Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Tutoria 1- Lupus Eritematoso Sistêmico Quadro geral da doença Discussão do caso Paciente do sexo feminino, 25 anos (idade fértil), tem queixa principal de dor articular há 4 meses. Essa dor pode estar associada a uma gama de doenças, mas que pode ser restringida de acordo com as características. O fato de ela ser jovem, piorar ao acordar e melhorar com movimento, afastam a possibilidade de ser osteoartrite (anteriormente nomeada osteoartrose), já que esta acomete mais pessoas idosas e piora com o movimento. Podemos pensar também em artrite reumatoide, artrite gotosa(gota), febre reumática, artrite reativa, lúpus eritematoso sistêmico, artrite pós infecção gonocócica dentre outras. Desse modo, podemos afastar a artrite reumatoide pois ela geralmente tem padrão aditivo, poupa articulação falangeana distal, além de causar deformação, podendo também gerar nodulações subcutâneas. A artrite gotosa pode ser afastada pois na maioria dos casos é monoarticular, e apresenta a podagra (dor no hálux). A febre reumática apesar de possuir padrão articular migratório, geralmente vem acompanhada de febre, com início do quadro de duas a três semanas após infecção estreptocócica, o que afasta do quadro apresentado pela paciente. A maior suspeita para o caso acaba sendo o Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES), que apresenta geralmente uma poliartrite que pode ser migratória, não poupando articulações, geralmente não aditiva. Além disso, as lesões de pele, de mucosa oral, o rash cutâneo, a alopecia, favorecem a suspeita. A febre e perda de peso podem ocorrer, mas tem incidência variável. As convulsões podem ocorrer em pacientes com LES, inclusive sem a presença de outros sinais mais comuns, o que pode ser um fator confundidor. Como podemos perceber, a queixa de artrite possui várias causas dentre elas as doenças reumatológicas, que são um grupo de doenças com sintomatologia algumas vezes parecida e que pode implicar em confusão diagnóstica se seguido apenas os critérios clínicos, logo é necessário realização de exames laboratoriais para a confirmação. O que é lúpus? O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES ou apenas lúpus) é uma doença inflamatória crônica de origem autoimune, cujos sintomas podem surgir em diversos órgãos de forma lenta e progressiva (em meses) ou mais rapidamente (em semanas) e variam com fases de atividade e de remissão. São reconhecidos dois tipos principais de lúpus: o cutâneo, que se manifesta apenas com manchas na pele (geralmente avermelhadas ou eritematosas e daí o nome lúpus eritematoso), principalmente nas áreas que ficam expostas à luz solar (rosto, orelhas, colo (“V” do decote) e nos braços) e o sistêmico, no qual um ou mais órgãos internos são acometidos. Por ser uma doença do sistema imunológico, que é responsável pela produção de anticorpos e organização dos mecanismos de inflamação em todos os órgãos, quando a pessoa tem LES ela pode ter diferentes tipos sintomas e vários locais do corpo. Alguns sintomas são gerais como a febre, emagrecimento, perda de apetite, fraqueza e desânimo. Outros, específicos de cada órgão como dor nas juntas, manchas na pele, inflamação da pleura, hipertensão e/ou problemas nos rins. Quem tem lúpus? O lúpus pode ocorrer em pessoas de qualquer idade, raça e sexo, porém as mulheres são muito mais acometidas. Ocorre principalmente entre 20 e 45 anos, sendo um pouco mais frequente em pessoas mestiças e nos afrodescendentes. Acredita-se assim que uma a cada 1.700 mulheres no Brasil tenha a doença. O que causa o lúpus? Embora a causa do LES não seja conhecida, sabe-se que fatores genéticos, hormonais e ambientais participam de seu desenvolvimento. Portanto, pessoas que nascem com susceptibilidade genética para desenvolver a doença, em algum momento, após uma interação com fatores ambientais (irradiação solar, infecções virais ou por outros micro-organismos), passam a apresentar alterações imunológicas. A principal delas é o desequilíbrio na produção de anticorpos que reagem com proteínas do próprio organismo e causam inflamação em diversos órgãos como na pele, mucosas, pleura e pulmões, articulações, rins etc.). Dessa forma, entendemos que o tipo de sintoma que a pessoa desenvolve, depende do tipo de autoanticorpo que a pessoa tem e, que como o desenvolvimento de cada anticorpo se relaciona às características genéticas de cada pessoa, cada pessoa