Buscar

291886454-HILSDORF-Hist-Educ-Bras-Cap-6-as-Outras-Escolas-Da-Republica (1)

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

As OUTRAS ESCOLAS,
DA PRIMEIRA REPUBLICA
O'
J
.. I ..
.o:~
EscolaModernado Bras.1918.
69
~litl«10 6'
As OUTRAS ESCOLAS
DA PRIMEIRA REPUBLICA
1. NossoPontodeVista
No textoanteriorvimosaeducal;aodopontodevistadosliberaisedemocratasimigran-
tistas,naoabolicionistas.Procuramosmostrarque,paraeles,anal;aobrasileiramoderna
seriaconstruidapeloregimerepublicano- pois0Imperioatrasadonaopoderia"faze-
la" - e,paratanto,suaslideranl;as,desdeapropaganda,definirame ofereceramurn
sistemaescolarqueeducassetodaasociedade,masescalonando0seualcanceconforme
setratassedotrabalhadorimigranteoudascamadasdominantes.Parapromoverafor-
mal;aodascamadasmediasdasociedade,mascontendo-asdentrodelimitesaceitaveis
deascensaosocial,mantiveram0 sistemadeexamesparceladosaoscursossuperiores
eoferecerampoucasoportunidadesdeescolarizal;aoeminstituil;oespublicas:em1920
seriam6 milhOesosjovensdeambosos sexosemidadedereceberinstrul;aosecun-
daria,massomente52mil estavammatriculados- tresquartosdeleseminstituil;oes
particulares(Peres,1973).Ja 0crescimentodasmatriculasnoensinoelementar,queem
SaoPaulo,porexemplo,foi seisvezessuperioraodapopulal;ao,mostraque0esforl;o
deextensaodaescolapopularfoi efetivo(InfantosidaCosta,1983).
o pressupostodestecapituloequesea questaodaescolarizal;aopermaneceu
comournfatordeextremaimportanciaparaasoligarquiasqueestiveramnopoder,du-
ranteaPrimeiraRepublica,1elafoicrucialtambemparaostrabalhadores,masnosseus
termos:nasreivindical;oesdestes,aeducal;aoescolarprecisavaestaracompanhadade
transformal;oesmateriais,distribuil;aodasriquezas,justil;ae igualdade,pontosque
naoconstavamdaagendarepublicana.Os operariostinhamosseuspr6priosprojetos
enemtodospassa~amprioritariamentepelaescolarizal;aodasociedade.
A partirdo finalda decadade 1890a presencade liderancasde Sao Paulo no governofederalcolaboraparaa
disseminacaoemoutrosestadosdo modelepaulistadeorganizacaoescolare metodol6gica,representadocomo0
maisadequadoparaa modernidaderepublicana:Ceara,EsplritoSanto,MatoGrosso,Goias,Piauf,Sergipe,Santa
Catarinae Parana.A implantac§odosgruposescolaresedapedagogiamodernaemMinasGeraistemoutratrajet6ria,
segundo0 estudode LucianoM.de FariaFilho.
71
.
HistoriodoEduco~60Brasileiro
Mas0modelopaulistatornadohegemonicoteveoutroscontestadores,emergentes
dointeriordopropriogrupodeliberais,eemboraperdurasseaolongodosanos20,foi
desafiadopelovigorosomovimentodaEscolaNovacujahistoriavemsendorevisitada
atualmentepeloshistoriadoresdaeduca~aonofocodanacionaliza~aodoensino.
2. OsTrabalhadorese a Educa~aoEscolar
2.1 Os socialistas
A presen~adeposi~oessocialistasepercebidadesdemeadosdoseculoXIX, como
partedoideariodealgunsintelectuaisbrasileiros:estaonocasoosenvolvidosnomo-
vimentodaRevolu~aoPraieira(1848-50),emPernambuco,porcontadeseuprograma
socialavan~ado,quepedia,segundoFranciscoIglesias,aredistribui~aodasterrasea
nacionaliza~aodocomercio.UrndelesseriaAntonioPedrodeFigueiredo,jornalista
eprofessordoGinasioPernambucano- urndosliceusprovinciaisquesobreviveram
apseudodescentraliza~aodoperiodoimperial-,apontadocomotendournpensa-
mentoemquesemisturampreocupa~oesecleticasesocialistas.Influenciadopelos
movimentosutopicoseromanticoseuropeusde1848,elepassouadenunciarpela
imprensaamiseriadasclassestrabalhadoraseprocurouumasolu~aoparaela.Adepto
doecletismodofilosofofrancesVitorCousin,quefoimuitopopularentreosnossos
intelectuaisdoImperiosaquarema,2Figueiredotinhaumavisaodoshomensem
sociedadelutandopelasatisfa~aodesuasnecessidades,istoe,pormaisprazer,mas
tambemporsolidariedade:nessesentidodefendiaqueseahumanidadesoubesse
equilibrar-seentreessesdoisfatores,entreosdesejosegoistasdoserindividuale
osaltruistasdosersocial,entrea liberdadeindividualeaordemsocial,haveriaa
possibilidadedeprogressoparatodaasociedade.
NaperiododaPrimeiraRepublicajapodemosfalaremmovimentosocialista,
pois,soba influenciadasdecisoesda I e daII InternacionaldosTrabalhadores
(1864-76e1889-1916,respectivamente),ossocialistasiniciaram0processodearticu-
la~aodostrabalhadoresnoBrasil.Umadasestrategiasqueadotaramfoiaorganiza~ao
deassocia~oesassistenciaisdotipocaixasdebeneficenciaesociedadesdeauxilio
mutuoparaenfermos,viuvasedesempregados,segundoumaversaoproletariada
filantropialiberal.Outra,aforma~ao,desdeosanos90,departidospoliticosfundados
noRio,SaoPauloeBahiasobasdenomina~oesde"PartidoOperario"ou"Partido
Socialista",osquaismantiveramumaimprensaoperaria,organizaramCongressos
o ecletismo foi apontado como uma das teorias que possibilitaram a caracterfstica concilia9ao do liberalismo com a
escravidao que marca 0 periodo. Antonio Pedro de Figueiredo era conhecido como "Cousin fusco..
72
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiraRepublica
Openiriosechegaramadisputarelei'toes,poisdefendiamqueatransforma'taoda
sociedadeviria"dedentro",pelasviaslegais.3A participa'taodessessocialistasno
processopolitico-eleitoralpromoveuaaproxima'taodelescomosrepublicanos,com
ambososgruposoferecendo-seapoiomutuoparasuasiniciativas.Poresseprocedi-
mento,ossocialistasforamcriticadospelosoutrosgruposdefensoresdostrabalha-
dorescomoreformistase"democniticos",deprecia'taorefor'tadanaepocapelofatode
muitosdelesaceitaremapropriedadeprivadaeafamiliacomobasesdaorganiza'tao
social,asquaiseramimportantesalvosdasa'toespolitico-juridicasdepositivistase
republicanoshistoricos.
