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OAB XXXII EXAME DE ORDEM Dos Crimes contra o Patrimônio 1 CAPÍTULOS Capítulo 1 – Noções Gerais de Direito Penal Capítulo 2 – Tipicidade Penal. Tipicidade Conglobante. Capítulo 3 – Princípios aplicáveis ao Direito Penal. Capítulo 4 – Da aplicação da lei penal. Capítulo 5 – Tomo I - Teoria Geral do Crime. Tomo II - Fato típico. Tomo III - Ilicitude. Tomo IV - Culpabilidade. Capítulo 6 – Iter Criminis Capítulo 7 – Do Concurso de Pessoas Capítulo 8 – Das Medidas de Segurança Capítulo 9 – Ação Penal Capítulo 10 – Das Penas Capítulo 11 – Da Extinção da Punibilidade Capítulo 16 – Dos Crimes contra a vida Capítulo 13 – Lesões Corporais Capítulo 14 – Da periclitação da vida e da saúde Capítulo 15 – Rixa Capítulo 16 – Dos crimes contra a honra Capítulo 17 – Dos crimes contra a liberdade individual. Dos crimes contra a liberdade pessoal. Capítulo 18 – Dos crimes contra a inviolabilidade do domicílio. Capítulo 19 – Dos crimes contra a inviolabilidade de correspondência. Dos crimes contra a inviolabilidade dos segredos Capítulo 20 (você está aqui) – Dos crimes contra o patrimônio Capítulo 21 – Dos crimes contra a propriedade intelectual Capítulo 22 – Dos crimes contra a organização do trabalho Capítulo 23 – Dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos 2 Capítulo 24 – Dos crimes contra a dignidade sexual Capítulo 25 – Dos crimes contra a família Capítulo 26 – Dos crimes contra a incolumidade pública Capítulo 27 – Dos crimes contra a paz pública Capítulo 28 – Dos crimes contra a fé pública Capítulo 29 – Dos crimes contra a administração Pública 3 SOBRE ESTE CAPÍTULO Olá, Futuro Advogado! Essa apostila do nosso curso de Direito Penal tratará sobre Dos Crimes contra o patrimônio, assunto que é amplamente cobrado no Exame de Ordem e nos mais diversos Concursos Públicos! Nossa Equipe de inteligência constatou que este assunto foi cobrado 8 VEZES nos últimos 3 anos no Exame de Ordem! Aqui, a banca costuma seguir o seu padrão: Apresentar um caso hipotético, pelo qual a resposta é respaldada na legislação vigente. Por isso, recomendamos a leitura atenta da letra seca da lei e entendimentos jurisprudenciais, e sempre em companhia de alguma doutrina à sua escolha. E o mais importante, responda questões! A resolução de questões é a chave para a aprovação! Vamos juntos! 4 SUMÁRIO DIREITO PENAL ........................................................................................................................................ 8 Capítulo 20 ................................................................................................................................................ 8 20. Dos Crimes contra o Patrimônio ................................................................................................... 8 20.1 Introdução ................................................................................................................................................................ 8 20.2 Furto............................................................................................................................................................................ 8 20.2.1 Previsão legal .......................................................................................................................................................... 8 20.2.2 Objeto jurídico e Objeto material .................................................................................................................. 9 20.2.3 Sujeito Ativo ......................................................................................................................................................... 11 20.2.4 Sujeito Passivo ..................................................................................................................................................... 12 20.2.5 Núcleo do tipo .................................................................................................................................................... 12 20.2.6 Elemento subjetivo ............................................................................................................................................ 13 20.2.7 Furto de uso ......................................................................................................................................................... 13 20.2.8 Furto famélico ...................................................................................................................................................... 13 20.2.9 Talão de cheques e cartão bancário ou de crédito ............................................................................ 14 20.2.10 Furto e princípio da insignificância (ou da criminalidade de bagatela) ............................ 14 20.2.11 Consumação do furto .............................................................................................................................. 15 20.2.12 Tentativa do furto ...................................................................................................................................... 16 20.2.13 Furto praticado durante o repouso noturno: art. 155, § 1.º ................................................... 16 20.2.14 Furto privilegiado: art. 155, § 2.º ......................................................................................................... 17 20.2.15 Furto privilegiado-qualificado .............................................................................................................. 18 20.2.16 Cláusula de equiparação (art. 155, §3º) ........................................................................................... 19 20.2.17 Furto qualificado: art. 155, § 4.º .......................................................................................................... 20 20.2.18 Furto qualificado: art. 155, § 4.º-A ..................................................................................................... 24 5 20.2.19 Furto qualificado: art. 155, § 5.º .......................................................................................................... 25 20.2.20 Furto qualificado: art. 155, § 6.º .......................................................................................................... 25 20.2.21 Furto qualificado: art. 155, § 7.º .......................................................................................................... 27 20.2.22 Furto de coisa comum (Art. 156) ........................................................................................................ 27 20.3 Roubo ...................................................................................................................................................................... 28 20.3.1 Considerações iniciais ...................................................................................................................................... 28 20.3.2 Roubo próprio: art. 157, caput, do Código Penal ............................................................................... 29 20.3.3 Roubo impróprio: art. 157, § 1.º, do Código Penal............................................................................. 32 20.3.4 Roubo circunstanciado ou agravado: art. 157, § 2.º, do Código Penal ..................................... 34 20.3.5 Roubo circunstanciado com destruição ou rompimento de obstáculo mediante explosivo ou artefato análogo (§2.º-A) ...................................................................................................................................... 38 20.3.6 Roubo qualificado:art. 157, § 3.º, do Código Penal .......................................................................... 39 20.4 Extorsão .................................................................................................................................................................. 42 20.4.1 Previsão legal ....................................................................................................................................................... 42 20.4.2 Bem jurídico tutelado ....................................................................................................................................... 42 20.4.3 Núcleo do tipo .................................................................................................................................................... 42 20.4.4 Distinção entre extorsão e roubo ............................................................................................................... 43 20.4.5 Sujeito ativo .......................................................................................................................................................... 