com lúpus tende a ter manifestações clínicas (sintomas) específicas e muito pessoais. Quais são os sintomas da doença? Os sintomas do LES são diversos e tipicamente variam em intensidade de acordo com a fase de atividade ou remissão da doença. É muito comum que a pessoa apresente manifestações gerais como cansaço, desânimo, febre baixa (mas raramente, pode ser alta), emagrecimento e perda de apetite. As manifestações podem ocorrer devido à inflamação na pele, articulações (juntas), rins, nervos, cérebro e membranas que recobrem o pulmão (pleura) e o coração (pericárdio). Outras manifestações podem ocorrer devido à diminuição das células do sangue (glóbulos vermelhos e brancos), devido a anticorpos contra essas células. Esses sintomas podem surgir isoladamente, ou em conjunto e podem ocorrer ao mesmo tempo ou de forma sequencial. Crianças, adolescentes ou mesmo adultos podem apresentar https://www.sanarflix.com.br/portal/caso-clinico-artrite-reumatoide/ https://www.sanarflix.com.br/portal/caso-clinico-artrite-reumatoide/ inchação dos gânglios (ínguas), que geralmente é acompanhada por febre e pode ser confundida com os sintomas de infecções como a rubéola ou mononucleose. As manifestações clínicas mais frequentes são alterações/ lesões de: a. Pele; b. Articulares; c. Pleurite ou pericardite; d. Nefrite; e. Alterações neuropsiquiátricas; f. Sangue Diagnóstico de lúpus Para o diagnóstico de LES costuma-se utilizar a orientação do Colégio Americano de Reumatologia (CAR), no qual é necessário que 4 dos 11 critérios* estabelecidos, estejam presentes para definir a doença. Estando presente ou havendo suspeita de dois dos 11 critérios, já é recomendada a solicitação da pesquisa de anticorpos antinucleares (FAN-HEp-2). O exame FAN é positivo em 98% dos casos, sendo assim ressalta-se sua alta sensibilidade, mas não sua especificidade. Outros testes laboratoriais como os anticorpos anti-Sm e anti-DNA são muito específicos, mas ocorrem de 30-40% das pessoas com LES. Da mesma forma, os anticorpos antiproteína P ribossômica, presentes em apenas 10% dos casos de LES, podem, em alguns casos, ser os únicos marcadores de doença e também auxiliam no acompanhamento de pacientes com quadros graves de distúrbios psiquiátricos associados a essa doença. Outros exames consistem na avaliação hematológica, tendo como parâmetros as seguintes alterações: 1. anemia hemolítica com reticulocitose; 2. leucopenia de menos de 4.000/mm³ em duas ou mais ocasiões; 3. linfopenia de menos de 1.500/mm³ em duas ou mais ocasiões; 4. trombocitopenia de menos de 100.000/mm³ na ausência de uso de fármacos causadores. As provas inflamatórias de fase aguda, como a velocidade de hemossedimentação (VHS) e a proteína C reativa (PCR), são úteis para o diagnóstico. A VHS geralmente está aumentada na atividade da doença, refletindo a fase aguda dos processos inflamatórios, porém pode persistir elevada mesmo após o controle da doença, não se correlacionando com sua atividade inflamatória. Entretanto, a PCR é geralmente baixa no LES e aumenta nos processos infecciosos, auxiliando por vezes no diagnóstico diferencial dessas duas condições. Como o diagnóstico é feito? O diagnóstico é feito através do reconhecimento pelo médico de um ou mais dos sintomas acima. Ao mesmo tempo, como algumas alterações nos exames de sangue e urina são muito características, eles também são habitualmente utilizados para a definição final do diagnóstico. Exames comuns de sangue e urina são úteis não só para o diagnósticoda doença, mas também são muito importantes para definir se há atividade do LES. Embora não exista um exame que seja exclusivo do LES (100% específico), a presença do exame chamado FAN (anticorpo antinuclear), principalmente com títulos elevados, em uma pessoa com sinais e sintomas característicos de LES, permite o diagnóstico com muita certeza. Outros testes laboratoriais como os anticorpos anti-Sm e anti-DNA são muito específicos, mas ocorrem em apenas 40% a 50% das pessoas com LES. Ao mesmo tempo, alguns exames de sangue e/ou de urina podem ser solicitados para auxiliar não no diagnóstico do LES, mas para identificar se há ou não sinais de atividade da doença. Existem critérios desenvolvidos pelo Colégio Americano de Reumatologia, que podem ser úteis para auxiliar no diagnóstico do LES, mas não é obrigatório que a pessoa com LES seja enquadrada nesses critérios para que o diagnóstico de LES seja feito e que o tratamento seja iniciado. Critérios para diagnóstico do lúpus eritrematoso sistêmico (LES) 1. Eritema malar: eritema fixo, plano ou elevado nas eminências malares, tendendo a poupar a região nasolabial. É a lesão vermelha no rosto (“asa de borboleta”). Não deixa cicatriz. 