Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Modelo de Pensamento Lean em Gestão de Processos Unidades I e II Dr. Eduardo Christiano Cecone SUMÁRIO Unidade I 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 3 2. TPS – JUST IN TIME – LEAN MANUFACTURING .......................................... 7 3. SISTEMAS – PROCESSOS – TAREFAS E ROTINA ..................................... 11 4. GESTÃO DE PROCESSOS – MAPEAMENTO DA CADEIA DE VALOR ...... 15 Unidade II 5. ALGUNS CONCEITOS, DEFINIÇÕES E FERRAMENTAS DO LEAN ........... 26 5.1 Jidoka ............................................................................................................. 27 5.2 Just in time ...................................................................................................... 28 5.3 Kanban ........................................................................................................... 29 5.4 Heijunka .......................................................................................................... 30 5.5 Kaizen ............................................................................................................. 31 5.6 5s (cinco s) ..................................................................................................... 35 6. ESTUDO DE CASO COMENTADO – ESCRITÓRIO ENXUTO (LEAN OFFICE) .................................................................................................................... 40 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 52 3 1. INTRODUÇÃO O Lean ou Lean Manufacturing é e deve ser entendido como mais do que metodologia de gestão ou uma terminologia ampla e popularmente empregada nos dias atuais, trata-se na verdade de uma cultura, uma mentalidade que leva a boas práticas que, por estar plena e produtivamente alinhada às expectativas e necessidades do mercado, apresenta o potencial de nortear a gestão organizacional com forte potencial de geração de resultados positivos. Também conhecido como Sistema Toyota de Produção ou Toyota Productive System (TPS), o Lean teve origem no Japão com Sakichi Toyoda (1867-1930) que, a partir da observação do trabalho de sua mãe, operando teares, começou a se questionar acerca da possibilidade e do que poderia ser feito para tornar esse trabalho mais produtivo, menos árduo e mais produtivo do ponto de vista de utilização racional dos recursos, físicos e humanos demandados pela atividade. Essa observação e a implementação de meios, métodos e recursos que visavam a eliminação de desperdícios e aumento da produtividade levaram Sakichi Toyoda a fundar a Toyoda Teares (Toyoda Automatic Loom) e à produção em 1924 do primeiro tear automatizado que conceitualmente incorporava tecnologias inovadoras que apresentavam como diferenciais, revolucionários recursos que promoviam o automático reabastecimento de matéria prima (linhas), tornando o processo produtivo contínuo, ininterrupto e mais produtivo, além de sistemas que interrompiam automaticamente o funcionamento da máquina e a operação em caso de problemas como a ruptura de uma linha, o que eliminava perdas de qualidade e o desperdício de se empregar recursos na produção de produto final que fatalmente seria segregado e descartado por consequência de problemas de qualidade. O que torna esse início do Lean marcante, inovador e historicamente revolucionário para a indústria mundial, inclusive no formato que conhecemos e presenciamos hoje, foi o desenvolvimento e aplicação de conceitos, recursos, dispositivos e sensores que deram origem à automação de processos produtivos com foco no aumento da produtividade e eliminação de desperdícios. Para a aplicação a que se propunha, a melhoria de processos produtivos têxteis a partir da observação e melhoria de processos produtivos e equipamentos nele empregados, os conceitos desenvolvidos por Sakichi Toyoda proporcionaram: Aumento de produtividade; Segurança no processo produtivo; Garantia da qualidade; Redução da dependência do fator humano. Além do que realmente fez com que esses conceitos se consolidassem e assumissem as proporções e importâncias que o Lean tem hoje como o conhecemos, a redução de desperdícios, como por exemplo: Melhor aproveitamento da mão de obra envolvida no processo, já que automatizados os teares, o processo demandaria menos operadores e estes não mais dedicados (um por máquina). Agora uma única pessoa poderia cuidar e responsabilizar-se por várias máquinas; 4 Redução de desperdício de tempo. O que hoje denominamos setup ou preparação da máquina para a efetiva produção, agora sendo realizada de forma automática e ininterrupta, eliminaria o tempo ocioso para realimentação da máquina e reinicio do processo produtivo; O desenvolvimento e aplicação de sensores que detectariam a quebra de uma linha no tear ocasionando problemas de qualidade, além de se apresentar como origem da automação moderna e controle da estabilidade de processos, na época resultou na eliminação da dependência do fator humano para detecção de problemas de qualidade, sua intervenção para interromper o processo e eliminação da produção de tecido defeituoso que consumiria recursos nobres para fabricação de produto com qualidade comprometida. Nascia assim conceitualmente o conceito Jidoka, um dos pilares do Sistema Toyota de Produção, que consiste na capacidade de máquinas e equipamentos de interromper o processo e sinalizar em caso de problemas. Dada a efetividade, assertividade e os resultados positivos resultantes da aplicação dos conceitos concebidos por Sakichi Toyoda, seu filho, Kiichiro Toyoda (1894-1952), em continuidade aos trabalhos do pai, viajou para os Estados Unidos com o propósito de licenciar a fabricação de teares. Durante sua viagem, Kiichiro, ao se deparar com o mercado e cultura Norte- Americanos e, em especial com os automóveis, o consumo e a indústria e mercado envolvidos nesse contexto, se entusiasmou e se questionou acerca da possibilidade de aplicar os conceitos e técnicas de seu pai na indústria automobilística e seus processos produtivos característicos. De volta ao Japão e já determinado em testar os conceitos da família Toyoda à produção de veículos automotores, em 1933, Sakiichi, dentro da fábrica de teares do pai, montou uma linha de produção para a fabricação de automóveis. Nela foi produzido em 1936 o Standard Sedan AA, em 1936, que à época ainda levava como marca o nome da família Toyoda. Dado o sucesso do projeto, em 1937, Kiichiro fundou a Toyota Motor Co, convidando seu primo e engenheiro Eiji Toyoda (1913-2013) para trabalhar com ele no projeto e na nova empresa. Outro marco do Lean como hoje conhecemos, foi o surgimento nesse momento do conceito de Just in Time (JIT), definido por Sakiichi, novamente com foco na eliminação de desperdícios, que preconizava acerca da produção e dos processos produtivos: Produzir o que é necessário; Entregar o que é necessário; Quando é necessário; Na quantidade que é necessária. Novamente nota-se aqui o surgimento de um conceito fundamental que leva à eliminação de desperdícios físicos e humanos nos processos produtivos. A aplicação efetiva do JIT ocasiona e proporciona: Redução de estoque em processo; Redução de estoque de produtos acabados; Emprego racional dos recursos humanos; Emprego racional de recursos físicos; 5 Otimização do aproveitamento potencial de máquinas e equipamentos; Entre outros... Em 1943, o chinês Taiichi Ohno (1912-1990), passa a integrar a Toyota Motors Co, o que viria a contribuir para o aprimoramento, implementação e valorização dos conceitos, práticas e culturas do que conhecemos hoje como Sistema Toyota de produção. Foi Taiichi Ohno que em 1953, apoiado pelo entãoconsultor da Toyota, Shingeo Shingo, propõe, adota e implanta no ambiente fabril o kanban. Prática esta que ganharia importância e destaque tendo sido estendida cerca de 10 anos depois a todos os fornecedores envolvidos na cadeia produtiva da Toyota. Shingeo Shingo, entre outras contribuições relevantes ao Sistema Toyota de Produção é reconhecido e a ele atribuem-se a criação e proposição de dois dos mais relevantes e aplicados recursos do Lean: Sistema de setup rápido: metodologia empregada para tornar rápido, prático e dinâmico o processo de preparação da linha de produção, máquina ou equipamento, para o efetivo início da produção. Poka-yoke: conceito que preconiza o uso de dispositivos e mecanismos à prova de falha. Muitos foram os colaboradores, envolvidos e figuras relevantes desde o início do Toyota Productive System até os dias atuais, mas, até por reconhecimento e dever moral, destacamos aqui cinco destas personalidades às quais cabem nosso reconhecimento e homenagem por suas vidas e obras: Sakiichi Toyoda Kiichiro Toyoda Eiji Toyoda Taiichi Ohno Shingeo Shingo Entre outros frutos óbvios e presentes no dia a dia, destacamos dois marcos decorrentes do surgimento, crescimento e valorização da Toyota e do Sistema Toyota de Produção: A join-venture (parceria cooperativa e colaborativa) em 1984, entre a Toyota e a gigante norte americana, fabricante de veículos automotores, General Motors Company, para transferência e incorporação dos conceitos e tecnologias da Toyota nos processos e práticas produtivas da GM. O livro “A Máquina que Mudou o Mundo” (The Machine that Changed the Word), publicado pelo Massachussettes Institute of Techonology (MIT), dedicado à Toyota, sua história, conceitos e práticas revolucionárias. O texto abaixo transcrito, dito por Taiichi Ohno (vice-presidente da Toyota), evidencia e ilustra um pouco da cultura, do foco e da mentalidade da Toyota na prática: “Tudo o que fazemos é olhar para a linha do tempo, do momento em que o cliente nos dá um pedido até quando recebemos o pagamento. E estamos reduzindo este tempo removendo os desperdícios.” O diagrama apresentado na Figura 1, apresenta alguns dos principais marcos dessa bem-sucedida e fascinante história ao longo dos anos. 6 Figura 1 – TPS – Linha do Tempo Fonte: VARGAS, 2019. 