44 20.4.6 Sujeito passivo ..................................................................................................................................................... 44 20.4.7 Elemento subjetivo ............................................................................................................................................ 44 20.4.8 Consumação e tentativa ................................................................................................................................. 44 20.4.9 Causas de aumento de pena: art. 158, § 1.º .......................................................................................... 45 20.4.10 Extorsão qualificada: art. 158, § 2.º .................................................................................................... 45 20.4.11 Sequestro relâmpago: art. 158, § 3.º, do Código Penal ............................................................ 46 20.5 Extorsão mediante sequestro ....................................................................................................................... 47 6 20.5.1 Dispositivo legal ................................................................................................................................................. 47 20.5.2 Objeto jurídico e Objeto material ............................................................................................................... 48 20.5.3 Núcleo do tipo .................................................................................................................................................... 48 20.5.4 Elemento subjetivo ............................................................................................................................................ 48 20.5.5 Sujeitos ................................................................................................................................................................... 48 20.5.6 Consumação e tentativa ................................................................................................................................. 49 20.5.7 Formas qualificadas (art.159 §§1º, 2º e 3º) ............................................................................................. 49 20.5.8 Delação premiada (art. 158 §4º - minorante) ........................................................................................ 51 20.6 Extorsão indireta ................................................................................................................................................. 52 20.7 Estelionato ............................................................................................................................................................. 53 20.7.1 Dispositivo legal ................................................................................................................................................. 53 20.7.2 Objetividade jurídica ......................................................................................................................................... 55 20.7.3 Objeto material ................................................................................................................................................... 55 20.7.4 Núcleo do tipo .................................................................................................................................................... 55 20.7.5 Sujeito ativo .......................................................................................................................................................... 57 20.7.6 Sujeito passivo ..................................................................................................................................................... 57 20.7.7 Elemento subjetivo ............................................................................................................................................ 57 20.7.8 Consumação e tentativa ................................................................................................................................. 57 20.7.9 Estelionato e torpeza bilateral (fraude nos negócios ilícitos ou imorais) ................................. 57 20.7.10 Estelionato e falsidade documental ................................................................................................... 58 20.7.11 Crime impossível (“crime oco”) ............................................................................................................ 58 20.7.12 Estelionato privilegiado: § 1.º ............................................................................................................... 59 20.7.13 Estelionato e outros delitos .................................................................................................................. 59 20.7.14 Figuras equiparadas ao estelionato: § 2.º ....................................................................................... 59 20.7.15 Causa de aumento da pena: § 3.º ...................................................................................................... 66 7 20.7.16 Estelionato contra idoso ......................................................................................................................... 67 20.7.17 Ação penal (Lei n.º 13.964/2019 - Pacote Anticrime) ................................................................ 68 20.8 Receptação ............................................................................................................................................................ 68 20.8.1 Dispositivo legal ................................................................................................................................................. 68 20.8.2 Receptação própria: caput, 1.ª parte ......................................................................................................... 69 20.8.3 Receptação imprópria: caput, parte final................................................................................................. 71 20.8.4 Receptação qualificada (§1.º) ........................................................................................................................ 72 20.8.5 Receptação culposa: § 3.º ............................................................................................................................... 73 20.8.6 Perdão judicial e privilégio (Art. 180, § 5.º) ............................................................................................ 74 20.8.7 Forma qualificada (Art. 180, §6.º) ................................................................................................................ 75 20.9 Receptação de animal (Art. 180-A) ............................................................................................................75 20.10 Disposições gerais dos crimes contra o patrimônio .......................................................................... 76 20.10.1 Imunidades absolutas .............................................................................................................................. 76 20.10.2 Imunidades relativas (Art. 182) ............................................................................................................ 77 20.10.3 Limite de aplicabilidade dos arts. 181 e 182 (Art. 183, CP) .................................................... 79 QUADRO SINÓPTICO ............................................................................................................................ 80 QUESTÕES COMENTADAS ................................................................................................................... 83 GABARITO ............................................................................................................................................... 91 QUESTÃO DESAFIO ................................................................................................................................ 92 GABARITO QUESTÃO DESAFIO ........................................................................................................... 93 LEGISLAÇÃO COMPILADA .................................................................................................................... 95 JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................................... 98 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................... 104 8 DIREITO PENAL Capítulo 20 20. Dos Crimes contra o Patrimônio 20.1 Introdução Os crimes contra o patrimônio são espécies de ilícito penal que ofendem ou expõem a perigo de lesão qualquer bem, interesse ou direito economicamente relevante, privado ou público. Serão objeto de estudo nesse capítulo, os seguintes crimes contra o patrimônio: Furto; Roubo; Extorsão; Extorsão mediante sequestro; Estelionato e a Receptação. 