2. Lesão discoide: lesão eritematosa, infiltrada, com escamas queratóticas aderidas e tampões foliculares, que evolui com cicatriz atrófica e discromia. Também ocorrem mais frequentemente em áreas expostas à luz, são bem delimitadas e podem deixar cicatrizes com atrofia e alterações na cor da pele 3. Fotossensibilidade: eritema cutâneo resultante de reação incomum ao sol, por história do paciente ou observação do médico. Neste caso, com apenas um pouco de exposição à claridade ou ao sol, podem surgir tanto manchas na pele como sintomas gerais (cansaço) ou febre. A queda de cabelos é muito frequente, mas ocorre tipicamente nas fases de atividade da doença e na maioria das pessoas, o cabelo volta a crescer normalmente com o tratamento. 4. Úlcera oral: ulceração oral ou nasofaríngea, geralmente não dolorosa, observada pelo médico. 5. Artrite: artrite não erosiva envolvendo 2 ou mais articulações periféricas, caracterizada por dor à palpação, edema ou derrame. A dor com ou sem inchaço nas juntas ocorre, em algum momento, em mais de 90% das pessoas com LES e envolve principalmente nas juntas das mãos, punhos, joelhos e pés, tendem a ser bastante dolorosas e ocorrem de forma intermitente, com períodos de melhora e piora. Às vezes também surgem como tendinites. 6. Serosite: a) pleurite – história convincente de dor pleurítica ou atrito auscultado pelo médico ou evidência de derrame pleural; ou b) pericardite – documentada por eletrocardiografia ou atrito ou evidência de derrame pericárdico. São relativamente comuns, podendo ser leves e assintomáticas, ou, se manifestar como dor no peito. Caracteristicamente no caso da pleuris, a dor ocorre ao respirar, podendo causar também tosse seca e falta de ar. Na pericardite, além da dor no peito, pode haver palpitações e falta de ar. 7. Alteração renal: a) proteinúria persistente de mais de 0,5 g/dia ou acima de 3+ (+++) se não quantificada; ou b) cilindros celulares – podem ser hemáticos, granulares, tubulares ou mistos. É uma das que mais preocupam e ocorrem em cerca de 50% das pessoas com LES. No início pode não haver qualquer sintoma, apenas alterações nos exames de sangue e/ou urina. Nas formas mais graves, surge pressão alta, inchaço nas pernas, a urina fica espumosa, podendo haver diminuição da quantidade de urina. Quando não tratada rapidamente e adequadamente o rim deixa de funcionar (insuficiência renal) e o paciente pode precisar fazer diálise ou transplante renal. 8. Alteração neurológica: a) convulsão – na ausência de fármacos implicados ou alterações metabólicas conhecidas (por exemplo, uremia, cetoacidose, distúrbios hidroeletrolíticos); ou b) psicose – na ausência de fármacos implicados ou alterações metabólicas conhecidas (por exemplo, uremia, cetoacidose, distúrbios hidroeletrolíticos). 9. Alterações hematológicas: a) anemia hemolítica com reticulocitose; ou b) leucopenia ou c) linfopenia; ou d) trombocitopenia. As alterações nas células do sangue são devido aos anticorpos contra estas células, causando sua destruição. Assim, se os anticorpos forem contra os glóbulos vermelhos (hemácias) vai causar anemia, contra os glóbulos brancos vai causar diminuição de células brancas (leucopenia ou linfopenia) e se forem contra as plaquetas causará diminuição de plaquetas (plaquetopenia). Os sintomas causados pelas alterações nas células do sangue são muito variáveis. A anemia pode causar palidez da pele e mucosas e cansaço e a plaquetopenia poderá causar aumento do sangramento menstrual, hematomas e sangramento gengival. Geralmente a diminuição dos glóbulos brancos é assintomática. 10. Alterações imunológicas: a) presença de anti-DNA nativo; ou b) presença de anti-Sm; ou c) achados positivos de anticorpos antifosfolipídios baseados em concentração sérica anormal de anticardiolipina IgG ou IgM, em teste positivo para anticoagulante lúpico, usando teste-padrão ou em VDRL falso-positivo, por pelo menos 6 meses e confirmado por FTA-Abs negativo. 