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262 POLÍTICA, PODER E ESTADO + PARA SABER MAIS • Sudão do Sul: um novo Estado Em 9 de julho de 2011, foi criado um novo país, a República do Sudão do Sul, formado a partir da independência da região sul do Su- dão. Como vários outros países, o Sudão do Sul tem sua origem em uma guerra: a san- grenta guerra civil entre o governo do Sudão e os rebeldes do Exército Popular da Liberta- ção do Sudão. Um dos motivos principais da guerra era o fato de que a maior parte das reservas de petróleo do Sudão se localizava no sul do país. Além disso, havia diversos conflitos étnicos entre os povos que compu- nham o Sudão. Em janeiro de 2005, as duas partes assina- ram um tratado de paz em Naivasha, no Quê- nia. O tratado previa para 2011 um referendo (votação popular para aprovar ou rejeitar uma proposta) que decidiria se o Sudão do Sul se tornaria independente. O referendo aconteceu em 7 de janeiro de 2011, e a maio- ria dos eleitores do Sudão do Sul optou pela independência. Desde então, uma das prioridades do governo do Sudão do Sul tem sido, como é caracterís- tico de um novo Estado, tentar desarmar a população, garantindo para si o monopólio da violência legítima. A Organização das Nações Unidas (ONU) financia um programa que bus- ca garantir a reinserção dos antigos comba- tentes da guerra contra o Sudão na vida civil. Não sabemos se esses esforços serão bem- -sucedidos, mas outros exemplos históricos nos permitem supor que não será fácil a con- solidação do Estado do Sudão do Sul. Na Eu- ropa, por exemplo, a consolidação dos Esta- dos Nacionais foi muito sangrenta: na Inglaterra, que hoje é um dos países mais es- táveis do mundo, houve grandes conflitos po- líticos e religiosos. Na América do Sul, a vio- lentíssima Guerra do Paraguai foi muito importante na consolidação dos Estados da região (inclusive o Brasil). É importante ter isso em mente para não achar que os atuais conflitos africanos são causados por algo específico das culturas dos povos da África. A consolidação dos Estados Nacionais sempre é difícil, e só nos resta espe- rar que os diversos setores da sociedade sul- -sudanesa, os países vizinhos da nova nação, e os órgãos de governança global (como a ONU) consigam que a construção do Sudão do Sul seja a menos violenta possível. 5. PARTIDOS POLÍTICOS Em uma democracia, deve haver liberdade para que todos apresentem pro- postas a serem discutidas com os demais cidadãos. Mas como cada cidadão, so- zinho, pode ter influência sobre todos os outros? Digamos que você tenha uma boa ideia sobre uma nova lei, ou sobre como o país deve ser governado. Como agir para que todos os outros brasileiros ouçam sua opinião e possam avaliar se você tem razão? Uma solução é juntar-se a outros cidadãos que pensam mais ou menos como você para ampliar sua influência. Essa é a ideia por trás dos partidos políticos. Os partidos políticos são associações que têm o objetivo de disputar o poder político. Quando você resolve se filiar a um partido político, sabe que as ideias do partido não vão ser exatamente iguais às suas (afinal, os outros membros do partido tam- bém têm o direito de dar suas opiniões, que nem sempre coincidirão com a sua). Mas, se fizer uma boa escolha, você vai optar pelo partido com ideias mais próxi- mas das suas. Boa parte da política consiste nisso: juntar-se a outras pessoas para defender ideias e interesses semelhantes. Como surgiram os partidos modernos? Sempre que há Estado, há grupos que lutam entre si para controlá-lo. Mesmo onde o rei tem poder absoluto existem grupos diferentes tentando convencê-lo a fazer coisas diferentes. Porém, esses gru- pos não são semelhantes aos partidos modernos, que se formaram quando o di- reito ao voto foi se tornando mais abrangente, passando a incluir os homens brancos de classe média e depois os mais pobres, os negros, as mulheres, etc. A partir desse momento, todos os grupos que queriam ganhar influência sobre o Estado precisaram correr atrás do apoio dos eleitores. 263 UNIDADE 3 | CAPÍTULO 11 Além disso, os operários formaram seus próprios partidos assim que puderam. Por que os mais pobres se esforçaram tanto para formar partidos? Porque os ricos têm outras formas de se fazer ouvir na política. Podem, por exemplo, comprar es- paço nos jornais para divulgar suas ideias. Os que não desejam concorrer a cargos no governo podem financiar as campanhas dos candidatos — que, em contraparti- da, precisarão ouvir o que seus financiadores querem. Já os pobres não podiam (nem podem) fazer nada disso. Portanto, quando se formaram, os partidos socia- listas e trabalhistas visavam juntar a contribuição financeira de milhares de pessoas para terem chance de competir com os mais ricos pelo poder político. A fundação dos partidos socialistas forçou a formação de outros grandes par- tidos, que representavam outros grupos sociais e outras ideias. Como notou o cientista político francês Maurice Duverger (1917-2014), em muitos países moder- nos a disputa costumaria ocorrer entre dois grandes