20.2 Furto 20.2.1 Previsão legal Furto Simples Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. Agravado § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno. Furto privilegiado § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. Normal penal explicativa § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. Furto qualificado 9 § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:1 I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III - com emprego de chave falsa; IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas. Furto qualificado § 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018). Furto qualificado § 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Furto qualificado § 6º A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração. Furto qualificado § 7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) Furto de coisa comum Art. 156 - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamente a detém, a coisa comum: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. § 1º - Somente se procede mediante representação. § 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente. 20.2.2 Objeto jurídico e Objeto material A propriedade e a posse legítima são tuteladas pela lei penal. Reforça, dessa forma, a proteção conferida pelo Direito Civil ao patrimônio das pessoas. Importante dizer que, a doutrina diverge quanto à possibilidade de proteção a “detenção” ou não. Cleber Masson entende que a detenção, isoladamente, não contempla essa proteção, eis que não produz qualquer efeito jurídico e não integra o patrimônio das pessoas. 1 Questão 3 10 Em sentido contrário, entende Mirabete e maioria dos doutrinadores, protegendo a propriedade, a posse e a detenção, desde que legítimas. O patrimônio é bem jurídico disponível. Sendo assim, o consentimento do ofendido, antes ou durante a subtração, torna o fato atípico, ainda que sua anuência seja ignorada pelo agente. Após a subtração, o consentimento é ineficaz, subsistindo intacto o delito. Já o objeto material do furto é a coisa alheia móvel que suporta a conduta criminosa. O ser humano não pode ser furtado, pois não é coisa. Caso contrário, o crime será de sequestro, extorsão mediante sequestro ou subtração de incapazes. Em regra, a subtração de cadáver ou de parte dele caracteriza o crime definido pelo art. 211 do Código Penal (“Destruir, subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele: Pena – reclusão, de um a três anos, e multa”). Caso o cadáver tenha alguma finalidade específica, possuindo algum valor econômico, pode se falar em delito de furto. É o exemplo do furto do cadáver adquirido por faculdade de medicina para ser usado nas aulas de anatomia. É possível, ainda, se falar em furto de partes do corpo humano, como cabelos e dentes (Mirabete). A coisa deve ser alheia. A palavra “alheia” funciona como elemento normativo do tipo, não pertencendo àquele que pratica a subtração. Do contrário, haverá crime impossível. Não há, por fim, furto quando se tratar de res nullius (coisas que nunca tiveram dono) ou res derelicta (coisas abandonadas). A apropriação das coisas sem dono ou abandonadas é meio lícito para obtenção do domínio. Quanto à coisa perdida (res desperdicta), é coisa alheia, mas não é objeto material de furto, pois não há subtração. O art. 169, parágrafo único, inciso II, do Código Penal contempla um crime específico, denominado “apropriação de coisa achada”, aplicável a “quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro no prazo de quinze dias”. 11 A Coisa pública de uso comum pode ser objeto material de furto? Em regra, não se caracteriza o crime de furto em relação às coisas de uso comum (pertencentes a todos), tais como o ar e a água dos rios e oceanos. Excepcionalmente, contudo, caracteriza-se o delito de furto, quando tais coisas foram destacadas do local de origem e sejam exploradas por alguém (exemplos: água engarrafada e gás liquefeito). Por sua vez, entende-se por coisa móvel todo e qualquer bem corpóreo suscetível de ser apreendido e transportado de um local para outro. Não se confunde com o conceito de coisa móvel do Direito Civil, que adota algumas ficções jurídicas. 20.2.3 Sujeito Ativo O furto é crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa, salvo o proprietário ou possuidor da coisa. Não existe furto de coisa própria, uma vez que consta do tipo penal a elementar “coisa alheia”. Não comete furto o proprietário que subtrai coisa sua na LEGÍTIMA posse de terceiro. Trata-se do crimede exercício arbitrário das próprias razões, previsto no art. 346 do CP. Art. 346 - Tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de terceiro por determinação judicial ou convenção: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa. O funcionário público que subtrai ou concorre para que seja subtraído bem público ou particular que se encontra sob a guarda ou custódia da Administração Pública, valendo-se da facilidade que seu cargo lhe proporciona, pratica o crime de peculato furto (CP, art. 312, § 1.º), também conhecido como peculato impróprio. Entretanto, se a subtração não foi facilitada pela condição de agente, pratica furto comum. Art. 312 Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. § 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. 12 Por fim, se o proprietário que subtrai coisa comum de condômino, coerdeiro ou sócio, pratica furto de coisa comum (Art. 156, CP). Trata-se de Infração de menor potencial ofensivo (JECRIM), que se procede mediante representação. Art. 156 - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamente a detém, a coisa comum: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. § 1º - Somente se procede mediante representação. § 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente. 20.2.4 Sujeito Passivo Proprietário, possuidor ou detentor da coisa alheia móvel. O sujeito passivo pode ser tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica. Cleber Masson, como já informado acima, sustenta que a lei penal tutela, no art. 155 do Código Penal, a propriedade e a posse legítima. Consequentemente, apenas o proprietário e o possuidor legítimos da coisa móvel podem ser vítimas do furto, pois funcionam como titulares do bem jurídico atingido pela conduta criminosa. 20.2.5 Núcleo do tipo O núcleo do tipo é “subtrair”, que significa retirar algo de alguém, inverter o título da posse. É apoderar-se da coisa móvel da vítima, com o ânimo de tê-la em definitivo para si ou para outrem. Cuida-se de crime de forma livre. Admite qualquer meio de execução. A subtração pode ser direta (apreensão manual) ou indireta (valendo-se de interposta pessoa, instrumentos ou animais). 13 20.2.6 Elemento subjetivo É o dolo, também conhecido como animus furandi. Exige-se ainda um especial fim de agir, representado pela expressão “para si ou para outrem”: cuida-se do fim de assenhoreamento definitivo da coisa, isto é, o animus rem sibi habendi. Independe da finalidade lucrativa (animus lucrandi). Não se admite a modalidade culposa. 20.2.7 Furto de uso Subtrair para uso momentâneo é fato atípico, pela ausência do elemento subjetivo do tipo. O furto de uso caracteriza-se pela intenção que tem o agente de usar a coisa sem dela se apropriar, isto é, sem o animus rem sibi habendi. O elemento objetivo resulta da devolução da coisa, depois de usada. Ausente o fim de assenhoreamento definitivo, a apropriação no furto de uso resume-se em exercer sobre a coisa atos de apoderamento temporário. Três são os requisitos apresentados pela jurisprudência para o reconhecimento da figura atípica do furto de uso: a. Intenção, desde o início, de uso momentâneo da coisa subtraída. b. Coisa não consumível (não existe furto de uso de dinheiro, por exemplo); c. Restituição imediata e integral da coisa ao local onde foi subtraída. O Código Penal Militar prevê a figura típica do furto de uso no art. 241: Art. 241. Se a coisa é subtraída para o fim de uso momentâneo e, a seguir, vem a ser imediatamente restituída ou reposta no lugar onde se achava: Pena - detenção, até seis meses. 20.2.8 Furto famélico É o furto cometido por quem subtrai alimentos em geral para saciar a fome e preservar a saúde ou a vida própria ou de terceiro, quando comprovada uma situação de extrema penúria. 14 Não há crime em face da exclusão da ilicitude pelo estado de necessidade, desde que: O fato seja praticado para mitigar a fome; O comportamento lesivo seja inevitável; A coisa subtraída tenha aptidão para contornar diretamente a emergência; Os recursos do agente sejam insuficientes ou este tenha impossibilidade de trabalhar. Por fim, não se deve confundir o furto famélico, típica hipótese de estado de necessidade, com o estado de precisão, correspondente a dificuldades financeiras, o qual não autoriza a invasão no patrimônio alheio, sob pena de consagração da quebra do Estado de Direito. 