Do mesmomodo,nocampodaeduca'tao,ossocialistasaproximaram-sedos
liberais-republicanosdeduasmaneiras,segundoP.Ghiraldelli.Deurnlado,incor-
porandonoseudiscursoadefesaqueestesfaziamdaeduca'taopopularpelaexpansao
daescolaelementarpublica,estatal,leiga,gratuitaeobrigatoriaeacria'taodeescolas
openiriasnoturnaseprofissionalizantese debibliotecaspopularespublicas,para
asquaissolicitaramincessantemente0usodeverbaserecursospublicos.Deoutro,
definindoumapedagogiasocialistanacional,cujosprincipaiseixosarticuladores
tambemeramaquelesdapropostamodernaoficial:ensinoleigo,cientifico,intuitivo,
disciplinar,abertoasmeninas,massemco-educa'tao.
o diferencialdossocialistasestavanosseusobjetivos:comsuasiniciativas,
tinhamemvistapossibilitaraeduca'taopolitizantedotrabalhadoremtodososes-
pa'tos,segundoavisaodoprofessorcomourntrabalhadoredotrabalhadorcomo
educadordepersi.
Quea enfasedossocialistastenhasidonasinstitui'toesdaculturaletrada-
escolas,bibliotecas,imprensa- parecesercomprovadopelotipodelazeropenirioque
incentivavam,umamanifesta'tao"deliberdade,deextravasamentodasfantasiasedo
desejo,deritualcoletivopantagruelico",segundoFranciscoF.Hardman(NemPatria,
NemPatriio,p.45).Ouseja,0quepredominavanasfestasdocalendariosocialista
dotempolivre,donao-trabalho,era0aspectoludico,adescontra'tao,abrincadeira,
acomidaeabebida,maisdoqueapropagandaeadiscussaodefundoeducativo,
regularmentepraticadasnasreunioesdosCirculosdeEstudosSocialistas.
2.2 Os libertarios
As grandesfestasdepropagandaestaraomaisassociadasacorrentelibertaria,
quevemcomosimigrantesportugueses,espanhoise,sobretudo,italianos,edomina
omovimentooperarionapassagemdoseculoXIX para0XX, sendomaisinfluente
3 A bibliografiaregistra,paraas decadasde 1890-1920,cereadevintedesses"PartidosOperarios".
73
Historiodo Educo<;60Brasileira
entreosanos1906e1920.Oslibertariossaoativosreivindicadoresdasnecessidades
dostrabalhadores,comoossocialistas,masenquantonao-organizacionaisradicais
posicionam-secontraqualquertipodeinstituivao,seja0Estado,aIgreja,0Exercito,a
familiaeapropriedadeprivada.Naoaceitamareorganizavaodasociedadepelaviada
reforma,comoossocialistas:queremchegararupturapormeiodaavaorevolucionciria
diretanomeiosocial,combatendo0regimedocapital- causadosmalesdaclasse
trabalhadora- emsuatotalidade.
Parapromoveressalinhadeavaorevolucionariaoslibertariosprecisamgarantir
aeducavaopoliticadooperariadoemtodososmomentosdavidasocial.Comofize-
ramisso?Atualmenteabibliografiadistinguepelomenosduastendenciasentreos
libertarios:adosanarquistaseadosanarco-sindicalistas.Estes,superandoasprati-
casdassociedadesdemutuosocorro,dospartidospoliticosedasfestassocialistas,
propoemaresistenciadostrabalhadoresorganizadosemsindicatosdeoficios,que
desenvolvemumalutadebaseeconomicaeadotamaparticipavaonasgrevescomo
estrategiaprimordialdemilitancia.Osanarquistas,porseulado,procuramcobrir
maisamplamenteasmanifestavoessociais:alemdeteremfundadoLigasOperarias
deassistenciaecoloniascomunitariasdeimigrantes(comoaColoniaCecilia,que
duroude1889a 1894),usaram0teatrosociale asfestasdepropagandadecunho
fortementedidaticocomoestrategiasdeavaoeapoiaramasatividadesdeformavao
desenvolvidasnosCentrosdeCulturaenosCirculosOpercirios,estreitamenteligadas
aousodoimpressodoutrinario:CeliaGigliopoderegistraraexistencia,em1912,de
125bibliotecaspopularesemSaoPaulo,propiciadorasdacirculavaodelivros,folhetos
volantes,jornaiserevistasanarquistas.Finalmente,outraformadeatuavaodosgrupos
anarquistasestanasinstituivoesescolaresquepromoveramassuasexpensas,pois0
operariodeveeducarsuascrianvassemprecisardoEstado,dependendoapenasda
solidariedadedasfamiliastrabalhadoras.
Elesorganizam,entao,escolasleigas,privadaselivres,comumalinhapeda-
g6gicamuitoclara,quecombinaosprincipiosdaescolamodernaouracionalistadeF.
Ferreredaeducavaointegral,deRobin.Nelaapraticacientificamodernadeobser-
vavaodiretaeexperienciaempiricaternlugar,masdiferentementedoqueeraproposto
pelosliberaisqueaceitavamacienciamodernaparaaformavaodasindividualidades
condutoras,istoe,das"mentescientificas",0criteriodaeducavaocientificalibertaria
era0usosocialdaciencia.Damesmaforma,superandoadivisaoentreformavao
para0trabalhointelectualetrabalhomanual,explicitanomodelodualistadeescola
dosliberais(0ginasioeoscursossuperioresparaaeliteeaescolanormale0ensino
tecnicoparaostrabalhadores),nessapropostalibertariaascrianvasdeveriamreceber
umaeducavaointegral.Liberdadeesolidariedadesao,segundomostrouRegina
Jomini,osprincipiosbcisicosdaeducavaoescolaranarquista,porqueelesreproduzem
74
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiraRepublica
osprincipiosdasociedadeidealacrata,regidaapenaspelaliberdadeeasolidariedade
entreseusrnernbros.4
Giglio e Jornini refererna existenciade EscolasModernasanarquistas
emvariascidadesdeSaoPaulo(Bauru,Jau,Carnpinas,SaoCaetano,SaoPaulo),
MinasGerais(Machado)enoRiodeJaneiro.AsrnaisconhecidasSaDasdosbairrosdo
BraseBelenzinho,emSaoPaulo,atuantesnadecadade1910.DaescoladoBrasternos
urnanunciopublicadoemurnjornaloperario,queperrniteentrevera sualinha
pedagogica:
Estaescolaservir-se-adometodoindutivodemonstrativoeobjetivo,
ebasear-se-anaexperimenta¥iio,nasafirma¥oescientificaseraciocinadas,
paraqueosalunostenhamumaideiaclaradoqueselhesquerensinar.
