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Resumo de Patologia - Reparo Tecidual

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Reparo 
 
A lesão a células e tecidos coloca em movimento uma série de eventos que 
contém a lesão e inicia o processo de cura. De um modo geral, esse processo pode ser 
dividido em regeneração e reparo. A regeneração resulta na restituição completa do 
tecido perdido ou lesado; o reparo pode restaurar algumas estruturas originais, mas 
pode causar desarranjos estruturais. A regeneração refere-se à proliferação de células 
e tecidos para substituir estruturas perdidas, como o crescimento, em anfíbios, de um 
membro amputado. Nos mamíferos, órgãos inteiros e tecidos complexos raramente se 
regeneram após lesão e o termo é geralmente aplicado a processos como crescimento 
hepático após ressecção parcial ou necrose, porém esses processos consistem em 
crescimento compensatório, em vez de uma regeneração verdadeira. O reparo consiste 
em mais frequentemente em uma combinação de regeneração e formação de cicatriz 
pela deposição de colágeno. A inflamação crônica que acompanha a lesão persistente 
estimula também a formação de cicatriz, devido à produção local de fatores de 
crescimento e citocinas que promovem a proliferação de fibroblastos e síntese de 
colágeno. O termo fibrose é usado para descrever a extensa deposição de colágeno 
que ocorre sob essas condições. 
 
Atividade proliferativa do tecido 
→Os tecidos do corpo são divididos em três grupos com base na atividade proliferativa 
das suas células: tecidos em divisão contínua (tecidos lábeis), quiescentes (tecidos estáveis) e 
tecidos que não se dividem (tecidos permanentes). 
→Em tecidos que se dividem continuamente, as células proliferam por toda a vida, 
substituindo aquelas que são destruídas. Esses tecidos incluem os epitélios superficiais, como o 
epitélio estratificado escamoso da pele, cavidade oral, vagina e colo uterino; a mucosa de 
revestimento de todos os ductos excretores das glândulas do corpo (p. ex., glândulas salivares, 
pâncreas, vias biliares); o epitélio colunar do trato gastrointestinal e do útero; o epitélio de 
transição das vias urinárias, e células da medula óssea e tecidos hematopoiéticos. Na maioria 
desses tecidos, as células teciduais maduras são derivadas de células-tronco adultas, as quais 
possuem uma enorme capacidade de proliferação e cuja progênie pode diferenciar-se em vários 
tipos celulares. 
→Tecidos quiescentes normalmente possuem um baixo nível de replicação; entretanto, 
as células desses tecidos podem sofrer rápida divisão em resposta a estímulos e, portanto, são 
capazes de reconstituir o tecido de origem. Nesta categoria, estão as células parenquimatosas 
do fígado, rins e pâncreas; células mesenquimais como os fibroblastos e de músculo liso; células 
endoteliais vasculares, linfócitos e outros leucócitos. A capacidade regenerativa das células 
estáveis é mais bem exemplificada pela capacidade do fígado de sofrer regeneração após 
hepatectomia parcial e após lesão química aguda. Fibroblastos, células endoteliais, células 
musculares lisas, condrócitos e osteócitos são quiescentes em mamíferos adultos, mas 
proliferam em resposta à lesão. 
Tecidos que não se dividem contêm células que deixaram o ciclo celular e não podem 
sofrer divisão mitótica na vida pós-natal. A esse grupo pertencem os neurônios e células 
musculares cardíacas e esqueléticas. Se neurônios do sistema nervoso central forem destruídos, 
o tecido é geralmente substituído pela proliferação dos elementos de suporte do sistema 
nervoso central, as células gliais. 
 
