medida é que a vida vence a morte, e a morte permanece morta e não ressuscita?
Essas são algumas das perguntas a que este trabalho propõe se a responder.
 Ironicamente, para toda uma força criativa subjaz uma destrutiva que, independentemente dos seus efeitos, porventura, avassaladoras sobre a criativa, esta última necessita-a para continuar a ser; para continuar a existir e a acumular mais forças que a tornem mais forte em relação ao poder destrutivo da morte[footnoteRef:1]. [1: Tal como diz Friedrich Nietzsche - “Da Escola de Guerra da Vida - o que não me mata torna-me mais forte.”] 
Tal como a vida necessita da morte para continuar a existir, também uma ética hedonista e simplista sobre a vida necessita do polo oposto, para, em contrabalanço, continuar a sensibilizar o homem à cerca de uma visão puramente estética da existência, visão essa, que desde a era cristã o homem tem vindo a perder; tem vindo a preterir em favor de uma Mentira Santa[footnoteRef:2] dita pelos tschandala[footnoteRef:3]. [2: Significa - Mentira Sagrada, Mentira Sacerdotal, Mentira Bíblica.] [3: Como diz Nietzsche: “A noção de tschandala exprime os degenerados de todas as castas: os excrementos constantemente rejeitados [de Auswurfstoffe in Permanenz], que não cessam de se reproduzirem entre eles; contra eles fala o mais profundo instinto da saúde de uma raça. Ser duro aqui é sinônimo de ser “são”: é o desgosto diante da degenerescência, que acha aqui uma quantidade de fórmulas morais e religiosas…” (FP 14[224] da primavera de 1888).
A noção de tschandala como um abismo ou um esgoto mesmo da civilização é que vai, na verdade, despertar a genialidade de Nietzsche, tornando-se um verdadeiro meio e instrumento pelo qual ele vai interpretar a sociedade judaica da diáspora como um mundo da degenerescência, cuja principal consequência foi o cristianismo, não que os judeus um dia tenham sido verdadeiramente parte da tschandala indiana, e sim que eles tenham exercido o papel de tschandala no interior do Império Romano] 
 Tendo dito isso, com este trabalho, pretendemos demonstrar a tríade histórica que envolve o hedonismo, tríade essa, em que uma das esferas que compõem essa Trimúrti permitiu a fundação dos alicerces ideológicos do hedonismo (Escolas Filosóficas hedonistas, da idade helenística), a que nós a chamamos de impulsos Eros; quanto à outra esfera, espelha a relação de fio da navalha, pela convergência destrutiva, entre duas placas ideológicas, uma aliada às malhas perversas da moral cristã - Cristianismo (impulsos Tânatos), e outra aliada à plena devoção do corpo humano não como uma potência mas como uma realidade - Hedonismo; e, finalmente, uma outra esfera que se faz sentir na atualidade que ainda não encontrou o equilíbrio entre impulsos Tânatos e Eros, ou seja, uma esfera cuja moral de há 2000 anos atrás, moral cristã, permanece ainda à deriva na terra mas de forma ainda mais ardilosae sorrateira e oculta por poderes políticos e poderes sacerdotais; existe mais subtilmente do que antes.
 Torna-se possível, atualmente, traçar uma ética hedonista e uma postura rebelde[footnoteRef:4] perante a vida, que elege o prazer como estética primária da existência e a rebeldia como princípio ético da vida. O verdadeiro hedonista resgata do que é velho e torna lo uma obra de arte nova, ou seja, é o resultado sempre do que se passa no aqui e no agora, sem nunca prescindir nem negligenciar toda uma influência passadista, mas ricamente artística, inerente às escolas filosóficas que estabeleciam um estreito liame relacional entre a ética hedonista e a ética da vida. O verdadeiro hedonista é aquele que conduz a sua própria existência, um artífice na habilidade de conduzir-se, numa tentativa de autorrealizar-se: um ser rebelde e guerreiro na construção de seus caminhos. Ele fá-lo, a partir da sutileza; a partir da elegância e do prazer, fatores esses, a serem conjugadas aos interesses dos outros, no alcance da felicidade universalizante. Autorrealiza-se, subsequentemente, não por um orgulho egoísta, mas pela articulação permanente entre o “eu” e o “outro”, de tal modo, que a individualidade deixa de o ser para um nós se tornar. A sua ideia fixa o seu enfoque numa estética existencial que reverencia o exercício do prazer como força motriz para esculpir a própria vida, com ares elegantes e artísticos. O hedonista, paradoxalmente, tudo é, das influências do passado e nada é do passado, porque se tem consciência das influências vitais das escolas filosóficas que permitiram a construção concetual do hedonismo, ao mesmo tempo não deixa de simplesmente viver o que a vida lhe traz ao momento. [4: Não queremos que o leitor nos interprete erroneamente quanto ao conceito de ser rebelde.
Ser verdadeiramente rebelde significa estar em um estado de tremendo amor pela liberdade - liberdade total, nada menos do que isso. Daí ele não ter qualquer salvador ou messias ou guia ou líder que o faça tornar irresponsável pela vida, em si. Ele não segue ninguém, nem imita ninguém. Certamente ele está condenado a viver arriscadamente, cheio de responsabilidades, mas de uma alegria e liberdade tremendas.] 
Indubitavelmente, o hedonista como rebelde e guerreiro da vida apresenta atitudes resgatas do cinismo grego. “O filósofo cínico carrega em si uma incurável vontade de dizer não, de desmascarar o conformismo através de hábitos. O cínico é a figura emblemática do autêntico filósofo definido como a ‘consciência crítica da (sua) época’.” (Onfray, 1990, p.29). Queremos valorizar o hedonista como aquele cínico ou aquele cirenaico que tenta aniquilar em sua luta quotidiana uma tradição de passividade, abandono da matéria e valorização do sagrado, disseminadas na cultura ocidental pela moral cristã. Valoriza-se a condição existencial do homem ligada a uma maneira estética de ver a vida, calcada mais na alegria e na busca do prazer do que na repetição e na mediocridade. A moral hedonista está, pois, ligada à exaltação da vida enquanto excesso transbordante.
 O hedonismo, busca nos atos conscientes o exercício do prazer enquanto valor moral. Para tal, buscamos na história da filosofia, inserida na primeira parte, em personagens como os cirenaicos, cínicos, gnósticos, epicuristas, pensadores do Livre-Espírito, entre outros; os elementos que possam compor uma moral que não se funda apenas nos prazeres sensíveis ou imediatos, mas nos prazeres mais amplos, onde o Bem é baseado em valores estéticos e artísticos. 
No que diz respeito à segunda parte, consideramos as duas principais fontes de abandono do corpo em detrimento da alma: o platonismo e o cristianismo. 
Quanto à terceira parte, encontra-se em evidência a existência de uma filosofia hedonista no período iluminista tendo em genuína consideração os filósofos Marquês de Sade e La Mettrie.
No que concerne à quarta parte, convidamos o leitor a perceber, mais intensamente, as críticas de Nietzsche a tudo a que permanece escravizado pelas amarras da décadence, como movimento incitado pela dita doutrina cristã. 
Por último relativamente à quinta parte, é estabelecido uma íntima relação entre um genuíno hedonismo, um tanto esquecida e corrompida, e a existência de um pseudo-Hedonismo, ora influenciada pelos jogos políticos materialistas ora influenciada pelos grilhões da Santa Fábula, que resulta na existência de uma sociedade Charvaka e niilista. 
 Propomos, no entanto, que o ser humano se esculpe a si próprio; que seja o seu próprio Deus; que seja o seu próprio criador, baseada numa visão do mundo que busque a elegância e o prazer como forma de esculpir a sua existência e estabelecer o seu estilo, exuberante e alegre como forma de enfrentar o niilismo cristão e contemporâneo.
 
 
 Parte I
Primórdios e Essência prática do Hedonismo
“O descobrimento da moral cristã é um acontecimento que não tem igual, uma verdadeira catástrofe. Quem a coloca a descoberto é uma force majeure, um destino - ele parte a história da humanidade em dois. Vive-se antes dele, vive-se depois dele... O raio da verdade fulminou precisamente o que até então era do mais alto valor: quem compreende o que foi destruído, que veja se ainda lhe resta algo nas mãos”. (Nietzsche, Ecce homo, Por que sou um destino).
“Desfruta e faz desfrutar, sem fazer mal nem a ti nem a ninguém; essa é, creio eu toda a moral”. (Nicolas de Chamfort, Maximes et pensées).
“A felicidade é saúde e para mim a religiosidade é basicamente hedonista. O hedonismo é a própria essência da religião. Ser feliz é tudo. […] A existência é feita a partir de alegria. É a sua própria matéria. A alegria é o material de que a existência é constituída”. (Osho. Amor, Liberdade e Solidão, 2017, p. 198).
1.1 - Primórdios
 O Hedonismo[footnoteRef:5] (conceção de origem grega, hēdonē, prazer), tendo em consideração a representação do estilo de vida e cosmovisão adotada por quem perscruta nesse tal dito modus Vivendi e não simplesmente a de uma mera palavra e/ou doutrina inane de significância empírica na realidade, mas repleta de conceitos, sempre existiu desde as primícias da humanidade. É importante retratar que, implicitamente, o hedonismo ou o eudemonismo, de certa forma, estão presentes no passado dos estudos geográficos e etnológicos, cabendo denotar que estes se manifestam num passado muito mais distante e remoto do que se pensa amiúde e de forma mais perene e estável, temporalmente, do que se crê. [5: A palavra hedonismo deriva do grego edonê que significa prazeroso e ismo que significa doutrina.] 