Educa¥iioArtistica,IntelectualeMoral- conhecimentodetudoquanto
nosrodeia;conhecimentodascienciasedasartes;sentimentodobelo,do
verdadeiroedoreal;desenvolvimentoecompreensiiosemesfor¥oepor
iniciativapropria.Materias:amateriasasereminiciadas,segundo0a1cance
dasfaculdadesdecadaaluno,constariiodeleitura,caligrafia,gramatica,
aritmetica,geometria,geografia,botanica,zoologia,mineralogia,fisica,
quimica,fisiologia,historia,desenho,etc.5
A eduCa9aOescolarlibertariaapresenta-se,entao,comduascaracteristicas.De
urnlado,oslibertariosternurnaclaraforrnula9aOpedagogicaedidatica,quenaoparte,
porern,darealidadebrasileira,masdastradicionaisdiretrizesdoanarquisrnointerna-.
cional(italiano,paraosanarquistas,efrances,paraosanarco-sindicalistas).Deoutro,
naolutarnpeloensinopublicoegratuitooferecidopeloEstadoliberalrepublicano:
aposturadoslibertariosedelevarsuascrian9asaescola,masnaoaescolaliberal-
republicana,porqueestanaocorrespondia,tantodopontodevistainstrucional(a
cienciaenquantosuportedoprogressocapitalista)quantodopontodevistadafun9aO
dernodelagern(construindoernantendoaordernsocialhierarquicaedual),asneces-
sidadesdostrabalhadoresdefinidaspeloslibertarios,quetinharnoutroentendirnento
darela9aOforrna9aOhurnana- processodetransforrna9aOdasociedade.
IssotrouxevariasconseqiienciasnopIanodaeduCa9aOescolar.Naoapenas
concorreuparasepararoslibertariosdossocialistasnointeriordopropriornovirnento
dostrabalhadores,ja queestesaceitavarna escolacontroladapeloEstado,como
Ct. 0 anuncioda Escola LibertariaGerminal,instaladanobairrodo BornRetiro,emSao Paulo: "Trabalhadores,
nao vos iludais!(...)Ai! do deserdadoque confia na providenciadumdeusquimerico,na tutelado governoou
na beneticenciaburguesa!(...)Nas escolassubsidiadas,ortodoxas,oficiais,esgota-sea potencialidadementale
sentimentaldevossospequeninos(...)Animaios promotoresouregentesdeescolasracionalistas,dasquaissejam
rigorosamentebanidasas supertluidadese trai90esdoensinoortodoxo"(0 Amigodo Pova,26/11/1904,cit.em
Hardman,p. 102).
A Lanterna,10/1/1914,reproduzidode Hardman,pp.70-71.
75
Historiodo Educo~aoBrasileiro
aindacontribuiu,segundoP.Ghiraldelli,para0arrefecimentodaquelemovimento
de"entusiasmopelaeducayao"que1.Nagleobservouparaasdecadasdetransiyao
Imperio-Republica,quetinhaumadesuasmarcasnaexpansaodaescolaelementar
publicanalutacontra0analfabetismo.
Osrepublicanosnopoder,desuaparte,enfrentamaoposiyaodoslibertariosde
duasmaneiras:aprimeira,repressivaeostensiva,aotomaramedidadefechamen-
todasescolaslibertariasnosfinsdadecadade1910;a segunda,ativa,aooferecer
oportunidadesdeensinoprofissionaltecnicopublicoegratuitoparaostrabalhadores.
Enquantooslibertariosesocialistasfundavamuniversidadespopularesquefuncio-
navamcomocentrosdeculturaoperaria,osgovernosrepublicanoscriavamumarede
deescolastecnicas.EmSaoPaulo,porexemplo,ja haviadesde0 Imperioensino
profissionalorganizadopelosrepublicanoshistoricosnaforamdeinstituiyaoprivada,
alemdeiniciativasassistencialistas(C. S.V. Moraes,1990).Masapartirdoinicio
dadecadade1910,0governopaulistanaosocriou50escolaselementaresnoturnas
paracrianyasoperarias,localizadaspertodefabricas,comofundouentre1909e1919,
74escolasnoturnasparaadultose 17escolasprofissionaismasculinasefemininas,
sendoduasdelasemSaoPaulo,umaparacadasexo,justamentenoBras,0bairro
queconcentrava0maiornumerodeimigrantesproletarios.
Naopodemosesquecer,noentanto,que0propriotrabalhadornacionaljarecebia
o olhardasautoridades.Depoisdelongosanosdepredominioestrangeiro,acidade
deSaoPaulocomeyavaaatrairlevasdemigrantesnacionaisque,vivendodetarefas,
sem"ocupayaofixa"- istoe,naindustriaenoartesanato-, semcontrole,configuram
urnproblemasocialepoliticotaogravequanto0dosestrangeiros.Elespassamaser
representadoscomodignosdevalorizayaoenecessitadosdeformayao,com0argu-
mentodequenaosecomportavamdemaneiraantipatrioticaeinsubordinada,como
osestrangeiros.Podemosentender,entao,a localizayaoestrategicadessasescolas
profissionaisparafazerfrenteaagitayaooperaria,asquais,simultaneamente,eram
apresentadaspelogovernopaulistacomourn"veiculosegurodenacionalizayao":0
alvoeraaformayaodeurnnovotrabalhador,fosseelenacionaloudescendentede
estrangeiros,desdequedisciplinadoedevotadoaotrabalho.
2.3 Os comunistas
Oscomunistasdestacam-sedoslibertarioscomournadissidencia,nodecorrerdeurn
processorelacionadoaRevoluyaoRussade1917:emurnprimeiromomento,muitas
figurasdeesquerdaviram0"outubrovermelho"comournarevoluyaolibertaria,mas
com0desenrolardosacontecimentosentenderamque0 movimentotomououtro
rumo,tomando-semilitarizado,burocratizadoecentralizadonafiguradoditadordo
76
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiraRepublica
partido.Assim,paramanteracoerencia,aquelesqueapoiavamaRevolu9aode1917
tiveramdeseparar-sedomovimentolibertario.