11. Anticorpo antinuclear (FAN): título anormal de FAN por imunofluorescência ou método equivalente em qualquer momento, na ausência de fármacos sabidamente associados ao lúpus induzido por fármacos. EXPLICAR AS ALTERAÇÕES/ MARCAR E ENTENDER ALTERAÇÕES NOS EXAMES / SINTOMAS Dentre as apresentações mais frequentes do LES está à manifestação de doenças renais, em aproximadamente 30 a 70% dos casos, sendo mais comum em crianças. Os doentes que evoluem para esse tipo de manifestação apresentam risco de infecções agravado devido à perda pela urina de imunoglobulinas e fator B da properdina, ao defeito na imunidade celular, à má nutrição, e ao fato do edema/ ascite constituirem um potencial meio de cultura. A principal causa de óbito por LES se dá por infecções causadas por bactérias gram negativas, fungos e agentes oportunistas. A linfopenia, a reduzida capacidade fagocítica dos polimorfonucleares, a diminuição do complemento sérico e a asplenia funcional são responsáveis pela frequência e gravidade das infecções. AUTOIMUNIDADE/ GENÉTICA A paciente que tenha a etnia lúpica, ou seja, formação genética constitucional que a predispõe a desenvolver lúpus, já possui autoanticorpos em grande quantidade. Quando uma substância vinda do exterior une-se a eles, forma-se o complexo antígeno-anticorpo. Isso ativa o sistema complemento e leva à formação dos complexos imunes, cuja concentração dita a gravidade e o prognóstico da doença, porque eles se depositam no cérebro e nos rins principalmente. O complexo imune depositado no rim inflama esse órgão, produzindo a nefrite lúpica, importante para determinar se a doente vai viver muitos anos ou ter a sobrevida encurtada. Embora a etiologia do LES e da AR não esteja bem estabelecida, hipotetiza-se que a ativação desregulada dos linfócitos desempenhe um papel importante na quebra da tolerância imunológica e leve à autorreatividade. Envolvidas nesses processos, as moléculas coestimuladoras são essenciais para o equilíbrio entre a ativação e a inibição dos linfócitos T. Dentre essas moléculas, a proteína PD-1 tem mostrado um importante envolvimento na profunda perda de autotolerância, o que leva à rápida letalidade associada à infiltração de linfócitos em vários órgãos. Essa proteína é expressa na superfície dos linfócitos T, linfócitos B e células mieloides e é um membro da família CD28 que pertence à superfamília das imunoglobulinas e atua como uma molécula inibitória dos linfócitos T, após interação com os seus ligantes PDL-1 e PDL-2. Após a ativação inicial das interações com os linfócitos T, o complexo PD-1-PDL-1/2 pode limitar a proliferação dos linfócitos T autorreativos e a produção de citocinas. Por sua vez, a PD-1,estimulada por antígenos, atenua a sinalização dos receptores de linfócitos T (TCR - T-cell receptor). A quantidade de expressão de PD-1 e o grau de envolvimento entre essa proteína e seus ligantes regulam o limiar de ativação dos linfócitos T e a quantidade de citocinas produzidas. A proteína PD-1 é codificada pelo gene codificado pelo gene PDCD1, localizado no locus 2q37.3. Entre os SNPs encontrados nessa região, o PD1.3G/A (rs11568821) representa um polimorfismo potencialmente funcional relacionado com a regulação da transcrição de PD-1.24 O alelo PD1.3 A altera o sitio de ligação do fator de transcrição RUNX1 (ou AML1), localizado na região ativadora do íntron 4, o que poderia levar à expressão aberrante da proteína e sugerir um mecanismo para a quebra da autotolerância. -- Em todos os indivíduos existe o potencial para a autoimunidade, pois durante seu desenvolvimento, os linfócitos podem expressar receptores específicos para antígenos próprios, e muitos desses antígenos são rapidamente acessíveis ao sistema imune. A tolerância aos antígenos próprios é normalmente mantida por processos de seleção, que evitam a maturação de alguns linfócitos específicos que poderiam atacar autoantígenos, e por mecanismos que inativam ou deletam os linfócitos autorreativos. Não é conhecido se o defeito patogênico primário do LES (falha de tolerância central ou periférica) está nos linfócitos B, nas células T auxiliares ou em ambos. A apoptose é um processo de destruição celular ordenado e de remoção dos restos celulares, e várias doenças autoimunes têm sido associadas a alterações neste processo. Durante este processo, são expostos componentes nucleares e citoplasmáticos, que estão habitualmente fora do alcance do sistema imunitário, e assim podem ocorrer reações imunes contra elementos do núcleo, citoplasma e membrana. Quando as células apoptóticas são expostas, as células dendríticas (DC) não ativam as células T, o que já não ocorre no caso de células