 Já desde os primeiros povos da humanidade, inseridos na época histórica da antiguidade oriental, povos de organização iniciática tribal como os - mesopotâmicos (4.000 a.C), egípcios (3.100 a.C), fenícios (3.000 a.C), hebreus (2.000 a.C), e persas (2.000 a.C) -, é de notar que, à medida que essas organizações coletivas se iam desenvolvendo quer culturalmente quer moral e eticamente, seria adotado por excelência, mediante meios criteriosos e austeros, uma moral de cariz hedonista que reinava e servia de sustentáculo vital para a categorização do homem, nascida por princípios existenciais à cerca da origem ultrassensível deste.
Pela Bíblia, compreende-se a existência de uma situação de estabilidade entre a noção egípcia da criação do homem, notavelmente hedonista - floreada por um montante infindável de mitos tradicionais de carácter religioso - e a conceção mesopotâmica, cujo ser constatado como renovador (homem) foi criado por finalidade última a suceder os deuses de castas divinas inferiores nos trabalhos agrários entre outros, que agoniados com tais trabalhos ameaçavam, sob coação, uma total rutura[footnoteRef:6] da espécie humana. [6: Cf. «Poema de Atrahasîs», em, Jean Bottéro, Lorsque les dieux faisait l’homme, p.532.] 
 No entanto, como doutrina propriamente dita o hedonismo surgira no mundo ocidental, nomeadamente na Grécia antiga (2000 a.C, inícios do período pré-homérico, a 136 a.C ondemarca a extinção do período helenístico embora os seus efeitos tenham-se sentido ainda no início da Idade Média, apresentando características gregas e romanas), não desde os seus primórdios de fundação política, mas entre aproximadamente 390 a 338 a.C, com a chegada daquela que seria o último período histórico da Grécia antiga (helenismo). Na realidade, o helenismo revelou ser vital para a ascensão de uma nova perspetiva do homem; para a ascensão de um novi hominem no ocidente, visto que com as conquistas de Alexandre os ideias gregos que contemplavam a moral e ética humana com base numa visão estética da existência, foram espalhados pelo mundo e absorvida por todos os povos conquistados.
As éticas helenísticas focam-se no indivíduo não no coletivo, tal como mostra ser o enfoque essencial da ética hedonista sendo que o hedonismo engloba o helenismo e não o oposto, porque é pela unidade individual que é possível a existência de uma unidade coletiva a partir de uma visão ultrassensível dos valores humanos. Elas fundem-se numa visão sábia que realça a efetividade da realização subjetiva: o alcance da cândida consciência; o alcance da tranquilidade do espírito[footnoteRef:7], não obstante das circunstâncias. O bem helenista não mais terá o sentido metafísico do bem de Platão, fundamentado por motivos ideológicos impregnados de ideias e provocador da formação de modelos rivais da existência, modelos esses, que separam o mundo corpóreo do mundo inteligível. O bem das perspetivas de vida helenísticas terá uma aceção unicamente existencial, mas não moralista. Enquadrado a esse período histórico da filosofia, surgem as escolas filosóficas – epicurismo, cirenaísmo, estoicismo, cinismo, e ceticismo –, entre outras correntes ideológicas, surgidas depois do ano 0, de teor moral absurdo e irracional para a mente atual, pelas práticas tribais arbitrárias à lógica humana como o gnosticismo, ou tremendamente libertinas como os irmãos do livre espírito. Essas escolas filosóficas espelham uma nova forma de ser e viver, livre de proibições sociais externos que sirva como que um entrave à sua felicidade. [7: Em última instância, a finalidade última seria atingir o estado de nirvana, estado anorgânico de ser.] 
 Pela radical aproximação e convergência entre a mundividência cirenaica e hedonista, Aristipo de Cirene fora constatado o predecessor do hedonismo, cujas certas ideias serviram de base para a construção de um Epicurismo “moderado”, por Epicuro.
 
1.2 - O Hedonismo Na Era Cristã
 À era cristã advém o nascimento de uma tradição moral deveras crítica e absurdamente intransigente em relação à ética do prazer da “carne”. Gradualmente, à medida que a doutrina do cristianismo se vai proliferando por todo o ocidente como um “cancro metastático”, vai-se perdendo a essência moral e toda a virtu da matéria e do prazer, e em contrapartida há a instauração do ideal ascético e por conseguinte a real décadence, principalmente na Europa. Essa tal dita décadence resulta na supervalorização, tal que se torna doentia, do não material / transcendental em detrimento do material e consequentemente da desvalorização de toda uma biologia humana que marca o homem como um ser biológico. Essa força opressora doentia de carácter sacerdotal acaba por levar à existência de uma arbitrária autoridade sacerdotal sobre qualquer heresia prevalecente, sendo que por força de hábito os hereges sofriam recorrentes perseguições por parte da igreja, interessada em aniquilar qualquer forma de heresia.
A Patrística e o pensamento cristão na era cristã tiverem um papel relevante nas difamações que a ética hedonista sofrera, já que este foi fortemente alvo de calúnias e injúrias, embora as práticas hedonistas sempre tivessem existindo, tendo provocado falhas e rebeldias no pensamento filosófico que parecem ser irremediáveis.
Segundo Michel Onfray (1999), “O hedonismo é uma gargalhada, um parti jovis, alegre em meio à austeridade geral: Aristipo contra Platão; os cirenaicos contra epicuristas; Simão, o Mago, contra Agostinho, o Santo; os gnósticos contra os padres da igreja. A contra moral jubilosa insere-se sempre na perspetiva de um combate contra os defensores da morte, da renúncia e do ódio aos sentidos” (p.252).
Essência prática do Hedonismo
1.3 - O Radicalismo Cínico
 Começamos por esta vital escola socrática menor: os cínicos[footnoteRef:8]. Nenhuma outra escola filosófica foi mais drasticamente revolucionária e antagonista à ideia de cidade-estado e dos valores normativos e sociais que a Escola Cínica. A palavra cínico, é aplicada pela primeira vez talvez para se referir ao seu possível fundador Diógenes, o cínico mais insigne que praticava uma peculiar lógica sábia e por vezes absurda como um método engenhoso para quebrar a maneira habitual de pensar e as barreiras da mente. Não obstante de os cínicos não terem administrado qualquer ensino acadêmico à maneira platônica, aos olhos de Pierre Hadot [footnoteRef:9]compunham uma escola de ensino ideológica, pela presença de uma relação notável entre mestre e discípulo. Para este autor, ao longo de toda a Antiguidade era comum considerar o cinismo uma filosofia na qual o discurso filosófico era reduzido ao mínimo. [8: Deriva do grego Kynismó e do latim cynismu, que significa “cão”.] [9: HADOT, Pierre. Op. cit] 
 A ideia central do cinismo é, indubitavelmente, a mais antiética e anti cultural das conceções filosóficas da Grécia Antiga - Diógenes declarava que toda a pesquisa filosófica abstrata e teórica é fútil para levar o homem à felicidade. A essa conceção relaciona-se a sua tão célebre “procura pelo homem”. Para Fraile (1965), Diógenes usava a ironia e o sarcasmo, tal como muitos sofistas, como meio para por à prova os padrões sociais de sua época. Conta-se que Diógenes saía de dia, pela cidade, com uma lanterna na mão, afirmando procurar um “homem que fosse justo”. Alegoricamente, ele tinha como objetivo achar um ser humano que vivesse a sua vida naturalmente, não que necessariamente escapasse às convenções e ditames sociais, mas que adotasse uma postura estoica para com tudo aquilo que procurasse corroer a sua própria essência de ser, como um ser humano. Seria condição vital para ser alcançada a verdadeira felicidade.
De acordo com Diógenes, “quanto mais se eliminam as necessidades supérfluas, mais se é livre”[footnoteRef:10]. Tal liberdade manifestada pelos cínicos aplicava-se em todos os sentidos: liberdade da palavra, pois diziam o que queriam da forma que queriam e quando queriam, sendo considerados, por isso, arrogantes; e liberdade da ação, pois faziam o que queriam, onde queriam e diante de qualquer pessoa. [10: O excerto a seguir proporcionará uma visão mais clara à cerca do modo de viver e de pensar dos cínicos: “Costumava fazer qualquer coisa à luz do sol, mesmo o que diz respeito a Demeter e Afrodite (comer e amar). [...] Se comer não é estranho, nem mesmo na praça pública é estranho. Não é estranho comer; portanto, também não é estranho comer na praça pública. [...] Costumava masturbar-se em público e dizia: quem me dera pudesse aplacar a fome esfregando-me o ventre.” (DIÓGENES, Laércio. VI, 69).] 
 A filosofia cínica é essencialmente um estilo de vida, a escolha da liberdade, da total independência e emancipação das necessidades fúteis, a recusa do luxo, da volúpia e da vaidade. “Essa escolha implica, de maneira evidente, certa conceção de vida, mas ela, provavelmente definida nas conversas entre mestres e discípulos ou nos discursos públicos, jamais é justificada diretamente nos tratados filosóficos teóricos.”[footnoteRef:11] [11: Ibid., págs. 163/164.] 