NoBrasiloscomunistasassumemavanguardadaesquerdaoperarianadecada
de20,pelapresen9adominantedessalinhanaIII InternacionaldosTrabalhadores
(1919-1935).Organizaram,em1922,urnpartidoqueapresentacomoprincipiosde
politicaeducacionalosseguintespontos:apoioaescolapublica,obrigatoria,leiga
egratuitaque0Estadoliberaljaoferecia;melhoriadevidaedecondi90esdetraba-
lhoparaosprofessores(salarios)ealunos(transporte,uniformes,livros,material
deestudo);educa9aopolitico-partidariaparaaforma9aodaconscienciaoperaria;
edefesadaescolaunitaria,semdivisaoemensinoprofissionalizanteeintelectual,
propostapedagogicaqueacompanhavaapolitecniapostaempraticanaRussia,nos
anos20,porNadiaKrupskaja.6
Oscomunistascriticavamoslibertariosdizendoqueestesnao"pensavam0
Brasil",maselestambemparecemterficadopresosaosmodelospedagogicoses-
trangeiros.Naodesenvolveramasteoriaspedagogicas,preferindotrabalharmaisno
sentidodadefesadaspoliticasnacionaisdeeduca9aopublicanasruasenoCongresso
Nacionale dapraticadeforma9aopoliticaparaospropriosquadrosdoPartido.
Assim,tambemsobalideran9adoscomunistas,0movimentodostrabalhadoresnao
criouredespropriasdeescolaselementares:nadareivindicavamfazeralemdoqueos
liberaisrepublicanosja ofereciamemmateriadeescolariza9ao,acreditandoqueera
necessarioprimeiramenteestenderatodososgrupossociaisasconquistasliberais
para,depois,avanguardaoperariaassumir0governodasociedade.
Asdivergenciassobreosmodelosdeescolaadotadospelostrabalhadoresesobre
apraticadoprocessodeescolariza9aodasociedadebrasileirapassam,portanto,pelas
diferentesvisoesque0movimentotinhadoprocessorevolucionario.
2.4 0 movimentonegro
NaPrimeiraRepublica,para0trabalhadorbranconacionalouestrangeiro,alemdas
escolaspublicasoficiais,haviaasinstitui90esparticulareseasescolasdostrabalha-
dores.E paraosex-escravos?Temosaindapoucasinforma90essobreeles.Segundo
ZeilaDemartini,queentrevistouantigaslideran9asdomovimentonegrodoiniciodo
seculoXX, emSaoPaulo,ocorreuurnesfor90paraacria9aodeescolasnointerior
deurnprojetodeconscientiza9aodaspopula90esnegras,masasprimeirasentidades
organizam-secomosociedadesrecreativase0movimentoporescolasvaisefirmar
entreelasapenasnosfinsdadecadade20.
6 Essa naoeraa posiQaodosdirigentesdo PartidoComunista.quepreferiama educaQaoprofissional.
,77
r
Historiodo Educo<;60Brosileiro
Umaexplica9aoqueaautoraofereceparaessaconfigura9ao,recolhidadosde-
poimentos,equefaltavamrecursosparasustentarurntrabalhopedagogicocontinuo.
Outra,maisdramatica,refereque0movimentonegropensavaque0caminhopassava
pelaescola,mastevedificuldadesemmantersuasiniciativas,porque,deurnlado,
ogovernorepublicanorealmenteexpandiasuarede(comodocumenta0trabalhode
AnaMariaInfantosidaCosta)ehaviamaislugaresparae1es,aindaqueosnegros
pobresfossemnelasdiscriminados;deoutro,e1espropriosnaoseachavamnodireito
doacessoaeduca9aoescolar,haviaumaacomoda9ao,devidaa"interioriza9aodaes-
cravidao".A for9adesseconstrangimentointernalizadoficaressaltadasepensarmos
queem1886,nacidadedeSaoPaulo,osescravoseramemnumerode493,emuma
popula9aonegradecercade12milpessoas,paraurntotalde50milhabitantes.
Essascondi90esajudamaentenderasitua9aoqueTeresinhaBernardoencontrou
quando,buscandotambemrecuperaraslembran9asdeantigosmoradoresdeSao
PaulonasprimeirasdecadasdoseculoXX pormeiodedepoimentosorais,perce-
beuqueosdescendentesdenegrosreferiampoucasoportunidadesdeestudo,ao
passoqueosdeascendenciaitalianaguardavamamemoriadeumainfanciaescolar,
sobretudooshomens,quecompletavamasuaaprendizagemdeoficioscomcursos
tecnicosfeitosnasescolasdecomercio,noLiceudeArteseOficiosenasescolas
tecnicasestaduais.
2.5 A escoladarua
OutraabordagemdesseperiodofoidesenvolvidarecentementeporAiltonMorila,ao
destacarqueacidadedeSaoPauloeraaindaextremamenteoralizadaequeascama-
daspopularestinhamamusicacomoumadasformasdeexpressaomaisimportantes
dasualutapelasobrevivencia.Analisandoascan90espopularesdetrabalhadores
imigrantesenacionais,livreseex-escravos,elepodevislumbrarumaordempropria
deorganiza9aodessapopula9aoqueatravessatodososmomentoseespa90sdavida,
nocotidiano,desdeacasaateasperspectivasdefuturo,passandopelasbrincadeiras
infantis,0trabalho,0lazer,0amor,asmanifesta90esdesolidariedade,resistenciae
revolta.Essascan90essaoparteessencialdoqueesseautordenominade"aescola
darua",ondeasli90esacontecemnodia-a-dia,nocontatooral,noouvir-ver-fazer,
configurandournensinamentomutaveldeacordocomascondi90esmateriaiseos
multiploscontatosculturais.0 queseproduziaeseensinavanesseprocessonaoea
tradi9aoconservadora,repetidasimplesmentegera9aoaposgera9ao- comopensa-
ramalgunsfolc1oristas-, masumaculturaviva,quesemodificavaeinterferiano
contextohistorico,concretizandoumaeduca9aonio-formal,masnemporissoisenta
deinten90es:Morilarecuperacomoobjetivodessaa9aocotidiana0desejodedara
sociedadeumaorganiza9aodiferentedaquelaqueelesvivenciavam,indoaoencontro
domovimentooperario.
78
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiraRepublica
3. Os Pioneirosda EscolaNovae os Catolicos
QuandoescreveuA CulturaBrasileira,nofinaldadecadade30,FernandodeAze-
vedor~presentouaeduca~aoescolardaPrimeiraRepublicacomournimensoplato
de"estabilidadeerotina"(p.642),dizendo,deurnlado,queaescolaesteveamargem
daspreocupa~oesdominantesentreospoliticos;deoutro,queastransforma~oesno
sentidodamoderniza~aodaescolabrasileirasomenteaconteceramaolongodadecada
de20,quandooutroseducadoresliberaisforamintroduzindoapedagogiadaEscola
Novanopaispormeiodereformasrealizadasnossistemasestaduaisdeensino.Esse
processoculminounoaproveitamentodesuasideiaspelaRevolu~aode30,agrande
revolu~aoburguesaque,essasim,estendeuatodososdireitosliberaisqueaPrimeira
Republicanaoconseguiraconcretizar,inclusive0direitoaeduca~ao.