7 2. TPS – JUST IN TIME – LEAN MANUFACTURING Designações diferentes, porém, equivalentes em diferentes momentos históricos, os termos Toyota Productive System (TPS), Just in Time (JIT), Lean e Lean Manufacturing, referem-se em essência como vimos na eliminação, ou no mínimo, na redução de desperdícios naturalmente presentes em processos e sistemas produtivos. Curioso é que, guardadas as particularidades e peculiaridades inerentes aos diferentes e distintos mercados e segmentos empresariais, embora concebidos e desenvolvidos na indústria automobilística, os conceitos e a metodologia Lean são cada vez mais atuais, aplicáveis e presentes em todo e qualquer tipo, porte ou segmento organizacional. A cultura e o pensamento Lean tem foco na eliminação de desperdícios por meio da utilização direta ou adaptada de suas ferramentas, com foco especial em: Reduzir tempos; Reduzir estoques; Reduzir espaços /áreas; Reduzir etapas; Reduzir defeitos. A obtenção desses resultados pretendidos pelo Lean passa obrigatoriamente por um longo e meticulosamente estruturado processo de abordagem, tratamento e atuação que se inicia pela classificação dos tipos de desperdícios à luz do que os japoneses denominaram “muda”, ou, os sete desperdícios, apresentados na Figura 2. Figura 2 – Os 7 Desperdícios Clássicos do Lean Fonte: VARGAS, 2019. 8 Cabe aqui uma relevante consideração e atualização que propositalmente evidenciamos e destacamos. Aos 7 Desperdícios apresentados na Figura 2, acrescenta-se um oitavo desperdício de igual relevância e importância. Trata-se do desperdício do potencial humano. Nessa categoria de desperdício estão contidos os potenciais, características e capacidades naturais e inerentes ao recurso humano (pessoas) que, desconsiderados fazem com que não se aproveitem aspectos da personalidade das pessoas que, se bem considerados e aproveitados, apresentam o potencial de tornar as pessoas mais felizes, comprometidas, engajadas e naturalmente produtivas no exercício de suas atribuições, atividades e responsabilidades profissionais. Adaptados à realidade industrial, os 7 Desperdícios definidos pela cultura Lean podem ser interpretados e aplicados como apresentado na Figura 3. Figura 3 – Os 7 Desperdícios Clássicos do Lean Fonte: VARGAS, 2019. Nota-se claramente e evidenciamos a todo tempo que a cultura Lean tem foco no máximo, melhor e mais racional aproveitamento de recursos físicos e humanos e, consequentemente e notadamente na eliminação ou diminuição de todo e qualquer desperdício. Nesse sentido há de se fazer uma consideração que além de relevante, explica a origem desta cultura, ao mesmo tempo que de certo modo nos faz meditar e entender o nível e a natureza das dificuldades e desafios envolvidos na implantação do Lean em nossas empresas e dia a dia. 9 O fato é que como vimos, o Lean tem origem no Japão. País que historicamente sempre se viu obrigado a conviver e se adaptar a sérias e significativas restrições de toda ordem, inclusive naturais, que vão da restrição à água potável e alimentos, a limitações de espaço físico e territorial, passando por tudo o que está presente e é necessário em termos de uso e consumo para a sobrevivência humana. Além desta realidade, historicamente o Japão, a exemplo da Segunda Guerra Mundial e suas consequências, sempre se viu obrigado a se reinventar, recriar, aprimorar e melhorar, racionalizar o uso de recursos, cooperar e colaborar de forma ordenada, disciplinada e responsável. Esse conjunto de fatores e circunstâncias de certo modo explica e nos mostra a cultura deste povo e nos dá ideia clara de como e em que contexto o Lean nasceu e se desenvolveu. Em contrapartida, o mesmo conjunto de fatores e circunstâncias, face a nossa realidade e cultura, entenda-se aqui “nossa” com sendo no Brasil, talvez nos explique e faça ter ideia e entender o nível de desafio, complexidade e dificuldade de adoção e implantação do Lean e da cultura Lean em nossas organizações. Ainda à luz da cultura e sabedoria popular japonesa, podemos e devemos ter em mente que “na crise e nas dificuldades estão presentes as maiores e melhores oportunidades de crescimento e aprendizado”, o que na prática nos revela que, a implantação do Lean em organizações Brasileiras é, acreditem, tão desafiador quanto gratificante. Quadro 1 – TSP – Visão Geral Fonte: VARGAS, 2019. 10 Considerando-se se tratar o Lean de uma cultura e metodologia originada no Japão, existem e estão presentes no dia a dia de sua aplicação nas organizações, termos e expressões japoneses empregados na prática. Com a finalidade de tornar comum e familiar estes termos e expressões, apresentamos no Quadro 2, algumas das principais formas de apresentação e respectivos significados destas terminologias: Quadro 2 – Termos & Expressões Lean Fonte: VARGAS, 2019. 11 3. SISTEMAS – PROCESSOS – TAREFAS E ROTINA As organizações têm por objetivo a transformação de inputs (recursos) em outputs (produtos ou serviços), disponibilizando estes aos clientes externos em atendimento às suas necessidades ou desejos. Segundo Oliveira (1998, p.35), “Sistema é um conjunto de partes integrantes e interdependentes que, em conjunto, formam um todo unitário com determinado objetivo e efetuam determinada função”. Internamente e para fins de organização e controle as organizações ordenam, definem, estruturam e executam estas transformações de inputs em outputs por meio de sistemas, processos e tarefas, embora se possa encontrarnomenclatura diferente, mas análoga, tanto na literatura quanto no cotidiano e realidade das organizações. As tarefas são atividades ou rotinas pontuais e bem definidas que tem por objetivo produzir um resultado específico, necessário ao fluxo de um contexto mais amplo, o que será melhor exemplificado em breve. Os processos igualmente destinam-se à obtenção de resultados específicos, mas dependem dos resultados isolados e interação entre estes resultados, decorrentes ou consequentes das tarefas ou rotinas. Os sistemas por sua vez reúnem os resultados dos processos e consolidam a entrega do escopo pretendido, tanto internamente, nas áreas individuais das organizações, quanto externamente, provendo o escopo de fornecimento de produtos ou prestação de serviços aos clientes externos consumidores finais. Dessa definição e classificação resultam termos e expressões presentes no dia a dia das organizações, como por exemplo a denominação “sistema produtivo”. Neste caso, estão estruturadas e ordenadas tarefas e rotinas individuais que produzem resultados únicos, inter-relacionados e interativos por meio de processos que os associam e consolidam, resultando em um sistema que prove o continuo e final fornecimento do produto. Figura 4 – Sistemas, Processos e Tarefas Fonte: CECONE, 2019. Ocorre que, nos sistemas, processo e tarefas ou rotinas, demandam-se recursos físicos e humanos por meio dos quais se obtêm os resultados esperados agregando-se valor ao escopo de fornecimento. É fundamental ter sempre em mente que toda e qualquer atividade que se realize dentro de uma organização consome recursos e, considerando-se que o objetivo final é a satisfação dos clientes, esse consumo de recursos deve se dar dentro de rígidos critérios de planejamento e realização, a fim de que não se traduzam em custos desnecessários e indesejados para o cliente e para a própria organização. Tarefas Processos Sistemas 12 Nesse sentido, toda e qualquer atividade que se realize pode e deve ser classificada e entendida dentro do seguinte critério: Atividades que agregam valor: São definidas como atividades que agregam valor todas aquelas que durante o processo conferem, direta ou indiretamente, características ou propriedades, ao produto ou serviço, que o cliente reconhece como importantes ao atendimento do escopo contratado. De outro modo podemos entender como sendo as atividades que o cliente entende como importantes, reconhece como valor e está disposto a remunerar por ela. As atividades que agregam valor são as mais relevantes em qualquer processo, visto que o termo “agregar valor” refere-se a conferir ao produto ou serviço as propriedades e características desejadas pelo cliente e, assim, estão diretamente relacionadas e são fundamentais para a satisfação do cliente. Atividades que não agregam valor: As atividades que não agregam valor, até intuitivamente pode se concluir, são aquelas que não conferem ao produto ou serviço as propriedades ou características pelas quais o cliente anseia. O conceito e a aplicação podem num primeiro momento parecer simples, mas na prática essa simplicidade não necessariamente se traduz em verdade. Ao analisarmos as definições até aqui verificadas, a primeira coisa que se imagina é que as atividades que não agregam valor não são de interesse do cliente e ele deve ser satisfeito para que reconheça valor no produto ou serviço contratado, estas atividades deveriam ser imediata e sumariamente descartadas e eliminadas do processo, reduzindo o desnecessário consumo de recursos físicos e humanos, diminuindo o custo do processo e o preço de venda para o cliente e agilizando o tempo de produção ou realização para atender o cliente. Essa conclusão está correta e é bastante razoável pensar nessa eliminação, mas tudo deve ser analisado e feito com critério para não se incorrer em erros. Não é raro nos depararmos na prática com realidades em que os processos envolvem muitas atividades que não agregam valor, em alguns casos infelizmente até a maioria das atividades