O prazer era desprezado pelos cínicos pois este não tão somente debilita o físico como escraviza e manipula o espírito, pelo apego e dependência que o homem nutre para com o objeto de apego. Assim sendo, os cínicos viam como ideal de vida a ser alcançado a autonomia a partir de uma atitude de autossuficiência para com a vida, ou seja, cada um ser como é, porque nunca deixou de ser como é nem nunca deixaráde ser como foi e é.
Segundo Fraile (1965), a essência ontológica cínica renegava os conceitos universalizantes e verdades ditas universais, respeitando simplesmente a realidade do particular e do concreto. Os sentidos são os únicos meios possíveis para a dualidade homem-realidade se concretizar, pelo modo como o homem perspetiva sensorialmente a realidade, no aqui e no agora. Pela impotência existencial dos pensamentos na capacidade expressiva e subsequente incapacidade em transmitir vivamente a realidade, estes não fornecem informações precisas sobre os fenómenos, sendo preteridos pelos cínicos.
Para Bréhier (1978), os cínicos não se cingiam numa transformação pessoal, mas antes numa transformação interpessoal, por um amor próprio que se faz refletir nos outros e não por um orgulho pessoal; por um orgulho egóico.
A principal contribuição cínica, encontra-se na malha da moral. O Bem[footnoteRef:12] era o fim prático para se atingir a felicidade, e para tal, dever-se-ia levar uma vida serena e tranquila à merce do exercício da virtude. [12: A noção de Bem, encontra-se interrelacionada com todo um estilo de vida empregues por estes, estilo de vida esse, atrelada a um esforço de renúncia e desprezo às obrigações que as sociedades impõem. Já o mal é entendido como tudo aquilo que produz prazer desnecessário, prazer esse, dependente à satisfação menor das necessidades sociais, relacionadas aos prazeres convencionais resultantes da vida civilizada. ] 
 
1.3.1 - A Natureza Pragmática Do Cinismo
 Na ética hedonista de Michel Onfray, é possível perceber que no desenvolvimento do seu dito “materialismo hedonista”, este apoia-se substancialmente em Diógenes e a sua postura licenciosa e libidinosa que desprezava o ascetismo de Platão. Esse tipo de hedonismo, entrecruza-se com a experimentação prática de Diógenes e o seu esforço individual por tornar-se um ser feliz, uma solene forma de atuar no quotidiano, como é representado:
 “Atuar de modo cínico significa formar a existência como uma obra de arte: dotar de volume, superfície, natureza, densidade, consistência e harmonia o cotidiano, para, desta forma, transfigurá-lo. A vida deve ser querida, pensada e desejada da mesma forma que um artista dedica toda a sua energia a produzir um objeto único e não duplicado”. (ONFRAY, 1999, p.60).
Intemporalmente falando, para os cínicos todo o desapreço pelo que é estabelecido socialmente como modelo a ser seguido vem da pura compreensão de como toda uma dita “organização social” torna o homem infeliz, dado que o deixa apegado e condicionado a uma teia de obrigações e condutas que deve seguir, senão quer ser penalizado, quer consciente quer inconscientemente. Com finalidade a escapar de tais imposições arbitrárias, ou melhor dizendo, imposições evasivas e ofensivas para a individualidade humana embora ironicamente legalizadas por meios ilegais, o cínico valoriza a diferença, acima de tudo. Subsequentemente, a preocupação do cínico é com a postura idiossincrática que tem ante a realidade, estabelecendo com isso seu “pai nosso de cada dia”. Logo, os cínicos defendem uma dada transvaloração dos valores[footnoteRef:13], recusando a pátria, as leis, a família e as diferenças de classes (Fraile, 1965). [13: A transvaloração dos valores concerne a uma reavaliação do modo como perspetivamos a moralidade declarada principalmente pelo cristianismo. 
A cultura ideológica é necessária à formação do Übermensch, um importante conceito na obra de Nietzsche descrito no livro Assim falou Zaratustra.] 
 O interesse deste trabalho no que diz respeito aos cínicos, é ter demonstrado a presença de uma postura afirmativa e rebelde diante da vida. Mostrar a convergência entre a ética hedonista e uma atitude libertária e inconformada.
1.4 - A Ética Hedonista Cirenaica
 Aristipo de Cirene (c. 435-355 a.C), discípulo de Sócrates, apesar de ter aprendido diretamente, por uma relação mestre-discípulo, à moda sofista, com os ensinamentos ditos a priori de Sócrates converteu-os, digamos, numa abordagem tendencialmente a posteriori, por uma base de mundividência idêntica à que apresentara Sócrates.
Este preferia as virtudes dionisíacas do riso, a celebração em comunhão da vida e a libertinagem. Com a fundação da escola cirenaica orientada para o modo de vida hedonista, haveria uma predestinação para o futuro epicurismo, que ficaria famoso pela defesa do prazer como ética. O alicerce do pensamento essencial de Aristipo retrata um materialismo, com profundas raízes em Heráclito e no sofista Protágoras.
Segundo Bréhier (1978), a sua doutrina[footnoteRef:14] é de difícil composição restringindo-se a ínfimos documentos provenientes de Diógenes Laércio, excertos restritos do epicurismo entre outros poucos escritos. Portanto, a partir das suas reflexões filosóficas, desenvolvera-se a escola cirenaica[footnoteRef:15]. [14: É verdade, no entanto, que em alguns textos de Platão e de Aristóteles, acredita-se haver alusões a Aristipo. Ora, esses excertos subdividem-se em duas categorias: os do Filebo, da Ética a Nicômaco, da República, em que se critica intensamente a estética hedonista, e Teeteto, em que Platão revelaria, através de Protágoras, a doutrina cirenaica. (E.Bréhier, 1978). ] [15: Escola filosófica fundada por Aristipo, que consiste em professar e declarar a mais radical manifestação do hedonismo, ou seja, a total afinidade entre o prazer e a virtude (ou o bem).] 
 Para Fraile (1965), todo o edifício de conhecimento cirenaico encontra-se apoiada por uma doutrina do Bem[footnoteRef:16], onde defendem um hedonismo radical. [16: Neste sentido, o prazer verdadeiro, essencial, é efetivamente um estado que só o sábio, ser de exceção, pode sentir. Ele gozá-lo-á no meio de pretensas tristezas, tal qual no meio de pretensas alegrias. Não existe aí, para ele, senão ocasiões contingentes de se elevar ao bem verdadeiro. Esta noção se remete ao excesso: a total libertação, que tornaria o sábio sempre superior às conjunturas, sempre capaz de as impedir de tomarem a dianteira e de entravarem a sua liberdade. (A moral Antiga - Leon Robin, 1970).
] 
Correspondentemente à ética de vida dos cirenaicos, estes defendem que as sensações corporais são o único motor de regulação de uma vida livre e prática, sendo dividias entre - sensações agradáveis, desagradáveis e intermediárias. Selecionam-se as primeiras, em detrimentos das segundas e como resultado, as terceiras mantêm-se numa posição de indiferença, por não provocarem nem dor nem prazer. Sucintamente retratando, o homem virtuoso busca prazer por meio da “carne” a partir de uma cosmovisão doce, ligeira e suave em que a dor se encontra diminuída o máximo, não só para o “eu” pessoal, como de igual modo sem esquecer a presença de um “outro”[footnoteRef:17]. [17: Convergência com uma moral utilitarista.] 
O prazer só o é no momento presente, experimentado em movimento no agora e distanciando-se do passado pela memória ou do futuro através da imaginação. Os prazeres corporais são os mais intensos, logo equitativamente são os mais desejáveis pela sua vitalidade no enriquecimento da qualidade da vida humana. Os cirenaicos simplesmente mantinham o seu enfoque nas finalidades de uma ação sendo que desprezavam os meios e/ou origens de obtenção do prazer, constatada, portanto, virtuosa se prazerosa ou o oposto se dolorosa. O prazer não só é o bem, em si, como de igual modo é a manifestação de todas as ações virtuosas.
Pelo apoio do prazer como uma visão e ética da vida, Aristipo defendia que a vida devia ser vivia a fim de o homem concretizar a sua finalidade última, que era o gozo do prazer imediato. Seria constatado que os prazeres morais e espirituais, da alma, seriam simplesmente moralidades corporais ou prolongamentos dos prazeres corporais do hedonismo.
Aos olhos de Aristipo, o sábio deveria acomodar e desapegar-se às variadas circunstâncias da vida já que tudo é contingente e transitório, sendo que este devia viver a sua própria vidanão permitindo que ninguém mais “viva por ele”, através dos tais ditos ditames de ordem social.
Conceções dogmáticas da essência existencial das coisas defendidas pelas tradições e normas sociais é desprezado e posto em causa pelos cirenaicos dado que estes defendem que nada por natureza se limita a um rótulo objetivo, sendo que por exemplo nada é por natureza justo ou injusto, tal como as convenções sociais querem fazer parecer. Opostamente à opinião pública dos leigos, na verdade, existe uma conceção moral racional intimamente aritmética da vida, praticada pelos cirenaicos, ligada à prática dos prazeres, a fim de estes serem manipulados prudentemente. Portanto, tal conduta teórica de vida é somente aplicada por modos utilitaristas, de cálculo, a fim de discernir a cada momento os prazeres que possam conferir maior satisfação dependentemente das circunstâncias existenciais a cada instante. Por consequência, o sábio deve apresentar a digna capacidade em controlar e regular os prazeres, sem que estes o dominem.