ParaFernandodeAzevedoapresen~adosadeptosedivulgadoresdaEscola
Novanosanos20e30marcaaeduca~aobrasileiracomournverdadeiro"divisorde
aguas",separandoamentalidadetradicionalevelhadanovaeprogressista.Issoquer
dizerquetodosaquelesqueseopunham,outinhampropostasalternativas,como
ostrabalhadores,oscat6licoseosdefensoresdapedagogiamoderna,quertivessem
atuadonoperiodomonarquico,quernodaRepublica,querfossemdefensoresda
educa~aopopular,quertivessemrenovado0ensinotecnico,foramenfeixadospor
elesobarubricadetradicionalistas.Azevedodeixadeforaapenasosprotestantes
americanos,"fermentonovonamassadoensino"(p.593)ealgumasiniciativasdos
republicanospaulistasqueelevecomo"antecedentes"dosprogressistas.
Estes,pelocontrano,seriamoseducadoresenvolvidosemurnconjuntodeinicia-
tivasclaramentedemarcadascomvistasarenova~aoeducacional,compreendendo:
D . aquelesquetinhamfundadonoRio deJaneiroa Associa~aoBrasileira
deEduca~ao(ABE), em1924,promotoradasConferenciasNacionais
deEduca~ao,saudadascomoa principalinstanciasocialdedebatedas
questoeseducacionaisnoperiodo1925-35;
1:1participadodo"Inqueritosobre0ensino"promovidopelojornal0 Estado
deS.Paulo,em1926,erealizadoporele,Azevedo,com0intuitodediscutir
asorienta~oesvigentesnosistemaescolarpaulista;
D haviampromovidoreformasemalgunssistemasestaduaisdeensinoao
longodadecadade20;
D declarando-seliberaisabertosa sociedadecapitalista-urbano-industriale
asideiasdomovimentodaEscolaNovaquecirculavanoexterior,tinham,
ainda,assinado0Manifestode1932,textonoqual,levandoemcontaesses
pressupostos,formulavamumapoliticaliberalnacionale atualizadade
educa~aopara0paiscombasenaescolaUnica,publicaeleiga.
79
Historiada Educa<;ooBrasileira
Maiscuidadosoaoretomaresseentendimentodo"antese depoisdaEscola
Nova"nasuatesede1966,1.Naglevaiexplicitararazaopelaqualpensapoderlera
a9aodessespioneiroscomourndiferencialnahistoriadaeduca9aobrasileira:porque
elesseapresentavamcomoqualitativamentediferentesdagera9aoaoredo.rdo15
denovembro,nosentidodequeagiamnaoapenascomopoliticos,ouintelectuais
ouhomenspublicosinteressadosemeduca9ao,masenquantoespecialistas,istoe,
portadoresdeconhecimentostecnico-cientificos.Elechamaaessemovimentode
"otimismopedagogico",porqueseusadeptosacreditavamqueumadeterminadacon-
cep9aopedagogica,esomenteela- apedagogiadaEscolaNova- equepermitiriaa
reformadaescolaparaqueelapudessecumprir0seupapelsocialderenovadorada
sociedadebrasileiranoenquadramentoliberal.
ParaNagle,0queaconteceunadecadade20foiurndesvionomovimentodo
"entusiasmopelaeduca9ao"quecaracterizava,ateentao,aa9aorepublicanadeam-
plia9aodoacessoitescolaelementar:issosignificaquetomaracessivel-democratizar
- aalfabetiza9aoparatodoseraumaposi9aopoliticaquefoidespolitizadanadecada
de20,quandoosnovosprofissionaisdaeduca9aopassaramaseguiarporcriterios
tecnicosparatrataraquestaodaeduca9aoescolarpopular.A OP9aopelomodelo
pedagogicodaEscolaNovatinhabasestecnicas:era0unicoportadordeconcep90es
cientificasmaisatualizadas,nocasoasociologia,abiologiaeapsicologia.A
adesao
itorienta9aoescolanovistaerarepresentadacomournavan90,urnprogresso:tanto
maisprogressistaquantomaistecnico,especializado,comoqueriaamodemidade
dosanos20.
Esseautorencontraapoioparaasuaargumenta9aoaoexaminarasreformas
empreendidasporessesrenovadores-especialistasdaeduca9ao.Ordenando-asem
urncontinuum,podemosvisualizarcomofoisefirmando,nainterpreta9aodeNagle,
aperspectivatecnico-pedagogicaentreosescolanovistas:
Criterios+Politicos-Pedag6gicos Criterios-Politicos+Pedag6glcos
1920
SaoPaulo
S. Doria
1922
Ceara
L.Filho
1925
Bahia
A.Teixeira
1927
D.Federal
F.deAzevedo
1927
Minas
M.Casassantal
Fr.Campos
ParaNagle,SampaioDoriatomouamedidafundamentalmentepoliticaderedu-
zir pelametade(dequatroparadoisanos)adura9aodocursoprimarioobrigatorioem
SaoPaulo,paragarantiraamplia9aodeofertasdevagasnaescolapublicasemampliar
osrecursosfinanceirosearedefisicaexistentes.Na reformadoCeara,Louren90Filho
ja teriatornadomedidastantodenaturezapolitico-administrativaquantodenatu-
80
..
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiraRepublica
rezametodologica,poiseraurnespecialistaemeducayaoeadeptodaEscolaNova
(professordePsicologiaePedagogiaExperimental).LecionandonaEscolaNormal
deFortaleza,preparouprofessoressegundoanovaorientayao,chegandoaescrever
textosdidaticosadaptadosarealidadesocialregional,deacordocomaformulayao
escolanovistadetratar0 sistemadeensinocomoumaminiaturadomundosocial.
NagleavaliaareformadeAnisioTeixeira,naBahia,comoaquelamenosrelacionada
arealidadesociale,inversamente,amaisbem-acabadaenquantopropostabaseada
emurnidearionao-nacional,ouseja,naexperienciaescolanovistanorte-americana
deJohnDeweyde"escolacomocomunidade".Estaideiatambemaparecenasduas
reformasde1927.FernandodeAzevedofazareformadosistemadeensinodoDistrito
FederalinfluenciadopelasociologiadeComteeDurkheim,destacando0 aspecto
datarefasocialdaescola.Outrosprincipiosorganizadoresdesuapropostaerama
"escoladotrabalho",baseadanaescolaativaecriadoradeKerschensteiner,ea"escola
unica",ouseja,publica,obrigatoriaegratuitaparatodos.