envolvidas, consumindo recursos desnecessariamente e elevando os custos e o preço. Uma das grandes causas desse tipo de equívoco está relacionada justamente a já mencionada falha no escopo, seja em sua definição, interpretação ou atendimento. Não é incomum que se dedique significativa parcela de recursos para conferir ao produto ou serviço propriedades e características que em certos casos, o fornecedor julga importante ou fundamental, mas o cliente não. Outro ponto fundamental que há de se considerar é que entre as atividades que não agregam valor, existem dois tipos distintos que serão detalhados adiante, as que não agregam valor, mas são necessárias e as que não agregam valor e são desnecessárias. Atividades que não agregam valor, mas são necessárias: 13 Este grupo de atividades é talvez o principal foco de concentração de esforços e atenções dos profissionais de Lean Manufacturing. Aqui estão enquadradas todas as atividades do processo que não conferem propriedades e características desejadas pelo cliente, mas que por uma ou mais razões são necessárias. Essa necessidade pode estar associada aos mais diferentes e diversos tipos de razões, por exemplo, atendimento à legislação vigente, segurança laboral dos profissionais envolvidos no processo, viabilidade técnica operacional etc. Apresentado o conceito e as definições, se considerarmos ainda o princípio fundamental e norteador da metodologia Lean Manufacturing que tem por base a eliminação de desperdícios, é fácil concluir o porquê dissemos que esse tipo de atividade é nosso foco. Claro que se a atividade é desnecessária, o primeiro pensamento e desejo é o de eliminá-la, contudo, nem sempre isso é possível. Aí está o desafio. As atividades que não agregam valor devem ser planejadas e realizadas de modo a consumirem o mínimo possível de recursos físicos e humanos. Na aplicação prática dessa definição é que está contida grande parte dos esforços e das oportunidades de aplicação do Lean Manufacturing com grande potencial de resultado prático. Trata-se de realizar o necessário, em atendimento às exigências relacionadas, eliminando desperdícios, otimizando e racionalizando processo e reduzindo custos. Atividades que não agregam valor, e são desnecessárias: As atividades que não agregam valor e são desnecessárias são as de teoricamente mais simples tratamento, não fosse a cultura das organizações e pessoas. Vejamos, se a atividade não agrega valor, ou seja, apesar de consumir recursos, não confere propriedades e características desejadas ao produto ou serviço, e além disso elas não são de nenhum modo necessárias ou obrigatórias ao processo em que estão inseridas, obviamente elas devem ser imediatamente eliminadas. Sim. O raciocínio está correto, o conceito adequadamente aplicado e o caminho claramente definido. Mas tudo seria perfeito, não fosse a questão cultural e as limitações técnicas presentes em algumas realidades que impedem a análise adequada dos processos e suas atividades, a classificação delas quanto ao valor agregado e as ações necessárias para concretização das alterações. Um ponto crucial que merece ser mencionado no que se refere ao aspecto cultural, é a postura de resistência à mudança que identificamos em frases como “isso sempre foi feito assim”, “sempre deu certo”, “sempre funcionou desse jeito”, “fazemos assim há muitos anos e sempre tivemos sucesso”, entre outras. Para a produtiva aplicação dos conceitos e máxima obtenção de resultados, há de se estar aberto às mudanças, e não refratário ou resistente a elas. Considerar novas possibilidades, métodos e meios. Ouvir, estudar e discutir possibilidades, mas acima de tudo, estar comprometido com as soluções, e não com os problemas. 14 Figura 5 – Valor Agregado Fonte: CECONE, 2019. Podemosentender assim que as organizações na verdade operam a partir de um conjunto ordenado de subsistemas inter-relacionados e interdependentes. Agrega – Valor Mas necessário Não Agrega Valor Desnecessário 15 4. GESTÃO DE PROCESSOS – MAPEAMENTO DA CADEIA DE VALOR A gestão de processos é uma atribuição, como o próprio nome diz, do gestor do processo e, por definição, o gestor é aquele que tem a responsabilidade de gerir, administrar e gerenciar os recursos que a organização disponibiliza e provar que deve necessariamente ser da melhor, mais produtiva e adequada maneira possível, convertidos nos resultados pretendidos e esperados. Quando nos referimos genericamente aos recursos disponibilizados pela organização, fica implícito que estão contemplados: Recursos humanos: pessoas envolvidas direta ou indiretamente nos processos, sejam eles colaboradores do quadro de funcionários da organização, consultores, terceiros, prestadores de serviço etc. Recursos físicos: de modo amplo e abrangente, tudo o que se faz necessário ao processo e que não são pessoas. Nesse sentido, podemos entender como recursos físicos, apenas para efeito de exemplo e sem estar restrito a isso, edificações, máquinas, equipamentos, dispositivos, materiais de consumo, insumos de produção, componentes, fontes de energia, veículos etc. Clássica e conceitualmente, portanto, define-se como gestão de processos a administração desses, alocando, utilizando e consumindo, recursos físicos e humanos necessários, para a obtenção de resultados fim ou meio, que atendam às demandas e necessidades dos clientes, sejam eles internos e externos. Além de conhecida, amplamente difundida e praticada, essa definição está presente no dia a dia dos profissionais, consciente ou intuitivamente. Mas então qual a diferença e o que há de especial na abordagem Lean ou na mentalidade Lean aplicada à gestão de processos? Eis que se trata aqui de uma adição dos conceitos e da cultura Lean como norteador da gestão de processos, ou seja, não mais se trata apenas de gerenciar recursos para convertê-los ou transformá-los em resultados. Agora o foco é realizar essa missão considerando o conceito de valor agregado e buscando continuamente não só a melhoria dos resultados e da qualidade, mas também e principalmente a obstinada e incessante meta de eliminar e reduzir desperdícios de todo e qualquer tipo. Para a efetividade e assertividade dessa prática, à luz da cultura Lean, o primeiro passo é conhecer intimamente os processos, seus inputs, outputs desejados, recursos físicos e humanos demandados e acima de tudo, como, em que condições e com que características o processo em questão se dá. Esse conceito aplicado à prática nos remete a um dos princípios mais básicos e elementares da Teoria Geral da Administração que define que “Só se controla e melhora aquilo que se mede e monitora adequadamente”. Nesse sentido, a cultura Lean oferece uma de suas principais e mais produtivas contribuições. O Mapeamento da Cadeia de Valor (MCV), ou, Value Stream Mapping (VSM). Trata-se de uma abordagem sistêmica de processos que tem por objetivo mapear e identificar todas e cada uma das etapas, rotinas e tarefas de um processo 16 e, a cada uma delas aplicar o conceito de valor agregado, conforme anteriormente apresentado e definido neste texto. Esse mapeamento deve ser realizado de modo completo e criterioso, contemplando todos os aspectos envolvidos e relevantes, como por exemplo os lead times, as restrições, as quantidades e volumes, os estoques em processo e acabados, os recursos humanos, as atividades predecessoras e sucessora, a obrigatoriedade ou não de sequencialização, o atendimento a procedimentos, normas, requisitos de clientes, requisitos legais vigentes e aplicáveis etc. Proposto por Taiichi Ohno, são cinco os pontos chave da cadeia de valor: Identificar o valor, sempre considerando o ponto de vista dos clientes; Analisar criteriosamente a cadeia de valor buscando eliminar desperdícios; Fazer fluir e facilitar o fluxo do valor ao longo da cadeia, ou nesse caso do processo; Adotar o sistema puxado de produção; Buscar constantemente a perfeição por meio de processos adequados de melhoria contínua. A Figura 4 nos evidencia o ciclo virtuoso da cadeia de valor proposto pela cultura e metodologia Lean. Figura 6 – VSM Fonte: VARGAS, 2019. A metodologia Lean nos recomenda que, para o adequado rastreamento da cadeia de valor, adote-se e respeite-se as seguintes etapas: Identificação do cliente – clara referência e foco nos conceitos de cliente interno e externo. Ter em mente que cada etapa do processo é cliente da etapa anterior e fornecedor da etapa seguinte; 17 Processos, equipamentos e recursos – não só o processo, mas também todos os recursos demandados por ele, devem ser identificados, listados, quantificados e especificados; Estoques – considerar todos os estoques envolvidos, desde os estoques de materiais, matéria prima e componentes, até os estoques de produto em processo, semiacabados e acabados; Fornecedores – todos os fornecedores, internos e externos, devem ser considerados; Fluxos externos de materiais – neste caso os termos “externos” referem-se a fornecedores externos aos processos, por exemplo de subconjuntos, ou, fornecedores externos a própria organização; Fluxos internos de materiais – movimentação, disponibilização e alocação interna de materiais; Fluxo de informações – toda e qualquer informação que, direta ou indiretamente, relacione-se com o processo considerado; Lead time de produção – todos os tempos de produção, considerando-se genérica e conceitualmente como lead time, “o tempo transcorrido entre a geração e o atendimento de uma demanda Como verificado inicialmente, as organizações têm por objetivo a transformação de inputs (recursos) em outputs (produtos ou serviços), disponibilizando estes aos clientes esternos em atendimento às suas necessidades ou desejos. Quadro 3 – Termos e significados VSM Fonte: VARGAS, 2019. 