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HC STJ - Francisco Elimário

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO
EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Processo de referência n° 2015.0001.007814-4 (TJPI)
Numeração única: 000005-07.2004.8.18.0066 (PIO IX-PI)
MARDSON ROCHA PAULO, advogado, inscrito na OAB-PI n°
15.476, endereço eletrônico: mardsonrochapaulo@gmail.com, residente e
domiciliado no Lot. Luíza Gomes de Medeiros, Q-82, C-10, Morada do Sol,
Picos-PI, CEP n° 64.601-620, na qualidade de impetrante, em favor de
FRANCISCO ELIMÁRIO ARAÚJO FEITOSA, devidamente qualificado os
autos, vem, respeitosamente, impetrar
HABEAS CORPUS
COM PEDIDO DE LIMINAR
, indicando como autoridade coatora a 1ª Câmara Especializada
Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, sendo o ato
coator a fundamentação da dosimetria da pena, em especial as circunstâncias do
artigo 59 do Código Penal, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos::
DOS FATOS
O paciente fora inicialmente condenado em relação ao crime de
Homicídio Qualificado Mediante Paga ou Recompensa em vinte (20) anos de
reclusão e, Lesão Corporal Gravíssima fixo a pena-base em sete (07) anos de
mailto:mardsonrochapaulo@gmail.com
mailto:mardsonrochapaulo@gmail.com
reclusão.” Em razão de fundamentação que entendemos ser ilegal, por fato
delituoso supostamente praticado no ano de 2004.
Interposto o recurso de apelação, o Tribunal a quo redimensionou a
reprimenda legal ao patamar de 24 anos, após ser tão somente considerada a
atenuante da confissão, mantendo inalterados todos os outros termos da
sentença condenatória, bem como a fundamentação utilizada para agravar a
pena base (art. 59, CP), a qual se revela como principal ilegalidade que
buscamos corrigir por meio do presente mandamus.
DO DIREITO
Agora passaremos a análise da ausência de fundamentação quanto a
exasperação da pena base do Paciente na sentença condenatória (confirmada no
acórdão).
Vejamos a consideração dos maus antecedentes:
“Pelo que se vê nos autos, o réu possui maus
antecedentes, já foi processado e condenado por
crime de Homicídio Qualificado e Formação de
Quadrilha ou Bando nesta Comarca, onde
cumpre atualmente a pena de 19 anos de reclusão,
em regime inicialmente fechado, na Casa de
Custódia, na cidade de Teresina-PI, e ainda,
conforme relatou em seu interrogatório responde
a processo por Porte Ilegal de Arma de Fogo. Vê-
se portanto que o réu ostenta maus antecedentes.
Aliás, segundo revelam os autos, antes do fato sub
judice o réu se envolveu em outros crimes da
mesma espécie."
Assim, percebe-se que tentou-se justificar os maus antecedentes do
Paciente tendo em vista a existência de inquéritos policiais ou ações penais
em curso, sem qualquer menção a existência de condenações transitadas
em julgado, sendo fundamento considerado inconstitucional pelo Supremo
Tribunal Federal: “PENA – FIXAÇÃO – ANTECEDENTES CRIMINAIS –
INQUÉRITOS E PROCESSOS EM CURSO – DESINFLUÊNCIA. Ante o
princípio constitucional da não culpabilidade, inquéritos e processos
criminais em curso são neutros na definição dos antecedentes criminais.”
(RE 591054, Órgão julgador: Tribunal Pleno, Relator(a): Min. MARCO
AURÉLIO, Julgamento: 17/12/2014, Publicação: 26/02/2015)
No mesmo sentido, a Súmula 444 STJ: “É vedada a utilização de
inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.”