A reformadosistemamineiroempreendidaporCasassantaeFranciscoCampos
e,paraNagle,amaisbem-sucedidadopontodevistadasubstituiyaodomodelopo-
liticoporurnmodelopedagogico,ouseja,orientadapelapreocupayaocom0aspecto
micropedagogico(0queacontecianasaladeaula,narelayaoprofessor-crianya),ao
invesdapreocupayaocom0macropedagogico(aexpansaodoacessoaeducayao
elementarnalutacontra0analfabetismo).Saocaracteristicasdareformamineira:a
escolaencaradacomoayaosocial;atentaaosinteressesemotivosdacrian~aenao
alogicadasdisciplinas;0predominiodaatividadenolugardapassividade,fazendo
daliyaourntrabalhoemcomum,uma"cooperayaodasinteligencias";amelhoriada
EscolaNormaldeformayaodeprofessorescomaintroduyaodeumanovadisciplina,
aPsicologiaEducacional,queforneceriaasbasescientificasdodesenvolvimento
infantilapartirdousodetesteseprojetosexperimentais.E esseconjuntodemarcas7
dareformamineiraque,tornadosimultaneamentecomo0desenhogeralaquechegou
aEscolaNovapraticadapelospioneirosliberaisnoBrasil,nocomeyOdadecadade
30,diferenciaehierarquiza,pelasuamodernidadeeatualidade,essapropostaem
relayaoasoutrasdoperiodo.
Examinandoessahistoriografiae reavaliando0 movimento,CarlosMonar-
chaelapidar:osescolanovistassaomodernosparaquemacreditaque1930earevo-
lUyaoburguesa.
Confrontando,porsuavez,aconstruyaodiscursivaazevediana,MartaCarvalho
lembraqueaoapresentar-secomovozautorizada- umavezqueeleproprionao
NotermosdasintesedaanalisedeNaglefeitaporCeliodaCunha.noseulivreEducar;aoeAutoritarismonoEstado
Novo.
81
Historiada Educac;aoBrasileira
apenasseincluiaentreospioneirosdaEscolaNova,mastambemseautodesignava
comoarticuladordomovimentoeredatordosseustextosprogramaticosmaisimpor-
tantes-, FernandodeAzevedoconstruiunoA CulturaBrasileiraumanarrativa,que
setornou"matrizinterpretativa"daHistoriadaEduca~aoparaasdecadasde20 e
30.A for~adeleestaemterconstruidoaomesmotempoamemoriaeahistoriada
EscolaNovanoBrasil.
Divergindodasposi~oesdeAzevedoedeNaglequantoainser~aodaABE no
movimentodedespolitiza~aodocampoeducacionalporcontadapresen~adominante
neladosliberaisespecialistasnaEscolaNova- e,portanto,dascoloca~oeshabituais
sobre0 tododomovimento-, essaautorafezduascoisas:analisouasatividades
dessaentidadecomocampanhaspoliticasempreendidasparaa modemiza~aoda
sociedadebrasileira,quereorganizamaescolasob0modelodafabrica,eidentificou
osseusintegrantescomomedicos,higienistaseengenheirosdeorienta~aocatolica.
Vistoque,pelasuainvestiga~ao,encontrouosliberaisrenovadoresnocomandodessa
entidadeapenasnadecadade30,concluiuqueos"pioneirosdaEscolaNova"queatuam
naABE,nadecadade20,saodiferentesdos"pioneirosdaEscolaNova"queassinam0
Manifesto,em1932,equeestestiveramparticipa~aoapenasmarginalnaorganiza~ao
daABE edasConferenciasNacionaisdosanos20,8ficando0papelmaisdestacado,
nesteperiodo,comospioneiroscatolicos.
Acompanhando0minuciosoexamefeitoporelaemdocumenta~aoineditada
ABE epossiveldizerque,nosanos20,essaentidadeeautoritaria,enao,liberal;nela
naodominamosliberaisrenovadorescomourngrupohomogeneodelinhaliberal
eescolanovista:naosomenteexistemvariascorrentesdeopiniao,variasfac~oes,
como,ainda,0quepredominaeaorienta~aodogrupodoscatolicos,preocupados
comaforma~aodaselitescujatarefae,porsuavez,formar0povodeacordocomas
tradi~oesnacionais,associadas- paraeles- aculturareligiosadaIgreja,representada
como0"cimentodanacionalidadeedaordem";que,noseuentender,asfac~oesmais
aesquerdavaoassumir0controleideologicodaABE apenasdepoisde1932.
NaABE osnovosespecialistasemeduca~aonio saoexpressivos,pois0grupo
maisforte,quepensaedeterminaapoliticaeducacionaldessaassocia~ao,eformado
porumamaioriadeengenheirose medicos.Emoutraspalavras,hapropostasde
renova~aoeducacional,maselasnio partemdosprofissionaisdeeduca~aodeque
falaNagle.
NasreunioesdaABE enosCongressosNacionaisqueelapromoveu0queesta
emdiscussaonio e0aspectotecnicodaeduca~ao,ouseja,seu"otimismo"naoe
ElasocorreramemCuritiba,1927;BeloHorizonte,1928;Sao Paulo, 1929;Rio deJaneiro, 1931;Niter6i,1932;For-
taleza,1934;RiodeJaneiro, 1935.
82
Capitulo6: AsQutrosEscolasda PrimeiraRepublica
pedag6gico,comodizNagle:epolitico,namedidaemquefazpartedeurnprojetode
controle,demoldagem.<fasociedade.Liberaisecat6licosternurnprojeto(autoritario)
deconstituira"nayaobrasileira".Pararealizaresseprojetotrouxeramapedagogia
daEscolaNovadoexterior,naoenquantomerotransplantecultural,umaimposiyao
deideiasestrangeiras,uma"dominayao",masporqueessametodologiafoiaceitae
consideradaurnmecanismoeficientedecontrolesocial,paraconstituir"decimapara
baixo"0povoadequadoanayao.Comosedariaisso?A EscolaNovaseriaapedagogia
adequadaparapromoverasuperayaodoelementonacionalfraco,doenteeamorfo-
queMonteiroLobatosintetizaranafiguradoJeca-Tatu-, porquepropiciavapraticas
dehigienizayao(dasaude),deracionalizayao(dotrabalho)edenacionalizayao(dos
valoresmoraisecivicos).Assim,paraMartaCarvalho,nocontextodaABE naqual
disputamcat6licoseliberais,aEscolaNovaemovimentonaodedespolitizayao,mas
derepolitiza.;io.