necróticas. O que pode ocorrer, durante o turnover normal dos tecidos, é que as células apoptóticas sejam capturadas pelas DC e transportadas para os gânglios linfáticos, onde é induzida tolerância aos antígenos expostos, e, alguma falha no processo de tolerância em relação às células apoptóticas, poderá tornar um indivíduo suscetível ao aparecimento de processos autoimunes e autoanticorpos. Desta forma, a fonte mais provável dos autoantígenos que vão dar origem aos autoanticorpos no lúpus são os restos celulares resultantes da apoptose. As vesículas apoptóticas expõem na sua superfície moléculas intracelulares, que normalmente não são apresentadas ao sistema imunitário, como nucleossomas, Ro 62, Ro 50 etc. Anticorpos contra estas substâncias são frequentes em pacientes com LES, e têm sido associados ao desenvolvimento de lesões cutâneas. Na desregulação imune do LES ocorre degradação anormal das células e perda da autotolerância; certos antígenos (sobretudo nucleares) são processados por células de apresentação de antígenos (macrófagos, linfócitos B, células dendríticas) em peptídios. Há expansão de células T auxiliares (CD4) autorreativas que, através da liberação de citocinas (IL-6, IL-4), posterior ativação, proliferação e diferenciação das células B autorreativas em células produtoras de anticorpos, com consequente produção de quantidades excessivas de anticorpos contra muitos antígenos nucleares. Por conseguinte, surge um perfil imunológico típico no paciente com LES – o desenvolvimento de níveis elevados de anticorpos antinucleares (ANA), sobretudo contra o DNA, Sm, RNP, Ro, La e outros. Com o curso da doença, a resposta imune é desviada de anticorpos IgM de baixa afinidade e alta reatividade cruzada – através de (hiper)mutação somática – para anticorpos IgG fixadora do complemento de alta afinidade (principalmente IgG1 e 3) e em epítopos mais limitados nos “auto”-antígenos. Idiotipos peculiares dos anticorpos podem estimular a expansão de células T autoreativas, ajudando assim determinados clones de células B a sofrer expansão, com consequente produção de mais ANA específicos com idiotipos peculiares. Os hormônios femininos promovem a hiperatividade das células B Por que é mais comum em mulheres? Hormônios É fundamental estabelecer uma correlação entre o sistema de imunidade, de defesa do organismo, com o sistema endócrino. O estrógeno (hormônio feminino) é autoformador de anticorpos; a testosterona (hormônio masculino) é baixo produtor. O estrógeno é sinérgico à produção de autoanticorpos e a testosterona, supressora. Na mulher lúpica, ocorre excesso de sinergismo, ou seja, excesso na produção de anticorpos, que se traduz pela taxa elevada da proteína gamaglobulina nos exames de laboratório. Existem ainda fatores hormonais, como os hormônios femininos (estrógeno e prolactina) e masculinos (testosterona), que participam da patogênese da doença. O peso de cada um desses fatores vai variar de paciente para paciente LIGAR COM OS ABORTOS; O argumento é que algumas dessas mulheres produzem anticorpos contra um constituinte especial chamado fosfolípedes, ou seja, substâncias com o radical fósforo do tipo gorduroso situadas na circulação. Esses anticorpos são responsáveis pela incidência de abortos recorrentes, aliás, outro sinal de pré-lúpus. Além de abortos de repetição, essas mulheres formam coágulos em várias partes do corpo. Formam trombos no cérebro e formam êmbolos. Paciente lúpica que não tenha esse componente talvez possa ter uma gravidez normal. No entanto, nas portadoras de lesão renal, aumenta muito a possibilidade de abortos ou de dar origem a um feto com pouca chance de sobrevivência. Na verdade, algumas não têm dificuldade para engravidar, mas a gravidez pode ser tempestuosa e difícil e exige segmento pré-natal feito por especialista. A gravidez é um estado de predomínio de estrogênio que está associado com perfil de citocinas Th2, essencial para a tolerância materna ao feto e manutenção da gravidez. No LES, onde prevalece a imunidade Th2, a gravidez está relacionada com a ativação da doença. A gravidez pode causar exacerbações da doença, pois há grandes alterações imunológicas, endócrinas, metabólicas e vasculares, tornando a gestante susceptível, necessitando intervenção imunosupressiva. No passado, era aconselhado a essas pacientes que evitassem a gravidez pelo temor de complicações maternas e fetais. Atualmente, a melhor compreensão da doença