partidos: 1. um partido de esquerda, que defende a cobrança de impostos dos mais ri- cos para oferecer benefícios aos mais pobres. São os partidos socialistas e semelhantes; 2. um partido de direita, que defende que o Estado não interfira muito na eco- nomia, para que ela cresça mais. São os partidos liberais ou conservadores. Nos Estados Unidos, há um partido um pouco mais à esquerda (o Partido De- mocrata) e outro um pouco mais à direita (o Partido Republicano). Na Inglaterra, essa distinção é mais evidente, com um partido claramente de esquerda (o Par- tido Trabalhista) e um partido claramente de direita (o Partido Conservador). Mesmo onde há mais de dois partidos importantes (no Brasil, como veremos, há bem mais que dois), é comum que os vários partidos se organizem em dois blo- cos: um mais à esquerda, outro mais à direita. Veja na seção BIOGRAFIAS quem é Maurice Duverger (1917-2014). H a rr y B e n s o n /R e v is ta T im e U K L a b o u r P a rt y /A rq u iv o d a e d it o raCapa da edição de 25 de maio de 1992 da revista Time, com o milionário Ross Perot, que concorreu à Presidência dos Estados Unidos naquele ano. Perot disputou essa eleição como candidato independente — ou seja, sem ser fi liado a um partido, o que é permitido nos Estados Unidos — e pagou boa parte de sua campanha com dinheiro do próprio bolso. Para quem não pode custear suas próprias campanhas, resta a alternativa de ingressar em um partido (ou formar um novo). Cartaz de campanha do Partido Trabalhista Inglês, de 1923. O texto diz: “Use a cabeça! Apoie alguém do seu próprio time, vote nos trabalhistas”. VOCÊ JÁ PENSOU NISTO? Muita gente no Brasil diz que não gosta de par- tidos políticos porque “vota em pessoas, não em partidos”. Vale a pena pensar em alguns problemas que essa atitude pode acarretar. Por exemplo, nem todos os partidos defendem as mesmas coisas. O partido que o candidato escolheu não refl ete suas opiniões a respeito de assuntos importantes? Além do mais, como o Brasil é um país em que os votos costumam se dividir entre muitos partidos, o candidato provavelmente vai ter de fazer alian- ças com outros partidos para conseguir governar. Sem saber de que partido ele é, como saber quais partidos são seus aliados? Será que você concorda com o que esses outros partidos defendem? 264 POLÍTICA, PODER E ESTADO VOCÊ APRENDEU QUE: ✔ Poder é a capacidade de impor sua vontade sobre as outras pessoas, mesmo contra a vontade delas. ✔ A política é a luta por participar do poder ou influenciar sua repartição, seja no Estado, seja entre os Estados, seja nos grupos de pessoas que compõem o Estado. ✔ Existem vários motivos, além da força, que levam as pessoas a obedecer. Se por algum motivo as pessoas concordam em obedecer, dizemos que há dominação legítima.✔ Entre os tipos de dominação legítima, Weber destacou a dominação tradicional, a racional-legal e a carismática. ✔ O Estado busca obter o monopólio da violência legítima em determinado território. ✔ Pode-se dizer que a Ciência Política foi fundada por Maquiavel, que defendia estudar a política não apenas como ela deveria ser, mas também como ela é. ✔ Os contratualistas discutiram o que o Estado podia ou não fazer. Para Hobbes, o Estado poderia fazer tudo, desde que garantisse a segurança da população. Para Locke, só poderia fazer o necessário para proteger os direitos naturais à liberdade e à propriedade. E, para Rousseau, o Estado não poderia fazer nada se suas leis não seguissem a vontade geral dos próprios cidadãos. ✔ Regimes políticos são o conjunto das instituições, leis e valores que regulam a disputa pelo poder. ✔ Democracia é um regime em que os membros do Poder Legislativo são eleitos pelo voto de todos os cidadãos, em eleições livres disputadas por mais de um partido. Nos regimes presidencialistas, os cidadãos geralmente votam no chefe de governo do Poder Executivo; nos parlamentaristas, o ocupante desse cargo, de modo geral, é escolhido pelos parlamentares eleitos pela população. ✔ Partidos políticos são grupos organizados com o objetivo de conquistar o poder. Nas disputas entre os partidos modernos, para conquistar a maioria e vencer a eleição, os partidos principais precisam disputar a simpatia (o voto) do centro: pessoas que não são nem muito de esquerda, nem muito de direita. Para isso, te- rão que se tornar menos inflexíveis. A esquerda, por exemplo, vai ter de aceitar cobrar menos impostos do que gostaria. A direita, por sua vez, vai ter de concor- dar em oferecer alguns serviços sociais à população mais pobre. Esse elemento de moderação proporcionado pela disputa por votos é impor- tante para a manutenção da democracia moderna. Mas também traz sérios pro- blemas. Há o risco de os partidos pararem de defender qualquer ideia e se torna- rem iguais. Nesse caso, as pessoas realmente interessadas em defender alguma ideia poderiam perder o interesse na democracia. Esse é um dos grandes desa- fios da democracia moderna, como veremos no último capítulo deste livro. B ru n o V in c e n t/ A g ê n c ia F ra n c e -P re s s e