A representayaotradicionaldoscat6licoscomocoadjutoresdomovimentodos
pioneirostambemdeveserrevista:ambososgruposternprojetosderemodelayaoda
educayaoescolarpararemodelarasociedadeetravam,entresi,urnembateideol6gico
objetivando0controledasescolas.Essapostura,segundoMartaCarvalho,retiraos
cat6licosdaposiyaosecundariaereativaqueavisaodeFernandodeAzevedolhes
atribuiudiantedosliberais.
De fato,assimcomonocasodostrabalhadores,apresenyadoscat6licosna
culturaenaeducayaobrasileirafoisilenciada,massabemosquedesdeadecadade
10,pelomenos,elessearticulavamparaafirmar-secomogruposocialinfluente,rea-
lizandournduploesimultaneomovimento:aproximando-sedoEstadoleigoeda
pr6priaIgrejaRomana,daqualestavadistanciadadevidoaoaporteregalistadaepoca
pombalina.0 cardealD.Leme,bispodoRio deJaneiro,teveumaatuayaomarcante
nesseprocesso.Deurnlado,reaproximoudaSantaSetanto0cleroquanto0 laicato
brasileiros,envolvendo-osnapraticadeatividadesassistencialistaseeducacionais.
preconizadaspelosPapasnomovimentodaAyaoCat6lica,demodoquea
Igreja
Cat6licalogosetornouamaiormantenedoradecolegiossecundariosdopais.De
outro,cuidouemespecialdeeducaraslideranyascontraosperigosdoateismo,do
anticlericalismoanarquista,doliberalismoedocomunismo,fundandoarevistaA
Ordem(1921)e0 "CentrodeEstudosD.Vital"(1922)paradivulgar-Ihes0pensa-
mentocat6licoautorizado,9emoposiyaoaodospioneirosliberais.
Constatara importanteparticipayaonaABE departidariosdaEscolaNovade
linhacat6licaconfirmaessasestrategiasdeayaodaIgreja.Ajudatambemaentender
A obra do intelectual Alceu Amoroso Lima (estudada por W. Cauvilla) e, a esse respeito, exemplar. Para uma figura
da hierarquia da Igreja na perspectiva da hist6ria dos homens comuns, ver 0 estudo de M. C. de Freitas.
l
83
Historiada Educa<;60Brasileira
que,porcontadessepredominio,aABE tinhaumavisaodeeduca9aoeminentemente
politica,ediferentementedafiguraquedelafoifixadapelabibliografia- deurngrupo
detecnicosemeduca9aoquetraziamparaasaladeaulaumametodologiaavan9ada
derespeitoacrian9aquesealfabetizava- atuavasegundournamploprojetodecon-
forma9aosocialpormeiodaenfasenasaude,namoralenotrabalho.Naorepresenta
onovo:fazfalar0velho.
3.1 Ensino nacionalista
Naosetrata,porem,do"velho"nosentidodapedagogiamodernaecosmopolitados
republicanoseliberaisadiantadosdosfinsdoseculoXIX, nemdasiniciativasde
educa9aopopularsustentadaspelaOP9aoimigrantistadosrepublicanoshistoricos.A
liga9aoeoutra:0 fioqueconduzaosescolanovistasdadecadade20vemdaescola
nadonalista,repostaemcircula9aopelosintelectuaisdadecadade10quandopediam
avaloriza9aodaculturanacionalnosconfrontoscomaimportantepresen9aestran-
geira.ModelarmenteagitadaporOlavoBilacemsuacampanhadesalva9aonacional
medianteaalfabetiza9aoe0servi90militarobrigatorios(1915-1918),queinspiroua
cria9aodeumaLigadeDefesaNacional(1916),aideianacionalistaganhouurgencia
emSaoPaulo,convulsionadapelasgrevesopenirias,levandoafunda9aodeumaLiga
Nacionalista,em1917.Rapidamenteexpandidaparaoutraslocalidades,aatua9aoda
Liga- queseprolongouate1924- ternsidoassociadaadefesadovotosecretoedireto.
Mas0seuprogramaerabemmaisamplo,inc1uindosimultaneamenteostopicosde
saude,moraletrabalhoeumasupera9aodaescolaalfabetizadoraqueecoamnas
propostasdaABE dadecadade20:funda9aodeescolasprimariaseprofissionais;
instru9aocivicadopovonaobedienciaasleisenorespeitoastradi90esnacionaispor
meiodeimpressoseconferencias;incentivoaeduca9aofisica,aoescotismo,aslinhas
detiroeaoservi90militar;celebra9aodosfatosnacionais;obrigatoriedadedoensino
dalingua,dahistoriaedageografiapMriasnasescolasestrangeiras.1O
A Ligaseaproximoudosdiretoresdegruposescolaresedascamarasmunicipais,
instandopelaaberturadeescolasnoturnas.Estampouem19190textodeSampaio
Doria,"0 que0cidadaodevesaber",paraserusadocomomanualdeeduca9aocivica.
EpormeiodeOscarThompson- queocupavaaDire9aoGeraldoEnsinodoEstadoe
organizouem1917urnprogramaoficialpara0ensinodasescolasprimarias-, alcan90u
asdisciplinasescolares:C. Botoapresentaurn"Programadeensinodasescolasda
LigaNacionalistadeSaoPaulo",publicadoem1919,comorienta90esespecificas
10 Fechada a Liga pelo governo federal, seus integrantes reagruparam-se no Partido Democratico, dissidencia do Partido
RepublicanoPaulista.Mas como1924e tarnbern0 anode cria980da ABE, estapodeterfuncionadocomo0 novo
refugiodos nacionalistas.
84
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiroRepublica
sobreconteudosemetodologiaspara0ensinodeleituraelinguagem(pelometodo
analitico-globaldasentenciac;ao),aritmetica,geografiaehistoria,ateaeducac;ao
moralecivicaeaslic;oesgeraisdecienciasaplicadasavidahigienicaeprodutiva.
CirceBittencourttambemmostrou(p.180)que0ensinodahistoriadoBrasilno
cursoprimariooficialtinhaurnfundamentonacionalistanasuaconcepc;ao,bemde
acordocom0titulodaintroduc;aodoprogramade1917:"Nacionalismodoensino
comoFundamentodaformac;aodaNovapatria".Estudandooslivrosdidaticosde
historiadoperiodo,fossemdeautorescatolicos,comoJonathasSerrano,fossemde
autoresidentificadoscomosliberais,comoAfranioPeixoto,percebeuqueelesforam
utilizadoscomoumadasestrategiasdeformac;aodessamentalidadenacionalistall
aoapresentarumanarrac;aoquecriavaurnpassadounico,noqual0elementobranco
- emdetrimentodoindioe donegro- eravalorizadocomotrabalhador,istoe,
construtordoprogresso,emcontrastecomafiguradesprovidadedireitosapresentada
pelomovimentooperario.