20.2.9 Talão de cheques e cartão bancário ou de crédito O tema não é pacífico. O Superior Tribunal de Justiça, porém, tem se posicionado no sentido de que a subtração de folhas de cheques em branco não caracteriza crime de furto, diante da insignificância do valor econômico. Quanto ao cartão bancário ou de crédito, não há crime de furto, em decorrência do princípio da insignificância (Cleber Masson). 20.2.10 Furto e princípio da insignificância (ou da criminalidade de bagatela) Consoante entendimento jurisprudencial, o "princípio da insignificância” - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu 15 processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público." Acerca da incidência do princípio da insignificância no crime de furto, vale a pena conferir um elucidativo julgado: Nesse contexto, para que o magistrado possa decidir sobre a aplicação do princípio da insignificância, faz-se necessária a ponderação do conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação do agente para verificar se a conduta formalmente descrita no tipo penal afeta substancialmente o bem jurídico tutelado. Nessa análise, no crime de furto, avalia-se notadamente: a) o valor do bem ou dos bens furtados; b) a situação econômica da vítima; c) as circunstâncias em que o crime foi perpetrado, é dizer, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima etc.; e d) a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou estilo de vida, com sucessivas ocorrências (reincidente ou não). Recentemente, o STJ julgou o seguinte caso: (RHC 93.472/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 15/03/2018, DJe 27/03/2018) No caso, teria a paciente, segundo a denúncia, subtraído um cofrinho com R$ 4,80 (quatro reais e oitenta centavos) de uma associação de voluntários de combate ao câncer, induzindo seu filho de apenas 09 anos a pegar o objeto e colocá-lo na sua bolsa. Características dos fatos que impedem o reconhecimento da atipicidade do comportamento irrogado, dada a especial reprovabilidade da conduta, não obstante o inexpressivo valor do bem. NÃO se aplica o princípio da insignificância ao furto de bem de inexpressivo valor pecuniário de associação sem fins lucrativos com o induzimento de filho menora participar do ato. 20.2.11 Consumação do furto Várias são as teorias que explicam o momento da consumação do furto: Teoria da concretatio: o crime se consumava no instante em que o agente tocasse a coisa. Teoria da apprehensio: o furto se consuma quando o agente segura a coisa. 16 Teoria da amotio: sustenta que o furto se consuma com a inversão da posse do bem, ou seja, a coisa deixa de integrar a posse da vítima para ingressar na posse do agente. Dá-se a consumação quando a coisa subtraída passa para o poder do agente, mesmo que num curto espaço de tempo, independentemente de deslocamento ou de posse mansa e pacífica. Teoria da ablatio: defende ser necessário, para a consumação do furto, não só a apreensão da coisa, mas também o seu transporte a outro lugar, para o qual o ladrão pretendia levá-la. No Brasil a jurisprudência atualmente adota a teoria da amotio. O furto se consuma com a inversão da posse do bem. Dispensa posse mansa e pacífica, bem como que a coisa saia da esfera de vigilância da vítima. 20.2.12 Tentativa do furto É possível em todas as modalidades de furto: simples, privilegiado e qualificado. Ocorre quando a pessoa é surpreendida no momento em que está se assenhoreando da coisa. A existência de sistema de vigilância por câmeras ou agentes de segurança em supermercados e estabelecimentos comerciais torna mais difícil, mas não impossível, a consumação de furtos ali praticados. Súmula n.º 567, STJ. Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto. 20.2.13 Furto praticado durante o repouso noturno: art. 155, § 1.º O furto praticado durante o repouso noturno, ou simplesmente furto noturno, está previsto no art. 155, § 1.º, do Código Penal. Trata-se de causa de aumento de pena, também denominado de furto circunstanciado. Art. 155, § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o REPOUSO NOTURNO. 17 Repouso noturno não coincide necessariamente com a noite ou ausência de luz. Significa o período que as pessoas se recolhem para dormir. O STJ já decidiu pelo não cabimento da majorante se o fato de o crime tiver sido praticado durante o período de repouso noturno não ter contribuído para a prática do delito O fundamento da agravante está ligado ao maior perigo ao qual está submetido o bem, em razão da precariedade de vigilância decorrente do horário. Não precisa ser praticado em casa habitada, podendo ocorrer mesmo quando praticado em veículos, estabelecimento comercial ou residência desabitada. Tanto o STJ quanto o STF dispensam a habitação do local onde ocorre o furto, permitindo a incidência da majorante até mesmo em furtos de estabelecimentos comerciais. Essa também é a posição de Noronha, que diz ser esse o entendimento apresentado na exposição de motivos do CP. Por fim, essa causa de aumento de pena pode ser aplicada tanto para os crimes de furto simples como para as hipóteses de furto qualificado. Não existe nenhuma incompatibilidade entre a majorante prevista no §1º e as qualificadoras do §4º. (STJ. 6ª Turma. HC 306.450.-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 4/12/2014 (Info 554). A causa de aumento de pena prevista no § 1° do art. 155 do CP (repouso noturno) é aplicável tanto na forma simples (caput) quanto na forma qualificada (§ 4°) do delito de furto. Não existe nenhuma incompatibilidade entre a majorante prevista no § 1.° e as qualificadoras do § 4º. Assim, é possível que o agente seja condenado por furto qualificado (§4º) e, na terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena em 1/3 se a subtração ocorreu durante o repouso noturno. 20.2.14 Furto privilegiado: art. 155, § 2.º Conforme dispõe o art. 155, § 2.º, do Código Penal: § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. Trata-se do conhecido furto de pequeno valor, ou furto mínimo, no qual a menor gravidade do fato, a primariedade do agente e o reduzido prejuízo ao ofendido recomendam um tratamento penal menos severo. 18 Verifica-se, inicialmente, a exigência legal de dois requisitos para a configuração do privilégio no delito de furto: Criminoso primário: É aquele que não é reincidente, ainda que tenha condenações no passado. Pequeno valor da coisa subtraída: é aquela que não excede o montante de 1 (um) salário mínimo. Não se confunde a “coisa de pequeno valor” com a “coisa de valor insignificante”, decorrência do princípio da insignificância. Desse modo, se a coisa subtraída é inferior a um salário mínimo, mas não é ínfima, chegando perto do valor do salário mínimo, a jurisprudência entende que não deve ser aplicado o princípio da insignificância, mas tão somente o furto privilegiado. Se o bem subtraído é bem inferior a um salário mínimo, sendo de valor ínfimo, estando longe do valor do salário mínimo, há de ser aplicado o princípio da insignificância, que é mais benéfico que o furto privilegiado. Com o reconhecimento do privilégio, o Código Penal autoriza ao juiz a opção pelas seguintes consequências: a. Substituir a pena de reclusão pela de detenção; b. Diminuir a pena de reclusão de um a dois terços; e c. Aplicar somente a pena de multa. Cuida-se, portanto, de direito subjetivo do réu, e não de discricionariedade judicial: o magistrado não pode negar o benefício quando presentes os requisitos legalmente exigidos. 20.2.15 Furto privilegiado-qualificado A figura privilegiadora se aplica ao furto qualificado (existe a figura do furto qualificado- privilegiado), também chamado de furto híbrido, desde que: a) estejam preenchidos os requisitos do § 2º (primariedade e pequeno valor da coisa); e b) a qualificadora seja de natureza objetiva. Súmula n.º 511, STJ. É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se 19 estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva. Existem qualificadoras de natureza objetiva e subjetiva. São qualificadoras subjetivas, são aquelas que dizem respeito à pessoa do agente. Ex.: crime praticado com abuso de confiança. Já as qualificadoras objetivas (materiais, reais), são aquelas que estão relacionadas com o fato criminoso, ou seja, com o seu modo de execução, tempo e lugar do crime, instrumentos utilizados etc. Assim, seria possível o privilegio, por exemplo, se o furto for qualificado por concurso de pessoas (qualificadora de índole objetiva). 20.2.16 Cláusula de equiparação (art. 155, §3º) Trata-se de norma penal explicativa e na expressão “qualquer outra que tenha valor econômico” ingressam, exemplificativamente, as energias nuclear, radioativa, cinética, atômica, mecânica, térmica e eólica, bem como o sinal fechado de televisão (TV a cabo ou equivalente). § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. A subtração de sêmen também é considerada furto, uma vez que se constitui em energia genética. É imprescindível o valor econômico da energia. Por fim, o STF e o STJ divergem acerca da subtração de sinal de televisão a cabo constituir ou não furto de energia. STF/2011: Sinal de TV a cabo não é energia, não se equiparando a coisa móvel. A energia se consome, se esgota; sinal de televisão é inesgotável, não diminui (Bitencourt). STJ: Sinal de TV é uma forma de energia, equiparando-se à coisa móvel (Nucci). 