E para ser reconhecido os maus antecedentes deverá existir documento
idôneo nos autos (p.ex.: certidão cartorária da condenação pretérita ou folha
de antecedentes do réu). Desse modo, a mera confissão do réu não implica no
reconhecimento de maus antecedentes.: “(...) 3. O registro de condenação
transitada em julgado em folha de antecedentes criminais é suficiente para a
caracterização da reincidência. (...)” (STJ, HC n° 212.789/SP, Rel. Min. Nefi
Cordeiro, Sexta Turma, j. 07.10.2014)
Vale o destaque também que “processos com condenações definitivas,
mas relativos a fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser usados
para agravar a pena-base, seja como maus antecedentes ou como
personalidade negativa do agente.” (STJ, HC n° 338.975/RJ, Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 24.11.2015)
Deste modo, temos por ilegal a consideração de maus antecedentes do
Paciente para fins de exasperar a pena-base.
Quanto aos motivos do crime, se tentou fundamentar:
Motivos: Não há conduta humana sem motivos,
sem finalidades. Os motivos podem ser éticos ou
morais, positivos ou negativos, nobres ou não. No
caso é lícito concluir o de obter lucro fácil.
Desta forma, ao ser considerado o lucro fácil como circunstância
desfavorável a fim de valorar a pena base, esvazia-se a qualificadora prevista
no código penal, que já “pune aumentando-se” a pena de homicídio simples -
de 6 a 12 anos - para homicídio qualificado -de 12 a 30 anos, “mediante paga
ou promessa de recompensa”, prevista na primeira parte do §2°, inciso I, do
Código Penal, vejamos:
Homicídio qualificado
§ 2° Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de recompensa,
ou por outro motivo torpe;
(...)
Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
Portanto, entende-se que o motivo considerado:“lucro fácil” - encontra-se
abrangido na própria qualificadora do artigo 121, §2°, inciso I, do Código
Penal, sendo elemento integrante do tipo penal, sendo fundamento inidôneo
para se elevar a pena-base.
No mesmo sentido, o que se extrai da fundamentação (ou ausência de
fundamentação) do acórdão confirmatório da sentença condenatória, é que a
maior parte das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal (com
única exceção do comportamento da vítima: que foi considerado neutro)
foram valoradas negativamente de forma ilegal, mencionando-se como
fundamento elementos integrantes do próprio tipo penal, vejamos:
"O réu tinha pleno conhecimento da ilicitude do
fato. Agiu com alto grau de reprovabilidade,
sendo a conduta altamente censurável e
repugnante, o que avalio como elevado o grau de
culpa da sua conduta."
(...)
Consequências: lhes são totalmente
desfavoráveis, pois uma vida humana foi ceifada,
a vítima Raimundo Alves Sobrinho deixou uma
filha ainda menor de idade; A outra vítima Dácio
de Alencar, embora não tenha tido sua vida
ceifada, certamente seus sonhos e projetos de
vida foram interrompidos.
(...)
O fato ocorreu em plena luz do dia,
demonstrando maior periculosidade do réu, que
não se intimidou diante das diversas pessoas que
se encontravam no local do crime.
O Crime de Homicídio e de Lesão Corporal em si
causa pânico e traz insegurança à comunidade,
imagino da forma em que foi praticado.
Tendo por presentes tais circunstâncias, e
considerando a gravidade das consequências dos
fatos, já que uma vida humana, pai de família,
foi ceifada, e outra encontra paraplégica,
havendo circunstâncias negativas militando em
desfavor do réu e á luz das diretrizes
estabelecidas pelo artigo 59, do Código Penal,
fixo a pena-base quanto ao crime de Homicídio
Qualificado Mediante Paga ou Recompensa em
vinte (20) anos de reclusão; Quanto ao crime de
Lesão Corporal Gravíssima fixo a pena-base em
sete (07) anos de reclusão.”
Desta forma, entendemos que todas as circunstâncias judiciais do artigo
59, do Código Penal negativadas encontram-se maculadas pela falta de
fundamentação, indo de encontro à jurisprudência dominante deste Colendo
Superior Tribunal de Justiça, ao passo em o juízo a quo considerou como
circunstância negativa elementos integrantes da reprimenda do tipo penal.
No mesmo sentido, a opinião do magistrado sobre a gravidade em
abstrato do delito imputado ao paciente não constitui fundamento idôneo para
justificar a elevação da pena-base.