18 Por se tratar de uma metodologia ou ferramenta visual, algumas simbologias padronizadas nos auxiliam na elaboração e interpretação do Mapa da Cadeia de Valor. A Figura 7 apresenta algumas das principais simbologias e seus respectivos significados ou interpretações. Figura 7 – Simbologia VSM Fonte: VARGAS, 2019. O Mapeamento da Cadeia de Valor deve, como vimos, a partir de uma representação gráfica, visual e de simples entendimento, apresentar as etapas do processo estudado, o fluxo de informação e os lead times envolvidos. 19 Assim, a Figura 8, meramente ilustrativa, nos exemplifica um Mapeamento da Cadeia de Valor (VSM), com seus elementos e características. Figura 8 – Exemplo VSM Fonte: VARGAS, 2019. Destacamos aqui, a partir do exemplo apresentado na Figura 8, a importância e o valor do VSM, em especial em decorrência do seu formato de apresentação gráfica. Notemos que a partir dele e de sua análise é possível claramente entender e identificar: Etapas do processo; Lead times envolvidos; Departamentos, áreas e responsáveis; Recursos humanos envolvidos; Recursos físicos envolvidos; 20 Atividades predecessoras e sucessoras; Demanda do cliente – foco e meta de produção; Periodicidades de entrega e recebimento. Com a finalidade de apresentar uma outra abordagem e definição do Mapeamento da Cadeia de Valor, apresentamos a transcrição de um artigo técnico, trechos originais transcritos apresentados abaixo, publicado pelo Lean Institute, uma das instituições mais reconhecidas e renomadas do país no assunto, acrescida de nossas contribuições e comentários. O texto original encontra-se disponível no website do referido instituto, através do link: https://www.lean.org.br/artigos/61/a-essencia-da-ferramenta-mapeamento- do-fluxo-de-valor.aspx.A ESSÊNCIA DA FERRAMENTA MAPEAMENTO DO FLUXO DE VALOR José Roberto Ferro Cada vez mais usado como uma nova linguagem, o Mapeamento do Fluxo de Valor ganha adeptos no mundo todo. Neste texto, você verá que alguns cuidados devem ser tomados em sua utilização para que os seus benefícios sejam amplamente alcançados. Em 1999 foi lançada a versão em português do manual de autoria de John Shook e Mike Rother “Aprendendo a Enxergar” (Learning to See). Um dos propósitos mais importantes era fornecer aos praticantes lean uma perspectiva que fosse além das melhorias dos processos individuais. Muitas empresas no Brasil estavam acostumadas ao conceito de melhoria contínua (ou kaizen), mas via de regra não focalizavam essas melhorias de forma sistêmica (FERRO, 2005). Destacamos aqui que um dos maiores desafios para a implantação do Lean, além do conhecimento técnico geral do contexto e do processo abordado, é a obrigatoriedade de visão sistêmica, ou seja, como o processo considerado interage e impacta ou é impactado por outros e, acima de tudo, a capacidade e habilidade necessárias para a identificação de oportunidades de melhoria. A perspectiva do fluxo de valor já havia sido apontada no “Mentalidade Enxuta”, de Womack e Jones, como fundamental na transformação lean, mas faltava o passo seguinte: uma ferramenta capaz de olhar para os processos de agregação de valor horizontalmente. Isso significava romper com a perspectiva tradicional de examinar departamentos ou funções e enfatizar as atividades, ações e suas conexões no sentido de criar valor e fazê-lo fluir, desde os fornecedores até os clientes finais (FERRO, 2005). O conceito revolucionário aqui evidenciado foi a mudança de abordagem, até então departamental, fundamentada apenas no fluxograma do processo considerado que agora daria lugar ao foco no valor agregado e seu fluxo ao longo de cada etapa, tarefa e rotina do processo. 21 Após mais de 2.600 manuais em circulação e mais de 50 workshops realizados por nós do Lean Institute em empresas de diversos setores, tamanhos, complexidades etc, observamos que esta ferramenta tem ajudado inúmeras empresas no Brasil a moverem-se de melhorias pontuais para uma eficiência sistêmica. Entretanto, existem ainda algumas inadequações em seu uso que merecem ser abordadas no sentido de preservar a sua essência. É bom lembrar que esses equívocos ocorrem em diversos países, conforme os próprios autores do manual apontam em suas palestras e artigos mais recentes (FERRO, 2005). Nota-se aqui a clara aplicação de um dos principais conceitos do Lean que fundamenta inclusive a teoria das restrições. A eficiência do processo de fato não é igual ou proporcional resultado da somatória das eficiências individuais isoladas. Daí a clara necessidade de, além de ter o fluxo de valor como fundamentação das análises, considerar também e principalmente o processo sistemicamente. Confundir meio com fim Mapear todos os fluxos de valor de uma organização pode ser um exercício relevante. Muitos ficam apaixonados pela ferramenta e a aplicam amplamente, mapeando tudo. Mas muito mais importante e, em verdade, a única coisa que importa, é a ação concreta na implementação dos estados futuros definidos. Como os recursos são limitados, inclusive o tempo dos responsáveis pelo mapeamento, mapear por mapear não é uma estratégia válida (FERRO, 2005). Um possível e adequado aprofundamento desta relevante afirmação é que, um dos grandes desafios e fundamental aspecto para a aplicação e sucesso do Mapeamento da Cadeia de Valor é a definição de condições de contorno com base nos resultados pretendidos ou esperados. Isso permite que se definam todas as etapas do processo necessárias ao alcance do resultado e permite o foco e priorização das ações baseados em uma abordagem clara e produtiva. O Mapeamento do Fluxo de Valor é apenas um meio de melhorar o desempenho de sua organização, o que é, afinal, o verdadeiro fim. Assim, sugerimos: – Focalize esforços nos fluxos de valor que exigem melhoria substancial sob uma perspectiva ampla, que tenha como núcleo o objetivo do negócio; – Entenda claramente a situação atual – não só os problemas (sintomas), mas também porque eles ocorrem; – Defina metas de melhoria para as famílias de produtos escolhidas (ex.: para algumas, a prioridade pode ser reduzir os custos com menos retrabalho, maior ocupação das máquinas etc, para outras, ganhar espaço físico para viabilizar uma ampliação ou reduzir lead time para aumentar a capacidade de resposta às variações do mercado); o ideal é definir indicadores e metas numéricas desde o começo. Uma alternativa pode ser definir objetivos qualitativos, que posteriormente podem ser quantificados; – Defina e busque o consenso sobre um estado futuro que possa ser alcançado em um período de 6 meses a um ano, com poucos investimentos; – Defina e implemente um plano de ação com claras responsabilidades, tarefas e metas a serem atingidas; 22 – Uma vez implementado o estado futuro, recomece o mapeamento, pois estados futuros implementados tornam-se estados atuais. Essa deve ser a dinâmica da melhoria contínua (FERRO, 2005). Nesse trecho, o autor, considerando que recursos físicos e humanos necessários à melhoria dos processos são restritos e limitados, sugere uma abordagem de priorização e de foco que, segundo ele, basicamente deve minimamente considerar: Análise e entendimento pleno da situação real; Definição de situação futura, metas e objetivos futuros pretendidos; Consenso entre os decisores e envolvidos acerca do foco; Adequado planejamento das ações com foco na assertividade. O Mapeamento de Fluxo de Valor não pode ser delegado A responsabilidade pelo mapeamento e, portanto, pela definição e implementação do estado futuro deve ser da alta administração: é preciso que ela se envolva diretamente, caminhe pessoalmente pelos fluxos de valor e apoie explicitamente. Isso é garantia da relevância do estado futuro e que a alta administração, ao menos a direção de manufatura, estará familiarizada com a nova linguagem, conhecerá bem o estado atual e cobrará a implementação do estado futuro (FERRO, 2005). Apesar de parecer óbvio, esse aspecto é muitas vezes na prática negligenciado ou desconsiderado. A responsabilidade pelo Mapeamento da Cadeia de Valor, em especial da situação futura alvo pretendida, são de responsabilidade da gestão. Trata- se da definição do escopo a ser entregue, resultante do trabalho de Mapeamento da Cadeia de Valor e suas ações e intervenções decorrentes. Deixar a responsabilidade dos mapas ao pessoal técnico, engenheiros de processo ou mesmo responsáveis pela coordenação lean é assumir riscos desnecessários de que, por mais interessante que possam ser as melhorias propostas, a implementação fique comprometida. E ainda, a priorização das ações e a determinação das medidas de ganhos, sem o envolvimento da alta administração, podem ser imprecisas, tornando as propostas muito menos interessantes do que poderiam ou deveriam ser (FERRO, 2005). Além das razões evidenciadas e enfatizadas pelo autor, chamamos atenção para o fato de que todos os esforços e ações Lean devem estar alinhadas e conduzir ao atendimento de metas, planos e objetivos estratégicos da organização, logo se faz necessário e adequado o comprometimento e envolvimento da alta gestão para a adequada definição de prioridades e direcionamento de esforços. O Mapeamento do Fluxo de Valor é diferente dos tradicionais mapas de processos Geralmente, os mapas de processos focalizam processos individuais e não fluxos de materiais e informações relacionadas a famílias de produtos. A 23 visão de estado futuro é definida com base em perspectivas muitas vezes óbvias de melhorias a serem feitas, sem levar em conta os princípios lean, capazes de gerar fluxos de valor cada vez mais enxutos (FERRO, 2005).Trata-se de definir o fim e, fundamentado em estudos e visão sistêmica, definir os meios, caminhos e recursos que levarão ao sucesso. O