 Em súmula, há que enfatizar que a ética suportada pelos cirenaicos condena a entropia, a inércia, os ditos impulsos tânatos que provocam e aguçam a dor, dizendo um alto “sim” à vida e um acentuado “não” a tudo aquilo que a ponha em causa. Dessa forma, neste trabalho pretende-se resgatar as forças positivas e movimentos revolucionários dos cirenaicos, em que o bem viver constitui o mais alto valor.
1.4.1 - Ética Libertina Cínica E Ética austera Cirenaica
 Ora, na verdade, a máxima da doutrina cirenaica consiste na autorrealização mediante contacto direto com a experiência prazerosa, cujo epíteto que melhor o define é - “conhece-te a ti próprio”[footnoteRef:18], que compõem um claro exemplo de egocentrismo utilitário. [18: Na realidade, toda a filosofia parte da inscrição que os sete sábios deixaram no frontispício do templo de Delfos - “Conhece-te a ti próprio”. Típico epíteto proveniente de uma mente grega, cuja paixão máxima é a do conhecimento, sabendo que foi a mente grega a responsável pela produção de todo o conhecimento científico.] 
Constatava-se que o critério da verdade é a sensação, sensação essa, que dependentemente dos momentos de sensação conduziria ao sujeito à verdade dessa realidade, embora apreendida não objetivamente, mas pela impressão imediata que estes obtêm da realidade circundante. A finalidade última do homem revelar-se-ia, por uma conduta puramente cirenaica, o alcance a estados de prazer a partir da experiência de acontecimentos momentâneos que satisfaçam as suas necessidades biológicas, e não propriamente a de um estado de felicidade, pela impossibilidade de esta existir sem coexistir com momentos que a contrastem. Valorizavam o prazer do instante, sendo o presente a única categoria de tempo existente. Aristipo dizia:
 “só o presente é nosso, não o momento passado nem aquele que aguardamos, porque um já está destruído e o outro não sabemos se existirá.” (in abbagnano, p.119)
 Aceitar o prazer do instante era, a via da virtude. Aristipo pôs em destaque do ensino de Sócrates a condição imperativa de auto governação e de procura do bem.
 Contrariamente, o objetivo último da vida segundo os cínicos[footnoteRef:19] seria torná-la serena e racional a fim de a tornar virtuosa; a fim de imperar a dita virtu nela, a partir do domínio das paixões e dos desejos. A virtude era o maior bem possível, pois quem assim a adotasse como reguladora de vida, não era submisso a convenções sociais, tal como seria a grande pretensão dos cirenaicos. [19: A escola dos cínicos foi prolongada, nos primórdios do século III, enquadrada no estoicismo de Zenão de Cítia.] 
No entanto, os cínicos defendiam que o prazer seria um mal porque serviria como que uma distração ou um pretexto social organizado para afastar o homem da verdadeira essência da vida, ou seja, a virtu. O sábio deveria ser autossuficiente, vivendo com o indispensável, a partir do seu desprezo contra todas as manifestações que apresentem origem social, mesmo que algumas dessas ditas manifestações de ordem social atribuem estados de prazer vólucres.
Antístenes costumava dizer:
 “Antes queria ser louco do que gozar.” 
 (in abbagnano, p.116)
1.5 - A Sabedoria Epicurista
1.5.1 - A Arte De Viver Em Paz E Em Amizade
 Você prefere ser feliz ou ter razão? Muitos respondem que preferem ser felizes, mas passam a vida inteira tentando ter razão. 
 Muitos filósofos aventuram-se na busca pela felicidade, mas a necessidade de ter razão é mais forte do que eles. Por volta do seculo 4 a.C. existiu um filósofo bastante excêntrico, Epicuro, o fundador do Epicurismo, provavelmente a escola mais difamada e mal compreendida da filosofia. “Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou ou que ela já passou, é como se dissesse que ainda não chegou ou que já passou a hora de ser feliz.” - Epicuro. 
 Para Epicuro procuramos a felicidade no lugar errado, nos luxos, no poder, na riqueza e no status. O caminho para felicidade é muito mais simples, do que nos é explícito nas faces da política; tenha muitos amigos e valorize as suas amizades e tenha bastante tempo para se dedicar à filosofia e a si mesmo. Mas ele não evitava discussões por volta do que dizer, muito pelo contrário, consta que ele teria escrito mais de trezentos livros que não sobreviveram até os dias de hoje. O que ele não queria era ficar discutindo o tempo todo tentando consertar uma sociedade hipócrita, em troca de sua paz, sem chegar a algum lugar. Em vez de sair por ai tentando ensinar pessoas que não querem aprender e dialogar com pessoas que não querem dialogar, ele decidiu aplicar a sua filosofia na própria vida. E assim, fazer da sua experiência um verdadeiro exemplo para as próximas gerações. 
 Então, ele se mudou para uma grande casa, logo na saída de Atenas com vários amigos. Esse lugar ficou conhecido como “O Jardim de Epicuro”. Ninguém trabalhava além do necessário para a manutenção da própria comunidade. Cada um tinha o seu espaço particular, e eles passavam bons tempos juntos filosofando nas áreas de convívio e Epicuro lecionava no jardim. De acordo com o Epicurismo, o bem maior e a busca fundamental do ser humano, é o prazer. O Prazer Epicurista é, antes de qualquer coisa, a ausência de dor. Mas tendo isso resolvido, ele é muito pouco focado em maximizar as experiências sensoriais pela sua natureza passageira e bastante breve. O foco mesmo são os prazeres da alma, a filosofia, a amizade, a diversão e os bons momentos. Tudo que dura dentro de nós indeterminadamente. 
 A comunidade de Epicuro não tinha uma boa fama perante a sociedade Ateniense. E ainda aceitar escravos e mulheres como membros sem distinção hierarquica não ajudou muito essa fama. 
 O cerne do Prazer Epicurista não provem de orgias. É um prazer moderado, se encontra nas coisas simples e deve trazer o mínimo possível de consequências negativas. 
Ele dizia “Nenhum prazer é, em si mesmo, um mal, mas aquilo que produz certos prazeres acarreta sofrimentos bem maiores do que esses prazeres.” - Epicuro. Por exemplo, álcool e ressaca; drogas e dependências; sexo, sem proteção, e DSTS; comida em excesso e obesidade; etc. O objetivo final é alcançar um estado de Ataraxia (ausência de perturbações) e de Aponia (ausência de medos) e daí, surge o Tetrapharmakon, ou os quatro remedios da alma: 
 Não tenha medo de Deus. 
 Para Epicuro, os deuses gregos eram loucos. Pois viviam se metendo na vida dos mortais, causando desastres ambientais e interferindo nos resultados das guerras. Na logica dele, os deuses se preocuparem com os humanos é como os humanos se preocuparem com as formigas. E disso Epicuro desenvolveu o Paradoxo de Epicuro. 
 • Paradoxo de Epicuro: 
 
 Deus está disposto a prevenir o mal, mas não é capaz? 
 Então ele não é onipotente (todo-poderoso).Ele é capaz, mas não está disposto?
 Então ele é malévolo.
 Ele é capaz e está disposto?
 Então de onde vem o mal?
 Ele não é capaz nem está disposto?
 Então por que chamá-lo de Deus?
 Não é que Epicuro não acreditasse em uma figura divina, ele só dizia que eles são deuses e que eles não sentem emoções que nós mortais sentimos. Para ele, os deuses não se metem em nossas vidas. Para ele, nós temos livre-arbítrio e a felicidade, as conquistas e desgraças dependem, exclusivamente, de nós mesmos. “É tolice um homem orar aos deuses por aquilo que ele tem o poder de obter por si mesmo.” - Epicuro.
 Não se preocupe com a morte.
 Na logica de Epicuro, se você deixar de existir não sobrarão sentidos e se não existirem sentidos não tem como sofrer. Sobre isso Epicuro diz “A morte não é nada para nós porque enquanto existirmos, não existe a morte; e quando existe a morte, já não existimos mais.” - Epicuro.
 
 
 O que é bom é fácil de ser alcançado.
 Se o prazer é alcançado pela ausência de dor, então em vez de se fartar em um enorme banquete, Epicuro acreditava que era a simples ausência de fome que constituía o real prazer. Ele se alimentava quase exclusivamente de pão e água, podendo beber uma taça de vinho e comer um pedaço de queijo no auge do esbanjamento. Como ele disse “Nada é suficiente para o homem, cujo suficiente é muito pouco” - Epicuro.
Quanto mais desejarmos, mais perturbações teremos. Parece contraditório, mas se o seu desejo é moderado você poderá aproveitar os prazeres em abundância. Entretanto, se o seu desejo é abundante ele nunca será satisfeito por completo. 
“A riqueza exigida pela natureza é limitada e fácil de obter, mas a riqueza exigida por vãos ideais se estende ao infinito.” - Epicuro.
 O que é terrível é fácil de ser suportado.
 Ao decorrer da sua vida, Epicuro teve uma saúde muito frágil. Essa condição fez com que ele entendesse como suportar momentos de muito sofrimento e concluir que a dor na maioria dos casos, quando é aguda, não é duradoura e quando é crônica se torna suportável. Mesmo sob extrema dor, as lembranças dos prazeres da alma podem garantir a felicidade. Nos seus últimos dias de vida, ele escreveu uma carta ao seu amigo Meneceu, que ficou conhecida como “Carta Sobre a Felicidade” na qual ele contava que sofria de uma dor extenuante nos rins e no estômago e que mesmo assim se sentia feliz por lembrar de todas as conversas filosóficas que partilhou com o
amigo. Ao decorrer dos anos, o Epicurismo tem vindo a ser construído e desconstruído, difamado e caluniado, em virtude do desentendimento colossal, por uma sociedade ironicamente instruída. 