e o manejo multidisciplinar, levaram a melhores resultados perinatais e maternos. Entretanto, sabe-se que gestações em pacientes lúpicas apresentam maiores índices de abortamentos, partos prematuros e restrição do crescimento fetal (RCF). Vários fatores estão associados a esses resultados, como atividade da doença, nefropatia prévia, hipertensão arterial e a presença de anticorpos antifosfolípides (aPL). Pode ocorrer ainda, o lúpus neonatal, uma síndrome neonatal e fetal, caracterizada por bloqueio cardíaco e lesões cutâneas. associada à presença de anticorpos contra ribonucleoproteínas citoplasmáticas SSA (Ro) e SSB (La). -- A gestante apresenta estado de imunomodulação fisiológica. Células embrionárias que se fixam ao útero e eventualmente formam a placenta, iniciam a atividade que estimula resposta supressiva ao linfócito Th2. O trofoblasto induz à produção no organismo materno de anticorpos capazes de dirigir a atividade imunológica materna contra aloantígenos paternos. Estes anticorpos suprimem as células Natural- Killer (NK) citotóxicas, através de receptores Fab para atividade inibitória ou atividade de estímulo. Além de aloantígenos, as mulheres entram em contato com volume excessivo de autoantígenos representados pelos produtos fetais, facilitando o aparecimento de autoanticorpos. O estrogênio ainda promove a maturação das células B e formação de anticorpos, além de evitar a apoptose dos macrófagos na sinóvia, e reduzira apoptose das células do sangue, mas não das células T. Pacientes com LES de ambos os sexos têm aumento da hidroxilação de estrógenos em 16-αhidroxiestrona e estriol, metabólitos feminilizantes. A elevação do estriol sérico é frequentemente vista em mulheres com LES, e algumas vezes está associada à atividade da doença. A gravidez resulta em uma supressão da resposta imune celular, mas também na preservação e algumas vezes aumento da imunidade humoral. O estrogênio e a progesterona têm efeitos diferentes na regulação do equilíbrio Th1/Th2, sendo que a progesterona leva ao aumento na produção de IL-4 e IL-10 pelas células T, promovendo assim a diferenciação destas células. Um estudo mostrou que pacientes com LES responderam ao tratamento com estrogênio com uma redução da produção de TNF pelas células do sangue, sendo que TNF é um dos fatores de regulação da apoptose, e a falha para manter essa produção durante a gestação pode perturbar a atividade celular imunocompetente da apoptose no LES, e assim aumentar a autoimunidade. Assim, alguns investigadores acreditam que as mudanças induzidas pela gestação na resposta Th2 são um fator contribuinte para a atividade observada em pacientes gestantes com LES. Em gestações normais, ocorre aumento gradual dos níveis séricos do Sistema Complemento, incluindo C3, C4 e CH50. Elevação superior de 30 a 50% em relação aos valores pré-gravídicos é observado com frequência, e está associado a uma maior síntese hepática induzida pelo estrogênio. A hipocomplementemia de C3, C4 e CH50 também pode estar relacionada à atividade da doença durante a gestação. O estrogênio estimula a secreção de prolactina, hormônio polipeptídico secretado pela glândula pituitária anterior, que aumenta durante a gravidez e no período da lactação. Tem efeito sobre as células B e células T, envolvida na proliferação e diferenciação celular, e tem múltiplos efeitos sobre o sistema imune. A prolactina estimula a resposta imune, e foram verificados níveis elevados deste hormônio em pacientes com LES em ambos os sexos. Desta forma, as mudanças hormonais da gravidez podem agravar os sintomas do LES. Dados recentes mostram diminuição significativa da concentração de hormônios esteroidais no soro das pacientes com LES no terceiro trimestre de gestação, fator que poderia ser responsável pela surpreendente diminuição de recaídas observada por alguns autores neste período de gestação nas pacientes. Torna-se evidente que diferenciar os sinais e sintomas da exacerbação lúpica das alterações fisiológicas e de outros estados patológicos da gestação pode ser um desafio e um dado extremamente importante para o tratamento adequado. O período ideal para a concepção é a fase de remissão da doença. A fim de minimizar os riscos de exacerbação do LES durante a gestação, a doença deve estar inativa pelo menos por seis meses antes do momento da concepção. O momento adequado para a concepção é um artifício eficaz para garantir às pacientes portadoras de LES, uma