20 20.2.17 Furto qualificado: art. 155, § 4.º As qualificadoras previstas no § 4.º do art. 155 do Código Penal dizem respeito ao meio de execução empregado pelo agente na prática do crime. § 4º -A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;2 II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III - com emprego de chave falsa; IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.3 I - Com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa Destruição é o comportamento que faz desaparecer alguma coisa. Rompimento, por sua vez, é a atividade consistente em deteriorar algum objeto, abrir brecha, arrombar, arrebentar, cortar, serrar, perfurar, forçar de qualquer modo um objeto para superar sua resistência e possibilitar ou facilitar a prática do furto. Obstáculo é a barreira, o empecilho que protege um bem, dificultando sua subtração. A violência deve recair sobre o obstáculo que separa o agente da coisa. Se atingir uma pessoa, estará delineado crime mais grave: Roubo. A simples remoção de obstáculo não configura furto qualificado. Assim, a retirada de telhas, o desparafusar de uma janela ou o desligamento de um alarme, não caracteriza a qualificadora. A violência contra o obstáculo deve ocorrer antes, durante ou após a subtração, porém sempre antes da consumação, pois, do contrário, ocorrerá crime de furto (simples ou qualificado por outra circunstância), em concurso material com o delito de dano. 2 Questão 01 3 Questão 06 21 Finalmente, como a destruição e o rompimento de obstáculo deixam vestígios, é imprescindível a elaboração de exame de corpo delito, direto ou indireto, para comprovação da materialidade: (HC 456.927/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 12/03/2019, DJe 28/03/2019). O reconhecimento das qualificadoras da escalada e rompimento de obstáculo (previstas no art. 155, § 4º, I e II, do CP) exige a realização do exame pericial, SALVO nas hipóteses de inexistência ou desaparecimento de vestígios, ou ainda se as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do laudo. II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza O inciso II do § 4.º do art. 155 do Código Penal contempla quatro qualificadoras distintas: abuso de confiança, fraude, escalada ou destreza. Abuso de confiança Consiste na traição, pelo agente, da confiança que, oriunda de relações antecedentes entre ele e a vítima, faz com que o objeto material do furto tenha sido deixado ou ficasse exposto ao seu fácil alcance. O agente viola a confiança incomum nele depositada. Essa confiança pode advir de relação de amizade, parentesco ou atividade laboral. Para incidir a qualificadora os tribunais exigem que a confiança traga facilidade à execução do delito. É o caso do famulato, exemplo típico desse tipo de furto, ou seja, a subtração praticada por empregados domésticos, mormente aqueles que trabalham há longa data para o ofendido e, além de terem as chaves de sua casa, são encarregados de diversas atividades pessoais. A mera relação empregatícia, por si só, não é assaz para caracterizar o abuso de confiança. A qualificadora pressupõe dois requisitos: 1) A vítima tem que depositar, por qualquer motivo (amizade, parentesco, relações profissionais etc.), uma especial confiança no agente; e 2) O agente deve se aproveitar de alguma facilidade decorrente da confiança nele depositada para cometer o crime. 22 O furto qualificado pelo abuso de confiança e a apropriação indébita (CP, art. 168), nada obstante apresentem pontos comuns, são crimes que não se confundem. Em ambos os crimes opera-se a quebra da confiança que a vítima depositava no agente. Mas, enquanto no furto qualificado o sujeito subtrai bens do ofendido aproveitando-se da menor vigilância dispensada em decorrência da confiança. Na apropriação indébita o agente não restitui à vítima o bem que lhe foi por ela voluntariamente entregue. Fraude O agente se utiliza de artifício, ardil ou qualquer outro meio enganoso como forma de induzir ou manter a vítima em erro, e, assim, ter facilitada a tarefa de subtrair a coisa. É importante destacar que furto mediante fraude e estelionato, embora apresentem características comuns, não se confundem. Furto mediante fraude Estelionato No furto qualificado, a fraude se presta a diminuir a vigilância da vítima (ou de terceiro) sobre o bem, permitindo ou facilitando a subtração. O bem é retirado da esfera de disponibilidade do ofendido sem que ele perceba a subtração. A fraude se destina a colocar a vítima (ou terceiro) em erro, mediante uma falsa percepção da realidade, fazendo com que ela espontaneamente lhe entregue o bem. Não há subtração: a fraude antecede o apossamento da coisa e é causa para ludibriar sua entrega pela vítima. Com relação ao crime envolvendo o test drive de veículos automotores, prevalece que é furto mediante fraude, pois o sujeito da concessionária não dá a posse desvigiada da coisa. É o mesmo caso da mulher que prova a roupa na loja e some com ela. Phishing é a conduta maliciosa em ambiente digital, voltada à tentativa de obter senhas bancárias e outras informações pessoas da vítima. Condutas que caracterizam furto mediante fraude: 23 I. Se o agente emprega fraude para obter senha do banco e passa a efetuar saques indevidos, tem-se o crime de furto mediante fraude. II. A conduta de efetuar saques indevidos por meio da clonagem de cartões também configura furto mediante fraude. III. A instalação de aparelho em caixa eletrônico para efetuar saques indevidos dos clientes. Escalada É o uso de via anormal para ingressar ou sair do local em que se encontra a coisa visada. Não necessariamente é uma subida, podendo ser via subterrânea. A jurisprudência exige que essa via anormal provoque um esforço incomum para o agente, demonstrando audácia que conduzem a maior reprovabilidade da conduta. Destreza Destreza é a especial habilidade física ou manual que permite ao agente retirar bens em poder direto da vítima sem que ela perceba a subtração. É o famoso caso dos punguistas ou batedores de carteira. Não há destreza se a vítima percebe o objeto sendo subtraído, uma vez que não restou provada sua especial habilidade quanto à subtração. Estará caracterizada a tentativa de furto simples. Se um terceiro é quem percebe, há destreza. Por sua vez, a destreza é uma ação que recai sobre a vítima, e não sobre coisas. Não incide a qualificadora se a vítima estava, ao tempo da subtração, dormindo ou embriagada em estágio avançado, pois nessas circunstâncias não se exige destreza, ainda que o agente dela seja dotado. III - com emprego de chave falsa Chave falsa deve ser entendida como todo o instrumento, com ou sem a forma de chave, destinado a abrir fechaduras. Não incide a qualificadora se o agente utiliza a chave verdadeira. Pode ensejar, todavia, a qualificadora atinente à fraude. 24 Prevalece o entendimento de que não incide a qualificadora inerente ao uso de chave falsa na “ligação direta” de veículos automotores, pois não há emprego de qualquer instrumento em sua ignição. Por fim, o STJ, no HC 152.079 decidiu que a utilização de mixa para abrir fechadura de automóvel configura a qualificadora do inciso III. IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas A qualificadora depende de número plural de participantes, computando-se partícipes, concorrentes não identificados e inimputáveis. Essa qualificadora do concurso de duas ou mais pessoas eleva a pena do furto para 2 (dois) a 8 (oito) anos de reclusão, e multa, tornando-a muito mais gravosa do que a pena da modalidade simples, delineada pelo caput, qual seja, reclusão de 1(um) a 4 (quatro) anos, e multa. Indaga-se, entretanto, se o Juiz poderia, nesse caso, em vez de aplicar a qualificadora do furto, utilizar a causa de aumento de pena do roubo, valendo-se da analogia in bonam partem (favorávelao réu)? O Supremo Tribunal Federal acertadamente entende que não. O Superior Tribunal de Justiça possui idêntico posicionamento, consagrado na Súmula n.º 442: Súmula n.º 442, STJ. É inadmissível aplicar, no furto qualificado, pelo concurso de agentes, a majorante do roubo. 20.2.18 Furto qualificado: art. 155, § 4.º-A A qualificadora do § 4.º-A foi inserida no art. 155 do Código Penal pela Lei nº 13.654/2018, e assim dispõe: § 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018). Nova qualificadora, de natureza objetiva. Diz respeito ao meio de execução. Comunicável com o concurso de pessoas. 