conceito é simples e verdadeiro, chamando atenção e fazendo-nos lembrar a máxima que diz que “quando não se sabe onde se pretende chegar, qualquer caminho serve”. Não fique deslumbrado com os níveis de estoque e as possibilidades de reduzi-los É muito comum as pessoas ficarem desapontadas, e ao mesmo tempo fascinadas, quando encontram elevados níveis de estoques, quer seja de matérias-primas, produtos em trânsito ou acabados, em seus fluxos de valor. A transformação pura e simples desses números em valores financeiros ajuda a vislumbrar ganhos significativos imediatos e aparentemente fáceis de conquistar. Mensurar os níveis de estoque ajuda a medir o lead time, indicador muito importante. Mas os acúmulos de estoque nos trazem uma mensagem “invisível”: apontam onde o fluxo é interrompido. Nossa tarefa é entender porque isto acontece e identificar o que pode ser feito para melhorar o fluxo da matéria-prima ao produto acabado (FERRO, 2005). Aqui fica evidenciado o popular ditado amplamente utilizado no Gemba, “não existe almoço grátis…”. Com isso, queremos dizer que ganhos fáceis, rápidos e aparentemente óbvios podem até se apresentar em nossos caminhos, mas se faz necessário sempre o estudo técnico, aprofundado e sistêmico para fundamentar decisões e ações. Não polua os mapas Algumas empresas acrescentam informações desnecessárias aos mapas tais como o custo dos estoques, a distância entre estações de trabalho, o número de empilhadeiras utilizadas etc, poluindo o mapa com uma “fumaça” que torna impossível enxergar o essencial. Muitas vezes são consumidos dias de trabalho para o levantamento dessas informações pouco úteis. A utilização dos parâmetros básicos (T/C, T/R e Disponibilidade) é suficiente para se projetar um estado futuro melhor. O objetivo não é produzir mapas completos e perfeitos. Um bom mapa é aquele capaz de tornar possível vislumbrar claramente a mudança (FERRO, 2005). Devemos sempre ter em mente que o Mapeamento da Cadeia de Valor é um recurso visual que essencialmente tem por finalidade a comunicação e comunização de informações. Nesse sentido, reforçamos que a comunicação deve, em especial na área técnica, ser clara e concisa e seu sucesso não depende do que se pretendia dizer, mas sim do que foi efetivamente entendido. Escolha a altitude certa 24 Olhar muito de longe significa não ser capaz de enxergar precisamente o estado atual e não ter visão de futuro. Olhar muito de perto implica enxergar apenas melhorias pontuais e não sistêmicas. Entender o estado atual é mais difícil do que pode parecer, principalmente sob a perspectiva sugerida por Shook e Rother. Depois de anos de análise e de melhorias dos processos individuais, é difícil para a maioria dos gerentes olhar os fluxos de valor bem do alto, enxergando o fluxo porta a porta como um todo. Uma primeira abordagem pode não conter muitos detalhes dos processos individuais, e nem é esse o objetivo inicial. Uma breve caminhada ao longo do fluxo de valor permite vislumbrar, em linhas bastante gerais, apenas uma primeira visão do estado atual (FERRO, 2005). Como praticamente tudo o que fazemos e implementamos, no Mapeamento da Cadeia de Valor também se faz necessário o aprimoramento e melhoria contínuos. Naturalmente, a prática e expertise em aplicar os conceitos e realizar mapeamentos levará ao aprimoramento. Um dos aspectos mais relevantes desse conceito é aprender a adequadamente detalhar a abordagem e nível de aprofundamento de informações apresentadas no Mapeamento da Cadeia de Valor. Defina as melhorias que possam ser realizadas em até um ano Mike Rother e John Shok nos ensinam que um estado futuro definido com um número excessivo de kaizens, superior a 6, significa possivelmente ir muito além no estado futuro possível de ser atingido em um período de até um ano. Um mapa do estado ideal pode ser uma boa visão de futuro, de dois a cinco anos na frente. Mas, via de regra, não é muito operacional, pois imobiliza o time frente aos investimentos necessários e outros fatores que impedem a ação imediata; a adoção de um “mapa futuro 1”, cujo plano de ação possa iniciar amanhã, colhendo-se resultados em 6 meses, é fundamental para que sejam dados os passos necessários para, gradativamente, chegarmos ao estado ideal (FERRO, 2005). O aspecto temporal é sempre fortemente recomendado. Trata-se de definir objetivos e metas de curto, médio e longo prazos, com o objetivo de facilitar o monitoramento das ações e resultados, além é claro de na prática, manter os envolvidos continuamente comprometidos e motivados dom o trabalho. Elabore planos de ação, não de estudos, e monitore sua implementação diariamente É fundamental a participação da alta direção em deixar claro a prioridade da implantação do estado futuro desenhado, suas expectativas de prazos para implementação e recursos (principalmente humanos) que devem ser alocados. Sem essa determinação, corre-se o risco de planos de “ação” com atividades de meses, do tipo “estudar a possibilidade de tal mudança…”, onde seriam possíveis atividades de semanas como “implementar tal mudança…”. Uma vez elaborado o plano de ação, sua execução deve ser monitorada diariamente, removendo os obstáculos um a um conforme surgirem. E podem surgir, imobilizando o time, se a determinação de mudar não estiver bastante sólida (FERRO, 2005). Deve-se manter sempre o foco e a assertividade. Os objetivos e metas devem ser claros e bem definidos, assim como o acompanhamento de atividades e o 25 monitoramento de resultados devem ser contínuos e transparentes. Inadequadamente conduzido o processo, é muito fácil perder-se o foco e comprometerem-se os resultados. Muitas empresas têm utilizado o mapa do estado atual como justificativa de problemas. Não perca tempo dessa forma. O poder da ferramenta é sua simplicidade e seu poder de provocar mudanças, servindo como mecanismo de monitoração. Mas evite ficar encantado com a ferramenta em si: lembre- se que é apenas um meio, cuja essência deve ser entendida e sempre lembrada (FERRO, 2005). De modo simples e objetivo, no nosso entendimento, o melhor comentário para essa consideração é “Mantenha o foco na solução, e não nos problemas”. Ao compartilhar estas percepções não temos a ilusão de estarmos dando uma “receita de implementação infalível”, mas sim a certeza de que a difusão das lições aprendidas, a partir de muitos casos de aplicação e observação, possam ser úteis a todos aqueles que pretendem fazer do Mapeamento do Fluxo de Valor uma ferramenta capaz de apoiar a efetiva transformação em suas empresas (FERRO, 2005). 26 5. ALGUNS CONCEITOS, DEFINIÇÕES E FERRAMENTAS DO LEAN Com o objetivo de fundamentar as aplicações do pensamento Lean em gestão de processos, neste capítulo apresentamos alguns dos principais conceitos e definições por ele preconizados. Inicialmente, destacamos que estes conceitos e definições podem e devem ser considerados, adaptados e aplicados aos processos e suas respectivas gestões, sempre com foco e objetivo em eliminar desperdícios e potencializar resultados. Chamamos atenção para o fato de que o termo “processos” aqui empregado é abrangente de largo espectro de aplicação e, assim deve ser entendido e considerado, ou seja, os conceitos e definições aplicam-se tanto a processos produtivos ou de manufatura, quanto à serviços ou produtos agregados de serviços. É justamente nesse sentido que se aplicam os conceitos e definições para gestão de processos produtivos, administrativos ou gerenciais, como de fato se verifica por exemplo no Lean Office. Figura 9 – Fundamentos do Lean Manufacturing Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 27 5.1 Jidoka Originalmente o conceito se desenvolveu com foco nacriação de mecanismos automatizados que permitissem a identificação de falhas em máquinas e equipamentos e interrupção do processo, afim de evitar desperdícios de tempo, recursos físicos e humanos, produzindo-se aquilo que apresentaria problemas de qualidade e fatalmente resultaria em desperdícios. Para esse fim se faz necessário o emprego de sensores e comandos que percebessem os problemas ou falhas e atuassem interrompendo o processo. Naturalmente o conceito e sua aplicação, ao longo dos anos, fomentaram o crescimento, valorização e aprimoramento de técnicas, elementos, dispositivos e tecnologia que deram origem ao controle e automação modernos. A aplicação do conceito a serviços, gestão e processos gerenciais, a princípio pode parecer complexa e inviável, contudo, se considerarmos os avanços e desenvolvimentos, em especial computacionais e de informática, os exemplos e possibilidades ficam mais claros e evidentes. Consideremos por exemplo a utilização dos chamados ERPs (Enterprise Resource Planning ou Sistema Integrado de Gestão Empresarial), presentes em grande parte das empresas de diferentes portes e segmentos em todo o mundo. Nessas soluções, os processos são gerenciados de modo automático e informatizado e o sistema permite parametrizações que interrompem os processos mediante, por exemplo, a falta de uma aprovação, liberações, informações, conferência, cumprimento de etapas predecessoras etc. Esses mecanismos aplicados aos processos gerenciais e administrativos, fazem com que o processo não seja continuado se não estiverem atendidos os padrões e parâmetros previamente estabelecidos, o que na prática impede que se empreguem recursos e valor a um processo comprometido, eliminando-se desperdícios. Figura 10 – Jidoka Fonte: adaptado da internet, CECONE, 2019 28 5.2 Just in Time O conceito de Just in Time ou simplesmente “Na hora certa” tem foco na eliminação de desperdícios associados aos estoques, superprodução e superprocessamento. O conceito fundamenta-se no conceito de que a produção, ou