gestação segura. DIAGNÓSTICO Diagnóstico clínico: Ter pelo menos 4 dos 11 sintomas já citados. Diagnóstico laboratorial: Os auto anticorpos são as evidências mais consistentes em exames laboratoriais para o diagnóstico do lúpus eritematoso. Os fatores antinucleares (FAN) estão presentes em quase todos os casos de doença ativa, e reagem com componentes do núcleo, não sendo específicos para o LES. No entanto, em nenhum outro caso existe frequência e título tão elevados destes fatores. Alguns auto anticorpos como o anti- Sm e o anti- DNA de dupla hélice são altamente específicos para o lúpus eritematoso sistêmico. Quando os exames são reagentes aos auto anticorpos, o paciente deve ser submetido à avaliação reumatológica, pois a presença dos auto anticorpos, por si só, não é específica para o diagnóstico do Lúpus Eritematoso. Os testes de laboratório são mais úteis quando estão associados às seguintes informações: sinais e sintomas de lúpus, um resultado positivo no teste FAN, que confirma o diagnóstico. Não são necessários mais exames, se uma pessoa tem apenas dois ou três sintomas, então um resultado positivo no ANA (Fator Anti Nuclear- ANA) reforça o diagnóstico. Nesse caso, a menos que testes mais específicos se apresentem reagentes (ex: anti- DNA, anti- Ro- contra RNA), o diagnóstico do lúpus é considerado incerto até que sejam encontrados mais sinais clínicos ou outros exames sanguíneos mais específicos. Pode-se optar por fazer uma biópsia nas erupções cutâneas e nos cabelos do paciente, que podem auxiliar no diagnóstico do Lúpus Sistêmico em 75% dos casos. Testes de laboratório que dosam os níveis de complemento no sangue, também são de algum valor, já que se o nível total de complemento no sangue se apresentar baixo, ou os valores dos complementos C3 e C4 estiverem baixos, e o paciente também tem um FAN positivo, algum peso é adicionado ao diagnóstico do lúpus. Baixos níveis dos complementos C3 e C4 em indivíduos com resultados positivos no teste FAN, também podem indicar lúpus com envolvimento maior dos rins. TRATAMENTO Suprimir a produção de estrógeno não ajuda. Não há um tratamento específico para o LES, pois não existe um protocolo padrão para todos os pacientes. Dessa forma, uma série de medidas, entre medicamentos e normas, para que se tenha uma boa qualidade de vida são empregadas. Algumas medidas gerais devem ser adotadas como parte importante da abordagem terapêutica, como oferecer para o paciente como para familiares acompanhamento psicológico, estimular a prática de atividades físicas regulares, exceto nos períodos de atividade sistêmica da doença em que o repouso é aconselhável, indicar a adoção de uma dieta balanceada, evitando excessos de sal, carboidratos e lipídios, evitar períodos de exposição ao sol e a outras fontes de raios ultravioletas e evitar o tabagismo. O tratamento da pessoa com LES depende do tipo de manifestação apresentada e deve portanto, ser individualizado. Dessa forma a pessoa com LES pode necessitar de um, dois ou mais medicamentos em uma fase (ativa da doença) e, poucos ou nenhum medicamento em outras fases (não ativas ou em remissão). Ao mesmo tempo, o tratamento sempre inclui remédios para regular as alterações imunológicas do LES e de medicamentos gerais para regular alterações que a pessoa apresente em consequência da inflamação causada pelo LES, como hipertensão, inchaço nas pernas, febre, dor etc. Os medicamentos que agem na modulação do sistema imunológico no LES incluem os corticoides (cortisona), os antimaláricos e os imunossupressores, em especial a azatioprina, ciclofosfamida e micofenolato de mofetila. É necessário enfatizar a importância do uso dos fotoprotetores que devem ser aplicados diariamente em todas as áreas expostas à claridade. O produto deve ser reaplicado, ao longo do dia, para assegurar o seu efeito protetor. Em alguns casos podem ser usados cremes com corticosteróides ou com tacrolimus aplicados nas lesões de pele. Os sintomas mais leves podem ser tratados com analgésicos, anti-inflamatórios e/ou doses baixas dos corticoides (prednisona – 5 a 20 mg/dia). Na vigência de manifestações mais graves do LES, as doses dos corticoides podem ser bem mais elevadas (prednisona – 60 a 80 mg/dia). Geralmente, quando há envolvimento dos rins, do sistema nervoso, pulmões ou vasculite é necessário o emprego dos imunossupressores em doses variáveis de acordo com a gravidade do acometimento. Um aspecto importante