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1 www.g7juridico.com.br INTENSIVO II Flávio Tartuce Direito Civil Aula 04 ROTEIRO DE AULA Direito das Coisas (CC, arts. 1.196 a 1.510-A) 1. Introdução. Direito das Coisas x Direitos Reais I – Direito das Coisas: ramo do Direito Civil que tem por objeto o estudo e a regulamentação das relações de domínio que uma pessoa exerce sobre uma coisa - Livro do Código Civil de 2002. II – Relação de domínio: Sujeito ativo Questão n. 1: quem é o sujeito passivo da relação dominial? O sujeito passivo é universal, ou seja, é toda a coletividade. Por isso, os efeitos dessa relação são, em regra, “erga omnes”. Observação n. 1: entre os civilistas, prevalece o entendimento segundo o qual não existe posse ou propriedade sobre bens incorpóreos ou imateriais. Portanto, inadmite-se a expressão “propriedade intelectual”, empregando-se “direitos intelectuais” ou “direitos de autor” (José de Oliveira Ascensão e Silmara Chinellato). No mesmo sentido, a Súmula 228 do STJ: “É inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral”. domínio Coisa = bem corpóreo ou material • Fático: posse • Jurídico: propriedade 2 www.g7juridico.com.br IV – O termo “Direitos Reais” significa um conjunto de categorias ou institutos relacionados à propriedade - previstos no art. 1.225 do Código Civil1 -, seja ela plena ou limitada. São direitos reais: • Inc. I: propriedade plena. • Inc. II: superfície. • Inc. III: servidões. • Inc. IV: usufruto. • Inc. V: uso. • Inc. VI: habitação. • Inc. VII: direito do promitente comprador do imóvel • Inc. VIII: penhor. • Inc. IX: hipoteca. • Inc. X: anticrese. • Inc. XI: concessão de uso especial para fins de moradia. • Inc. XII: concessão de direito real de uso. • Inc. XIII: a laje - incluído pela Lei n. 13.465/17. 1 CC, art. 1.225: “São direitos reais: I - a propriedade; II - a superfície; III - as servidões; IV - o usufruto; V - o uso; VI - a habitação; VII - o direito do promitente comprador do imóvel; VIII - o penhor; IX - a hipoteca; X - a anticrese. XI - a concessão de uso especial para fins de moradia; XII - a concessão de direito real de uso; e XIII - a laje”. Direitos reais de gozo ou fruição. Direitos reais de garantia Incisos XI e XII foram incluídos pela Lei n. 11.481/07. São concessões especiais do Poder Público. São direitos reais de gozo ou fruição. Direito real de aquisição (compromisso registrado). 3 www.g7juridico.com.br ➢ Observação n. 2: sobre a natureza jurídica da laje, há duas correntes: • Direito real de gozo ou fruição sobre coisa alheia (superfície) (Mazzei, Simão, Stolze e Pamplona). • Direito real sobre coisa própria (Rosenvald, Kümpel e Carlos Elias de Oliveira). ➢ Questão n. 2: o rol do artigo 1.225 do Código Civil é taxativo (“numerus clausus”) ou exemplificativo (“numerus apertus”)? Existem duas correntes: • Visão clássica (1ª corrente) (majoritária, inclusive para provas de 1ª fase): rol taxativo (princípio da taxatividade) (Caio Mário, Orlando Gomes, Maria Helena Diniz e Álvaro Villaça). • Visão contemporânea (2ª corrente) (minoritária, por enquanto): rol exemplificativo. Subcorrentes: ✓ Não há taxatividade, mas há tipicidade, ou seja, necessidade de previsão em lei (Gustavo Tepedino). ✓ Não há taxatividade, nem tipicidade. A autonomia privada pode criar direitos reais (Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald). Exemplo: “Time-sharing”. ➢ Existem direitos reais que não estão no rol do artigo 1.225 do Código Civil (previstos em leis especiais). Exemplo: alienação fiduciária em garantia: • Móveis: Dec.