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FUNDAÇÃO CENTRO DE CIÊNCIAS E EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO LICENCIATURA EM PEDAGOGIA KESSYLEN CARVALHO CARDOSO LOPES DE SOUZA CONTRIBUIÇÕES DA LITERATURA INFANTIL PARA O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ 2020 CONTRIBUIÇÕES DA LITERATURA INFANTIL PARA O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO KESSYLEN CARVALHO CARDOSO LOPES DE SOUZA Monografia apresentada à banca examinadora da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – Campos dos Goytacazes, como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciatura em Pedagogia. Orientadora: Profª. Drª. Eliana Crispim França Luquetti CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ 2020 CONTRIBUIÇÕES DA LITERATURA INFANTIL PARA O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO KESSYLEN CARVALHO CARDOSO LOPES DE SOUZA Monografia apresentada à banca examinadora da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – Campos dos Goytacazes, como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciatura em Pedagogia. Orientadora: Profª. Drª. Eliana Crispim França Luquetti APROVADA EM: ____/____/______. Comissão examinadora: Profª. Drª. Eliana Crispim França Luquetti (Orientadora – D. Sc. Linguística - UFRJ) Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) Profª. Mª. Luciana da Silva Almeida (Mª. em Cognição e Linguagem – UENF) Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) Prof. Dr. Sérgio Arruda de Moura (D. Sc. Letras – UFRJ) Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) Dedico este trabalho primeiramente a Deus, autor de toda minha trajetória, meu firme alicerce, ao meu marido Rômulo e meus filhos Laura e Pedro. AGRADECIMENTOS Primeiro agradeço a Deus, por tudo que sou, pela sua infinita e maravilhosa graça, por ser meu porto seguro e socorro bem presente na hora da angústia. À minha família que me deu suportes para cumprir toda essa trajetória, sem vocês eu jamais conseguiria chegar até aqui. Em especial, agradeço a Rômulo, meu esposo, maior incentivador e apoiador para que essa conquista fosse real em minha história. Aos meus amados filhos, pois mesmo sem entender, falar ou consentir foram minha maior fonte de inspiração para não desistir! Obrigada por agregar a minha vida garra e determinação! À minha mãe Valéria e minha sogra Carla, que incansavelmente, cuidaram de meus filhos (seus netos) na minha ausência. Vocês foram fundamentais para a conclusão dessa etapa. Muito obrigada! Ao meu amado irmão Joao Ricardo, por me encher de carinho e por fazer parte da minha história. Ao meu irmão Felipe e minha cunhada Priscila, que sempre estiveram prontos para me ajudar. Obrigada! À minha avó Clélia, seus conselhos e encorajamentos fizeram toda diferença durante essa trajetória. Obrigada, vovó! Às minhas amigas Kissilla e Caroline, a amizade de vocês é um presente e agradeço por torcerem por mim! À Beatriz Rezende, minha referência como educadora e inspiração a seguir! Obrigada por cada ensinamento e pela honra de ter trabalhado com você! Às minhas amigas de curso, Carla, Tânia e Dione. Foi maravilhoso compartilhar essa graduação com vocês! Agradeço a minha coorientadora Luciana, a quem eu tenho uma enorme admiração. Obrigada por transmitir paz, obrigada pela atenção, carinho e dedicação. Como você foi importante para a efetivação dessa pesquisa! Meu muitíssimo, obrigada! Às professoras que se disponibilizaram a participar da pesquisa. Obrigada por cada contribuição! Agradeço a todos que direta ou indiretamente foram agentes colaboradores para o cumprimento dessa caminhada. Obrigada! (...) O que faz da leitura uma experiência é entrar nessa corrente onde a leitura é partilhada. (...) Defendo a leitura da literatura e de textos que têm dimensão artística, não por erudição, mas porque são textos capazes de inquietar. (...) (Sônia Kramer, 2000) RESUMO O presente trabalho objetivou relacionar a literatura infantil à prática de alfabetização e letramento, destacando a importância de práticas literárias para a efetivação de um processo de ensino e aprendizagem mais prazeroso. A metodologia foi baseada no aspecto qualitativo da pesquisa, desta forma, realizou-se o levantamento bibliográfico como meio de subsidiar o estudo e oportunizar reflexões pertinentes acerca das ações pedagógicas no 1º ano. A entrevista foi o método escolhido para a coleta de dados e os entrevistados foram seis professores da rede pública e privada do município de Campos dos Goytacazes. Para referenciar a pesquisa, usou-se perspectivas de autores como Freire (1978), Coelho (2000), Zilberman (1982), Kramer (2000), Tfouni (1994), Silva (1995), entre outros. Desta forma, conclui-se que é de grande relevância a exploração da literatura infantil como meio de promover o incentivo à leitura e escrita, assim como a formação do indivíduo autônomo e do leitor apaixonado. PALAVRAS-CHAVE: Literatura infantil. Alfabetização e letramento. Ensino remoto. SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 10 1. LITERATURA INFANTIL É ARTE EM FORMA DE TEXTO? .............................................. 13 1.1. Literatura infantil: arte que inquieta, que desperta ........................................................ 14 1.2. Retrato da leitura no Brasil: a literatura infantil e a formação de leitores na escola 16 1.3. Leitura ou lei-dura? ............................................................................................................ 18 2. DISCUSSÕES ACERCA DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO .................................. 22 2.1. Alfabetização e letramento: um breve panorama histórico .......................................... 25 2.2. Literatura infantil e o processo de alfabetização e letramento .................................... 28 2.3. Qual a importância dos docentes para formação de leitores apaixonados? ................ 30 3. PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO .......................................................... 34 3.1 Escola e família ........................................................................................................................ 37 3.3 Literatura Infantil: um caminho para uma aprendizagem prazerosa ................................... 40 4. A PESQUISA ............................................................................................................................... 44 4.1 Metodologia .................................................................................................................................. 44 4.2 Apresentação dos dados coletados e análise ......................................................................... 46 4.3. Demonstração das respostas e análise .............................................................................. 48 CONCLUSÃO ..................................................................................................................................... 57 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 61 APÊNDICE ..........................................................................................................................................65 10 INTRODUÇÃO Segundo Zilberman (1982) não há como definir literatura infantil, sem antes refletir sobre seu destinatário – as crianças. E é através da reconfiguração da noção de família, partindo de uma nova valorização da infância, que pôde assim, gerar a produção de produtos culturais para este público. A percepção de alfabetizar se deu em torno do século XVI, por meio do movimento do Humanismo, que visava a educação como meio de transformação do homem. Porém, a instrução pertencia a classe da nobreza e quem ministrava o ato de educar eram os padres. Com a Revolução Francesa um ideário é insta lado: a possibilidade de uma escola em que todos tenham acesso, logo, essa generalização de alfabetização, da escola universal, permite um novo ciclo na história educacional da humanidade. (BARBOSA, 1994) O conceito de letramento emergiu a partir de reflexões relacionadas ao analfabetismo, portanto, letramento apresenta um significado mais amplo que a alfabetização, este termo está ligado ao processo de desenvolver práticas sociais. (TFOUNI, 2010). Para tanto, o estreitamento das relações entre literatura infantil e práticas de alfabetização e letramento tornam-se intrínsecas, porque é por meio do universo imaginário (do faz-de-conta) que a criança pode reconhecer sua própria humanidade e fragilidade, permitindo uma experiência diferenciada com o sistema de leitura e escrita, uma vivência mais prazerosa e mais, permite que o indivíduo se aproprie de seus sonhos, assumindo um papel de autonomia diante de uma sociedade que quer “consumi-lo”. (QUEIRÓS, 1999) Compreender a literatura como um caminho significativo para práticas alfabetizadoras, é de fato, um meio de valorizar toda autenticidade e potencialidade de provocar sensações de prazer que os textos literários têm. É por isso, que Abramovich (1995) caracteriza a literatura como arte e como práticas prazerosas de liberdade, de ensino e aprendizagem. Ao gerenciar uma prática pedagógica de alfabetização e letramento relacionada a textos literários infantis é oportunizado o vínculo da criança com a literatura que contribui para a potencialização de um indivíduo que seja capaz de ler o mundo, um indivíduo crítico, porque a leitura desperta no sujeito o desejo de 11 aprender e redimensiona seu entendimento, ultrapassando o ensinar simplesmente letras escritas, mas assume um viés direcionado a práticas sociais de leitura e escrita que pode