25 Perigo comum significa número indeterminado de pessoas. Não se confunde com a qualificadora do homicídio “ou outro que pessoa resultar perigo comum”, em que basta à probabilidade do perigo. No furto, o perigo comum, exige o perigo efetivo. Explosivo é a substância ou artefato que possa produzir uma explosão, detonação, propulsão ou efeito pirotécnico. Para ser considerado artefato explosivo, é necessário que ele seja capaz de gerar alguma destruição. (STJ/2017). O objetivo declarado desse novo parágrafo foi o de punir com mais rigor os furtos realizados em caixas eletrônicos localizados em agências bancárias ou em estabelecimentos comerciais (ex: drogarias, postos de gasolina etc.). Antes da lei, prevalecia que o agente respondia por furto qualificado pelo rompimento de obstáculo à subtração da coisa em concurso formal impróprio com o crime de explosão majorada. Percebe-se que o legislador falhou no objetivo de punir mais gravemente o delito de furto mediante explosão de caixas eletrônicos, pois antes da lei 13.654/18, a pena mínima ficava no patamar de 6 anos e com o advento da lei, a pena mínima será a de 4 anos de reclusão. A Lei 13.654/2018 é novatio legis in mellius e os réus condenados sob a égide da lei antiga farão jus à redução de pena. 20.2.19 Furto qualificado: art. 155, § 5.º A qualificadora do § 5.º foi inserida no art. 155 do Código Penal pela Lei 9.426/1996: § 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. Não se relaciona ao meio de execução do furto. Diz respeito a um resultado posterior à subtração, consistente no transporte do veículo automotor para outro Estado federativo ou para outro país. Para incidir a qualificadora é INDISPENSÁVEL que o veículo automotor ultrapasse os limites do Estado ou as fronteiras do país, independentemente da intenção do agente em fazê-lo. Em não logrando êxito na efetiva transposição de fronteiras, estaremos diante de furto simples consumado. 20.2.20 Furto qualificado: art. 155, § 6.º O § 6.º do art. 155 do Código Penal foi criado pela Lei 13.330/2016, com a seguinte redação: 26 § 6º A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração. Trata-se de qualificadora de natureza objetiva, relacionada ao objeto material do furto. Destarte, admite-se a sua comunicabilidade no concurso de pessoas. O § 6º do art. 155 pune mais gravosamente o abigeato, que é o nome dado pela doutrina para o furto de gado. O abigeato abrange não apenas o furto de bovinos, mas também de outros animais domesticáveis, como caprinos, suínos etc. Haverá a incidência da referida qualificadora ainda que o agente mate o semovente ou venha a dividi-lo em partes no local da subtração. Caso o animal tenha sido legitimamente dividido pelo seu proprietário e suas diversas partes tenham seguido destinos diferentes, não se pode dizer que ainda exista aí um semovente. Uma peça de picanha, de costela, de maminha etc., isoladamente considerada, não pode ser equiparada a um semovente. A causa de aumento de pena prevista no § 1º (repouso noturno) pode também incidir no caso de furto qualificado de semoventes (§ 5º). Assim, se o agente, durante o repouso noturno, furta um semovente domesticável de produção, deverá ter sua pena aumentada em um terço. É possível também aplicar a redução do § 2º do art. 155 para o condenado pelo furto qualificado de semoventes (§ 6º), desde que estejam preenchidos os requisitos do § 2º (primariedade e pequeno valor da coisa). Isso porque a qualificadora do § 6º é de natureza objetiva. Logo, não há incompatibilidade em se reconhecer, neste caso, o chamado “furto privilegiado-qualificado”, também conhecido como “furto híbrido”. Súmula n.º 511, STJ. É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva. Ainda, é possível o furto duplamente qualificado, nos casos de cumulação dos §§ 4º e 6º do art. 155. A pena em abstrato será a prevista no § 4º do art. 155 (de dois a oito anos) e a qualificadora descrita no § 6º será utilizada pelo magistrado como circunstância judicial desfavorável na primeira fase da dosimetria da pena (art. 59 do CP). 27 Por fim, a conduta descrita no § 6º do art. 155, a depender do caso concreto, pode ser compatível com os requisitos de aplicação do princípio da insignificância. O simples fato de se furtar um semovente domesticável de produção não traz nenhuma circunstância especial ou mais gravosa que determine, por si só, a proibição de se aplicar o princípio da insignificância. 20.2.21 Furto qualificado: art. 155, § 7.º A Lei nº 13.654/2018 acrescentou também o § 7º ao art. 155 do Código Penal prevendo outra qualificadora para o crime de furto. § 7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018). Substância explosiva “é aquela capaz de provocar detonação, estrondo, em razão da decomposição química associada ao violento deslocamento de gases". O agente é punido por furtar uma substância explosiva ou acessório que, conjunta ou isoladamente, possibilite sua fabricação, montagem ou emprego. 20.2.22 Furto de coisa comum (Art. 156) Art. 156 - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem legitimamente a detém, a coisa comum: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa. § 1º - Somente se procede mediante representação. § 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota a que tem direito o agente. O crime de furto de coisa comum é uma modalidade específica de furto. A coisa é comum por ser inerente a uma relação de condomínio, herança ou sociedade. De fato, é o condômino, o coerdeiro ou o sócio quem pode praticar o delito. O núcleo do tipo também é “subtrair”. Trata-se de crime próprio ou especial: somente pode ser praticado pelo condômino, coerdeiro ou sócio da coisa comum. O elemento subjetivo é o dolo (animus furandi). Prescinde-se do fim de lucro (animus lucrandi). O sujeito se apossa da coisa comum e passa a comportar-se como se fosse seu exclusivo proprietário, sem dividi-la com os demais condôminos, coerdeiros ou sócios. 28 Por fim, o art. 156, § 2.º trás causa especial de exclusão da ilicitude, não punindo a subtração quando houver fungibilidade da coisa comum e que seu valor não exceda a quota a que tem direito o agente. 20.3 Roubo 20.3.1 Considerações iniciais O Código Penal capitulou, em seu art. 157, o crime de roubo Roubo simples próprio Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidadede resistência:4 Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. Roubo simples impróprio (Roubo por aproximação); § 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. Causas de aumento da pena § 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade: (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) I – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância. IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) Roubo majorado § 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo; (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) 4 Questão 4 e 8 29 II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) Roubo qualificado § 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019). Roubo qualificado § 3º Se da violência resulta: (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa; (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) 20.3.2 Roubo próprio: art. 157, caput, do Código Penal Conceito O roubo é um crime complexo, caracterizado pelo furto acrescido de circunstâncias especialmente relevantes previstas pela lei, quais sejam, a violência (própria e imprópria) ou grave ameaça empreendida contra a pessoa. Objeto jurídico e objeto material É pluriofensivo, ou seja, com mais de um bem jurídico tutelado. Inicialmente, protege-se o patrimônio, posse ou detenção da coisa. Mediatamente, tutelam-se a integridade física, a liberdade, bem como a vida da vítima (no caso do latrocínio). O objeto material do roubo, assim como no furto, é a coisa alheia móvel. Ressaltamos que a pessoa humana contra quem se endereça a violência ou a grave ameaça também é objeto material do crime de roubo. Roubo e princípio da insignificância ou criminalidade de bagatela O princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela é incompatível com o crime previsto no art. 157 do Código Penal. Para o STF é inviável reconhecer a aplicação do princípio da insignificância para crime praticado com violência ou grave ameaça, incluindo o roubo. 