no uso desses medicamentos é a atenção necessária quanto ao risco aumentado de infecções, já que eles diminuem a capacidade do indivíduo de defender-se contra infecções, incluindo a tuberculose. Em pacientes com LES grave, com rápida evolução, pode- se utilizar altas doses de glicocorticoide por via endovenosa. O uso da cloroquina (ou hidroxicloroquina) está indicado tanto para as formas mais leves quantonas mais graves e deve ser mantido mesmo que a doença esteja sob controle (remissão), pois auxiliam na manutenção do controle do LES. Que outros cuidados as pessoas com lúpus devem ter? Além do tratamento com remédios, as pessoas com LES devem ter cuidado especiais com a saúde incluindo atenção com a alimentação, repouso adequado, evitar condições que provoquem estresse e atenção rigorosa com medidas de higiene (pelo risco potencial de infecções). Idealmente deve-se evitar alimentos ricos em gorduras e o álcool. Quem está utilizando anticoagulantes por ter apresentado trombose (muitas vezes relacionada à síndrome antifosfolipídeo associada ao LES), deve ter um cuidado especial que é a manutenção de uma dieta “monótona”, ou seja, parecida em qualidade e quantidade todos os dias, para que seja possível um controle adequado da anticoagulação. Pessoas com hipertensão ou problemas nos rins, devem diminuir a quantidade de sal na dieta e as com glicose elevada no sangue, devem restringir o consumo de açúcar e alimentos ricos em carboidratos (massas, farinhas e pães). Outra medida de ordem geral é evitar (ou suspender se estiver em uso) os anticoncepcionais com estrogênio e o cigarro (tabagismo), ambas condições claramente relacionadas à piora dos sintomas do LES. Pessoas com LES, independentemente de apresentarem ou não manchas na pele, devem adotar medidas de proteção contra a irradiação solar, evitando ao máximo expor-se à “claridade”, além de evitar a “luz do sol” diretamente na pele, pois além de provocarem lesões cutâneas, também podem causar agravamento da inflamação em órgãos internos como os rins. Outra medida muito importante é a manutenção de uma atividade física regular, preferencialmente aeróbia que ajuda não só para o controle da pressão e da glicose no sangue, mas também contribui para melhorar a qualidade dos ossos, evitando a osteoporose e melhorando o sistema imunológico. O objetivo geral dos cuidados com a saúde (incluindo os medicamentos) para as pessoas com LES é permitir o controle da atividade inflamatória da doença e minimizar os efeitos colaterais dos medicamentos. De uma forma geral, quando o tratamento é feito de forma adequada, incluindo o uso correto dos medicamentos em suas doses e horários, com a realização dos exames necessários nas épocas certas, comparecimento às consultas nos períodos recomendados e os cuidados gerais acima descritos, é possível obter um bom controle da doença e melhorar de forma significativa a qualidade de vida das pessoas com LES. Quanto tempo dura o tratamento? O lúpus é uma doença crônica. Todas as pessoas que têm essas doenças necessitam de um acompanhamento prolongado, mas isso não quer dizer que a doença vai estar sempre causando sintomas, ou impedindo a pessoa de viver sua vida, pois a evolução natural do lúpus, se caracteriza por períodos de maior e menor “atividade” (com quantidade maior ou menor de sintomas). Ao mesmo tempo, o uso regular dos medicamentos auxilia na manutenção da doença sob controle e, o uso irregular dos corticoides, antimaláricos (difosfato de cloroquina ou hidroxicloroquina), azatioprina e micofenolato de mofetila favorece a reativação da doença. Algumas medidas são para a vida toda como proteção solar (chapéus, sombrinhas, etc., além dos cremes fotoprotetores já citados), não fumar, exercícios físicos regulares, controle alimentar, não faltar às consultas, realizar exames com a periodicidade recomendada e seguir as orientações e sempre retirar suas dúvidas com seu médico reumatologista. Quanto ao uso dos remédios, as doses prescritas não devem ser modificadas para que não haja retardo na melhora programada, mesmo que a pessoa esteja se sentindo bem a acredite que daria para reduzir os remédios. As consultas geralmente são marcadas a cada 3 a 6 meses, no entanto, nos casos de doença em atividade, podem ser necessários retornos mais frequentes, como semanal e, se necessário até mesmo com internação hospitalar (condição que não é necessária para a maioria das pessoas com LES).
Compartilhar