 
Ciclo celular e a regulação da replicação celular 
→A replicação das células é estimulada por fatores de crescimento ou por sinalização dos 
componentes da matriz extracelular, através das integrinas. Para alcançar a replicação e divisão 
do DNA, a célula passa por uma sequência de eventos estreitamente controlados conhecida 
como ciclo celular. O ciclo celular consiste nas fases G1 (pré-síntese), S (síntese de DNA), G2 (pré-
mitótica) e M (mitótica) As células quiescentes, que não entraram no ciclo celular, estão no 
estado G0. As células podem entrar em G1 a partir de G0 (células quiescentes) ou após 
completarem a mitose (células que se dividem continuamente). As células quiescentes devem, 
primeiramente, passar pela transição de G0 para G1, a primeira etapa de decisão, que funciona 
como uma entrada para o ciclo celular. Essa transição envolve a ativação transcricional de um 
grande conjunto de genes, que inclui proto-oncogenes e genes necessários para a síntese de 
ribossomos e translação da proteína. As células em G1 progridem através do ciclo e alcançam 
um estágio crítico na transição G1/S, conhecida como ponto de restrição, uma etapa de 
limitação da velocidade para a replicação. Passando por esse ponto de restrição, as células 
normais tornam-se irreversivelmente comprometidas com a replicação do DNA. A progressão 
através do ciclo celular, particularmente na transição G1/S, é estreitamente regulada por 
proteínas chamadas ciclinas e enzimas associadas chamadas cinases ciclina-dependentes (CDK). 
As CDK adquirem atividade catalítica quando se ligam e formam complexos com as ciclinas. As 
CDK ativadas nesses complexos direcionam o ciclo celular através de fosforilação de proteínas 
que são críticas para as transições do ciclo celular. A atividade dos complexos CDK-ciclina é 
altamente regulada por inibidores de CDK. Alguns fatores de crescimento desligam a produção 
desses inibidores. 
 
Cura por Reparo, formação de cicatriz e fibrose 
 Quando a lesão ao tecido é grave ou crônica e resulta em lesão das células 
parenquimatosas e do arcabouço de estroma, a cura não pode ser efetuada por regeneração. 
Sob estas condições, o principal processo de cura ocorre por deposição de colágeno e outros 
elementos da MEC, promovendo a formação de uma cicatriz. O reparo pela deposição de tecido 
conjuntivo inclui as seguintes características básicas: (1) Inflamação; (2) Angiogênese; (3) 
Migração e proliferação de fibroblastos; (4) formação de cicatriz; (5) remodelamento do tecido 
conjuntivo. 
 
Angiogênese 
Angiogênese é um processo fundamental que afeta reações fisiológicas (p. ex., cura de feridas, 
regeneração, vascularização de tecidos isquêmicos e menstruação) e processos patológicos, 
como o desenvolvimento de tumores e metástase, retinopatia diabética e inflamação crônica. 
 
Angiogênese a partir de Vasos Preexistentes: há vasodilatação e aumento da permeabilidade 
dos vasos existentes, degradação da MEC e migração das células endoteliais. As principais etapas 
são: (1) vasodilatação em resposta ao óxido nítrico e aumento da permeabilidade dos vasos 
preexistentes induzido pelo fator de crescimento endotelial vascular (VEGF). (2) Degradação 
proteolítica da membrana basal do vaso original pelas metaloproteinases de matriz (MMP) e 
rompimento do contato célula-célula entre células endoteliais pelo ativador do plasminogênio. 
(3) Migração das células endoteliais em direção ao estímulo angiogênico. (4) Proliferação de 
células endoteliais, logo atrás da frente de células migratórias. (5) Maturação das células 
endoteliais, que inclui inibição do crescimento e remodelagem em tubos capilares. (6) 
Recrutamento de células periendoteliais (pericitos e células musculares lisas vasculares) para 
formar o vaso maduro. 
 
Angiogênese a partir de Células Precursoras Endoteliais (EPC): As EPC podem ser recrutadas da 
medula óssea para os tecidos e iniciar a angiogênese. A natureza do mecanismo de migração é 
incerta. Essas células expressam alguns marcadores de células-tronco hematopoiéticas, bem 
como VEGFR-2 e caderina-endotelial vascular (caderina-VE). As EPC contribuem para a 
reendotelização de implantes vasculares e a neovascularização de órgãos isquêmicos, feridas 
cutâneas e tumores. O número de EPC circulantes aumenta grandemente em pacientes com 
condições isquêmicas, sugerindo que as EPC influenciam a função vascular e determinam o risco 
de doenças cardiovasculares. 
 