romper com uma aprendizagem fria. (QUEIRÓS, 1999) O propósito da pesquisa é analisar as ações pedagógicas e compreender como a literatura infantil pode contribuir para o processo de alfabetização e letramento, assim como refletir sobre o papel do professor diante desse cenário. Portanto, discutir esse processo, de alfabetizar e letrar é repensar o que se pretende para o Brasil como projeto educacional e não somente por conta de preocupações relacionadas ao analfabetismo, mas também como direção de práticas pedagógicas que interferem diretamente na formação de mundo e de homem. (GARCIA, 1998) São diversos os desafios em que o processo de alfabetizar e letrar implica. Os educadores deparam-se com numerosas problemáticas cotidianamente, o que resulta, muitas das vezes no fracasso escolar. Os problemas são oriundos de várias esferas, que contempla desde uma prática pedagógica neutra/desatualizada às questões sociais, históricas, políticas e culturais. A pesquisa foi fomentada partindo da grande paixão por literatura infantil, alfabetização e letramento que a pesquisadora tem, assim como, uma imensa preocupação com o cenário educacional. O trabalho foi norteado pelo método qualitativo, portanto, foi conceituada de modo subjetivo. Incialmente foi realizado um levantamento bibliográfico para obtenção de subsídios pertinentes para a investigação do trabalho proposto. A técnica de coleta de dados será feita por meio de entrevistas formativas, as perguntas serão direcionadas a um grupo de seis professores (três de escola pública e três de escola privada) que atuam com alunos do 1º ano do ensino fundamental. A organização da pesquisa constituiu-se em quatro capítulos, além da introdução e conclusão. O primeiro capítulo traça conceitos, objetivos acerca da literatura infantil, das práticas literárias e aponta discussões sobre a formação de leitores apaixonados. O capítulo dois, aborda aspectos relacionados à alfabetização e letramento e visa apontar a literatura como um caminho significativo no processo de ensino e aprendizagem, principalmente para alunos que estão aprendendo a ler e escrever. E ainda, disserta sobre o papel do professor diante a construção de indivíduos que tenham prazer na leitura. 12 O terceiro capítulo faz conexão das temáticas abordadas anteriormente, assim como discorre sobre as práticas de alfabetização e letramento e destaca a importância da família no processo de aprender a ler e escrever. Por fim, o quarto capítulo está relacionado à explicação da metodologia utilizada, assim como a apresentação dos dados recolhidos (por meio das entrevistas) e a análise das informações coletadas, salientando o quão foram importantes para a investigação. Para isso, a pesquisa buscou averiguar e constatar o papel da literatura como ferramenta significativa para alfabetizar e letrar. Desta forma, as investigações desenvolvidas sobre as ações dos professores, nortearam de forma conclusiva, como torna-se indispensável e essencial a busca por uma prática contextualizada e problematizadora, porque alfabetizar e letrar requer novidade, criatividade e paixão, para que assim, haja o rompimento de um ensino meramente bancário e para que a educação, ressurja! Ressignificando vidas, promovendo autonomia e liberdade. 13 1. LITERATURA INFANTIL É ARTE EM FORMA DE TEXTO? Conceituar a Literatura Infantil não visa apenas uma mera compreensão, com o intuito de agregá-la a uma prática fria de leitura em sala de aula, mas, a formulação deste conceito é para salientar o poder avassalador que ela tem de despertar, instigar, de representar a criatividade humana. Portanto, Coelho caracteriza a Literatura Infantil como arte. A literatura infantil é, antes de tudo, literatura; ou melhor, é arte: fenômeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida, através da palavra. Funde os sonhos e a vida prática, o imaginário e o real, os ideais e sua possível/impossível realização... (COELHO, 2000, p. 27). Com base na obra de Jesualdo (1982), a descrição de um conceito sobre literatura infantil é importante quando a beleza literária se dá por meio de uma essência que difere de padrões meramente instrutivos, para isso, é tão necessário refletir sobre os equívocos, dentre eles, é possível perceber uma associação de que os textos literários, especialmente, os infantis têm, um caráter de apenas instruir moralmente as crianças. As definições acerca do que é literatura infantil, nessa perspectiva, não devem ter a pretensão de excluir o objetivo de ensinar e/ou instruir as crianças, porém, é intrínseco a formação de um paradigma (o da literatura infantil) que seja apreciado e compreendido em amplitude e profundidade. Com base na ressignificação do que é literatura infantil, Jesualdo (1982) traz apontamentos que são relevantes para um olhar desmistificador de um conceito literário infantil retórico e de cunho instrutivo. As obras literárias puramente instrutivas não a atraem, geralmente são repelidas e dificilmente alcançavam seu fim; e, quando isso acontece é sob forte pressão. Os livros educativos também costumam levar-nos facilmente ao equívoco, pois as crianças percebem de imediato, anota Cousinet, que as histórias neles contadas não têm nenhum cunho de realidade e são recomendadas por quem jamais as lê, pois são produzidasespecialmente para “educar”. (JESUALDO, 1982,p.29) Segundo Jesualdo em sua obra “La literatura infantil”, os textos literários mais proveitosos para as crianças são aqueles que tem o enérgico potencial de dar prazer e distração ao ler, paralelamente, pontua que a imaginação instiga o que a realidade inspira e é por isso, que ler textos que desperte sensações agradáveis contribui para 14 um desenvolvimento saudável da psique infantil. Nessa perspectiva, a forma como os textos infantis são apresentados para as crianças pode demonstrar que leitores têm se formado, porque é a partir das ações pedagógicas, das estratégias para o ensino de literatura que define se teremos de fato, leitores apaixonados ou não- leitores e é por isso que Kleiman complementa: Ninguém consegue fazer aquilo que é difícil demais nem aquilo do qual não consegue extrair o sentido. (...) Muitas práticas do professor desse período após alfabetização sedimentam as imagens negativas sobre o livro e a leitura desse aluno que logo passa a ser mais um não-leitor em formação (KLEIMAN, 1998). O que Kleiman ressalta acima, permite uma profunda reflexão sobre o que se pretende formar e como se pretende, pois é partindo de posturas reflexivas que há inúmeras possibilidades de ampliar um ensino que seja recheado de sentido e que antes de tudo, rompam com imagens negativas/frias que os educandos formam dos livros e pela ação de ler. 1.1. Literatura infantil: arte que inquieta, que desperta De acordo com Abramovich a escola tem uma importante função na formação dos leitores e na forma como a literatura é mediada, ou seja, se esta é imposta ou se é temperada de prazer, e isso é determinante para a fomentação de práticas leitoras que despertam, que inquietam, com isso a autora disserta: Me parece que a preocupação básica seria formar leitores porosos, inquietos, críticos, perspicazes, capazes de receber tudo o que uma boa história traz, ou que saibam por que não usufruíram aquele conto... Literatura é arte, literatura é prazer... que a escola encampe esse lado. É apreciar – e isso inclui criticar... (ABRAMOVICH, 1995, P.148). Pensar em Literatura na escola, cabe salientar, como pressupõe o trecho de Abramovich a importância básica e essencial, que é a formação de leitores. Aprofundando, uma formação de leitores autônomos, críticos, apaixonados, leitores que saibam se posicionar, que saibam analisar, interpretar e que antes de tudo, descubram na leitura o prazer em ser, descobrir e saborear o que uma boa história carrega. Pertinentemente, a escola precisa mediar esse desabrochar, porque é por meio de um ensino libertador que os aprendizes conseguem voar, libertando-se 15 assim de padrões que insistem em tornar o ato de ler em uma “pesada” imposição, fazendo uma literatura infantil; imposta, fria, gelada, sem sabor, destituída de sentidos maravilhosos. As crianças ao experimentarem as obras literárias têm a oportunidade de descobrir um universo infinito de imaginar, criar, partilhar e ressignificar sonhos, descobrindo a si mesmo e o outro. Para isso, a leitura e a escrita precisa ser compreendida como experiência positiva, saborosa e não imposta, não por obrigação, pois a literatura é arte que proporciona experimentos irrefutáveis, no que tange em sua essência marcante de inquietar e permitir a leitura de mundo. A partir desse pressuposto, Sônia Kramer, traz contribuições muito relevantes para a compreensão do processo de ler e de compreender a literatura como ferramenta incentivadora de descoberta e inquietação. O que faz da leitura uma experiência é entrar nessa corrente onde a leitura é partilhada. (...) Defendo a leitura da literatura e de textos que têm dimensão artística, não por erudição, mas porque são textos capazes de inquietar (...) (KRAMER, 2000, p. 28-29). Para se fazer uma literatura que contemple a essência do ler por e com prazer, pra imaginar, pra descobrir novos mundos, pra redefinir, pra ressiginificar; torna-se necessário difundir novos parâmetros de práticas leitoras. Estes, não valorizam o imperativo (leia, faça, releia...), mas se apoiam na descoberta do universo múltiplo, amplo e profundo que as obras literárias carregam. O repensar e refletir não são atrelados a uma resposta pronta, não há imposição, nem pudera ter, porque “ler é voar por caminhos infinitos”, assim define Simone Helen([200-]) sobre o que a leitura é capaz, e parafraseando, ler é liberdade, é prazer, é uma busca gostosa pelo aprender. Então é a forma de se fazer literatura nas salas de aulas que contribui para a formação de leitores apaixonados, ou não, são as imposições que tornam uma leitura prazerosa em uma lei-dura, para tanto, Ezequiel Silva conclui: É esse tipo de leitura o mais prejudicado no ambiente escolar devido às próprias distorções existentes em nosso sistema de ensino. Ao invés do prazer, levantam-se o autoritarismo da obrigação, do tempo predeterminado para a leitura, da ficha de leitura, da interpretação prefixada a ser convergentemente reproduzida (como se isso fosse possível!) pelo aluno- leitor e outros mecanismos que levam ao desgosto pela leitura e à morte paulatina dos leitores (...) (SILVA, 1986) 16 Ao compreender a Literatura como arte, é possível aprofundar e apontar o papel intrínseco que ela realiza nas séries iniciais (quando atrelada à práticas significativas de alfabetização e letramento), porque é através do imaginar, criar, brincar, instigar e sonhar, que a criança se descobre, redescobre, vive, conhece e ainda, torna-se sujeito crítico e ativo diante de uma sociedade desigual. 