30 Núcleo do tipo O núcleo do tipo é “subtrair”, que equivale a retirar algo de alguém, invertendo o título da posse do bem. Quanto ao núcleo, portanto, os crimes de furto e de roubo são idênticos. Todavia, no roubo ao contrário do furto, a subtração se reveste de maior gravidade. O delito foi mais severamente apenado em decorrência dos seus meios de execução, capazes de facilitar a prática do crime, sem prejuízo de causar maiores danos à vítima e à coletividade. No roubo próprio o constrangimento à vítima, mediante grave ameaça ou violência (própria ou imprópria) à pessoa, é empregado no início ou simultaneamente à subtração da coisa alheia móvel, ou seja, antes ou durante a retirada do bem. Assim, uma vez encerrada a subtração, a utilização de grave ameaça ou violência (própria) à pessoa configurará o delito de roubo impróprio. Por fim, os meios de execução consistem, nos termos do art. 157, caput, do Código Penal, em: Grave ameaça; Violência à pessoa; e Qualquer meio que reduza a vítima à impossibilidade de resistência. Grave ameaça A grave ameaça é também chamada de violência moral ou de vis compulsiva. Consiste na promessa de mal grave, iminente e verossímil, isto é, passível de realização. Pode-se exteriorizar por palavras, gestos, símbolos, utilização de objetos em geral ou qualquer outro meio idôneo a revelar a intenção do agente de subjugar a vítima. O roubo é crime de forma livre, devendo a ameaça estar indispensavelmente ligada a uma subtração patrimonial. O porte simulado de arma configura a grave ameaça. O emprego de arma com defeito, desmuniciada ou de brinquedo autoriza o reconhecimento da grave ameaça, mas não serve para configurar a causa de aumento do roubo. Violência à pessoa É denominada de violência própria, violência física, vis corporalis ou vis absoluta. Consiste emprego de força física sobre a vítima, mediante lesão corporal ou vias de fato, para paralisar ou dificultar seus movimentos, impedindo sua defesa. São seus exemplos, entre outros, os socos, pauladas, pontapés, facadas, golpes com instrumentos contundentes e disparos de arma de fogo. 31 Trombada e subtração de objetos presos ao corpo da vítima podem caracterizar crime de roubo. Qualquer meio que reduza a vítima à impossibilidade de resistência É a chamada violência imprópria ou meio sub-reptício. Ocorre quando o agente se vale de outros meios para retirar a capacidade de resistência da vítima. São exemplos de violência imprópria: drogar a vítima ou embriagá-la, usar soníferos (o famoso “Boa noite Cinderela”) ou hipnose etc. Sujeitos Sujeito ativo: pode ser qualquer pessoa (crime comum), salvo o proprietário do bem, pois a lei penal fala em coisa “alheia”. Sujeito passivo: O proprietário ou possuidor da coisa móvel, bem como qualquer outra pessoa que seja atingida pela violência ou grave ameaça. É possível, portanto, a existência de duas ou mais vítimas de um único crime de roubo, pelo fato de se tratar de crime complexo. Elemento subjetivo É o dolo. Reclama-se também um especial fim de agir (elemento subjetivo específico), representado pela expressão “para si ou para outrem”: cuida-se do fim de assenhoreamento definitivo da coisa, ou seja, o animus rem sibi habendi. Prescinde-se da intenção de lucro. Não se admite a modalidade culposa. Consumação e tentativa Consuma-se com o apoderamento da coisa mediante violência ou grave ameaça, dispensando posse mansa e pacífica (teoria da ‘amotio’). Basta a simples retirada do bem da esfera de disponibilidade da vítima. O STJ editou a súmula 582 acerca da consumação do crime de roubo. Vejamos: Súmula n.º 582, STJ. Consuma-se o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, AINDA QUE por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo PRESCINDÍVEL a posse mansa e pacífica ou desvigiada. 32 Admite-se tentativa, qualquer que seja a posição acolhida em relação ao momento consumativo do crime de roubo. 20.3.3 Roubo impróprio: art. 157, § 1.º, do Código Penal Estabelece o art. 157, § 1.º, do Código Penal: § 1º - Na mesma pena incorre quem, LOGO DEPOIS de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro. O roubo impróprio é também chamado de roubo por aproximação. Difere do roubo simples, quanto aos meios de execução, o momento de emprego do meio de execução e na finalidade do meio de execução. Meios de execução: o roubo próprio pode ser praticado mediante grave ameaça, violência à pessoa (violência própria) ou depois de haver reduzido a vítima à impossibilidade de resistência (violência imprópria). Já o roubo impróprio, de outro lado, não admite a violência imprópria, por ausência de previsão legal. Assim, o roubo próprio é compatível com a violência própria e com a violência imprópria, ao passo que o roubo impróprio apenas se coaduna com a violência própria. Momento de emprego do meio de execução: No roubo próprio, a grave ameaça ou a violência (própria ou imprópria) é empregada antes ou durante a subtração. Já no roubo impróprio a grave ameaça ou a violência à pessoa (própria) é utilizada posteriormente à subtração. Finalidade do meio de execução: No roubo próprio, a grave ameaça ou violência à pessoa (própria ou imprópria) é utilizada para alcançar a subtração do bem. No roubo impróprio, por seu turno, a violência à pessoa (própria) ou grave ameaça é empregada para assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa. Fator de diferenciação Roubo próprio Roubo impróprio Meios de execução Violência à pessoa – própria ou imprópria – e grave ameaça. Violência à pessoa – própria – e grave ameaça. 33 Momento de emprego do meio de execução Antes ou durante a subtração. Após a subtração. Finalidade do meio de execução Permitir a subtração do bem. Assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa (o bem já foi subtraído). Características do roubo impróprio Só é possível a caracterização do roubo impróprio quando o sujeito já se apoderou de algum bem da vítima, pois o tipo penal exige expressamente a utilização de violência à pessoa ou grave ameaça “logo depois de subtraída a coisa”. É, na realidade, um furto que se transforma em roubo. A violência à pessoa (própria) ou grave ameaça deve ter sido utilizada “logo depois” da subtração da coisa. Em termos claros, a expressão “logo depois” deve ser compreendida como “após a subtração, mas antes de consumado o furto que o agente desejava praticar”. Por fim, a configuração do roubo impróprio depende da finalidade do agente no tocante ao emprego da violência à pessoa (própria) ou grave ameaça. É imprescindível o propósito de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa, para si ou para terceiro. Consumação e tentativa Consuma-se com o emprego da violência ou grave ameaça para assegurar o sucesso da empreitada criminosa, dispensando posse mansa e pacífica da coisa. Cuida-se de crime formal, de resultado cortado ou de consumação antecipada. No que tange a tentativa, a doutrina diverge quanto à sua possibilidade. 1ª Corrente: Não se admite, pois ou a violência é empregada e tem-se a consumação, ou não é empregada e tem-se o crime de furto (Damásio e doutrina clássica). 2ª Corrente: Admite-se a tentativa na hipótese em que o agente, após apoderar-se do bem, tenta empregar violência ou grave ameaça, mas é contido (Doutrina moderna: Mirabete, Nucci, Greco, Fragoso, Bitencourt etc). 34 20.3.4 Roubo circunstanciado ou agravado: art. 157, § 2.º, do Código Penal Apesar de todas as mudanças ocorridas nesse dispositivo, o §2º continuou a prever cinco causas de aumento de pena (majorantes). § 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade: (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) I – (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância. IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996) V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996) VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) Roubo circunstanciado por emprego de arma Traremos aqui as explicações de David Metzker acerca das mudanças incluídas nesse artigo. No artigo 157 do CP houve alteração a fim de resolver uma lacuna deixada na reforma realizada pela lei 13.654 de 2018. Nessa lei, foi revogado o inciso I do parágrafo segundo do artigo 157. Essa revogação tirou a majorante do emprego de arma. Não havia especificação se era arma de fogo ou branca, apenas trazia que o emprego de arma majorava a pena. Portanto, a sua aplicação era para os dois tipos de armas. Com o advento da lei 13.654/2018, dia 23 de abril de 2018 foi revogada essa majorante, incluindo no §2º-A, inciso I do artigo 157 a majorante “emprego de arma de fogo”, aumentando o grau de aumento, que de um terço a metade, passou a ser de 2/3 somente. 