de modo mais amplo, a execução de algo, deve ser motivada pela demanda ou necessidade efetiva da etapa subsequente do processo. Além disso, são três as diretrizes que devem ser observadas ao produzir algo ou executar um processo: Fazer o necessário (somente o que é necessário); Quando necessário (no momento certo); Na quantidade necessária (nada a mais nem a menos). Trata-se da aplicação prática de vários conceitos que apresentam forte potencial de redução de desperdícios. É fundamental ter em mente que tudo o que se realiza em uma organização consome recursos físicos e humanos e, consequentemente, tem um custo associado. Sendo a venda, o faturamento e o recebimento o único meio de entrada de capital na organização, é intuitivo concluir que todo o custo demandado pelo processo produtivo, somente será reavido no momento em que o cliente realiza o pagamento. Então, produzir o desnecessário, sem uma demanda ou necessidade real e em quantidade superior ao necessário é contraproducente, oneroso e pouco inteligente. Figura 11 – Contextualização Just in Time Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 29 5.3 Kanban O Kanban é uma metodologia de gestão visual destinada ao controle e movimentação de materiais, podendo ser aplicado em materiais em processo, partes e componentes, subconjuntos ou mesmo produtos acabados. A metodologia fundamenta-se no sistema de produção puxado de modo que um cartão ou espaço físico vazio onde originalmente posicionavam-se os elementos que estavam sendo consumidos motiva a reposição destas partes por um alimentador- abastecedor da linha. De outro modo e exemplificando, imaginemos uma linha de montagem na qual são utilizados rolamentos. Esses rolamentos são inicialmente dispostos em embalagens com determinado número de peças. Quando todas as peças da embalagem são consumidas pelo processo, a embalagem então vazia é retirada de sua posição inicial demandando a sua reposição para utilização no processo. Essa mesma embalagem, agora vazia, é então posicionada em outro local físico pré-determinado, para que, por meio de gestão visual, motive o responsável pelo reabastecimento a repor os rolamentos na embalagem e novamente a posicione no local inicial de embalagens com rolamentos para serem consumidos pelo processo. Existem variações possíveis e produtivas dos métodos na prática. Por exemplo, a disponibilização de certo número de embalagens cheias ao processo que, adequadamente dimensionadas com base no consumo médio de componentes do processo, permitem o balanceamento da linha, o planejamento e prioridade de reposição e a redução do espaço físico ocupado por estes estoques no processo. Outro aspecto interessante do método é a possibilidade de balanceamento de vários e diferentes componentes utilizados no processo, na verdade de tantos quantos forem necessários. Claro que isso depende fundamentalmente do adequado balanceamento do processo, mas proporciona significativas reduções de desperdícios com mão de obra, movimentação e estoque em processo. Figura 12 – Sistema Kanban Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 30 5.4 Heijunka Heijunka é uma metodologia que se dedica ao planejamento e administração da produção, buscando seu nivelamento a partir dos volumes de produção (quantidades) e os diferentes tipos de produtos (mix). Seus objetivos principais são a padronização e a estabilidade do processo produtivo ao longo de um intervalo de tempo, o que viabiliza a análise de fluxo. No que se refere a estabilidade, o Heijunka tem grande importância para minimização do chamado efeito chicote – termo adotado para se referir ao fato de que, uma pequena variação na origem, nesse caso no planejamento, se traduz em grandes variações ao longo e no final do processo, nesse caso a produção. A aplicação do Heijunka está alinhada e fundamentada na utilização de outros conceitos do Lean, notadamente: Produção puxada; Takt time; Kanban; Balanceamento do processo – Teoria das restrições; Padronização; Tempo de setup. O diagrama apresentado na Figura 13 evidencia a aplicação e posicionamento do chamado Heijunka Box, um sistema de gestão visual em que os cartões Kanban, quando utilizados, são posicionados de modo a definir a produção objetivada ao longo de um determinado e preestabelecido intervalo de tempo, que pode ser uma semana, um dia ou, mais usualmente, um turno de trabalho. Na prática, trata-se de uma gestão a vista do PPCP (Programação, Planejamento e Controle da Produção), por meio de cartões Kanban suficientes para o atendimento da demanda durante um intervalo específico de trabalho. Figura 13 – Contextualização Heijunka Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 31 O Heijunka mostra-se adequado e extremamente útil para a gestão e administração da produção e dos processos produtivos, individual e principalmente, sistematicamente. 5.5 Kaizen Embora não haja um padrão rigoroso em termos de prazo, o Kaizen, ou Evento Kaizen, é uma atividade que dura em média 3 a 5 dias. Trata-se de uma “imersão” em um problema, desafio ou oportunidade de melhoria. Figura 14 – Significado Kaizen Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 Deve-se inicialmente promover uma análise adequada da qual resultará a definição, alinhada aos objetivos estratégicos da organização, do foco, objetivos e metas do Kaizen. O foco pode ser um determinado produto, um processo, o atendimento a um cliente específico, uma revisão procedimental etc. Figura 15 – Papel Gestão – Operação – Kaizen Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 32 Definidos o foco, objetivo e metas do Kaizen, deve-se promover um levantamento, análise e estudo detalhado da situação atual do tema do Kaizen. Essa análise deve ser abrangente e contemplar todos os aspectos e informações atualizadas e atinentes ao tema. O próximo passo é a definição dotime de trabalho ou Grupo do Kaizen. Esse grupo deve ser cuidadosamente formado definindo-se a participação de profissionais que representem as diversas áreas da empresa envolvidas com o tema, que tenham conhecimento técnico para participar, analisar e se possível, tomar decisões em nome de suas áreas e, acima de tudo, devem ser envolvidos todos os profissionais que representem partes atingidas, envolvidas ou interessadas no tema. Esses profissionais deverão durante o processo se dedicar exclusivamente a ele, devendo-se evitar ao máximo a dispersão de foco com todo e qualquer assunto que não o tema do Kaizen. Como em geral o grupo do Kaizen é composto por profissionais da própria empresa, o resto da empresa não para, o dia a dia continua e as demandas do departamento não param, é comum que haja alguma tentativa de interrupção do trabalho ou demanda do departamento de origem para os profissionais do grupo. Isso deve ser fortemente evitado e impedido. O foco deve ser total no projeto. Figura 16 – Metodologia Kaizen para a melhoria contínua Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 33 O início efetivo do trabalho do grupo do Kaizen se dá geralmente com uma reunião. Nela são apresentados os integrantes do grupo de trabalho, suas funções e responsabilidades dentro da organização, isso com foco e objetivo claro de que todos do grupo se conheçam e saibam o tipo e nível de contribuição que cada integrante oferece ao grupo e ao projeto. O próximo passo, ainda nessa reunião de início de trabalho é a apresentação do tema, que deve ser conduzida pelo líder do grupo e deve expor: O tema do Kaizen; A situação atual – detalhada; As informações técnicas do tema; Os objetivos e metas do Kaizen; O cronograma de atividades, horários de trabalho e pausas etc; Oportunidades de melhoria previamente identificadas; Se adequado ao Kaizen e geralmente o é, realiza-se uma visita ao Gemba; Dúvidas e esclarecimentos gerais que se façam necessários. Todos os esforços, dedicação e foco do grupo passam então a ser o projeto Kaizen, seu tema e suas metas e objetivos. Todos deverão trabalhar juntos, cooperar e interagir para alcançar o sucesso do projeto. Cumpridas estas etapas iniciais, deve-se promover um Brain Storm (Tempestade de Ideias), no qual todos os integrantes do grupo podem e devem livremente apresentar sugestões e ideias que a seu critério possam vir a contribuir para com a busca e alcance dos objetivos e metas alvo. Todas as ideias e sugestões dadas e apresentadas devem respeitosamente ser consideradas e posteriormente triadas, o que em geral se dá com base em um critério previamente estabelecido que se fundamenta em: Viabilidade técnica; Viabilidade legal; Custo; Benefício; Tempo de implementação; Complexidade de implementação; Entre outros, a critério da organização. Dadas as ideias e sugestões e devidamente triadas, espera-se a obtenção de uma lista de ações, ajustes, alterações e intervenções que levarão a implementação delas. Como sabemos, para que se proceda uma alteração ou intervenção de qualquer ordem dentro de uma organização, se faz necessária a análise sistêmica considerando as limitações e consequências do que se pretende realizar, além das autorizações e aprovações de diferentes áreas envolvidas. Esse é um dos principais objetivos da formação do grupo a partir do envolvimento de profissionais de diferentes áreas. Para que cada um possa opinar, avaliar e se possível, decidir em nome de sua 34 área e, é claro realizar o maior número possível de intervenções implantando o máximo possível de melhorias. As intervenções realizadas durante o Kaizen e as melhorias implantadas devem, portanto, ter foco em buscar eliminar desperdícios de toda ordem, por exemplo: Tempo de processo; Consumo de materiais; Mão de obra envolvida; Movimentação e transporte desnecessários; Perdas de qualidade; Atividades que não agregam