1.2. Retrato da leitura no Brasil: a literatura infantil e a formação de leitores na escola Com base no estudo Retrato da leitura no Brasil (2016), afirma-se o poder transformador da leitura e sua imensa importância com a formação de cidadãos conscientes, por meio dessas proposições, salienta ainda a compreensão desse universo da leitura, que corresponde aquele que lê, o que não lê, por que lê, como lê, como se tem acesso aos livros. Sendo assim, mapear um retrato da leitura brasileira, torna-se um ato histórico, cultural e social, pois é à medida que se mensura tais questões, que se pode obter profundas reflexões que estejam aptas e respaldadas, para de fato ressignificar a história social e econômica do país. A obra Retrato da leitura no Brasil disserta: O foco ou a lente mudam para essa análise: a leitura autônoma, a leitura arte, a leitura por “gosto” ... Mas todas constroem uma só tese: a de que a leitura é libertadora e promove o protagonismo no acesso ao conhecimento e à cultura. A leitura transforma, informa, emociona e humaniza. Traduz e nos aproxima do que é humano em diferentes tempos, lugares, sentidos, culturas e sentimentos. É a principal ferramenta para a aprendizagem e para a educação de qualidade, e condição essencial para o desenvolvimento social de uma nação. (Retratos da Leitura no Brasil, 2016) Através dessa perspectiva abre-se um leque de significações que tem a pretensão de traduzir uma essência marcante para o poder excepcional da leitura na vida daqueles que tiveram um verdadeiro encontro com a cultura dos livros, com as histórias que inquietam e despertam. Dissertando sobre essas significações, cabe descrever que estas (significações), podem e devem ser desenvolvidas por meio de uma educação de qualidade, quando a escola assume o papel humanizador: aquele que valoriza a cultura, a bagagem de seus alunos, que compreende que a leitura transforma, informa, emociona e possibilita diversas descobertas em si e no outro, sobre si e sobre a sociedade. 17 De acordo com a pesquisa realizada e publicada na obra Retrato da Leitura no Brasil (2016), notou-se que o número de leitores cresceram de 2011 a 2015, exceto na região nordeste, como a quantidade de livros lidos porestudantes e não estudantes, ocorreu também um aumento de nove pontos percentuais no número de pessoas que declararam que gostam de ler. Para tanto, estes índices positivos (pontuados pela pesquisa) estão veiculados ao aumento sem precedentes da escolaridade média da população e a redução da proporção de analfabetos no país, como também cresceu o quantitativo de pessoas com ensino superior, destacando, que o PNLL (Plano Nacional do Livro e da Leitura) contribuiu para o incentivo à formação de leitores no Brasil, pois esse plano envolveu um conjunto de atores do livro, da literatura, da leitura e das bibliotecas com o objetivo de promover projetos que fomentam práticas efetivas de leitura no país. Caracterizar a população brasileira no que tange a sua formação leitora é importante para a consolidação de uma ação pedagógica que viabilize um ensino equalizador que mova-se em direção à transformação, abandonando um ensino tradicional, autoritário, denunciando e se opondo a uma educação bancária (FREIRE,1978). Nesse pressuposto de denúncias, formula-se um conceito que está casado com a ressignificação na forma de se alfabetizar, para tanto, José Mindlin (1997) diz: “Não basta alfabetizar, é preciso ensinar a ler.” Sendo assim, é intrínseco ao ato de alfabetizar a formação de indivíduos que disponham da leitura com prazer, compreendendo além de interpretações explícitas, mas, lendo o que está no “profundo” de um texto literário e apreciando a essência da literatura (informar, instigar, inquietar...). O desafio é conseguir despertar para a leitura uma geração quase entorpecida pela comunicação em meio digital. Ler é uma prática que exige ficar só, que pede concentração, não oferece estímulo multimídia, mas, principalmente, pede o domínio da competência leitora e do letramento. Ler não é tarefa fácil para quem ainda não foi “conquistado” e é impraticável para quem não compreende aquilo que lê. (Retratos da Leitura no Brasil, 2016) Diante do desafio da formação de uma geração leitora, pontua-se o papel da escola para promover esse encontro; entre livro e leitor, mas esse encontro precisa ser dotado de sentido, dotado de prazer e é por isso, que o trecho acima caracteriza o ato de ler como uma tarefa difícil para aqueles que não experimentaram uma troca 18 saborosa em ler um bom texto e para aqueles que não desvendaram os mistérios presentes em um livro. A quem está dada essa tarefa? Ora a escola? Ora a família? Ora as políticas públicas? Aqui será pontuado o papel que é imputado as escolas, aos educadores, em tornar as práticas leitoras, em práticas que possibilite um universo de despertamentos e paixões, para que assim tenham-se leitores que transformem a realidade a sua volta. 1.3. Leitura ou lei-dura? Ao transcrever a fala do professor Joel Rufino dos Santos “Não foi na escola que me apaixonei por livros.” (SANTOS, 1999), aprofunda-se importantes reflexões acerca dos conceitos abordados e desenvolvidos até aqui, com isso é permitido o início de indagações pertinentes que contribuirá para uma ação pedagógica que forme cidadãos que sejam apaixonados por leitura. Um apontamento teórico e significativo com o intuito de esclarecer e proporcionar uma definição clara e flexível (do que é leitura), oportunizando endossar a pesquisa, Paulo Freire comenta: [...] creio que muito de nossa insistência enquanto professoras e professores, em que os estudantes “leiam”, num semestre, um cem número de capítulos de livros, reside na compreensão errônea que às vezes temos do ato de ler [...] (FREIRE, 1984, p.18) O trecho acima demonstra que há uma compreensão errônea sobre o ato de ler por parte dos professores e professoras, então, torna-se urgente a ressignificação de uma prática engessada que valoriza a leitura “quantitativa” (muitas páginas) ao invés de valorizar o prazer e a liberdade do ato de ler. Para fomentar as assertivas, o autor Ezequiel Silva, aponta: O problema da leitura no contexto brasileiro deve ser colocado, figurativamente falando, em termos de uma lei-dura, isto é, em termos de um conjunto de restrições agudas que impede a fruição da leitura, do livro, por milhões de leitores em potencial. É essa mesma “lei-dura” que vem colocar a leitura numa situação de crise, num reflexo de crises maiores presentes em nossa sociedade [...]. (SILVA, 1997, p. 39) 19 Conceituar o que o autor caracteriza como “lei-dura” requer analisar diversos aspectos que influenciam negativamente a formação de leitores que teriam/têm potencial de se tornarem indivíduos amantes pelos textos, pela arte escrita. Mesmo que pareça redundante, porém de grande estima, ressalta que a pesquisa não apresenta pretensão de julgar professores, mas, tem como bandeira despertar aqueles (os professores) que são capazes de mediar um ensino com ideários que valorizem o pensamento crítico e o prazer em ler. De antemão, é preciso ressalvar o quão necessário é, que os próprios educadores sejam amantes da leitura e é partindo desses pressupostos que teremos alunos conscientes e apaixonados. Elucidando o viés que Silva aponta sobre o reflexo das crises presentes na sociedade, vemos o poder negativo que os problemas sociais, econômicos e culturais têm para restringir um indivíduo de se “encontrar” em um livro literário. Para isso, Ezequiel complementa: [...] Numa sociedade onde estão presentes a injustiça, a desigualdade, a miséria, a fome e a falta de liberdade e democracia (aqui caracterizados como elementos dessa lei-dura), torna-se muito fácil encontrar pessoas que não tem acesso à informação, aos diversos referenciais escritos em diversos tipos de livros [...] (SILVA, 1997, p. 39) O termo “lei-dura” requer uma leitura profunda e que deve ser compreendido partindo da análise da bagagem que cada indivíduo possui, das desigualdades sociais e das práticas alienadas e massificadoras do ensino. A ótica de compreensão e diferenciação de uma “lei-dura” para uma leitura prazerosa, ocorrerá com um poder excepcional quando for praticada/refletida por meio de metodologias que apreciem e visem pilares de descoberta, instigação, inquietação e imaginação, portanto, métodos que vão contra a um ensino