-Lei n. 911/69. • Imóveis: Lei n. 9.514/97. A respeito do “time-sharing” (multipropriedade imobiliária fracionada no tempo), há um precedente do STJ (REsp n. 1.546.165/SP) no sentido de que ele é um direito real, mas que não supera a ideia de taxatividade do rol do art. 1.225 do Código Civil, confirmando a 1ª corrente: “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA (TIME- SHARING). NATUREZA JURÍDICA DE DIREITO REAL. UNIDADES FIXAS DE TEMPO. USO EXCLUSIVO E PERPÉTUO DURANTE CERTO PERÍODO ANUAL. PARTE IDEAL DO MULTIPROPRIETÁRIO. PENHORA. INSUBSISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. 1. O sistema time-sharing ou multipropriedade imobiliária, conforme ensina Gustavo Tepedino, é uma espécie de condomínio relativo a locais de lazer no qual se divide o aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé, apartamento) entre os cotitulares em unidades fixas de tempo, assegurando-se a cada um o uso exclusivo e perpétuo durante certo período do ano. 2. Extremamente acobertada por princípios que encerram os direitos reais, a multipropriedade imobiliária, nada obstante ter feição obrigacional aferida por muitos, detém forte liame com o instituto da propriedade, se não for sua própria expressão, como já vem proclamando a doutrina contemporânea, inclusive num contexto de não se reprimir a autonomia da vontade nem a liberdade contratual diante da 4 www.g7juridico.com.br preponderância da tipicidade dos direitos reais e do sistema de numerus clausus. 3. No contexto do Código Civil de 2002, não há óbice a se dotar o instituto da multipropriedade imobiliária de caráter real, especialmente sob a ótica da taxatividade e imutabilidade dos direitos reais inscritos no art. 1.225. 4. O vigente diploma, seguindo os ditames do estatuto civil anterior, não traz nenhuma vedação nem faz referência à inviabilidade de consagrar novos direitos reais. Além disso, com os atributos dos direitos reais se harmoniza o novel instituto, que, circunscrito a um vínculo jurídico de aproveitamento econômico e de imediata aderência ao imóvel, detém as faculdades de uso, gozo e disposição sobre fração ideal do bem, ainda que objeto de compartilhamento pelos multiproprietários de espaço e turnos fixos de tempo. 5. A multipropriedade imobiliária, mesmo não efetivamente codificada, possui natureza jurídica de direito real, harmonizando-se, portanto, com os institutos constantes do rol previsto no art. 1.225 do Código Civil; e o multiproprietário, no caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento espaço-temporal (time-sharing), tem, nos embargos de terceiro, o instrumento judicial protetivo de sua fração ideal do bem objeto de constrição. 6. É insubsistente a penhora sobre a integralidade do imóvel submetido ao regime de multipropriedade na hipótese em que a parte embargante é titular de fração ideal por conta de cessão de direitos em que figurou como cessionária. 7. Recurso especial conhecido e provido” (REsp 1546165/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/04/2016, DJe 06/09/2016). ➢ Observação n. 3: a Lei 13.777/2018 introduziu ou artigos 1.358-B a 1.358-U no Código Civil, tratando do tema. 2. Diferenças entre os Direitos Reais e os Direitos Pessoais Patrimoniais I – Exemplos (por excelência): • Direitos reais: propriedade. • Direitos pessoais patrimoniais: contrato. Direitos reais Direitos pessoais patrimoniais Relação entre um sujeito ativo e uma coisa. O sujeito passivo é universal. Relação pessoal entre um sujeito ativo (credor) e um sujeito passivo (devedor). Princípio da publicidade (tradição ou registro). Princípio da autonomia privada. Rol taxativo. Rol exemplificativo. Efeitos “erga omnes” (absolutos) Efeitos “inter partes” (relativos). A coisa responde. O patrimônio do devedor responde. Caráter permanente. Caráter transitório. 