valor. Figura 17– Kaizen Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 Cabe ressaltar que ao término do Kaizen, espera-se que tenham sido implementadas, se não todas, a maioria das melhorias propostas. O objetivo de uma ação rápida e focada é a de obtenção rápida de resultados positivos significativos. Evidentemente algumas melhorias demandam maior tempo para a implementação. Por exemplo a alteração de um produto que, em geral demanda um estudo adequado por parte da engenharia, análise e aprovação do cliente, documentação e registros etc. Nesses casos o recomendado é que se iniciem os trabalhos, se realize ou encaminhe tudo o que for possível durante o Kaizen e, na apuração de resultados do Kaizen, apresente-se e identifique-se como melhorias em implantação. É fundamental que para cada melhoria dessa, ainda durante o Kaizen, se defina um plano de ação com todas as etapas do início até a conclusão, com responsáveis e prazos e, estes 35 planos de ação deverão ser monitorados e acompanhados por um “padrinho” responsável por isso, geralmente o líder do Kaizen. O Kaizen se encerra com uma reunião de fechamento no último dia de trabalho, na qual apresentam-se para a alta gestão da empresa colaboradores-chave e partes interessadas, os resultados do trabalho, evidenciando no mínimo: Custos do Kaizen; Resultados obtidos (já implantados); Resultados futuros esperados (ações iniciadas no Kaizen com conclusão futura. Embora como mencionado, o grupo Kaizen deva ser multifuncional e composto por profissionais de todas as áreas envolvidas, o que inclui as áreas de custos, financeiro e contábil, os resultados acima mencionados deverão ser apresentados com o acompanhamento, conferência e validação desses profissionais. De qualquer modo se recomenda e é o que geralmente se adota que, os resultados financeiros do Kaizen sejam projetados mensal e anualmente e, que os departamentos necessários sejam envolvidos para monitorar, formalizar e divulgar adequadamente os resultados efetivamente obtidos. Outra consideração importante é que o Kaizen pode e deve ser encarado como projeto, ou seja, é oportuno e adequado que ele esteja inserido no foco de melhoria continua. A medida em que ele se reproduz e repete várias ou inúmeras vezes ao longo do tempo e, tem uma metodologia e conceito claramente definido, torna-se adequado o emprego do ciclo PDCA para sua condução. Essa prática tende a proporcionar melhorias no próprio modelo e jeito da organização de realizar Kaizen, potencializando os resultados a cada edição. 5.6 5S (Cinco S) Tendo tido origem no Japão no período pós-guerra, o programa 5S se consolidou e difundiu-se principalmente nos anos 70, fundamentando-se em cinco palavras-conceitos que, à luz da metodologia, têm por finalidade e objetivo a organização da casa, no nosso caso, do ambiente de trabalho. Inicialmente é fundamental entender, considerar e atentar para o fato de que novamente trata-se de uma metodologia que depende inclusive e principalmente de uma mudança de cultura, comprometimento e envolvimento por parte de todos os envolvidos. Não é incomum que organizações implantem o programa 5S e, após as etapas iniciais, em especial o chamado dia “D”, vejam o programa não se consolidar, não vingar e consequentemente, todos os esforços e recursos empregados no projeto serem perdidos infrutiferamente. Embora sejam muitos os objetivos e benefícios, diretos e indiretos, proporcionados pela adoção implementação e principalmente, manutenção do Programa 5S, alguns dos principais resultados a partir dele são: Satisfação e motivação dos colaboradores; 36 Redução de custos operacionais; Racionalização da utilização de recursos físicos e humanos; Aumento de produtividade; Adequação e melhoria do ambiente de trabalho; Ganho de agilidade nos processos; Redução de estoques; Figura 18 – 5S Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 De acordo com artigo publicadopelo Lean Institute Brasil, disponível no endereço eletrônico: https://www.lean.org.br/conceitos/21/o-que-e-o-cinco-ss.aspx, com texto original transcrito abaixo e, comentado de maneira explicativa abaixo, as cinco palavras-conceitos que definem e norteiam o Programa 5S são: Cinco termos relacionados, começando com a letra S, que descrevem práticas para o ambiente de trabalho, úteis para a gestão visual e para a produção lean. Os cinco termos em japonês são: 1. Seiri: Separar os itens necessários dos desnecessários - ferramentas, peças, materiais, documentos - descartando os últimos (LEAN INSTITUTE, 2019). O primeiro dos S preconizados pela metodologia consiste em uma revisão geral em tudo o que está presente na área de trabalho. Deve-se nessa etapa remover tudo o que ali está e a partir de uma análise isenta e desapegada separar o que é útil e necessário do que não o é. É adequado ainda nessa fase já considerar e ordenar o que é útil a partir de um critério de frequência de usos. Isso será útil na próxima etapa – organizar. 37 2. Seiton: Organizar o que sobrou, definindo um lugar para cada coisa e colocando cada coisa em seu lugar (LEAN INSTITUTE, 2019). Nessa etapa, aparentemente simples, começam a se apresentar os desafios para manutenção do Programa 5S. Definir e alocar os recursos necessários no dia a dia na área de trabalho é fundamental para o sucesso do Programa 5S e isso deve ser feito com base no critério anteriormente mencionado de frequência de uso. Itens, ferramentas e dispositivos de uso frequente devem ser sempre posicionados com acesso facilitado, ao mesmo tempo que itens de uso mais esporádico devem ser alocados em posições menos privilegiadas, mas também acessíveis. O desafio ao qual nos referimos consiste no fato de que se faz necessária uma mudança de mentalidade, disciplina e rigor para manter a organização implementada. Tudo o que é utilizado deve ser devolvido no devido lugar após o uso. É evidente, mas cabe ressaltar que não basta alocar e manter os itens nos lugares preestabelecidos. É também fundamental que eles sejam mantidos operantes e em condições de uso. Não basta definir e manter no local designado uma bomba manual de óleo lubrificante, se não se mantiver esse recurso abastecido e pronto para o uso sempre que se fizer necessário. 3. Seiso: Limpeza (LEAN INSTITUTE, 2019). O local de trabalho, seus postos, o chão e todos os recursos ali dispostos devem ser mantidos limpos com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos colaboradores que ali atuam, evitar acidentes e até mesmo proporcionar um ambiente saudável e agradável. 4. Seiketsu: Padronização resultante do bom desempenho nos três primeiros Ss (LEAN INSTITUTE, 2019). Todas as ações e iniciativas de organização e limpeza até aqui propostas e implementadas devem obrigatoriamente seguir uma padronização adequada a fim de que se torne sustentável a iniciativa e implantação do Programa 5S. Além disso, a padronização terá papel fundamental para sustentar o quinto e mais desafiador dos Ss. 5. Shitsuke: Disciplina para manter em andamento os quatro primeiros Ss (LEAN INSTITUTE, 2019). Aqui evidencia-se o mais desafiador dos Ss, e também o maior causador de insucesso do Programa 5S. É fundamental que ao longo de todo o processo e, em especial após a intervenção e implantação na área de trabalho, se promova e 38 mantenha a disciplina necessária a manutenção das de processo e rotina de trabalho, inerente a dinâmica das organizações. Os Cinco S’s são normalmente traduzidos para o português como Senso de Utilização, Senso de Organização, Senso de Limpeza, Senso de Padronização e Senso de Autodisciplina. Alguns praticantes do pensamento lean adicionam um sexto S para segurança, ou seja, estabelecer e praticar procedimentos seguros no chão-de-fábrica e no escritório (LEAN INSTITUTE, 2019). Figura 19 – 5S Fonte: LEAN INSTITUTE, 2019 Contudo, a Toyota costuma se referir a apenas Quatro 5s: 1. Analisar (Seiri): analisar aquilo que se encontra na área de trabalho, separando e eliminando o que não é necessário. 2. Classificar (Seiton): organizar os itens que são necessários de forma clara e fácil de usar. 3. Limpar (Seiso): limpar a área de trabalho, os equipamentos e as ferramentas. 4. Ficar “Novo em Folha” (Seiketsu): organização e limpeza geral resultante da prática disciplinada dos três primeiros Ss. O último S, shitsuke (sustentar), é abolido por ser redundante dentro do sistema Toyota de auditorias diárias, semanais e mensais, que verificam o trabalho padronizado. Sejam quatro, cinco ou seis Ss, o ponto principal a ser lembrado é que o esforço deve ser sistemático, e não um programa isolado (LEAN INSTITUTE, 2019). 39 Novamente, aqui fica evidente a total dependência da cultura e mentalidade para o sucesso do Programa 5S. O que ocorre é que, diferentemente da situação que temos em nossa realidade, para os japoneses e aos seus olhos, questões como disciplina não precisam ser evidenciadas por já estarem conceitualmente implícitas em tudo o que se faz. Essa é a base da Mentalidade Lean. 40 6. ESTUDO DE CASO COMENTADO – ESCRITÓRIO ENXUTO (LEAN OFFICE) Valemo-nos aqui do assunto Lean Office com alguns objetivos específicos: Exemplificar a aplicação do Pensamento Lean em Gestão de processos; Contextualizar a aplicação das ferramentas e conceitos Lean estudados; Evidenciar as possibilidades, amplitude e aplicabilidade do Lean; Apresentar um case de aplicação e estudo do Lean. Para isso, valemos do artigo “Escritório Enxuto (Lean Office)”, de autoria de Jeferson Duarte Oliveira, publicado pelo Lean Institute Brasil, disponível no endereço https://www.lean.org.br/artigos/57/escritorio-enxuto-(lean-office).aspx, transcrito do original, que embasa nossos comentários para efeito de estudo e aprofundamento dos conceitos estudados. ESCRITÓRIO ENXUTO (LEAN OFFICE) Jeferson Duarte Oliveira Este artigo tem como objetivo fazer uma revisão bibliográfica das mais importantes formas de desperdício nos escritórios e apresentar os métodos que podem ser aplicadas no ambiente administrativo para transformar os escritórios em “lean offices”. Várias ferramentas e conceitos lean usados no chão da fábrica vêm sendo utilizados e implementados em ambientes administrativos. É importante que as áreas administrativas trabalhem integradas e em sintonia com a área fabril, pois elas estão conectadas e são interdependentes. 