arbitrário, contra a uma leitura didaticamente imperativa, ou seja, aquela que é realizada por meio do “LEIA”, do tempo cronometrado, do livro desconectado (aquele que não se conecta com o seu usuário, por não fazer sentido). Uma proposta de leitura prazerosa é aquela que assume um caráter múltiplo da aprendizagem, ou seja, aquela que possibilita que as diversas formas de aprender, de ser, de experimentar tenham impacto nas salas de aula e através dessa diversidade será possível constituir em um mix de impressões, sensações que o texto literário tem, para então poder provocar grandes descobertas, com isso, os 20 indivíduos terão a possibilidade de reinventar, recriar, brincar e ressignificar histórias. Desta maneira, a BNCC complementa: Essa consideração dos novos e multiletramentos; e das práticas da cultura digital no currículo não contribui somente para que uma participação mais efetiva e crítica nas práticas contemporâneas de linguagem por parte dos estudantes possa ter lugar, mas permite também que se possa ter em mente mais do que um “usuário da língua/das linguagens”, na direção do que alguns autores vão denominar de designer: alguém que toma algo que já existe (inclusive textos escritos), mescla, remixa, transforma, redistribui, produzindo novos sentidos, processo que alguns autores associam à criatividade. Parte do sentido de criatividade em circulação nos dias atuais (“economias criativas”, “cidades criativas” etc.) tem algum tipo de relação com esses fenômenos de reciclagem, mistura, apropriação e redistribuição. (BNCC, 2018) Ao abordar o questionamento: leitura ou “lei-dura” percebe-se a abertura de um leque de definiçõese questões que culmina em ações pedagógicas, em reflexões sobre cultura, sobre sociedade. Apontar paradigmas inovadores na forma de se ver e pensar o ato de ler, viabiliza que o texto literário assuma a centralidade das práticas de alfabetização e letramento, e atualmente de forma mais ampla – compreender o multiletramento, oportunizando assim, a produção de novos sentidos. A BNCC discorre: Tal proposta assume a centralidade do texto como unidade de trabalho e as perspectivas enunciativo-discursivas na abordagem, de forma a sempre relacionar os textos a seus contextos de produção e o desenvolvimento de habilidades ao uso significativo da linguagem em atividades de leitura, escuta e produção de textos em várias mídias e semioses. (BNCC, 2018) Com base no pressuposto sobre leitura, a BNCC destaca que a ação ler é constituída por meio de uma interação ativa e com diversidade de textos, formulando assim, uma compreensão ampla, dinâmica que caracteriza um ensino alfabetizador autêntico e significativo para as séries iniciais. Para tanto, este documento disserta: O Eixo Leitura compreende as práticas de linguagem que decorrem da interação ativa do leitor/ouvinte/espectador com os textos escritos, orais e multissemióticos e de sua interpretação, sendo exemplos as leituras para: fruição estética de textos e obras literárias; pesquisa e embasamento de trabalhos escolares e acadêmicos; realização de procedimentos; conhecimento, discussão e debate sobre temas sociais relevantes; sustentar a reivindicação de algo no contexto de atuação da vida pública; ter 21 mais conhecimento que permita o desenvolvimento de projetos pessoais, dentre outras possibilidades. (BNCC, 2018) Redefinir conceitos é a tarefa de uma educação atual que permite que a flexibilidade, a revolução e a inovação faça parte das ações pedagógicas em sala de aula. As concepções de leitura e escrita se complementam e devem reassumir métodos ativos e dinâmicos em que a ludicidade exerça uma papel preponderante nas ações dos professores, porque a leitura tem o potencial de agregar paradigmas e recriar novas perspectivas de ser e viver. 22 2. DISCUSSÕES ACERCA DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO De acordo com Magda Soares, alfabetizar constitui no processo de ensinar a ler e escrever e letrar requer habilidades para a utilização da língua escrita de modo a se comunicar “socialmente”, ou seja, fazer o uso social da leitura e da escrita (SOARES, 2007). Ambos (letrar e alfabetizar) não são dissociados, contudo, Soares disserta: [...] no Brasil a discussão do letramento surge sempre enraizada no conceito de alfabetização, o que tem levado, apesar da diferenciação sempre proposta na produção acadêmica, a uma inadequada e inconveniente fusão dos dois processos, com prevalência do conceito de letramento, [...] o que tem conduzido a um certo apagamento da alfabetização que, talvez com algum exagero, denomino desinvenção da alfabetização [...]. (SOARES, 2003, p.8) O equívoco denunciado por meio das proposições de Magda, impõe a reflexão sobre os conceitos de alfabetização e letramento. Ao refleti-los será permitido compreender como alfabetizar e letrar se conectam e como os dois, têm poder de tornar o processo de aprendizagem enriquecedor, significativo. E, apesar de denominar como exagero, o que a autora chamou de desinvenção da alfabetização, é por meio do então “exagero” que se pode almejar a ressiginificação do conceito de alfabetização e ao invés de buscar o distanciamento das práticas de letrar e alfabetizar, que esses dois se casem, para que aconteça ações que efetivem um ensino de leitura e escrita de qualidade. Cada qual com sua definição e diferenciação, porém não separados, mas relacionando-se. Para afunilar as significações que envolve a conceituação de alfabetizar e letrar, cabe, trazer a seguinte assertiva de Freire (1996) “[...] percebe-se, assim, a importância do papel do educador, o mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo.” Através disso, a compreensão do papel do professor diante ao desenvolvimento de práticas alfabetizadores é enriquecedor para que haja um alinhamento de como atuar em prol de um ensino que seja libertador. E com o intuito de fomentar ainda mais, Tfouni discorre dizendo que “Enquanto a alfabetização se ocupa da aquisição da escrita por um indivíduo, ou grupo de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição 23 de um sistema escrito por uma sociedade.” (TFOUNI, 1995 apud MORAES, 2005, p.4) De forma sucinta, a alfabetização finda-se no processo de aquisição dos signos e códigos do alfabeto escrito, é “desvendar” a junção dos fonemas e o letramento consiste em colocar em “prática” ferramentas de leitura e escrita de maneira a se comunicar socialmente, nesses dois processos (de alfabetizar e letrar) não há reservas, não há grau de demérito, nem pudera ter, pois os dois se complementam a medida em que acontece, a medida em que são atrelados a ações que valorizam o conhecimento prévio dos educandos, a medida em que há comprometimento com uma educação libertadora. E segundo Freire “[...] a educação problematizadora, de caráter autenticamente reflexivo, implica um constante ato de desvelamento da realidade [...]” (FREIRE, 1997, p. 97) Ao elucidar esse caráter de autenticidade explicitado por Paulo, conclui-se como um ensino libertador pode contribuir para a formação de educandos que tenham posicionamentos com autonomia e criticidade diante a sociedade, partindo da análise crítica e construtiva acerca das desigualdades, sendo capaz de refletir, indagar, pesquisar e mudar suas histórias. Discutir os problemas que tangem a educação brasileira é necessário e partindo do pressuposto que educação não é neutra, logo alfabetizar também não é, abre-se então, um leque de questões que interferem direta e indiretamente no processo de alfabetização e letramento. Existem diversos empecilhos que ocasionam no fracasso escolar, mas de certa forma, questionar uma prática pedagógica ultrapassada é um dos meios de trazer luz para o problema de leitura e escrita que as séries iniciais vêm carregando. Nessa perspectiva, Regina Leite Garcia, salienta que: Discutir alfabetização é discutir o projeto político que se pretende para este país, não apenas pelas consequências sociais do analfabetismo, mas também porque o modo como se direciona a prática pedagógica traz uma determinada concepção de mundo e de homem. (GARCIA, 1998, p.25). Os apontamentos que causam a desaceleração do aprender a ler e a escrever são diversos, não cabendo neste presente trabalho julgar o professor, nem muito menos martirizá-lo como o principal responsável pelo insucesso no alfabetizar 24 e letrar, mas, a grande ausência de ações pedagógicas inovadoras tem ainda, invadido a forma de mediar esse processo, que deveria ser dotado de sentido, diálogo, prazer e é por isso que a literatura infantil atrelada a uma prática inovadora, tem papel fundamental para formar indivíduos que sejam capazes de fazer o uso social de leitura e escrita. É evidente que responder aos questionamentos sobre alfabetizar é complexo, mas, nem se quer refleti-los é negação da possibilidade de uma educação que desmascare a educação bancária, ensino definido por Freire, que tem por um dos objetivos instigar o educador a repensar sua forma de mediar o conhecimento, demonstrando que os educandos não são tábuas vazias ou depósitos que devem ser cheios de “saberes” sistematizados, prontos, acabados. A alfabetização é uma mola propulsora de transformação, portanto, a educação transforma homens, homens transformam uma sociedade. Logo, o que refuta a questão em ênfaseé que o alfabetizar e letrar em toda sua essência transformadora seja capaz de solucionar, libertar os oprimidos, para que cada indivíduo torne-se cultivador de sua história com perspectivas novas, que façam parte da luta de libertar os oprimidos e construir um mundo mais justo. Assim, aponta Freire: Só assim a alfabetização cobra sentido. É a consequência de uma reflexão que o homem começa a fazer sobre sua própria capacidade de refletir. Sobre sua posição no mundo. Sobre o mundo mesmo. Sobre seu trabalho. Sobre seu poder de transformar o mundo. Sobre o encontro das consciências. Reflexão sobre sua própria alfabetização, que deixa assim de ser algo externo ao homem, para ser dele mesmo. Para sair de dentro de si em relação com o mundo, como uma criação. Só assim nos parece válido o processo o trabalho de alfabetização, em que a palavra seja compreendida pelo homem na sua justa significação: como uma força de transformação do mundo. Só assim a alfabetização tem sentido. (FREIRE, 1989, p.142) Diante da complexidade dos processos de aprendizagem e do cenário educacional, cabe um questionamento: como romper com uma educação bancária? Denunciar a perspectiva bancária é antes de tudo, adotar atitudes conscientes sobre alfabetizar e letrar, porque é através de uma alfabetização com sentido, pautada na relação homem-mundo que se finda o objetivo de incutir o senso crítico em cada educando, para que assim, os sujeitos tenham voz, criticidade e autonomia, para 25 que então, sejam capazes de denunciar e se posicionar contra uma sociedade corrupta e desigual. 