Às vezes, pela simples associação ao prazer, o Epicurismo leva uma fama enviesada de um Hedonismo sem ponderação que é algo totalmente contrário a sua filosofia. Mas vale pensar no quanto podemos aprender com os seus reais ensinamentos, que redirecionam a nossa atenção no que importa de fato e falam diretamente com os
dias de hoje. Que curam os males da alma, nos livram dos medos irracionais e nos botam no caminho certo em direção a felicidade.
“Eu nunca quis agradar as multidões; pois aquilo que eu sei, elas não aprovam, e aquilo que elas aprovam, eu não sei.” - Epicuro.
1.5.2 - Influências E Divergências Entre O Hedonismo Cirenaico E O Hedonismo Epicurista
 Efetivamente, há que perceber o desempenho vital que a escola cirenaica obteve no processo de influência na construção ideológica da escola epicurista, pois ambas reconheceram que o prazer deve ser preferido em detrimento da dor. No entanto, claramente, que a conceção de hedoné (prazer) na doutrina filosófica epicurista não consiste num clone literal da cirenaica, já que a dimensão e abrangência de complexidade concetual por parte de Epicuro na formulação do seu hedonismo, é maior.
 Como já se pode ter depreendido do contexto que até aqui tem vindo a ser retratado relativamente à escola cirenaica, estes simplesmente concebiam o prazer em movimento, “sendo o prazer um movimento suave e a dor um movimento brusco”. Segundo os cirenaicos não haveria a existência de prazeres maiores e de prazeres menores, sendo consequentemente a sua busca indistinta, em que a dor seria um mal a ser evitada a todo o custo.
 “[…] dois estados de alma - o prazer e a dor -, sendo o prazer um movimento suave, e a dor um movimento brusco. Um prazer não difere de outro prazer, nem um prazer é mais agradável que outro; todos os seres animados aspiram ao prazer e repelem a dor.” (LAÊRTIOS, 2008, p.69)
 Em oposição, Epicuro contesta parcialmente os cirenaicos na medida em que a sua conceção de prazer sustenta-se em maior grau no prazer estável (catastemático), um prazer maior de carácter ascético, pois quando cultivado pelo ser leva-o a estados substanciais de tranquilidade mental, em que, por subsequência, provoca a libertação da dor no corpo. Já o primeiro estado de prazer, o prazer menor; o prazer em movimento, segundo Epicuro, é condição vital para a existência do segundo.
Logo, o prazer passageiro, ou seja, o prazer cinético / prazer menor deve levar à origem de um outro tipo de prazer, mais duradouro (prazer catastemático / prazer maior) que produza um equilíbrio necessário para uma vida feliz.
1.6 - Irmãos e irmãs do livre espírito
 A expressão "Livre Espírito", foi inventada pela Igreja. Enquanto a igreja ensinava a pobreza para os seus fiéis e para o clero, os irmãos e irmãs do livre espírito celebram os prazeres e uma sexualidade livre. 
Onfray, esteve interessado nesta corrente hedonista. Nesta teoria não aceitam o ascetismo cristão, acusando-o de desprezar o corpo e o prazer, e são a favor do júbilo corporal, como se fosse um prazer a nível da “carne”, ou seja, um prazer corporal. 
De facto, o corpo é um instrumento de salvação, onde o que é importante é o prazer simples e puro. 
Assim, os irmãos e irmãs do livre espírito interessavam-se pela satisfação do corpo, dos sentidos e da matéria. 
1.7 - Gnosticismo 
 A palavra gnosis[footnoteRef:20], quer dizer conhecimento e baseia-se na experiência religiosa, porém nem toda essa experiência resulta do conhecimento gnóstico. [20: Livro publicado em 1916, por Carl Gustav Jung.] 
No século XVII, o termo gnosticismo foi usado, pela primeira vez, em França, para ofender uma religião unificada. Porém, alguns autores (cf. Ibid) questionam a existência do gnosticismo como um único movimento religioso. Por outro lado, a este conceito acrescentou-se um sentido religioso, que fazia mais referência à fé do que propriamente à razão.
 Existem vários autores que têm a sua opinião sobre o gnosticismo. Van Baaren, Jung e Onfray são um dos autores. 
Segundo Van Baaren (cf. In Bianchi, 1966) o gnosticismo consiste num conjunto de elementos, em que cada elemento funciona de uma maneira específica.
A psicologia e o gnosticismo podem estar relacionadas. Jung, era um psiquiatra suíço que fundou a psicologia analítica e mostrou interesse no gnosticismo. Escreveu o livro Septem Sermones ad Mortuos (1916) onde explica que a "poesia expondo certos psicólogos", expressada num estilo gnóstico, ou seja, Jung considerou que os gnósticos foram os primeiros a demonstrarem os fenómenos inconscientes. Por fim, para Jung a importância do gnosticismo estava relacionada com a forma de que a mensagem cristã foi acolhida. 
 Por outro lado, Michel Onfray também estava relacionado com o gnosticismo. Segundo Michel Onfray, as práticas orgíacas faziam com que os gnósticos reencontrassem o seu corpo, pois o corpo é feito para a libertação e deve ser usado para tal. 
 Os barbelognósticos, eram gnósticos que estavam relacionados com a gastronomia e que usam o corpo para uma aproximação a um ser divino. Eles viam o corpo como algo que devia ser aproveitado e livre, ou seja, podiam fazer o que quisessem com o corpo, desde que lhe dessem prazer. 
De facto,os barbelognósticos não aceitavam e criticavam qualquer tipo de união, desde o casamento à família, pois impedia as orgias e limitava o prazer. 
 Por fim, uma corrente filosófica que era constituída por gnósticos licenciosos, ou seja, celebram o prazer e a orgia como uma comunhão com um ser divino. Viam o corpo como um elemento de alegria e, por outro lado, o adultério e o sexo eram vistos como um privilégio de uma aproximação a um Deus supremo. 
 Assim, verifica-se que o corpo é um elemento principal para os gnósticos e sem ele a sua filosofia não existia, pois deve ser usado para o prazer.
1.8 - Estoicismo
1.8.1 - A Arte Da Harmonia Existencial
 Os problemas que mais nos afligem são problemas do dia a dia, as contas para pagar, os desejos mundanos, as incertezas da vida e os anseios do coração. Entretanto, poucos pensariam em buscar respostas para essas angústias na filosofia. E de fato, a filosofia fez fama por se ocupar com questões grandiosas e acabar por muitas vezes se distanciando da vida real. O Estoicismo fala justamente o contrário. Sêneca escreve “Existem erros cometidos, por culpa de nossos conselheiros, que nos ensinam a debater e não a viver; há também erros cometidos pelos alunos, que vêm aos seus professores para desenvolver, não suas almas, mas sua perspicácia. Assim filosofia, o estudo da sabedoria tornou-se, filologia o estudo das palavras.” 
 O foco do Estoicismo é a vida real, que serve para toda e qualquer pessoa e que seja tão aplicada a mais de dois mil anos atras como nos dias de hoje. Dois dos maiores nomes dessa filosofia são Marco Aurélio, imperador romano e homem mais importante de seu tempo, e Epicteto, um escravo aleijado. Dois extremos que só se encontram por causa do terceiro grande nome do Estoicismo, Sêneca. Ele foi um dos maiores intelectuais do império romano. 
 O peso da liderança, o sofrimento da escravidão, o desespero da decadência e o medo da morte. Não parecem problemas diferentes dos que enfrentamos atualmente. Mas como os Estoicos lidavam com essas dificuldades e todas as outras que a vida nos apresenta? “Não é o que acontece com você, mas é como você reage que importa.” - Epicteto. 
 Uma das principais lições do Estoicismo é diferenciar a experiência externa, ou as coisas que estão fora da nossa mente, da experiência interna, ou as nossas interpretações e reações a experiência externa. Basicamente, é o mesmo que separar o que podemos controlar daquilo que não podemos controlar. Para então gastarmos a nossa energia somente com o que podemos controlar. Não importa o quanto nos esforcemos, nunca teremos total controle sobre os eventos externos. A perceção que os outros têm de nós, a nossa posição no mercado de trabalho e até a nossa saúde. Marco Aurélio escreve “A felicidade da sua vida depende da qualidade de seus pensamentos”. 
 Os Estoicos eram claros quando diziam que o que deve mudar é o nosso processo interno. Não podemos fugir de nós mesmos, a qualquer lugar que fomos iremos nos encontrar. Mas será que temos como achar a paz de espírito independentemente das condições externas não importando o quão adversas elas sejam? De acordo com Epicteto sim. Na citação que talvez seja a mais dura e difícil do Estoicismo, mas que melhor resume os ensinamentos dessa filosofia, ele diz “Doente e ainda assim feliz, em perigo e ainda assim feliz, morrendo e ainda assim feliz, no exílio e ainda assim feliz, na desgraça e feliz.” 
 É importante ressaltar que o Estoicismo não defende a inação perante as injustiças, ou a simples aceitação passiva dos males que vierem. Sêneca por exemplo, defendia o tratamento humano dos escravos na sua época e Marco Aurélio teve de liderar um dos maiores impérios da história do mundo tomando decisões importantes durante uma época conturbada por guerras e pela peste antonina. Mas eles acreditavam que para gerar mudanças positivas nos outros era necessário primeiro cultivar as quatro virtudes estoicas: 
 
 1- Coragem; 
 2- Justiça; 
 3- Autocontrole; 
 4- Sabedoria. 