1. DESPERDÍCIOS NOS ESCRITÓRIOS A ideia de tornar também enxutos os processos administrativos vem sendo aceita por empresas no Brasil e no mundo. Porém, a migração destes conceitos da área fabril para o escritório não é tão simples. É mais fácil identificar os desperdícios quando são envolvidos matérias primas e processos de transformação física ou química. Na área administrativa, a maior parte das atividades diz respeito a geração de informações, o que torna difícil a identificação dos desperdícios, pois visualizar o processamento de algo intangível como a informação é bem mais complicado (OLIVEIRA, 2007). É fato que o Lean, como vimos, foi conceitualmente concebido com foco na produção fabril e processos produtivos industriais, assim, sua aplicação é intuitivamente mais evidente nesses contextos, mas a evolução dos sistemas dentro das organizações vem cada vez mais evidenciando oportunidades de eliminação de desperdícios também nas áreas administrativas, trabalhos e rotinas intelectuais, com natural necessidade de ajustes e adaptações. No escritório, o que são os estoques? Pode-se defini-los como os relatórios produzidos e parados por dias nos computadores à espera de alguma análise? O que são os defeitos? Retrabalhos e dados incorretos registrados? 41 Uma máquina parada ou a falta de matéria-prima em uma fábrica causa desperdício e é visualizada imediatamente,mas no escritório nem sempre fica visível esta situação (OLIVEIRA, 2007). O desafio principal para a bem-sucedida transferência conceitual Lean – Lean Office consiste exatamente na tradução dos conceitos originalmente concebidos e definidos para o chão de fábrica para o plano do conhecimento, da informação e das atividades intelectuais. Conforme Lareau (2002), os desperdícios nos processos administrativos classificam-se da seguinte forma: Alinhamento de objetivos: é a energia gasta por pessoas trabalhando com objetivos mal-entendidos e o esforço necessário para corrigir o problema e produzir o resultado esperado (OLIVEIRA, 2007). As pessoas devem conhecer, compartilhar e trabalhar com objetivos e expectativas alinhadas. As informações e seus fluxos devem ser adequadamente comunicados para que todos trabalhem com o mesmo foco. Evidencia-se aqui a necessidade de consolidação da cultura Lean. Atribuição: é o esforço usado para completar uma tarefa inapropriada e não necessária (OLIVEIRA, 2007). A atribuição, isoladamente analisada, traduz-se em mera rotina ou tarefa a ser executada, não necessariamente alinhada aos objetivos e resultados pretendidos ou esperados. Espera: é o recurso perdido enquanto pessoas esperam por informações, reuniões, assinaturas, o retorno de uma ligação e assim por diante (OLIVEIRA, 2007). A espera é na prática uma das maiores oportunidades de eliminação de desperdícios no Lean Office, ela está presente e evidencia-se a cada situação em que o fluxo normal do processo é interrompido ou tem sua velocidade reduzida em função de uma ação pontual de um envolvido. O impacto no Lead Time do processo como um todo é significativamente representativo em função de esperas que se somam ao longo dos processos. Movimento: é o esforço perdido em movimentações desnecessárias; Processamento: um trabalho não executado da melhor forma é um desperdício de processamento (OLIVEIRA, 2007). Na prática, trata-se do retrabalho, outro grande vilão dos processos intelectuais. Ocorre quando por alguma razão como falta de conhecimento, habilidade, 42 desconhecimento ou desconsideração do escopo etc., uma atividade ou rotina realizado de forma inadequada. Essa situação em geral só é percebida em etapas futuras e, geralmente, obriga que o processo volte a etapas anteriores onde a falha teve origem para que possam ser revistos, retrabalhados e refeitos. Controle: é a energia usada para controlar e monitorar e que não produz melhorias no desempenho (OLIVEIRA, 2007). Os controles são, sempre foram e, sempre serão um valioso recurso para a garantia da conformidade e consequentemente da qualidade. O que se chama atenção é para o fato de que os controles demandam e consomem recursos e, portanto, devem ser pensados e implementados de forma produtiva, eficiente e eficaz. Nota-se na prática a presença de controles que de fato não agregam valor ao processo, ou seja, não garantem ao processo as características e desejadas. Variabilidade: são recursos utilizados para compensar ou corrigir resultados que variam do esperado (OLIVEIRA, 2007). Se considerarmos que no Lean Office os processos têm por característica o fluxo de informações e a geração de conhecimento e conteúdo intelectual, devemos admitir que estes processos são passíveis de variações em função da dinâmica que lhes é característica. Nesse sentido, os processos e procedimentos devem contemplar recursos adequados para absorver e ajustar estas variações. Alteração: é o esforço usado para mudar arbitrariamente um processo sem conhecer todas as consequências e os esforços seguintes para compensar as consequências inesperadas (OLIVEIRA, 2007). Alterações são sempre possíveis, necessárias e presentes, contudo, cada uma delas deve ser proposta, analisada, estudada e aprovada adequadamente por todos os envolvidos e sistemicamente. Não é aceitável que se altere um processo desconsiderando-se os impactos e consequências dessa alteração. Estratégia: é o valor perdido ao implementar processos que satisfazem objetivos de curto prazo, mas que não agregam valor aos clientes e investidores (OLIVEIRA, 2007). Novamente, evidencia-se que a abordagem deve ser sistêmica e, desconsiderar ou negligenciar essa recomendação pode isoladamente atender a objetivos pontuais ou específicos, mas no todo, há grande chance de comprometimento de resultado. 43 Confiabilidade: é o esforço necessário para corrigir resultados imprevisíveis devido a causas desconhecidas (OLIVEIRA, 2007). Trata-se das medidas e ações corretivas que no dia a dia são empregados para adequar o resultado efetivamente obtido ao resultado objetivado. Trata-se de um desperdício significativo que poderia ter sido evitado e o processo fosse adequadamente tratado desde o início. Padronização: é a energia gasta por causa de um trabalho não ter sido feito da melhor forma possível por todos os responsáveis (OLIVEIRA, 2007). Quando um processo não é adequadamente realizado, os resultados são comprometidos. Nesses casos, é comum que se definam e adotem-se padrões para garantir que o processo seja adequadamente realizado e os resultados obtidos. Ocorre que esses padrões de certo modo burocratizam o processo, obrigando a realização do processo em atendimento a requisitos que não necessariamente são adequados e produtivos em todos os casos, isso se traduz em desperdício. Subotimização: é causada pela concorrência de dois processos, no melhor caso o desperdício será́ o trabalho duplicado, mas pode chegar ao comprometimento de ambos os processos e na degradação do resultado final (OLIVEIRA, 2007). Esse desperdício é associado à redundância e duplicidade procedimental que, com o objetivo de assegurar a execução de uma tarefa e garantir o atendimento a um requisito, determina que o mesmo trabalho seja realizado desnecessariamente em dois momentos e etapas diferentes. Agenda: é a má utilização dos horários e da agenda (OLIVEIRA, 2007). Definida como sendo a má utilização dos horários e da agenda, o contexto e amplitude desse desperdício é muito maior. Trata-se do mal aproveitamento do horário de trabalho, falta de foco e objetividade, falta de eficácia e eficiência, desconsideração dos horários do grupo de trabalho e cada um de seus elementos etc. Todos esses aspectos devem ser considerados para que se possa promover o sincronismo necessário ao sucesso dos trabalhos. Processos informais: ocorre quando recursos são usados para criar e manter processos informais que substituem os processos oficiais ou que conflitam com outros processos informais, e também os recursos utilizados para corrigir os erros causados por este sistema (OLIVEIRA, 2007). 44 Os processos informais são em geral implementados para que se corrijam situações e problemas pontuais de forma rápida e ágil. Como informais que são, não têm a eles associados procedimentos, registros, monitoramentos etc. Naturalmente, eles consomem recursos e oficialmente não existem. Necessariamente tudo o que é informal, se realmente produtivo, necessário e agregador de valor, deverá passar a formalidade e compor o processo oficial e adequadamente. Fluxo irregular: recursos investidos em materiais ou informações que se acumulam entre as estações de trabalho e criam o desperdício de fluxo irregular (OLIVEIRA, 2007). Trata-se aqui especialmente de recursos físicos, basicamente nesse contexto de insumos de escritório. Não há necessidade de existência e manutenção de sub- estoques nas mesas e postos de trabalho. Deve-se manter o que é realmente necessário para a realização das tarefas e rotinas. Checagens desnecessárias: é o esforço usado para inspeções e retrabalhos (OLIVEIRA, 2007). Controles, monitoramentos e checagem que, se houvesse de fato confiabilidade no processo, seriam desnecessários
Compartilhar