2.1. Alfabetização e letramento: um breve panorama histórico Descrever o cenário histórico acerca do alfabetizar e letrar é importante à medida que possibilita discussões pertinentes a este processo, oportunizando o apontamento de estratégias que visam uma educação transformadora, para que assim construa-se um olhar mais dinâmico sobre as perspectivas da alfabetização e letramento. Por volta do século XVI com ideais iluministas a educação era vista como meio de transformação do homem, propagando o ideário de que cada indivíduo tinha o controle de seu próprio destino. No entanto, o acesso à cultura letrada era restrito, pois devia ser efetuado o pagamento para a ministração das aulas, ou seja, a acessibilidade era direcionada a classe nobre e quem atuava como mestre do ensino eram os padres. Diante desse cenário, a igreja dominava a produção cultural, tornando o acesso as obras restrito, esse panorama permaneceu até o fim do século XVIII, culminando na Revolução Francesa, com isso, José Juvêncio traz importantes apontamentos sobre o período: Sonhada no século XVIII, a generalização da alfabetização abre uma nova era na história da humanidade. As sociedades ocidentais iniciam, então, um período caracterizado pela revolução permanente que ressoa no plano político, econômico, social e cultural. Época marcada pela emergência das nações democráticas; pelo avanço da industrialização; pelo crescimento das cidades e erupção do individualismo; pela supremacia da cultura visual. E, no centro desse labirinto, a origem da concepção de alfabetização que herdamos. (BARBOSA, 1994, p.15) Sendo assim, com a Revolução Francesa é instaurado conceitos de uma república democrática e a escola como local de acesso aos livros, rompendo, a princípio, com a projeção de ensino individual, resultando numa adoção nova sobre a perspectiva de escolarização, logo, a escola é o espaço que promove o processo de ensino-aprendizagem. Com essas transformações, as preocupações com a aprendizagem (especificamente em aprender a ler e escrever) surgiram, pois o domínio da leitura e escrita estava fortemente ligado a um paradigma de exercer um cargo, ou seja, 26 emanava ‘poder’, quem era letrado possuía mais condições para desempenhar ‘sua’ dominação sobre aqueles que pouco ou nada sabiam. A história dos conceitos sobre alfabetizar esteve em constante mudanças, porque foi conectada aos diversos contextos sociais, econômicos e políticos, eclodindo assim, em diversas concepções e movimentos. No Brasil, o conceito de alfabetização está vinculada à catequese, à conversão dos indígenas e o ensino era ministrado pelos jesuítas, portanto, o ato educativo era de cunho religioso. As transformações ao longo do tempo revelam as lutas pelo acesso ao ensino, à cultura letrada, e é por meio desses embates, por meio de reflexões sobre o passo, que acontece uma prática educativa que seja capaz de adotar posturas que não exclua, mas que torne a aprendizagem significativa, valorizando a bagagem de vida de cada indivíduo. O século XIX foi marcado fortemente pela grande acentuação das desigualdades sociais e a separação da educação para elite e para o povo, acarretando em um total descaso com a educação pública. Maciel, traz os seguintes apontamentos: No decorrer de todo o século XIX e nas primeiras décadas do século XX, o termo mais comum para designar o ensino das primeiras letras, como também todo o processo de escolarização, era instrução. [...] A instrução atende aos princípios da instrução primária, proposta no século XIX, visto que o verbete não significa nem discrimina quais os conhecimentos e a habilidades a serem adquiridas pelos alunos, inferindo portanto, que na concepção de instrução estava implícita a alfabetização como uma das habilidades a serem adquiridas (MACIEL, 2008, p.243) Dos ideias humanistas, da Reforma Protestante à concepção de Alfabetização como Liberdade, que embasa a década das Nações Unidas para a Alfabetização, da Unesco (2003-2012), cabe pontuar que ocorreram mudanças significativas no conceito e nas concepções das práticas alfabetizadoras, trazendo efeitos pertinentes nas complexas relações entre educação e sociedade. Dentre as inúmeras concepções de alfabetização, destaca-se os conceitos freirianos: [...] seria impossível engajar-me num trabalho de memorização mecânica dos ba-bebi-bo-bu, dos la-le-li-lo-lu. Daí que também não pudesse reduzir a alfabetização ao ensino puro da palavra, das sílabas ou das letras. Ensino em cujo processo o alfabetizador fosse “enchendo” com suas palavras as cabeças supostamente “vazias” dos alfabetizados. Pelo contrário, enquanto ato de conhecimento e ato criador, o processo da alfabetização tem, no alfabetizando, o seu sujeito. O fato de ele necessitar da ajuda do educador, como ocorre em qualquer relação pedagógica, não significa dever a ajuda 27 do educador anular a sua criatividade e a sua responsabilidade na construção de sua linguagem escrita e na leitura desta linguagem. Na verdade, tanto o alfabetizador quanto o alfabetizando, ao pegarem, por exemplo, um objeto, como laço agora com o que tenho entre os dedos, sentem o objeto, percebem o objeto sentido e são capazes de expressar verbalmente o objeto sentido e percebido. [...] A alfabetização é a criação ou a montagem da expressão escrita da expressão oral. Esta montagem não pode ser feita pelo educador para ou sobre o alfabetizando. Aí tem ele um momento de sua tarefa criadora. (FREIRE, 1979, p. 13) O paradigma de uma educação contextualizada se finda quando o educador assume uma postura de mediar o processo de aprendizagem, valorizando e oportunizando a construção, a criatividade, a autonomia, por isso, torna-se essencial compreender que os indivíduos são seres capazes de criar e ressignificar sua própria história. Para tanto, Freire ainda discorre sobre o ato de alfabetizar A alfabetização não pode se fazer de cima para baixo, nem de fora para dentro, como uma doação ou uma exposição, mas de dentro para fora pelo próprio analfabeto, somente ajustado pelo educador. Esta é a razão pela qual procuramos um método que fosse capaz de fazer instrumento também do educando e não só do educador. (FREIRE, 1979, p.72) Nessas percepções a alfabetização é vista como um processointeiramente conectado ao educando e não distante dele, por isso, alfabetizar requer conhecer seus alunos, suas histórias, porque estes, não são vazios, mas tem uma importante bagagem de cultura e história. E é através dessas bagagens que fazem a leitura do mundo, colocando suas impressões, atribuindo sentido para aquilo que se aprende. Relata-se que o termo letramento apareceu pela primeira vez no livro “No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística” de Mary Kato, em 1986. Mas, outras autoras como Ângela Kleiman e Leda Tifouni, também discorreram sobre significações acerca do letramento. O conceito de letramento, segundo Soares (2004) surge da necessidade de novas práticas pedagógicas, por isso a autora aponta: O surgimento do termo literacy (cujo significado é o mesmo de alfabetismo), nessa época, representou, certamente, uma mudança histórica nas práticas sociais: novas demandas sociais pelo uso da leitura e da escrita exigiram uma nova palavra para designá-las. Ou seja: uma nova realidade social trouxe a necessidade de uma nova palavra (SOARES, 2004, p. 29) É por meio dessa nova demanda de como se apropriar da leitura e da escrita como prática social que finda-se o conceito de letramento. 28 Essa palavra tem origem inglesa – literacy, que significa o estado de introjeção do ato de ler e escrever, ou seja, está relacionado a apropriação da leitura e escrita de modo a ser capaz de usá-la socialmente. Tfouni também traz proposições acerca do surgimento do letramento, então a autora pontua que “A necessidade de se começar a falar em letramento surgiu, creio eu, da tomada de consciência que se deu, principalmente entre os linguistas, de que havia alguma coisa além da alfabetização, que era mais ampla, e até determinante desta (2010, p. 32)”. Em pauta, a conceituação de letramento se engaja na perspectiva de ampliação de alfabetismo, pois, letrar está intrinsecamente ligado ao resultado daquilo que se apreendeu sobre ler e escrever e mais, fazendo seu uso (de leitura e escrita) com um propósito, o de se comunicar para e com o meio social. Uma vez que o letramento é conceituado de modo mais amplo, fica claro que os processos de alfabetizar e letrar constituem uma tarefa que não condiz com práticas descontextualizadas, porque é por meio de um ensino prazeroso que a alfabetização e letramento faz sentido. Soares (2001) discorre sobre a importância do indivíduo se apropriar do sistema de leitura e escrita e saber utilizá-lo, atribuindo que o sujeito letrado assume um outro estado, uma outra condição, porque através dessa apropriação, ele corresponde às demandas sociais de leitura e escrita. Nesse sentido, as assertivas que demonstram e conceituam os termos alfabetização e letramento tem por objeção traçar os marcos históricos, assim como oportunizar reflexões importantes para uma compreensão mais ampla e significativa sobre o processo de aprender a ler, a escrever e a fazer o uso desse sistema socialmente. 