 E mesmo que o patamar moral e ético pareça alto demais, isso não deve ser um problema. Epicteto mesmo disse que nunca viu um estoico completo. Ser um estoico em formação já é o suficiente, não devemos nos preocupar com a perfeição.
1.9 - Crítica à divergência entre Eudemonismo e Hedonismo
 Em termos conceituais e etimológicos é, na verdade, possível distinguir o eudemonismo[footnoteRef:21] do hedonismo, no entanto, será que o é no que tange à vida prática e no modo como estes balizam os indivíduos no seu dia-a-dia? Será que o dito a priori condicionará o a posteriori a tomar o seu próprio rumo? [21: Do grego eudaimonismós, felicidade.] 
 Na realidade, as aplicações dos prazeres são diversas e subentende a existência de uma subtil arte de viver que converge, em última instância, em uma verdadeira arte de como viver a vida. Somente através de olhos coloridos por uma sabedoria verdadeiramente hedonista, permite fazer da panóplia dos prazeres uma clara potência de vida, ao passo que o seu oposto, a ausência ou renuncia dos prazeres a partir da defesa de ideologias supersticiosas e/ou infundamentadas, leva à conversão das pulsões de Eros em pulsões Tânatos. 
 Ora, se em alguém as pulsões de Eros palpitam desde o seu plexo solar a percorrer todo o seu organismo, por uma celebração empenhada entre o ser e toda uma consciência cósmica que o envolve, é impossível pensar o prazer e as suas implicações éticas sem concebermos a sua estreita relação com a felicidade.
 Convido, portanto, a não vermos o hedonismo como que se fosse uma ilha independente do arquipélago ou do oceano, sendo que o hedonismo, de facto, constitui uma parte do oceano designado de eudemonismo.
Separar a felicidade do prazer é tão impossível como separar a luz da cor, sendo que o prazer segue a felicidade tal como a sombra segue o homem.
 Parte II
2 - Ética Cristã e a radicalização dos princípios ascéticos
“Não ouvimos o barulho dos coveiros a enterrar Deus? Não sentimos o cheiro da putrefação divina? - também os deuses apodrecem! Deus está morto! Deus continua morto! E nós o matamos!” (Nietzsche, Gaia Ciência, §125)
“Nietzsche diz que o importante não é a notícia de que deus está morto, mas o tempo que ela leva a dar seus frutos.” (Deleuze, Anti-Édipo, p. 145)
“Pobreza, castidade e obediência - são todas insuportáveis.” (GOETHE, götz von berlichingen, 2002)
2.1 - Condenação Do Prazer: 
 A existência da condenação do corpo, pelo cristianismo, ou seja, segundo os platónicos, o corpo era mau e o espírito era bom. Há que fazer com que o corpo entre em tormentas para que o espírito se sobressair. 
 Por outo lado, o hedonismo critica esta teoria, pois o corpo é necessário para haver espírito, pois se não há corpo, muito menos irá haver espírito, ou seja, o corpo é substancial para o espírito existir. 
 Michel Onfray, no seu materialismo hedonista, defende que o corpo é a principal fonte de conhecimento. 
Na verdade, Onfray defende duas críticas, no seu materialismo hedonista, o advento do cristianismo e as tradições platónicas, no entanto, estas duas críticas são responsáveis pela separação do corpo e do prazer, e estão relacionadas de como as influências religiosas podem interferir no nosso quotidiano, ou seja, por um lado, o corpo é visto como algo mau e o espírito bom, mas noutra prospetiva, o corpo é visto como um elemento principal para a existência do espírito, mas segundo a filosofia de Onfray, o prazer e a alegria. 
 Por outro lado, Nietzsche também critica os platónicos e o cristianismo. Segundo a afirmação nietzschiana “o cristianismo é o platonismo do povo”6, onde se verifica um afastamento da realidade e do corpo.
2.2 - Dualismo Platônico
 Dualismo é uma conceção filosóficaou teológica do mundo, baseada na presença de dois princípios, ou duas realidades opostas que são irredutíveis entre si e incapazes de uma relação conjugal. Em filosofia, o dualismo opõe-se a várias formas de monismo, dentre as quais existem o - fisicalismo e o fenomenismo-, que se referem a relação de matéria e espírito fundadas sob a afirmação que os fenômenos mentais são exteriores ao mundo físico. 
 Durante muito tempo os filósofos ocidentais explicaram o ser humano como um composto de duas partes diferentes e inseparáveis, o corpo que é a parte material e a alma que é a parte espiritual e consciente. Chamamos de dualismo psicofísico essa dupla realidade separada do corpo. 
 Segundo Platão, antes de reencarnar, a alma teria vivido nos mundos das ideias onde tudo conheceu por simples intuição, ou seja, por conhecimento intelectual direto e imediato, sem precisar usar os sentidos. Quando a alma se une ao corpo ela se degrada por se tornar prisioneira dele. Passa então a se compor por duas partes. A alma superior, que é a alma intelectiva e a alma inferior e irracional que é a alma do corpo. A alma inferior se divide em duas partes, a alma impulsiva, localizada no peito e a alma concupiscível centrada no ventre com sede de desejo intenso em bens e gozo do que é matéria, inclusive o apetite sexual. 
 Escravizada pelo sensível, a alma inferior conduz a opinião e consequentemente ao erro perturbando o conhecimento verdadeiro, o corpo é também ocasião de corrupção e decadência moral. Caso a alma superior não saiba controlar as paixões e os desejos, portanto, todo o esforço humano consiste no domínio da alma superior sobre a inferior. 
 No entanto, o aforismo “corpo são, mente sã “apenas confirma a superioridade do espírito, na posse de saúde perfeita, em que a alma se desprende dos sentidos para melhor se concentrar na contemplação das ideias. Caso contrário, a fraqueza física se tornaria um empecilho maior para vida intelectual. Nesse contexto, fica claro que a felicidade para Platão é de natureza racional e moral e depende do controle do corpo e das paixões. 
 Logo Platão, nunca aceitou o Modus Vivendi Hedonista como ideal de vida. Pois, no Fédon, sua aspiração a uma existência feliz pós-morte o faz inclinar-se a um ascetismo e à mortificação. Na República, condena a vida entregue ao prazer e propõe um ideal baseado na virtude e no cultivo do conhecimento. 
2.3 - Crítica à Genealogia dos valores Cristãos
 Primeiramente, tendo em consideração o capítulo 16, da obra de Nietzsche cognominada de Genealogia da Moral, há que perceber a grande rebelião e revolução de valores éticos sociais que fora concedida pelo povo judaico, rebelião essa, que precisamente evocou à tona a dita décadence dos valores ideológicos a partir de um sistema astuto que consistia em escravizar moralmente os fracos e débeis, mediante recompensas quiméricas sustentadas ora pelo medo do inferno ora pela cobiça do céu. Até então os valores do mundo teriam sido sintetizados pela visão imanente da Roma, vencida, no entanto, pela conceção escatológica fictícia judaica. Instaurada no novo testamento, por apóstolos, protagonistas nos quatro evangelhos: Mateus, Marcos, Lucas e João, cujos relatos revelaram o mistério do filho de Deus, Jesus, os seus feitos milagrosos e os ensinamentos empregues ao povo judaico. Dentro desses bem-feitores destaca-se um judeu, que foi o principal mentor do cristianismo - Paulo de Tarso -, filho de fariseus e “[…] um servo de Jesus Cristo, chamado apóstolo, escolhido para pregar o Evangelho de Deus” (VALADIER, 1982:311). 
 Ironicamente, perseguido pelo povo que permitiu, na sua razão de ser, a própria existência do cristianismo, Paulo foi quem mais difundiu o cristianismo em Roma e por todo o mundo, pelas suas viagens empreendidas na pregação da boa nova, boa nova essa, que de igual modo permitiu a existência de mais de três mil conflitos entre povos pela defesa do cristianismo, em nome da paz, até à atualidade.
Com a sua tal dita doutrina evangelizadora, radicalizará o platonismo. Como vimos, o dualismo platônico rompe a relação entre o mundo sensível e o mundo intelectual, entre corpo e alma. A negatividade relacionada à matéria, assim como a positividade associada às ideias, sintetiza toda a genealogia moralista de Paulo de Tarso que permitiu legalizar todo o mar de sangue religioso escorrido até à atualidade entre povos, em defesa do bom nome de Deus[footnoteRef:22]. [22: “Não sabeis vós que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? --- Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá a ele, porque o templo de Deus, que sois vós, é sagrado” (PAULO, 1.ª Coríntios, III, 16). --- Para quem dota do poder sacerdotal, tal como Paulo de Tarso, e para quem represente Deus na terra, eles próprios têm a legalidade para compor um genocídio dito religioso na terra, em nome da paz e de Deus. Para tais ideias todo o desprezo é pequeno … ] 
A fonte inaugural do cristianismo matutada por Paulo, adquiriu um poder de proporções inimagináveis. Michel Onfray (2001) destaca essa união, quando diz que: “A religião e a filosofia dominantes encontram-se sempre associadas - ainda hoje - para alcançar uma maldição sobre a vida”. Com uma lógica correspondente, Onfray propõem um confronto ao ideal ascético a partir de uma base ateísta de ideias - “uma teoria da libertinagem pressupõem um ateísmo que seja reivindicado no campo amoroso clássico e apoiado tradicionalmente por um materialismo combativo.” (p.50)
 Se atentarmos devidamente, tanto a necessidade de pôr em prática o ideal ascético e a renúncia aos desejos e aos prazeres, quanto a purificação da existência humana por intermédio do desprezo da biologia humana rumo à transcendência divina, entendemos que tal ideias produzem uma sólida correspondência entre as duas doutrinas, que colidem no auge da humana mediocritas.
