Prévia do material em texto
ARTRITE PSORIÁSICA Thayná Cerqueira Silveira A artrite psoriásica é uma artropatia inflamatória crônica que afeta entre 4-30% dos portadores de psoríase. Em cerca de 80% das vezes as lesões cutâneas da psoríase precedem o surgimento das manifestações articulares, mas é importante ter em mente que em 20% a artrite começa antes (até 2 anos antes) ou ao mesmo tempo em que as lesões cutâneas. De modo geral, a AP acomete portadores de psoríase cutânea grave, mas há casos em que acompanha casos leves e discretos. Não tem preferência por sexo, e em geral aparece na faixa etária entre 30-55 anos. A positividade do HLA-B27 se associa com a ocorrência de sacroileíte e envolvimento axial. A AP se expressa através de 5 padrões que podem coexistir num mesmo caso: ❖ Poliartrite periférica simétrica (lembra artrite reumatoide) É o padrão mais frequente, caracterizando-se por poliartrite simétrica de pequenas articulações de mãos + punho (exceto as IFD), sendo bastante semelhante a artrite reumatoide – mas menos articulações são acometidas. O fator reumatoide é tipicamente negativo. ❖ Oligoartrite periférica assimétrica (lembra artrite reativa) Se apresenta como uma oligoartrite assimétrica afetando as articulações do joelho, metatarsofalangianas e interfalangianas dos pés. A dactilite (dedo em salsicha) é o sinal mais característico deste tipo. ❖ Envolvimento das interfalangianas distais É considerado o padrão clássico da artrite psoriática, acometendo as IFD com distribuição assimétrica + lesões das unhas adjacentes. Existem cinco alterações que caracterizam as lesões ungueais da psoríase: ▪ Depressões puntiformes na placa ungueal – o famoso pitting ungueal ou “unha em dedal”; ▪ Cristas horizontais; ▪ Onicólise ou “unhas quebradiças”; ▪ Pigmentação amarelada nas bordas; ▪ Hiperceratose distrófica. ❖ Artrite mutilante Caracteriza-se por uma poliartrite periférica destrutiva predominando em mãos e pés + intensa osteólise. O RX demonstra a deformidade em ponta de lápis na qual as falanges se tornam pontiagudas devido a dissolução subperiosteal irregular do tecido ósseo. Casos avançados incluem a deformidade em telescópio ou em binóculo de teatro (engavetamento dos dedos) que cursam com destruição quase completa das falanges e consequente encurtamento dos dedos, o que resulta na formação de dobras na pele periarticular. O examinador consegue “esticar” o dedo do paciente até sua posição original. ❖ Envolvimento axial (lembra espondilite anquilosante) Acomete apenas 5% dos pacientes, com alterações assimétricas e aleatórias. Os sindesmófitos aparecem apenas em uma das margens laterais dos discos intervertebrais e em qualquer nível, sem obedecer a uma progressão ascendente. O grau de comprometimento vertebral é, em geral, menor que na espondilite anquilosante. O HLA-B27 é encontrado em 50% desses doentes. CRITÉRIOS DE FOURNIÉ SINAIS CLÍNICOS Psoríase anterior ou concomitante ao início do reumatismo 6 Psoríase familiar na ausência de psoríase pessoal ou psoríase posterior ao início do reumatismo 3 Artrite de uma IFD 3 Acometimento cérvico-dorsal 3 Mono ou oligoartrite assimertrica 1 Dor inflamatória em calcanhares, nádegas, esterno costo clavicular ou entesalgias difusas sensíveis aos AINE 1 SINAIS RADIOLÓGICOS ≥1 dos critérios de Avila 5 CRITÉRIOS LABORATORIAIS + HLA B16 (38,39) ou B17 4 Ausência fator reumatoide 4 Se a soma dos pontos é ≥11, o paciente será classificado como portador de AP A AMB sugere a utilização dos critérios CASPAR: CRITÉRIOS CASPAR Paciente tem de ter doença inflamatória articular (periférica, axial ou entesitica) + ≥3 pontos nas categorias a seguir: Evidencia de psoríase: Atual História pessoal História familiar 2 1 1 Distrofia ungueal psoriásica: Depressões puntiformes, onicólise, hiperceratose 1 Fator reumatoide negativo 1 Dactilite: Inflamação atual de 1 dedo em sua totalidade História de dactilite 1 1 Evidencia radiológica de neoformação óssea justa-articular: Ossificação bem definida próxima ás margens articulares á radiografia simples de mãos e pés 1 ACHADOS LABORATORIAIS E RADIOGRÁFICOS A VHS costuma estar elevada na artrite psoriásica. A hiperuricemia é outro achado frequente, principalmente na vigência de psoríase extensa (devido ao alto turnover das células cutâneas há um aumento na síntese e degradação de ácidos nucleicos, o que faz aumentar a produção endógena de ácido úrico). Uma descamação cutânea acentuada pode espoliar os estoques corporais de ferro e ácido fólico, os quais, portanto, devem sempre ser avaliados e repostos quando necessário. Os principais achados radiográficos típicos da artrite psoriásica são: 1. Erosões ósseas marginais, progressivas e irregulares, que nas falanges promovem a já citada “deformidade em ponta de lápis” ̶ mas que podem aparecer em diversos outros ossos, incluindo as diáfises de ossos mais longos e os próprios corpos