2.2. Literatura infantil e o processo de alfabetização e letramento A utilização de métodos que apresentam um viés lúdico, com imaginação e indagação é uma forma significativa para ser desenvolvida nas séries iniciais. Muitos alunos ficam desmotivados com um ensino tradicional em que ele não pode se quer verbalizar seus sentimentos, dúvidas, pensamentos, o que acarreta em uma troca sem prazer. 29 E as numerosas cópias? E leituras desembutidas de sentido como: “Eva viu a uva.” “A babá é bia.” “Bia é a babá do bebê.” Interpretações que servem de ferramenta para destacar respostas prontas que o texto já apresentou. É por isso, que a literatura pode exercer papel muito importante para despertar o desejo de aprender, mas é necessário repensar o planejamento para que os textos literários não venham descumprir o seu poder instigador e propulsor de despertar e inquietar. [...] a sala de aula é um espaço privilegiado para o desenvolvimento do gosto pela leitura, assim como um campo importante para o intercâmbio da cultura literária, não podendo ser ignorada, muito menos desmentida sua utilidade. Por isso, o educador deve adotar uma postura criativa que estimule o desenvolvimento integral da criança. (ZILBERMAN, 2003, p.16) Compreender a literatura como uma ferramenta eficaz para uma aprendizagem significativa de leitura e escrita é sem dúvidas perceber que cada indivíduo traz sua bagagem de vida, logo, seu histórico literário, seja ele popular ou de erudição, oral ou escrito, com pouca ou vasta vivência de livros... Cada ser tem sua história, cada ser lê o mundo a sua volta e é a prática que ensina e o somatório dessas coisas com o desejo de aprender, conquista-se um resultado infinito de novas descobertas e aprendizados, sendo assim, Freire conclui: Não podemos duvidar de que nossa prática nos ensina. (...) Desde muito pequenos aprendemos a entender o mundo que nos rodeia. Por isso, antes mesmo de aprender a ler e a escrever palavras e frases, já estamos “lendo”, bem ou mal, o mundo que nos cerca. Mas este conhecimento que ganhamos de nossa prática não basta. Precisamos ir além dele. Precisamos conhecer melhor as coisas que já conhecemos e conhecer outras que ainda não conhecemos. (FREIRE, 1921 -1997, P.71) O processo de ensinar a ler e escrever acarreta diversos resultados, satisfatórios ou não, os insucessos podem se findar num dado momento em que a real essência dos textos literários infantis (se perdem) e são aplicados de forma fria e destoada de sentido, para tanto, enquanto educador cabe buscar metodologias que contemple a realidade dos educandos e possibilite uma aprendizagem significativa. Com isso, Raquel Villardi salienta que [...] a prática pedagógica com o livro infanto-juvenil, no primeiro segmento, distancia a criança do livro, na medida em que põe o aluno frente ao tema, e não frente ao texto, trabalha a partir do livro e não o livro. Se o aluno passa a associar o texto a algo que vem depois, se para ele o livro é apenas um 30 elemento que detona outro trabalho, e este sim, é o importante, então todo o processo de valorização do livro e da leitura se perde, impedindo que a criança, compreenda que o prazer pode (e deve) estar no simples ato de ler, descobrindo uma variedade de sentidos no que leu. (1999, p. 22) Em consonância com o cenário descrito por Villardi, vale ressaltar a importância de redimensionar como se “faz literatura”, como se ensina a ler, como trabalhamos o livro e entre tantas “mil maneiras” – metodologias que se possa aplicar, é de destaque, que os educadores por diversas vezes acaba tornando o momento da leitura, atrelado a explicações gramaticais, esquecendo-se assim, da essência gostosa de saborear um texto, pelo simples e prazeroso fato de ler; o que acarreta em uma formação rasa com cidadãos distantes da leitura, distantes do universo singular, profundo, múltiplo, mágico, que só aqueles que embarcam nesse mix de emoções traduzidas por bons textos literários, é capaz de sentir, viver, experimentar. É por isso que promover uma aferição sobre uma ferramenta de qualidade para um alfabetizar e letrar eficaz, requer questionamentos, indagações, pesquisa e estudo, porque não é simplesmente trazer apontamentos positivos ou negativos, é repensar toda forma de ser educador e de fazer educação. Em complemento das assertivas, Freire (1997) destaca “que o pensar do educando somente ganha autenticidade na autenticidade do pensar dos educandos”. Sendo assim, as ações pedagógicas devem ser pautadas pelo diálogo, pela intercomunicação, em que esta, contribui para que haja liberdade no processo de alfabetização e letramento. 2.3. Qual a importância dos docentes para formação de leitores apaixonados? Segundo Infante (1998, p.46) “a leitura é o meio de que dispomos para adquirir informações e desenvolver reflexões críticas sobre arealidade”. É pertinente formular mais conceitos sobre leitura, porque é partindo desses pressupostos que haverá possibilidade de conter apontamentos para o que tange a indagação “qual a importância dos docentes para a formação de leitores apaixonados”? Para a compreensão acerca do papel dos docentes com a formação de leitores, requer refletir sobre o espaço de atuação dos professores (a escola), assim como os atores desse processo (alunos), para tanto, Lerner afirma: 31 O necessário é fazer da escola uma comunidade de leitores que recorrem aos textos buscando respostas para os problemas que necessitam resolver, tratando de encontrar informação para compreender melhor algum aspecto do mundo que é objeto de suas preocupações [...] (2002, p.17). O trecho acima pressupõe que a escola seja recheada de leitores conscientes, que saibam se posicionar, que saibam investigar, sendo capaz de propor soluções, em que façam do texto lido, interpretado um meio de propagação de ideias e informações. É o leitor autônomo! E partindo desse conceito de tornar a escola um lugar com intensos leitores, cabe salientar, que esse espaço precisa ser ultra propagador de ações pedagógicas que sejam encantadoras, mágicas, utilizando-se de todo poder que o livro tem em encantar as crianças, ou seja, viabilizar práticas leitoras que instigam e que despertam seus aprendizes. (PRADO, 2003) Pontuar a importância dos docentes no processo de formação do leitor é tão importante quanto à reflexão acerca de que leitor se pretende formar, por isso, a união de teoria e prática, pesquisa e estudo são tão imprescindíveis para a fomentação de questionamentos que embasam as práticas leitoras, contudo, Freire apresenta que “a práxis, é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-oprimido. [...]” (FREIRE, 1997, p. 52) As proposições sobre formar leitores e o papel dos educadores na mediação desse processo, incide na perspectiva freiriana de que a educação tem como alvo ações pedagógicas libertadoras, mediadas com diálogo, questionamentos, discussões, para que assim haja a libertação dos oprimidos. Ainda sobre essas implicações, Freire destaca Daí a necessidade que se impõe de superar a situação opressora. Isto implica o reconhecimento crítico, a “razão” dessa situação, para que, através de uma ação transformadora que incida sobre ela, se instaure uma outra, que possibilite aquela busca do ser mais. (FREIRE, 1997, p. 46) A formação de leitores precisa ser vista diante da ótica da transformação, aquela que busca a formação de leitores autônomos, e é por meio da mediação do educador que a criança pode assumir posturas coerentes, conscientes, é através de 32 ações pertinentes a uma educação problematizadora que possibilita a busca do ser mais, para que cada indivíduo seja capaz de lutar pela transformação da sua realidade, valorizar sua cultura, entender as desigualdades, se posicionar e movimentar-se em direção contrária à alienação. Quando se trata de formar leitores não há como negar o quão importante é o papel do professor no desenvolvimento de habilidades leitoras, porém, não cabe apenas ao corpo docente o incentivo à prática por leitura, assim analisa Silva É preciso que haja “modelos de leitura” no lar (visto aqui como instancia primeira ou microssistema de socialização) para que a criança possa perceber e assimilar o valor e a função do ato de ler e, movida por mecanismos como a observação, curiosidade, identificação, etc., passe a executar esse ato em sua vida. (SILVA, 1983, p.88) A assertiva acima se complementa com o artigo 205 da constituição de 88, que menciona a educação como direito de todos e delega a responsabilidade do ato educativo à família e ao Estado, devendo ser promovida e incentivada pela sociedade. Sendo assim, os apontamentos de Silva sobre “modelos de leitura” no lar nos leva a confirmar que a formação de leitores não está exclusivamente ligada ao âmbito escolar, mas, cabe pontuar que o educador tem grande relevância no processo de se fazer ponte, possibilitando acessar um portal de descobertas. Convém pontuar como as questões sociais, econômicas são cruciais para que a alienação e o desprazer em ler se multiplique. É por isso, que segundo Silva O professor guia o aluno através do mundo do saber elaborado, sistematizado historicamente e sempre aberto à recriação e novas contribuições. O aluno guia o professor através de necessidades e desafios revelados no contexto da sala de aula. (SILVA, 2004, p.89) E embasado nessas contribuições e caracterização do educador como ponte, como aquele que guia, media, possibilita o entendimento mais amplo da função do docente para com seus alunos, o que deve ser colocado em pauta, é a enorme urgência de que cada professor desapegue e se desfaça de métodos destoados de sentidos e passem a ser colaboradores para a construção de leitores amantes de uma boa história. 