35 Pode ser enxergar uma novatio legis in mellius e uma novatio legis in pejus. Quanto à arma branca, deixou de ser considerada majorante e passou a ser aplicado o caput do artigo 157. Quanto à arma de fogo, passou a ser aplicado o §2º-A, que é prejudicial ao réu. Reparem que houve uma lacuna. Até 23 de abril de 2018, o emprego de arma branca na prática do crime de roubo era uma majorante, aplicando o aumento de um terço até a metade. Após essa data, o emprego de arma branca no crime de roubo passou a ser aplicado a pena do caput. Agora, com a lei anticrime, a partir de 23 de janeiro de 2020, volta a ser majorante. Assim, aquele que praticou roubo usando arma branca, a lei 13.654/2018 retroagiu para retirar a causa de aumento de pena e fazer uma nova dosimetria com base na pena do caput do artigo 157. Quem praticou crime de roubo usando arma de fogo, ainda com fulcro na lei supramencionada, permaneceu com a pena e os novos fatos de roubo com uso de arma de fogo, a partir de 23 de abril de 2018, passaram a ter o aumento de 2/3. O legislador, tentando acertar essa modificação benéfica que ocorreu na lei 13.654/2018, incluiu, através da lei anticrime, o “emprego de arma branca” como majorante no inciso VII do 2º do artigo 157. O uso de arma branca no cometimento do crime de roubo fará com que a pena seja majorada de um terço até a metade. Essa alteração, por ser maléfica, somente será aplicada a fatos posteriores a vigência da lei. Tivemos ainda o acréscimo do §2º-B no artigo 157. Aqui têm a inclusão da qualificadora por emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, cuja pena será o dobro da prevista no caput. Verifica-se que com essa alteração, a majorante prevista no §2º-A, inciso I será aplicada somente ao uso de arma de uso permitido. Assim, temos três penas para emprego de arma, a depender do tipo de arma. Temos o emprego de arma branca, arma de uso permitido e arma de uso restrito ou proibido, cada um com preceito secundário diferente. Lei Penal no tempo do artigo 157 Tipo de Arma Antes da Lei 13.654/18 Com a lei 13.654/18 Com a Lei 13.964/19 Branca Majorante: 1/3 até a metade Pena do caput Majorante: 1/3 até a metade Uso Permitido Majorante: 1/3 até a metade Majorante: 2/3 Majorante: 2/3 36 Uso Restrito ou proibido Majorante: 1/3 até a metade Majorante: 2/3 Pena de 8 a 20 anos Causas de aumento de pena: II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; Trata-se de crime acidentalmente coletivo: pode ser cometido por uma só pessoa, mas a pluralidade de agentes acarreta na exasperação da pena. A causa de aumento de pena é aplicável ainda que um dos envolvidos seja inimputável ou desconhecido. Quando uma pessoa, maior e capaz, comete o roubo em concurso com um menor de 18 anos de idade, a ela devem ser imputados dois crimes: roubo circunstanciado (CP, art. 157, § 2.º, inc. II) e corrupção de menores, definido pelo art.244-B da Lei 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, com a redação conferida pelo art. 5.º da Lei 12.015/2009. O delito do Art. 244-B do ECA dispensa a prova de efetiva corrupção de menor. Trata-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado, que tem como objetividade jurídica a proteção da moralidade da criança ou adolescente, razão pela qual sua finalidade precípua é coibir a prática de delitos em que existe a exploração de pessoas com idade inferior a 18 anos. Esta é a posição consolidada na Súmula 500 do Superior Tribunal de Justiça: Súmula n.º 500, STJ. A configuração do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal. Vale as mesmas considerações do crime de furto, com a diferença que, naquele delito, o concurso de agentes é uma qualificadora, e aqui, uma causa de aumento de pena. III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância. É imprescindível que a vítima esteja prestando serviços para alguém. Ou seja, quando a vítima está transportando seus próprios valores, não há que se falar em causa de aumento de pena, pois não haverá serviço de transporte. 37 IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; Ao contrário do furto, onde essa circunstância qualifica o delito, no roubo trata-se de majorante. No mais, aplica-se aqui tudo o que foi visto lá. V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. Trata-se de mais uma causa de aumento de pena introduzida no art. 157, § 2.º, do Código Penal pela Lei 9.426/1996. Sua finalidade é tornar mais grave a reprimenda na hipótese em que “o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade”. Conforme a Lei n.º 8.072/90 constitui espécie de crime hediondo: Art. 1.º, II - roubo: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019): a) circunstanciado pela restrição de liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) VI – se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018); A Lei nº 13.654/2018 acrescentou uma nova hipótese de roubo majorado no inciso VI. O agente, mediante violência ou grave ameaça, subtrai substância explosiva ou acessório que, conjunta ou isoladamente, possibilite a sua fabricação, montagem ou emprego. Ex: sujeito que, mediante violência ou grave ameaça, subtrai uma banana de dinamite. VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019). Conforme já dito acima, o legislador incluiu através da lei anticrime, o “emprego de arma branca” como majorante no inciso VII do 2º do artigo 157. O uso de arma branca no cometimento do crime de roubo fará com que a pena seja majorada de um terço até a metade. 38 Essa alteração, por ser maléfica, somente será aplicada a fatos posteriores a vigência da lei. Tivemos ainda o acréscimo do §2º-B no artigo 157. Aqui têm a inclusão da qualificadora por emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, cuja pena serão dobro da prevista no caput. § 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019). 20.3.5 Roubo circunstanciado com destruição ou rompimento de obstáculo mediante explosivo ou artefato análogo (§2.º-A) § 2º-A A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo; (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) II – se há destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) O inciso I já foi analisado acima. O destaque para o inciso I é, repetindo, o fato de que agora, para haver roubo circunstanciado pelo emprego de arma, é necessário que seja arma de fogo. Arma branca, arma imprópria não é mais suficiente para caracterizar causa de aumento de pena no roubo. É crime hediondo: Art. 1.º, II - roubo: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019): b) circunstanciado pelo emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, inciso I) ou pelo emprego de arma de fogo de uso proibido ou restrito (art. 157, § 2º-B); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019); O inciso II traz uma hipótese nova de roubo circunstanciado. Para que se caracterize esta causa de aumento de pena é necessário o preenchimento de dois requisitos: O roubo resultou em destruição ou rompimento de obstáculo; Essa destruição ou rompimento foi causado pelo fato de o agente ter utilizado explosivo ou artefato análogo que cause perigo comum. Vale ressaltar que, como o § 2º-A do art. 157, por se tratar de roubo, exige obrigatoriamente violência ou grave ameaça à pessoa. Na grande maioria dos casos essa violência ou grave ameaça será feita mediante emprego de arma de fogo. 39 Dessa forma, imaginem que o agente entra em um estabelecimento com seus comparsas, portando arma de fogo, rendem os funcionários e clientes e os trancam em uma sala. Com a utilização de uma dinamite, explodem o caixa eletrônico para dali subtrair o dinheiro. Neste exemplo, os agentes já responderiam pelo roubo com pena aumentada em 2/3 pelo simples fato de empregarem arma de fogo (inciso I do § 2º-A do art. 157 do CP). Diante disso, a circunstância narrada no inciso II (destruição ou rompimento de obstáculo mediante o emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum) será utilizada como agravante, nos termos do art. 61, II, “d”, do CP: Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: (...) II - ter o agente cometido o crime: (...) d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum; Por fim, para configurar a causa de aumento de pena do inciso II, NÃO é preciso à apreensão e perícia da arma: Roubo circunstanciado pelo emprego de arma e desnecessidade de perícia. De acordo com este Tribunal Superior, embora não realizado exame pericial para averiguar a potencialidade lesiva da arma, a sua utilização pode ser comprovada por outros meios de prova, o que justifica o aumento da pena. (AgRg no HC 449.102/MS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 09/10/2018, DJe 29/10/2018). 20.3.6 Roubo qualificado: art. 157, § 3.º, do Código Penal Como preceitua o art. 157, § 3.º, do Código Penal: § 3º Se da violência resulta: (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa; (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) A Lei nº 13.654/2018 alterou a redação do § 3º do art. 157 do Código Penal. Duas mudanças foram verificadas: 40 1. Dividiu a redação em dois tipos penais em incisos diferentes. 2. Aumentou a pena do roubo com resultado lesão corporal grave. Antes era de 7 a 15 anos. Agora é de 7 a 18 anos. Antes da Lei 13.654/2018 Depois da Lei 13.654/2018 (atualmente) Art. 157 (...) § 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa. § 3º Se da violência resulta: (Redação dada pela Lei nº 13.654, de 2018) I – lesão corporal grave, a pena é de reclusão de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e multa; (Incluído pela Lei nº 13.654, de 2018) II – morte, a pena é de reclusão de 20 (vinte)