5 www.g7juridico.com.br II - O quadro divisório ainda existe, mas há uma tendênciade aproximação entre os direitos reais e os direitos pessoais patrimoniais, contratualizando o Direito das Coisas (Luciano de Camargo Penteado - “Contratos de Direito das Coisas”). III – Demonstrando essa aproximação: ➢ 1º aspecto: há uma tendência em se afirmar que o rol do art. 1.225 do Código Civil é exemplificativo. ➢ 2º aspecto: em muitos casos, com previsão na lei, o direito real origina-se da autonomia privada. ➢ 3º aspecto: há tendência doutrinária de aplicação da boa-fé objetiva aos direitos reais. ➢ 4º aspecto: nem sempre o direito real terá efeitos “erga omnes”. E nem sempre o direito pessoal terá efeitos “inter partes”. Exemplos: • Súmula 308 do STJ2: a boa-fé objetiva vence a hipoteca (efeitos “inter partes”). • A função social do contrato na sua eficácia externa (Enunciado n. 21 – I Jornada de Direito Civil3). O contrato pode gerar efeitos perante terceiros. Exemplo: CC, art. 6084 (teoria do terceiro cúmplice). ➢ 5º aspecto: nem sempre o direito real terá caráter permanente - exemplos: alienação fiduciária e condomínio comum. E nem sempre o contrato será transitório – exemplo: contratos cativos de longa duração (Cláudia Lima Marques) (“casamentos contratuais”). Observação n. 4: Além desses cinco aspectos de aproximação, existem conceitos híbridos, que estão no “meio do quadro”. Exemplo: obrigação “propter rem” (própria da coisa, mista, híbrida, ambulatória ou reipersecutória) – Exemplo: dívidas condominiais (CC, art. 1.3455). 3. Posse (CC, arts. 1.196 a 1.224) 2 Súmula 308 do STJ: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”. 3 Enunciado n. 21, I JDC: “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito”. 4 CC, art. 608: “Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber durante dois anos”. 5 CC, art. 1.345: “O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios”. 6 www.g7juridico.com.br 3.1. Conceito, natureza jurídica, teorias justificadoras e diferenças quanto à detenção I – Conceito: domínio fático que uma pessoa exerce sobre uma coisa. II - A posse estará presente quando a pessoa tiver pelo menos um dos atributos relativos à propriedade (CC, art. 1.1966). ➢ Atributos da propriedade (“GRUD”): • Gozar/fruir. • Reaver/buscar. • Usar/utilizar. • Dispor/alienar. ➢ Propriedade: • Plena: todos os atributos. • Limitada: alguns atributos. • Posse: um atributo. ➢ Afirmações: • Todo proprietário é possuidor (direto ou indireto). • Nem todo possuidor é proprietário. Exemplos: locatário, comodatário e depositário. III – Natureza jurídica: segundo Moreira Alves, a posse é fato e é direito. Questão n. 3: é um direito de qual natureza? A posse é um direito de natureza especial ou “sui generis”. Portanto, não é direito real nem pessoal. IV – Teorias justificadoras da posse (3). a) Teoria subjetiva (Savigny) ➢ P = C + AD. 6 CC, art. 1.196: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”. 7 www.g7juridico.com.br Posse = “corpus” (domínio fático) + “animus domini” (intenção de ser proprietário da coisa). ➢ Por esta teoria, o locatário, o comodatário e o depositário não são possuidores, pois falta-lhes a intenção de dono. Portanto, a teoria subjetiva não foi adotada no Brasil, pois eles são possuidores. A teoria subjetiva, no Brasil, somente é relevante para fins de usucapião (posse “ad usucapionem”). b) Teoria objetiva ou simplificada (Ihering) ➢ P = C. Posse = “corpus” (domínio fático). ➢ Dentro do “corpus”, há um “animus”, não de ser proprietário, mas de explorar economicamente a coisa. ➢ Por essa teoria, o locatário, o comodatário e o depositário são possuidores. ➢ Entre as duas teorias clássicas, esta foi a adotada no Brasil (CC, arts. 1.1967 e 1.1978; e tinha sido adotado pelo Código Civil de 1916). c) Teoria da posse social ou da função social da posse (Saleilles – França; Perozzi – Itália; Hernandez Gil – Espanha) ➢ P = C + FS. Posse = “corpus” (domínio fático) + função social. ➢ A função social é componente da posse. ➢ Esta teoria foi adotada implicitamente pelo Código Civil de 2002, pela valorização da posse-trabalho. Artigos: • CC, art. 1.238, parágrafo único9: usucapião extraordinária. O prazo cai de 15 para 10 anos se houver posse- trabalho. 