33 Geraldi discorre sobre leitura e leitor, portanto Ao ler, o leitor trabalha produzindo significações e é nesse trabalho que ele se constrói como leitor. Suas leituras prévias, sua história de leitor, estão presentes como condição de seu trabalho de leitura e esse trabalho o constitui leitor e assim sucessivamente. (GERALDI, 1988, p.80) A produção de significados está relacionado ao processo de desvendar, de se encantar com o texto e é por meio de práticas leitoras, encontros e desencontros com o livro que vai agregando sentido à vida do indivíduo leitor, sendo assim, configura-se uma troca de quem lê com aquilo que se lê. É através da troca que ocorre uma relação singular, enérgica, ora pacífica, ora voraz... A qualificação não pudera ter um objeção, porque parte da experiência individual e particular daquele que se predispõe a penetrar numa boa história e é por isso, que a construção do leitor acontece com todas as marcas impressas e autenticadas dos livros na alma de seus leitores. Numa escala numérica, seria ousado mensurar o quão é importante o papel do educador para a formação de leitores apaixonados, mas, cabe salientar em palavras o quanto é indispensável, essencial e fundamental a atuação de educadores que sejam comprometidos com o processo de alfabetização e letramento, logo, com o desenvolvimento de crianças apaixonadas pela literatura, pela ação mágica de ler e escrever, para assim, poder se apropriar desse sistema (de leitura e escrita) com autonomia, criatividade e criticidade, contribuindo para uma sociedade mais “humana”, mais tolerante, mais amorosa e por fim, mais justa e igual. 34 3. PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO Discorrer sobre as práticas pedagógicas torna-se essencial, porque é através da compreensão do universo múltiplo e desafiador (a sala de aula) e da atuação do profissional alfabetizador, é que torna possível adotar ações que visam uma aprendizagem enriquecedora. Sendo assim delinear o papel do educador nesse processo se faz relevante, uma vez que esse agente é mediador do processo de conhecimento, por isso, segundo Wechsler (2001,2002, p. 169-170, apud, OLIVEIRA e ALENCAR 2008, p.297) [...] um professor criativo é aquele que está aberto a novas experiências e, assim sendo, é ousado, curioso, tem confiança em si próprio, além de ser apaixonado pelo que faz. Trabalha com idealismo e prazer, adotando uma postura de facilitador e quebrando paradigmas da educação tradicional. (OLIVEIRA E ALENCAR, 2008 p.297) O trecho acima define o que é um professor criativo e como sua postura tem potencial de romper com uma aprendizagem autoritária. De acordo com essa perspectiva destaca-se que as práticas de alfabetização e letramento deve antes de tudo, ser contrária ao ensino tradicional bancário. O panorama bancário vê seus alunoscomo depósitos vazios e essa visão defrauda à libertação, destoa à aprendizagem, porque não baseia a educação no diálogo, na troca, na criatividade, mas anula as experiências de vida de casa sujeito. Para fomentar as discussões acerca das práticas de alfabetização e letramento, Edgar Morin traz apontamentos significativos para a promoção de um ensino que rompa com a ‘grande necessidade de quantidade’, por isso, ressalta “é necessário dizer que não é a quantidade de informações, nem a sofisticação em Matemática que podem dar sozinhas um conhecimento pertinente, é mais a capacidade de colocar o conhecimento no contexto.” (MORIN,1999) Propor reflexões acerca de como se ensina, não torna-se apenas importante, mas é necessário para a retomada de posturas e estas, precisam assumir caráter inovador para a incorporação de uma aprendizagem significativa. Por isso, é tão coerente buscar posturas pedagógicas que estejam pautadas na ludicidade, para que o aprender seja recheado de prazer. Tânia Fortuna (2000) 35 traz uma interessante discussão sobre o lúdico no processo de ensino- aprendizagem, então a autora aponta: Convencê-los da importância para a aprendizagem, no entanto, não é simples. Muitos educadores buscam sua identidade na oposição entre brincar e estudar: os educadores de crianças pequenas, recusando-se a admitir sua responsabilidade pedagógica, promovem o brincar; os educadores das demais séries de ensino promovem o estudar. Outros tantos, tentando ultrapassar essa dicotomia, acabam por reforçá-la, pois, com frequência, a relação jogo-aprendizagem invocada privilegia a influência do ensino dirigido sobre o jogo, descaracterizando-o ao sufocá-lo. (FORTUNA, 200, p. 2) A dicotomia entre brincar e estudar precisa ser rompida, porque a brincadeira faz parte do universo infantil, o que pressupõe que a utilização de métodos que proporciona o encontro dessas experiências (aprender brincando), tem resultado de despertar o desejo pelo conhecimento. A alfabetização e letramento se complementam, se encontram, se casam, não por apresentar conceitos idênticos, mas por oportunizar uma aprendizagem mais completa e ampla. Cabe salientar que fundamental é unir esse processo à brincadeira, por isso, Kishimoto (2006) aponta: O renascimento vê a brincadeira como conduta livre que favorece o desenvolvimento da inteligência e facilita o estuda. Ao atender as necessidades infantis, o jogo infantil torna-se forma adequada para a aprendizagem dos conteúdos escolares. (KISHIMOTO, 2006, p.28) Elencar as formas de se promover o ensino é de grande relevância, pois são as ações pedagógicas que tem o potencial de tornar o processo de aprender a ler e escrever mais conciso e eficiente. As reflexões acerca das práticas alfabetizadoras e de letramento devem ser pautadas na contextualização e não no ensino fragmentado, por isso, Edgar Morin aponta: [...] O ensino por disciplina, fragmentado e dividido, impede a capacidade natural que o espírito tem de contextualizar, é essa capacidade que deve ser estimulada e deve ser desenvolvida pelo ensino de ligar as partes ao todo e o todo às partes. [...] E, hoje, que o planeta já está ao mesmo tempo unido e fragmentado começa a se desenvolver um ética do gênero humano para que possamos superar esse estado de caos e iniciar, talvez, a civilizar a terra. (MORIN, 1999) É imprescindível que para uma prática alfabetizadora contextualizada, tenha- se criatividade e busca incessante pela formação do indivíduo autônomo, pois um 36 ensino fragmentado, infelizmente, só contribui para que sejam multiplicadas as desigualdades sociais e a alienação. Em outras palavras, Morin provoca um despertamento, sobre a importância de uma educação problematizadora, para que seja explorado a conscientização acerca dos problemas da sociedade, e todavia, isso é de fato, muito mais do que conveniente, mas é necessário e urgente! (Morin, 1999) Ao compreender a necessidade de buscar estratégias de ensino é com certeza, um caminho sistemático de não deixar que “os livros morram”, que o conhecimento “se anule”, que o universo mágico da descoberta do ler e escrever não entre em extinção, e mais, a luta para promover a ascensão da educação, é dever de todo aquele educador que seja apaixonado pela sua prática. Falar em práticas de alfabetização e letramento é necessário pontuar que a mediação do educador é importante, mas ele não pode jamais tornar o ensino da língua restrito somente a codificar e decodificar letras, sílabas e fonemas... Requer muito mais! É nesse sentido que o educar irá cobrar mais e além, porque são práticas embutidas de imaginação, ludicidade, criticidade que será capaz de contribuir para a formação de cidadãos conscientes. Soares aponta que A criança deve aprender a ler e a escrever interagindo com textos reais, com os diversos gêneros e portadores de textos que circulam na sociedade. Assim, ela vai aprender não só as relações fonema/grafema, mas, simultaneamente, o sentindo e as funções que te a escrita. (SOARES, 2001, p. 5) A interação com textos reais oportuniza o encontro com o mundo diverso e encantador que é o universo da leitura, desta maneira, pressupõe que as experiências com o aprender a ler e a escrever precisa ter esse diálogo, essa troca com a literatura, pois a partir dessa sincronização é que se finda um processo enriquecedor de aprendizagem. A postura do educador em sala de aula e as propostas utilizadas para alfabetizar e letrar tem potencial incrível para a consolidação da leitura e da escrita, uma vez que adotada metodologias que valorizam o aluno, a brincadeira e a literatura. Fortuna ainda traz importantes contribuições sobre o papel do educador: A sala de aula é um lugar de brincar se o professor consegue conciliar os objetivos pedagógicos com os desejos dos alunos. Para isto é necessário encontrar o equilíbrio sempre