Em equivalência, junto dessa visão dualista estabeleceu-se a tradição judaico-cristã, onde o vasto processo de evangelização tomado, muito dele, a cabo por Paulo de Tarso propõe que os desejos e o prazer sejam renegados, pois provêm de uma fonte impura, o corpo, a fim de se purificar a alma e o espírito, enfim, tudo aquilo inatingível para o homem, mas que é por ele, que este é perfeitamente escravizado pelo sistema astuto clerical.
Segundo Michel Onfray:
 “Em matéria de prazer, o grande anátema histórico e inaugural do ocidente é lançado sem margem de dúvidas pelo pensamento judaico, em especial no Antigo Testamento. Este, como se sabe, abunda em imprecações contra a carne, os desejos e os prazeres, lança insultos contra o corpo, as sensações, as emoções e as paixões, e o seu ódio pela vida só tem equivalente na aversão que tem pelas mulheres. O monoteísmo judeu inventa a misogenia ocidental, faz a sua formulação e dá carta de nobreza à descoberta. Isso permite que o cristianismo e o islã venham continuar a obra, criando primeiro a metáfora de aversão ao corpo e depois a aversão à totalidade das mulheres”. (ONFRAY, 2001. p.84).
Podemos perceber, que o cristianismo absorve os ideais absurdos do platonismo por uma abstração com relação à realidade prática da vida. Um amor pelo imutável, a paixão como força biológica cega pelo ideal que no platonismo liga-se ao mundo das ideias que encontra no cristianismo uma provável dramatização maior. O platonismo está, portanto, metamorfoseado na moral cristã, em que o corpo é entendido como instância menor, impura, rejeitável a qualquer custo.
 Esses valores cristãos são tais, que chegaram a manipular os fatores primordiais que condicionam a existência da sociedade, existindo como imperativos categóricos, como princípios de manutenção do ideal da décadence; como princípios de manutenção do ordinário. Servem, por excelência, de seguro na manutenção da mediocridade face à insegurança interna das paixões dos homens, que, por medo; por temor a Deus, adotam-nos como imperativos categóricos[footnoteRef:23]. Assim, o medo forma o homem escravo, condição essa, exercidaa quem incute o medo nele (prisma sacerdotal). Logo, a fé nasce no homem escravo para com esse Deus utópico – é nessa perspetiva que o medo é a mãe da moral (ZA, 1999. Dos transmundanos), e é nesse sentido que a mediocridade se difunde, corroendo os instintos e fortalecendo a passividade ante a atividade. [23: Relação com o imperativo categórico de Immanuel Kant, como conceito essencial da sua deontologia da moral.] 
A Decadência e a Ética Cristã
 O objetivo desse subcapítulo, consiste em definir um estreito liame relacional entre a existência de uma ética niilista de ordem cristã e a gradual aceção niilista presente desde à séculos como moral das sociedades, moral essa, representante de diversos sistemas de tendências religiosas, metafísicas e tradicionais que dele descendem.
 Por essa conjuntura, o tema falado por Nietzsche relativamente à Morte de Deus representa o momento em que se denota em um grau mais elevado o carácter de decadência da tradição ocidental, e nesse contexto, do cristianismo e de toda a malha da moral convencional.
 Ora, o erro existencial e ultrassensível que serve de sustentáculo ao cristianismo e que para mim constitui o verdadeiro pecado contra a existência e contra a humanidade consiste na adoção de uma atitude tirana tida pela patrística[footnoteRef:24] à cerca de uma dita verdade absoluta sobre um mundo verdadeiro, que não é o nosso, a partir da qual se compreende a existência, e que se têm vindo a ocidentalizar-se e a proliferar-se por todo o mundo, como um cancro maligno. [24: Filosofia cristã enquadrada nos três primeiros séculos, construída pelos primeiros teóricos da Igreja.] 
Ora, esse mundo verdadeiro não passa de uma fábula que tem vindo a iludir a humanidade, através da fé que esta exerce sobre o utópico mediante rituais de fantasia de ordem escatológica. No entanto, como muitos filósofos da idade moderna, a quem eu os chamos de profetas modernos, mostraram esse erro existencial, o crente ficou sem chão, sem abrigo, sem defesas contra a sua miséria humana.
 A Morte de Deus, deveria ter levado a esse grau de consciência que fosse praticada no seio da realidade, contudo os limites do domínio sacerdotal e da sua força de manipulação sobre um povo indefeso mantêm-se no domínio dos ideais suprassensíveis, nos quais vagueia o dito niilismo cristão - “uma Vontade de nada, […]: o homem prefere ainda querer nada, a nada querer …” (GM, III, 28).
 Guiada quer consciente quer inconscientemente, ainda por modelos judaico-cristãos de há 2000 anos a trás, a humanidade não evolui senão para a sua degenerescência.[footnoteRef:25] [25: Na Bhagavad-Gita, Poema do Senhor é dito - “Na nossa época, encontramo-nos na quarta idade, Kali-Yuga, ou idade sombria, que começa a 18 de Fevereiro de 3102 antes de Cristo.” (VYASSA, 2007. p.392).] 
A sua decadência reside em inúmeros fatores já reportados: na tendência ignóbil dos crentes em possuir fé a algo cuja realidade não lhes é acessível, a uma mediocridade que repousa na moral sacerdotal e que dota os valores suprassensíveis como sendo os valores ditos como verdadeiros.
 Por consequência, tudo isso acaba por levar, como é bem visível na nossa sociedade, à perda paulatina, embora severa, da autonomia própria sobre o controle da vida humana, resultado de uma “nadificação” da força de vontade em superar as amarras da decadência, cujas consequências se fazem notar nas suas causas, ou seja, pela ética cristã, que combate os hereges através da sua moralidade e mentira santa para um povo indefeso e mísero, que necessita desse antídoto como meio de se livrar da dor e do sofrimento das suas vidas, ocasionados por um intenso ressentimento para com a vida.
 Parte III
3- Filósofos Hedonistas Do Período Iluminista
“O homem é uma máquina tão complicada que é impossível ter uma ideia clara da máquina de antemão, e, portanto, impossível defini-la. Por essa razão, todas as investigações foram vaidosas, que os maiores filósofos fizeram à priori, ou seja, na medida em que usam, por assim dizer, as asas do espírito. Assim, é apenas à posteriori ou tentando desembaraçar a alma dos órgãos do corpo, por assim dizer, que se pode alcançar a maior probabilidade em relação à própria natureza do homem, mesmo que não se possa descobrir com certeza qual é sua natureza.” (Mettrie, Man a Machine, p.2).
“Para conhecer a virtude, devemos primeiro nos familiarizar com o vício. 
Só então saberemos a verdadeira medida de um homem.” (Marquês de Sade, The Misfortunes Of Virtue).
3.1 - La Mettrie
 La Mettrie, foi um médico e filosófico que se destacou no projeto hedonista da fase iluminista. 
 Segundo Mettire, a sua teoria não ia de acordo com os cristãos da época, pois Mettire defendia que o homem devia ser autónomo e sem alma, assim, levou-o a defender um materialismo radical.
 De facto, o mais importante para Mettrie era o prazer e a satisfação segundo a ejaculação, o que levava a uma ética com rejeição à metafísica. De acordo com La Metrrie, tudo era matéria, mesmo os pensamentos ou até as ideias, ou seja, não há nada que seja imaterial. 
 Assim, considera que o corpo é uma máquina, pois reconhece o prazer e a dor. Na sua teoria, o que é importante é a vivência do prazer no momento e é possível ver isso no seu livro “L´homme-machine" (1983).
Segundo La Mettrie:
 "desfrutamos do presente, somos apenas o que é, se não aproveitamos os prazeres que se apresentam, se fugirmos do que parecem hoje nos procurar, virá um dia em que os procuremos em vão" (L´homme- machine, 1983, p.381). 
 A partir da teoria de Mettrie, verifica-se que devemos viver o aqui e o agora e disfrutar do prazer momentâneo.
3.2 - Marquês De Sade 
3.2.1 - A Origem Do Sadismo 
 Na infância, Sade demonstrava comportamentos agressivos. Por exemplo, em meio a uma brincadeira, Sade espancou seu primo porque ele tinha pegado em um de seus brinquedos para brincar. Anos depois ele começou a se aventurar na vida sexual e usou a agressividade dele lá. Chicotes, algemas, palmatórias e muitos outros “brinquedos” eram usados para que ele pudesse se satisfazer. Porém, essas práticas de violência sexual eram proibidas na época, principalmente por causa da igreja cristã. Assim, ele foi preso diversas vezes em sua vida. 
 Foram nas prisões que ele começou a escrever seus livros e contos eróticos. Mas ele era teimoso e nunca aprendia a lição quando era solto das prisões. Sempre lutou pelo seu prazer, sempre lutou pela liberdade de sua satisfação sexual. Ele defendia que devemos ser livres para nos satisfazer do jeito que quisermos. “A felicidade não reside no vício nem na virtude, mas sim na maneira como percebemos um e outro.” - Marquês de Sade.