vertebrais; 2. Reação periosteal de neoproliferação óssea “felpuda”, o que aparece principalmente nos sítios de inserção óssea das ênteses e tendões musculares. No que tange ao acometimento axial, não podemos esquecer que o mesmo se dá de forma bem diferente da espondilite anquilosante, ou seja, a sacroileíte da artrite psoriásica é assimétrica, assim como o surgimento de sindesmófitos entre os corpos vertebrais, que inclusive aparecem de maneira randômica e em menor quantidade do que na EA. TRATAMENTO – PORTARIA 26º/2018 O tratamento medicamentoso da AP inclui AINE, glicocorticoides e medicamentos modificadores do curso da doença (MMCD) – sulfassalazina, metotrexato, leflunomida, ciclosporina e agentes biológicos anti-TNF-alfa. ❖ AP periférica (artrite, entesite ou dactilite) Medidas não medicamentosas + AINE ↓ (1 mês) Substituir por outro AINE ou Glicocorticoide 1 ↓ (2 meses) MMDC sintético + AINE (artrite ou dactilite) ou Monoterapia de MMCD sintético ↓ (3 meses) Trocar MMCD sintético + AINE ↓ (3 meses) MMCD biológico + metotrexato ou ciclosporina ↓ (3 meses) Considerar anti-TNF ± MTX ou ciclosporina ou Outro MMCD biológico ± metotrexato ou ciclosporina 1Nos casos de mono ou oligoartrite, deve-se considerar a aplicação intra- articular de glicocorticoide (até 3 aplicações/ano) como alternativa ao uso de AINE. Nos casos de poliartrite + sinovite exuberante sem resposta ou com contraindicação ao uso de AINE, deve-se considerar o uso de glicocorticoide sistêmico VO na menor dose e pelo menor tempo possível. Em caso de persistência dos sintomas (artrite), após o uso de MMCD-s em monoterapia ou em associação a um 2º MMCD-s, em doses máximas toleradas por 6 meses, deve ser considerado o uso de MMCD-b em monoterapia ou associado ao MTX ou ciclosporina. Para os casos de entesite ativa ou dactilite com falha terapêutica após uso de AINE ou à injeção local de glicocorticoide, deve ser iniciado o tratamento com MMCD-b. ❖ AP axial O objetivo do tratamento é manter BASDAI <4: AINE ↓ (1 mês) Substituir o AINE por outro ↓ (2 meses) MMCD biológico ↓ (falha) Substituir MMCD biológico (até 2 vezes) ↓ (falha) Anti-TNF ↓ (falha) Substituir anti-TNF por outro ESQUEMAS DE ADMINISTRAÇÃO Ibuprofeno: 600-2.700 mg/dia VO em 3 administrações (8/8 horas) Naproxeno: 500-1.500 mg/dia VO em 3 administrações (8/8 horas) Prednisona: 5-20 mg/dia VO 3 administrações (8/8 horas). Metilprednisolona: 40 a 80 mg, intra ou periarticular, até 3 vezes/ano. Ciclosporina: 3-5 mg/kg/dia VO em 2 administrações (12/12 horas). Leflunomida: 20 mg VO MID Sulfassalazina: 500-3.000 mg/dia VO em até 3 administrações (8/8 horas). Metotrexato: 7,5 a 25 mg VO subcutâneo ou IM a cada semana. Adalimumabe: 40 mg, subcutâneo, a cada 2 semanas (máx.2 vezes/mês). Etanercepte: 50 mg, subcutâneo, a cada semana (máx. 4 vezes/mês). Infliximabe: 5 mg/kg IV nas semanas 0, 2, 6 e, posteriormente, a cada 8 semanas. Golimumabe: 50 mg, por via subcutânea, uma vez/mês. Aprovado apenas para pacientes adultos. Secuquinumabe: 150mg/ml, por via subcutânea, nas semanas 0, 1, 2 e 3; posteriormente, uma vez a cada 4 semanas. Aprovado apenas para pacientes adultos. CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO AINE úlcera péptica ativa insuficiência renal crônica discrasia sanguínea crise de asma urticária ou rinite CICLOSPORINA gravidez e lactação infecção sistêmica HAS descompensada insuficiência renal moderada a grave neoplasia GLICOCORTICOIDE DM descompensado infecção sistêmica úlcera péptica ativa HAS descompensada ANTI-TNF gravidez e lactação infecção sistêmica tuberculose sem tratamento neoplasia nos últimos cinco anos insuficiência cardíaca moderada a grave METOTREXATO gravidez e lactação infecção sistêmica alcoolismo depressão da medula óssea insuficiência hepática úlcera péptica ativa LEFLUNOMIDA gravidez e lactação insuficiência hepática insuficiência renal moderada a grave depressão da medula óssea infecção sistêmica SULFASSALAZINA gravidez e lactação obstrução urinária ou intestinal porfiria depressão da medula óssea insuficiência hepática insuficiência renal moderada a grave MONITORIZAÇÃO Reavaliações clínicas a cada 3 meses (se doença ativa) e a cada 6 meses (se doença estável) devem ser adotadas. Para isso, realizar VHS e proteína C devem ser mensurados. No inicio do tratamento e também para monitorar efeitos adversos dos AINE, SSZ, MTX, ciclosporina e anti-TNF, solicitar: ▪ Hemograma ▪ Plaquetas ▪ Creatinina ▪ AST e ALT Avaliação de RX ou RM deve ser feito no inicio do tratamento para diferenciar manifestação predominantemente axial ou periférica, possíveis danos estruturais, como o surgimento de erosões em articulações periféricas e/ou sinais de sacroileíte em atividade. Antes do inicio dos anti-TNF, recomenda-se investigação: ▪ Tuberculose latente (teste tuberculínico e RX de tórax) ▪ Hepatite B e C ▪ HIV ▪ Vacina antipneumocócica e influenza