7 CC, art. 1.196: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”. 8 CC, art. 1.197: “A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto”. 8 www.g7juridico.com.br • CC, art. 1.242, parágrafo único10: usucapião ordinária. O prazo cai de 10 para 5 anos se houver posse-trabalho ao lado de um requisito formal. • CC, art. 1.228, §§ 4º e 5º11: desapropriação judicial privada por posse-trabalho (Miguel Reale). V – Posse (CC, art. 1.196) e detenção (CC, art. 1.19812). ➢ O detentor também é chamado de “servidor da posse” ou “fâmulo da posse”. ➢ O detentor tem a coisa em nome de outra pessoa, com quem tem relação de dependência, recebendo ordens e instruções suas. ➢ Exemplos: • Exemplo 1: “Parei o meu carro em um estacionamento e entreguei as chaves ao manobrista” (MP-RS): ✓ Empresa de estacionamento: depositária (possuidora). ✓ Manobrista: detentor. Questão de concurso (MPE-RS - 2017 - MPE-RS - Promotor de Justiça - Reaplicação): Assinale a alternativa INCORRETA quando ao Direito das Coisas. (A) As leis extravagantes podem criar novos direitos reais, sem a sua descrição expressa no dispositivo civil que os prevê. 9 CC, art. 1.238: “Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo”. 10 CC, art. 1.242: “Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos. Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico”. 11 CC, art. 1.228: (...). § 4º: O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerávelnúmero de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5º: No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores”. 12 CC, art. 1.198, “caput”: “Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas”. https://www.qconcursos.com/questoes-de-concursos/provas/mpe-rs-2017-mpe-rs-promotor-de-justica-reaplicacao 9 www.g7juridico.com.br (B) João estaciona seu carro em um estacionamento e entrega a chave ao manobrista. A empresa de estacionamento nesta situação é a possuidora do veículo, o manobrista é mero detentor do mesmo, podendo defender a posse alheia do automotor por meio da autotutela. (C) Posse injusta para efeito possessório é aquela que tem vícios de origem na 1 violência, clandestinidade e precariedade. Mas para ação reivindicatória, posse injusta é aquela sem causa jurídica que possa justificá-la. (D) O fideicomisso, a propriedade fiduciária e a doação com cláusula de reversão são casos de propriedade resolúvel, que produz efeitos ex tunc. (E) Luís tem a posse de um terreno de 830 m² (oitocentos e trinta metros quadrados). Certo dia, a área de 310 m² (trezentos e dez metros quadrados) desse terreno foi invadida. A ação cabível no caso é a de manutenção de posse. Gabarito: E • Exemplo 2: ocupação irregular de terras públicas: a posição do STJ sempre foi no sentido de detenção (REsp n. 556.721/DF). Em 2016 (REsp n. 1.484.304/DF – Inf. 579), entendeu-se que há posse, a qual não possibilita usucapião, mas possibilita ação possessória contra quem invade a área. Em 2018, voltou-se à tese da detenção (Súmula 619, STJ13). “EMENTA - EMBARGOS DE TERCEIRO - MANDADO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - OCUPAÇÃO IRREGULAR DE ÁREA PÚBLICA - INEXISTÊNCIA DE POSSE - DIREITO DE RETENÇÃO NÃO CONFIGURADO. 1. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como proprietário. Posse e propriedade, portanto, são institutos que caminham juntos, não havendo de ser reconhecer a posse a quem, por proibição legal, não possa ser proprietário ou não possa gozar de qualquer dos poderes inerentes à propriedade. 2. A ocupação de área pública, quando irregular, não pode ser reconhecida como posse, mas como mera detenção. 