In analogia, a Súmula 718 do STF: “A opinião do julgador sobre a
gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a
imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena
aplicada.”
Excelência, não só para a imposição de regime mais severo, mas para
qualquer decisão, exige-se fundamentação concreta, segundo o disposto no
artigo 93, inciso IX, da CRFB/881, combinado com o §2°,incisos II e III do
artigo 315, do Código de Processo Penal, in verbis:
§2º Não se considera fundamentada qualquer
decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença
ou acórdão, que: (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
II - empregar conceitos jurídicos
indeterminados, sem explicar o motivo concreto
de sua incidência no caso; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
III - invocar motivos que se prestariam a
justificar qualquer outra decisão; (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
Este entendimento também é amparado na Jurisprudência dominante do
Superior Tribunal de Justiça: “Não cabe ao poder judiciário, o uso de
discursos metajurídicos de matriz ideológico ou moral, para incrementar o
1 Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, ob-
servados os seguintes princípios:
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pe-
na de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou so-
mente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o inte-
resse público à informação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
rigor do sispema punitivo e para contornar, com argumentos aparentemente
jurídicos, os limites impostos pela lei penal e pal jurisprudência consolidada
dos Tribunais Superiores, os qusis, como visto, pela Constituição da
República têm a especial competência para interpretar e uniformizar a lei
federal e a Constituição em última instância ante idênticas situações fáticas”.
(STJ, HC n° 596.603/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, j.
08.09.2020)
E ainda no recente julgado:“1. Porque foi concretamente
fundamentada a desfavorabilidade da vetorial relativa às circunstâncias do
crime, com base em elementos idôneos, acidentais e não integrantes do
próprio tipo penal violado, mostra-se devido o aumento da pena-base nesse
ponto.” (...) (AgRg no REsp 1919673/PR, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 16/03/2021, DJe 22/03/2021)
A contrário sensu, no caso em concreto, o magistrado sentenciante,
em sua sentença, mantida no acórdão confirmatório não apontouelementos
idôneos, acidentais e não integrantes do próprio tipo penal violado, o que
não se mostra devido o aumento da pena-base nesse ponto.
E no seguinte: “3. No caso em tela, o decreto de prisão preventiva é
genérico, nele não havendo nenhuma menção a fatos que justifiquem a
imposição da prisão cautelar. Carece, portanto, de fundamentação concreta,
pois se limita a invocar a gravidade abstrata da conduta atribuída ao agente,
elementos ínsitos ao tipo penal em tela e insuficientes para a decretação ou
manutenção da prisão preventiva, sob pena de se autorizar odiosa custódia ex
lege.” (HC 639.101/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA
PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 16/03/2021, DJe 24/03/2021)
Deste modo, revela-se ilegal a fundamentação em que baseia-se no
fato de “o réu ter pleno conhecimento da ilicitude do fato”, se afirmar que “o
réu agiu em alto grau de reprovabilidade”, porém sem apontar em que se
infirmaria este alto grau de reprovabilidade. Ou mesmo, sendo “a conduta
altamente censurável e repugnante”. Pelo que percebemos, o fato de a
conduta ser altamente censurável e repugnante, constituem elementos
integrantes do próprio tipo penal, não sendo relevante a opinião do
julgador quanto a gravidade abstrata da conduta como fundamento para
majorar a pena base.
DO REQUERIMENTO
Diante do exposto, requer seja CONCEDIDA a ordem tendo em vista
que todas as decisões devem ser fundamentadas, sobretudo aquelas que
restringem ou agravam a situação do réu, sob pena de nulidade (CR, art. 93, inc.
IX). Carecendo de fundamentação, requer seja o acórdão reformado para
reduzir a pena-base do réu ao mínimo legal, reconhecendo a ilegalidade da
fundamentação quanto todas às circunstâncias judiciais (art. 59, CP),
consideradas negativas.
Termos em que pede deferimento.
Picos-PI, 05.04.2021
Dr. Mardson Rocha Paulo
(OAB-PI n° 15.476)

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