móvel entre o cumprimento de suas funções pedagógicas – ensinar conteúdos e habilidades, ensina a aprender – e psicológicas – contribuir para o desenvolvimento da subjetividade para a 37 construção do ser humano autônomo e criativo – na moldura do desempenho das funções sociais – preparar para o exercício da cidadania e da vida coletiva, incentivar a busca da justiça social e da igualdade com respeito à diferença. (FORTUNA, 2000, p.9) É nesse sentido que o papel do professor vai se reestruturando, reinventando e acompanhando as transformações na sociedade. Porque a postura do educador não deve condizer com a neutralidade e muito menos com práticas desembutidas de ludicidade. Conceituar as práticas de alfabetização e letramento tem por objetivo delinear as estratégias e as metodologias que são mais eficazes, por isso, repensar sobre o que é um sujeito alfabetizado e letrado e quais as habilidades e competências ele deve ter, faz com que o ensino avance. Porque é por meio das reflexões que torna- se possível uma educação que rompa uma visão limitadora sobre o ato de ensinar. Nesse apontamento, cabe destacar as conceituações de Soares sobre o indivíduo alfabetizado e letrado: Uma criança alfabetizada é uma criança que sabe ler e escrever; uma criança letrada é uma criança que tem o hábito, as habilidades e até mesmo o prazer de leitura e escrita de diferentes gêneros de textos, em diferentes suportes ou portadores, em diferentes contextos e circunstâncias. (SOARES, 2000, p. 03) Que as práticas não só ensine o alfabeto, a junção de sílabas e fonemas, mas que sejam ações capazes de tornar o sujeito ativo, consciente e percursor de sua própria história. 3.1 Escola e família Dissertar sobre os papeis do professor e da família, provoca reflexões pertinentes com o objetivo de aguçar apontamentos significativos para o processo de ensino-aprendizagem. Portanto, a Lei de Diretrizes e Base da Educação 9394/96, em seu art. 1º declara queArt. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais. (BRASIL, 1996) 38 Por meio desse trecho da lei, compreende-se que a educação não está estritamente ligada à escola, pelo contrário, o indivíduo está em desenvolvimento de aprendizagem em todo tempo, através da família, do trabalho, da escola, do relacionamento com o outro. Partindo disso, já é possível demarcar a responsabilidade que a escola e a família possui, direta ou indiretamente, formal ou informal, porém ambos são responsáveis pelo processo de aprendizagem do indivíduo. No art. 2º da LDB fica explicitado quais entidades tem o dever de educar, que é a família e Estado, por isso, que travar um embate sobre a responsabilidade dessas instituições (família e escola) é, todavia, uma oportunidade de elencar como esses agentes podem contribuir de forma positiva para um ensino de qualidade. É no seio familiar que a criança inicia seus relacionamentos, amplia sua linguagem e por isso, Szymanzki (2003) diz que “é na família que a criança encontra os primeiros “outros” e, por meio deles, aprende os modos de existir – seu mundo adquire significado e ela começa a constituir-se como sujeito”. Ao compreender que a ação de ensinar também está delegada à família, torna-se possível flexibilizar o papel do professor e dos pais, não cabendo mensurar, nem atribuir uma porcentagem para o compromisso de cada ator desse processo, mas fica evidente que, tanto a família quanto a escola são agentes essenciais para a mediação e sucesso no processo de alfabetizar e letrar. Nessa via de compreensão do papel da família e da escola, ressalta que a escola é o local de promoção do diálogo, da democratização, e é por meio de estratégias pertinentes que finda-se uma parceria eficiente entre pais-professores. A parceria deve ser respaldada no respeito, na troca, para que de fato, família e escola caminhem juntos em prol de oportunizar um ensino mais eficaz para os sujeitos do processo. É importante delinear que os professores junto a escola devem promover um ensino que seja democratizado, que contemple a realidade de seus educandos. Para isso, Freire disserta que [...] a escola democrática não apenas deve estar permanentemente aberta à realidade contextual de seus alunos, para melhor compreendê-los, para melhor exercer sua atividade docente, mas também disposta a aprender de suas relações com o contexto concreto. Daí, a necessidade de, professando-se democrática, ser realmente humilde para poder reconhecer- 39 se aprendendo muitas vezes com quem sequer se escolarizou. (FREIRE, 1997) A citação acima, permite pontuar que não cabe mais, uma prática pedagógica autoritária ou até mesmo uma prática que apenas considere a vulnerabilidade de seus educandos, pede-se mais! Porque ações democráticas de ensino devem ser respaldadas na troca de experiência, na dialogicidade, na descoberta, na reconstrução e não na centralização do saber no professor. Desta forma, tanto os pais como professores podem promover um ambiente facilitador para alfabetização e letramento, portanto, através do compromisso com o incentivo à leitura será oportunizado um processo alfabetizador fincado na descoberta de um universo múltiplo e prazeroso, que é o da leitura. Contribuindo assim, para sujeitos autônomos, investigadores e apaixonados por literatura. Com base em uma relação franca e engajada pelo mesmo objetivo haverá inúmeros benefícios para uma aprendizagem mais significativa e de qualidade. A alfabetização não pode se fazer de cima para baixo, nem de fora para dentro, como uma doação ou uma exposição, mas de dentro para fora pelo próprio analfabeto, somente ajustado pelo educador. Esta é a razão pela qual procuramos um método que fosse capaz de fazer instrumento também do educando e não só do educador. (FREIRE, 1979, p.72) As ações que envolvem alfabetizar e letrar devem ser direcionadas em perspectivas que visam promover a criticidade para que os sujeitos sejam cidadãos conscientes. Para tanto, o relacionamento entre família e escola é determinante para que a formação do indivíduo leitor ocorra satisfatoriamente. Alfabetização não é um estado, mas um processo. Ele tem início muito cedo e não termina nunca. Nós não somos igualmente alfabetizados para qualquer situação de uso de língua escrita. Temos mais facilidade para ler determinados textos e evitarmos outros. O conceito também muda de acordo com as épocas, as culturas e a chegada da tecnologia. (FERREIRO E TEBEROSKY, 2003, p. 28) Através do trecho acima, as autoras destacam que o processo de alfabetização inicia-se cedo e não tem término, o que fica evidente a importância a família, pois é no seio familiar que o sujeito tem seu primeiro contato social, suas primeiras vivências com o mundo letrado. Sendo assim, para que o processo de aprender a ler e escrever aconteça satisfatoriamente, família e escola estejam engajados nessa ‘missão’ e que as ações em sala de aula sejam recheadas de imaginação, magia, encantos e muita liberdade 40 para ser, conhecer, investigar e sonhar. E que a família também possibilite um ambiente de aprendizagem dentro dos lares. Conclui-se de modo a destacar o quão é necessário que escola e família fortaleçam seus vínculos, dialoguem sempre mais e que busquem (juntos, em parceira) soluções para melhoria do ensino. Que cada qual desenvolva seu papel para com as crianças, assuma suas responsabilidades e que não haja negligência no cumprimento dessas funções, para tanto, que não falte compromisso, zelo, dedicação e amor. 3.3 Literatura Infantil: um caminho para uma aprendizagem prazerosa Não redundante, mas propositalmente, promover a conexão da Literatura Infantil ao processo de ler e escrever é oportunizar que a arte em forma de texto contribua para uma aprendizagem mais significativa e prazerosa. Segundo, Ernest Fisher Em todas as suas formas de desenvolvimento, na dignidade e na comicidade, na persuasão e na exageração, na significação e no absurdo, na fantasia e na realidade, a arte tem sempre um pouco a ver com magia. A arte é necessária para que o homem se torne capaz de conhecer e mudar o mundo. Mas a arte também é necessária em virtude da magia que lhe é inerente.(FISHER, 2002, p.08). Quando se trata de quais caminhos são mais eficazes para que o processo de ler e escrever tenha como fruto a criticidade, a autonomia e o prazer, podemos pontuar que a literatura infantil tem um viés de provocar uma aprendizagem prazerosa, porque é através desse universo plural, mágico e encantador que o sujeito descobre mais sobre si e sobre o outro. Nessa linha de apontamentos, em que a literatura infantil é utilizada como estratégia efetiva para que alfabetizar e letrar seja dotada de ludicidade, imaginação e criatividade, em que as práticas pedagógicas baseadas nessa perspectiva tem como resultado um ensino-aprendizagem que contribui para a construção de sujeitos ativos e mais, sujeitos que são apaixonados pela leitura e escrita. Com isso, a autora Villardi traz apontamentos de grande esclarecimento sobre o papel da literatura. Assim, discorre: Mas pra que é que serve a literatura? 41 E a resposta, tão distante do mundo pragmático e objetivo que nos cerca, vem, intensa, e cada vez com maior força. Serve para tornar o homem mais sensível, mais crítico, mais consciente de seu papel social, mais humano – e, certamente, mais feliz. (VILLARDI, 1999) A fala de Raquel Villardi atribui valores tão significativos e pertinentes em relação à literatura, que cabe compreender cada um deles, porque o ensino de práticas literárias é uma forma promover uma alfabetização contextualizada, problematizadora
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