3. Se o direito de retenção depende da configuração da posse, não se pode, ante a consideração da inexistência desta, admitir o surgimento daquele direito advindo da necessidade de se indenizar as benfeitorias úteis e necessárias, e assim impedir o cumprimento da medida imposta no interdito proibitório. 4. Recurso provido” (REsp 556.721/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/09/2005, DJ 03/10/2005, p. 172). “EMENTA - PROCESSUAL CIVIL. ÁREAS PÚBLICAS DISPUTADAS ENTRE PARTICULARES. POSSIBILIDADE DO SOCORRO ÀS DEMANDAS POSSESSÓRIAS. 1. A ocupação de área pública, sem autorização expressa e legítima do titular do domínio, não pode ser confundida com a mera detenção. 2. Aquele que invade terras e nela constrói sua moradia jamais exercerá a posse em nome alheio. Não há entre ele e o proprietário ou quem assim possa ser qualificado como o que ostenta jus possidendi uma relação de dependência ou subordinação. 3. Ainda que a posse não possa ser oposta ao ente público 13 Súmula 619, STJ: “A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias.” 10 www.g7juridico.com.br senhor da propriedade do bem, ela pode ser oposta contra outros particulares, tornando admissíveis as ações possessórias entre invasores. 4. Recurso especial não provido” (REsp 1484304/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 15/03/2016). • Exemplo 3: caseiro: ✓ Em relação à sede da fazenda: detentor. ✓ Em relação à casa de colono (comodato): possuidor. ➢ O detentor pode passar a ser possuidor (CC, art. 1.198, parágrafo único14). Isso é possível por força de contrato, nos casos em que a pessoa passa a se comportar como possuidora (Enunciado 301, IV Jornada de Direito Civil15). 3.2. Principais classificações da posse e seus efeitos 3.2.1. Quanto à relação pessoa-coisa ou quanto ao desdobramento ou quanto ao paralelismo Essa classificação é retirada do art. 1.197 do CC – classificação em posse direta e indireta. a) Posse direta: quando a pessoa tem uma relação imediata e corpórea com a coisa (poder físico imediato). Exemplos: locatário, comodatário e depositário. b) Posse indireta: é aquela decorrente do exercício de um direito. Exemplos: locador, comodante e depositante. A posse direta é havida de quem tem a posse indireta. O art. 1.197, CC, prevê que o possuidor direto pode defender a sua posse contra o indireto (e vice-versa – Enunciado 76, I Jornada de Direito Civil). Exemplo 1: vigente uma locação, o locatário viaja para o exterior e, quando retorna, o imóvel foi invadido pelo locador. O locatário ingressa com ação de reintegração de posse contra o locador. O locador, em defesa, alega 14 CC, art. 1.198, parágrafo único: “Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário”. 15 Enunciado 301, IV JDC: “É possível a conversão da detenção em posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessórios.” 11 www.g7juridico.com.br apenas ser proprietário do imóvel (“exceptio proprietates”). Essa ação deve ser julgada procedente, pois nas ações possessórias não cabe a alegação de propriedade ou de outro direito real sobre a coisa (art. 1.210, §2º, CC16). “Posse é posse, propriedade é propriedade” (Paulo Lôbo). Não há hierarquia entre os institutos. 3.2.2. Quanto aos vícios objetivos (art. 1.200, CC17) a) Posse justa – “posse limpa”, ou seja, sem os vícios objetivos. b) Posse injusta – aquela que apresenta, pelo menos, um dos três vícios. b.1) Posse violenta: obtida com violência física ou moral (roubo da posse). b.2) Posse clandestina: aquela obtida na “surdina”, sem a possibilidade de defesa da outra parte (furto da posse). b.3) Posse precária: aquela obtida em abuso de confiança ou de direito (estelionato ou apropriação indébita). 16 CC, art. 1.210, §2º: “Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.” 17 CC, art. 1.200: “É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.”
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