 Parte IV
Nietzsche E Übermensch, Como Potência De Vida
«Um sábio perguntava a um louco qual era o caminho da felicidade. O louco respondeu-lhe imediatamente, como alguém a quem se pergunta o caminho da cidade vizinha: “Admira-te a ti mesmo e vive na rua”. “Alto lá”, exclamou o sábio, “pedes demais, basta já que nos admiremos!” E o louco respondeu logo: “Mas como admirar sem cessar se não nos desprezarmos constantemente?”» (Nietzsche, A Gaia Ciência, 1998).
«Vós outros andais muito solícitos em redor do próximo, e a vossa solicitude exprime-se em belas palavras. Mas eu vos digo: o vosso amor ao próximo é apenas o vosso mau amor por vós próprios.
É para fugirdes de vós que andais em volta do próximo, e quereríeis converter isso numa virtude; mas pus a claro o vosso “desinteresse”.
(...) Não suportais a vossa própria companhia, e não vos amais o suficiente; procurais então seduzir o próximo com o vosso amor e doirar-vos com o seu erro.
Eu quisera que todos os próximos e aqueles que se seguem se vos tornassem intoleráveis: assim teríeis de extrair de vós mesmos o amigo de coração transbordante.
Convocais uma testemunha quando quereis dizer bem de vós; elogo que a haveis induzido a pensar bem da vossa pessoa, vós mesmos pensais bem da vossa pessoa.
É mentiroso não só o que fala contra a sua consciência, mas também o que fala contra a sua inconsciência. Ora é assim que falais de vós no trânsito diário, e que enganais o próximo e a vós mesmos.
Assim fala o louco: “O convívio dos homens estraga o carácter, sobretudo quando não tem carácter”.
Um procura o próximo porque se procura, o outro porque anseia perder-se. O vosso mau amor por vós próprios converte a vossa solidão num cativeiro.» (Nietzsche, Assim Falava Zaratustra, 2010).
4.1 - Nietzsche E Os Passos Para A Felicidade
 Nietzsche sempre apoiou que devemos sair da nossa zona de conforto, pois esse é o primeiro passo para se começar a viver de verdade e encontrar a melhor versão de si. Porém, muitas vezes deixamos de viver uma vida feliz por causa de timidez e insegurança. Para Nietzsche a preguiça e o medo são os nossos principais adversários. A preguiça é aquilo que nos leva a escolher seguir o caminho mais fácil, mais cômodo, mesmo que a insegurança seja um problema, requer muito esforço para vencê-la. Também tem o medo de pensar diferente, mesmo sabendo que todos são únicos, as pessoas preferem estar presas ao convencionalismo, ao julgamento e opiniões dos outros e assim colocar suas felicidades de lado.
 Todos adoram os gênios, até porque eles estão acima da média e são pessoas brilhantes. Mas para Nietsche essa atração aos grandes gênios é em grande parte uma fuga. Chamar alguém de divino significa “Aqui não precisamos competir, então, não precisamos nos esforçar”. Muita gente acredita que eles nasceram prontos e ignoram todo esforço que eles tiveram de fazer antes do sucesso da genialidade. Esses grandes gênios devem servir de inspiração, devemos aprender com as lições deles e não os endeusar.
 Para Nietzsche, outro passo para a felicidade, é não se preocupar com aquilo que não se pode mudar. Devemos compreender que estamos no aqui e agora e devemos viver o momento. Temos de fazer aquilo que achamos que vale a pena e não aquilo que os outros acham que devemos fazer. Mas isso não significa que você pode fazer tudo que quiser. Lembre se que liberdade implica responsabilidade. O que Nietzsche sustenta é que ninguém, além de você mesmo, pode construir a ponte pela qual terá de atravessar o rio da vida.
 Nietzsche afirmava que a arte é a maior fonte de saber. Para ele cada obra de arte é única em sua relação com o artista e com o publico. De acordo com Nietzsche, os artistas nos mostram que o homem até nos menores movimentos musculares é um ser individual.
 Todo educador sabe que a educação não serve para formatar mentes. Ao contrário, ao invés de agir como um funil que despeja conhecimento de um mestre para um discípulo, deve incentivá-lo a expandir a sua mente e desenvolver a sua sede por conhecimento. E era isso que Nietzsche apoiava.
 As filosofias de Nietzsche, suas muitas reflexões, procuravam o caminho para a felicidade. Seguindo o que ele dizia, talvez o homem seja mais livre e feliz. “Não é a força, mas a constância dos bons sentimentos que conduz os homens à felicidade.” - Friedrich Nietzsche.
 Parte V
5 - Materialismo Hedonista Atual E A Sociedade Charvaka
"[...] não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência." (MARX, Die deutsche Ideologie, 1845 -1846).
“E todo aquele que escandalizar um destes pequenos que creem em mim, melhor lhe fora que lhe atassem à roda do pescoço uma mó e o lançassem ao mar” (MAR-cos, IX, 42).
5.1 - Crítica ao Materialismo Hedonista e Consequências Práticas
 O materialismo mostra ser resultado de um valor estritamente pessoal, simbolizado por um montante de crenças formais do indivíduo sobre a importância da posse na sua vida. Toda a finalidade pragmática dessa conceção a priori de um modo de vida da realidade constatada como mísera, aos meus olhos, reflete tão somente, quando posta em prática, em valores que nada mais ultrapassam a questão de sobrevivência humana. Os bens materiais, por uma visão estreitamente materialista, são aplicados para o indivíduo demonstrar e por eles comunicar crenças e valores à sociedade, fatores esses, que provam o sucesso do indivíduo, a felicidade do indivíduo e os objetivos de vida do indivíduo. Neste caso o indivíduo materialista tende a acreditar que quanto maiores são as suas posses, maior será a sua felicidade. 
 No entanto, a experiência geral das pessoas ditas sucedidas na vida, pressupondo em termos materiais, diz exatamente o oposto; mostra um historial de vida repleta de infortúnio interno; repleta de debilidades psíquicas pelo stress incessante de um trabalho perseguidor embora fisicamente saudáveis, que a fim de ser ocultada há que ser provada, por meios materiais, exatamente o oposto para uma sociedade opressora e exigente aceitá-la, hierarquicamente, numa estrutura social. Quem é verdadeiramente feliz, não prova que é feliz por nenhum meio senão pela vida em si, não como uma potência, mas como uma realidade, porque primeiro ela não conhece verdadeiramente o polo oposto, a infelicidade, vivendo simplesmente a sua vida inocentemente, sem exibições que suportem a verdade, e segundo entende a contingência do material e o seu carácter simplesmente utilitário para a vida. 
Essa é toda a psicologia de quem vive por um materialismo dito hedonista, que de igual modo inclui todos os religiosos, embora pelo polo oposto ideológico, que creem cobiçosamente numa recompensa futura, num outro mundo que no fundo sabem que não passa de uma utopia, mas que para aliviar a sua miséria interior à custa da dureza deste mundo ingerem a droga mais subtil alguma vez criada, a ideia de existência de um jardim de Éden. Essa é a razão pela qual não só os pobres se convertem facilmente ao cristianismo, como também os ricos mentalmente miseráveis se convertem, ou seja, ambos procuram o mesmo fim de consolo, para aliviar o fardo que a vida se tornou para eles.
 Ora, subsequentemente, há dois tipos de seres ignóbeis que formam esse tal dito materialismo hedonista. Uma, apega-se ao corpo e simplesmente à sobrevivência humana, embora floreie essa ideia e decore-a com todo o poder financeiro que dota para o mesmo fim - comer; rejeita a essência interior humana e a verdade de que o ser humano não é um corpo, embora o tenha. No entanto, o lapso drástico da sua dita verdade, é que se o ser humano fosse somente um corpo, como Marx pensa, todo o holocausto teria sido facilmente justificável; todo o genocídio provocado por Hitler teria sido facilmente justificável, pois simplesmente não haveria qualquer diferença entre matar um ser humano e destruir uma outra matéria do mundo. Apega-se aos bens materiais da vida, esquecendo-se que a qualquer momento a morte pode aparecer e remover tudo aquilo de precioso que acumulara até ao momento; removendo toda a sua felicidade, pois para ela a felicidade cinge-se ao material. 
A outra, apega-se àquilo que não é; apega-se à ilusão de uma vida perfeita criada por ela, póstuma, em virtude da completa desilusão da sua vida, enquanto viva. Esse tipo de pessoa e de ideia é a mais astuta de todas, e com a sua astúcia conseguiu converter “metade do mundo” ao cristianismo. Esse tipo de pessoa, dita como religiosa[footnoteRef:26], mas ironicamente cobiçosa, infindavelmente ambiciosa e ardilosa, é-o como resultado de ter caído nas malhas ideológicas mortais dos responsáveis na formulação da fábula religiosa (comunidade sacerdotal), que pela noção de culpa e pecado têm vindo a impossibilitar a tomada de consciência do ser humano sobre a regulação da sua própria vida; a tomada de consciência de que são eles os legisladores do seu Karma[footnoteRef:27]. [26: Etimologicamente, religião significa alguém religar-se ao seu mundo interior esquecido. Daí, na verdade, essas pessoas ditas como religiosas serem as menos religiosas por procurarem a verdade em meios externos, se elas já

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