OscarThompsonfoi opositordasinovac;oesmetodologicasintroduzidasno
ensinopor SampaioDoriae Lourenc;oFilho,quetambemfoi, comoeles,ativo
membrodaLiga(Hilsdorf,1998).Masostrespartilharamamesmamatrizpolitica
nacionalistadapedagogia,permitindoainserc;ao,nahistoriografiadaeducac;ao,dessa
vertentedaescolabrasileiradaPrimeiraRepublicanoperiododosanos10e20.
Bibliografia
BERNARDO, T. Memoriaembrancoe negro:olharessobreSaoPaulo.Sao
Paulo:EDUC/Ed.Unesp,1998.
BITTENCOURT,CirceM. F."Produ9aodidaticaeprogramasdeensinodases-
colaspaulistasnasprimeirasdecadasdoseculoXX". RevistadaFEUSp,15,2
(1989):167-187.
BOTO, C. J. M. R. "RascunhosdaEscolanaEncruzilhadadosTempos".Sao
Paulo:FEUSP,1990.
CARVALHO,M. M. C.de."MoldenacionaleFormaCivica:Higiene,Morale
TrabalhonoprojetodaAssocia{:QoBrasi/eiradeEduca{:Qo(1924-31)':SaoPaulo:
FEUSP,1986.
11 NoGinasiopublicodeSaoPauloaobrautilizadapara0ensinodehist6riaera0 LiqoesdeHis/ariadoBrasil.deJoaquim
Manuel de Macedo. conhecido autor do Imperio cuja ediqao de 1907 fora completada. para os acontecimentos entre
1823 e 1905. justamente por Olavo Bilac (Bittencourt. p. 176).
85
I
Hist6riadaEduca<;aoBrasileira
. "Notasparareavalia~aodomovimentoeducacionalbrasileiro
(1920-30)",CadernosdePesquisa,66(1988):4-11.
CAUVILLA, Waldir."0 PensamentoPoliticodeAlceuAmorosoLima(Tristao
deAthayde)nadecadade30':SaoPaulo:PUC, 1992.
CUNHA, C. da.Educar;aoe autoritarismonoEstadoNovo.SaoPaulo:Cortez
eAutoresAssociados,1981.
DEMARTINI, ZeiladeF."AEscolariza~aodapopula~aonegranacidadedeSao
Paulonasprimeirasdecadasdoseculo".RevistaAnde,14(1989):51-60.
FARIA Filho,L. "DosPardieirosaosPalacios:formaeculturaescolaremB.
Horizonte(1906-1918)':SaoPaulo:FEUSP,1996.
FREITAS, M. C.de.Damicro-historiaahistoriadasideias.SaoPaulo/Bragan~a
Paulista:Cortez/USFR,1999,pp.37-70.
GHIRALDELLI Jr.,P.Educar;aoemovimentoopenirio.SaoPaulo:CortezeAu-
toresAssociados,1987.
GIGLIO, C. M. B. 'j\ VozdoTrabalhador:sementesparaumanovasociedade':
SaoPaulo:FEUSP,1995.
HARDMAN, FranciscoF.Nempatria,nempatrao!:vidaoperariaeculturaanar-
quistanoBrasil.SaoPaulo:Brasiliense,1983.
HILSDORF,M. L. S."Louren~oFilhoemPiracicaba".Souza,CynthiaP.de.(org).
Historiadaeducar;ao:processos,praticasesaberes.SaoPaulo:Escrituras,1998.
IGLESIAS, Fr.TrajetoriapoliticadoBrasil,1500-1964.SaoPaulo:Companhia
dasLetras,1993.
INFANTOSI DA COSTA,A.M. "A Educa~aoparatrabalhadoresnoEstadode
SaoPaulo(1889-1930)".Revistado InstitutodeEstudosBrasileiros-USp,24
(1982):7-14.
.A EscolanaRepublicaVelha.SaoPaulo:Edec,1983.
JOMINI, R. C.M. "Educa~aoAnarquistanaRepublicaVelha:algumasideiase
iniciativaspedagogicas".Pre-Posir;i5es,3(Unicamp)(1990):37-55.
. Umaescolapara a solidariedade:contribui~aoaoestudodas
concep~oeserealiza~oeseducacionaisdosanarquistasnaRepublicaVelha.Cam-
pinas':Pontes,1990.
LUIZETTO,Fl. "Culturaeeduca~aolibertarianoBrasilnoiniciodoseculoXX".
RevistaEducar;aoeSociedade,12(1982):61-79.
. "0 MovimentoanarquistaemSaoPaulo:aexperienciadaEscola
Modernan21,1912-1919".RevistaEducar;aoeSociedade,24(1986):18-47.
86
Capitulo6: AsOutrasEscolasda PrimeiraRepublica
LUIZETTO, Fl. "Presenc;adoanarquismonoBrasil:urnestudodosepis6dios
litenirioeeducacional':SaoCarlos:UFSCAR, 1984.
MAZZOTI, T.B. "Educac;aopopularsegundoossindicalistasrevolucionariose
oscomunistasnaPrimeiraRepublica':SaoPaulo:FEUSP,1995.
MONARCHA, C.A reinvenr;GOdacidadeedamultidGo.SaoPaulo:Corteze
AutoresAssociados,1990.
MORAES, CarmenS.V. "Socializac;aodaForc;adeTrabalho:instruc;aopopular
equalificac;aoprofissionalnoEstadodeSaoPaulo,1873/1934':SaoPaulo:FFL-
CHUSP,1990.
MORILA, AiltonP."A EscoladaRua:cantandoavidanacidadedeSaoPaulo
(1870-1910)".SaoPaulo:FEUSP,1999.
NAGLE,1.Educar;GoeSociedadenaPrimeiraRepublica.SaoPaulo:EPU/Edusp,
1974.
."AEducac;aonaPrimeiraRepublica".FAUSTO,B. (org.).Historia
geraldacivilizar;Gobrasileira,v.9.SaoPaulo:Difel,1977.
OLIVEIRA, S.T.de."UmaColmeiaGigantesca:EscolaProfissionalFeminina
deSaoPaulo,1920/30':SaoPaulo:PUC, 1992.
PEIXOTO,A. M. C.Educar;GonoBrasil-Anos Vinte.SaoPaulo:Loyola,1983.
PERES,T.R. "Educac;aoRepublicana:tentativasdereconstruc;aodoensinose-
cundariobrasileiro,1889-1920':Araraquara:FCL, 1973.
PILETTI, N. "A ReformaFernandodeAzevedonoDistritoFederal,1927-30".
Estudosedocumentos,20.SaoPaulo:FEUSP,1983.
87

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Continue navegando