Cura de feridas cutâneas 
 O tipo mais simples de reparo de ferida cutânea é o reparode uma incisão cirúrgica 
limpa não infectada, aproximada por suturas cirúrgicas. Tal tipo de cicatrização é denominado 
cura por união primária ou por primeira intenção. A incisão provoca a morte de um número 
limitado de células epiteliais e células do tecido conjuntivo, bem como ruptura da continuidade 
da membrana basal. A reepitelização para fechar a ferida ocorre com a formação de uma cicatriz 
relativamente fina. O processo de reparo é mais complicado em feridas de excisão que criam 
grandes defeitos na superfície da pele, provocando perda excessiva de células e tecidos. A cura 
dessas feridas envolve uma reação inflamatória mais intensa, formação de abundante tecido de 
granulação (descrita adiante) e extensa deposição de colágeno, levando à formação de cicatriz 
substancial que geralmente se contrai. Essa forma de cura é denominada união secundária ou 
cura por segunda intenção. 
 
Sequência de eventos da cicatrização: 
(1) Formação do Coágulo Sanguíneo. A ferida causa a rápida ativação das vias de 
coagulação, que resultam na formação de um coágulo sanguíneo na superfície da ferida 
Contudo, ocorre desidratação na superfície externa do coágulo, formando uma crosta 
que cobre a ferida. Dentro de 24 horas, neutrófilos aparecem nas bordas da incisão e 
migram para o coágulo, usando o arcabouço produzido pela fibrina. Essas células 
liberam enzimas proteolíticas que removem os restos necróticos e bactérias. 
(2) Formação do Tecido de Granulação. Nas primeiras 24 a 72 horas do processo de reparo, 
os fibroblastos e as células endoteliais vasculares proliferam e formam um tipo 
especializado de tecido chamado tecido de granulação. Progressivamente, o tecido de 
granulação invade o espaço da incisão; Por volta de 5 a 7 dias, o tecido de granulação 
preenche a área da ferida e a neovascularização atinge seu ponto máximo. 
(3) Proliferação Celular e Deposição de Colágeno. Por volta de 48 a 96 horas, os neutrófilos 
são amplamente substituídos por macrófagos. Os macrófagos representam os 
constituintes celulares chave do reparo tecidual, removendo resíduos extracelulares, 
fibrina e outros materiais estranhos do local de reparo e promovendo angiogênese e 
deposição de MEC. 
(4) Formação da Cicatriz. O infiltrado leucocitário, o edema e o aumento da vascularização 
desaparecem, em grande parte, durante a segunda semana. Inicia-se o 
empalidecimento, devido ao aumento do acúmulo de colágeno na área da ferida e a 
regressão dos canais vasculares. Finalmente, o arcabouço de tecido de granulação 
original é convertido em uma cicatriz avascular e pálida, composta de fibroblastos 
fusiformes, colágeno denso, fragmentos de tecido elástico e outros componentes da 
MEC. 
(5) Contração da Ferida. A contração da ferida ocorre geralmente em grandes feridas de 
superfície. A contração ajuda a fechar a ferida diminuindo a lacuna entre suas margens 
dérmicas e reduzindo a área de superfície da ferida. Portanto, esta é uma característica 
importante na cura por união secundária 
(6) Remodelamento do Tecido Conjuntivo. A substituição do tecido de granulação por uma 
cicatriz envolve alterações na composição da MEC. O equilíbrio entre síntese e 
degradação da MEC resulta no remodelamento da trama de tecido conjuntivo – uma 
característica importante do reparo tecidual. 
 
Fatores que influencia a cura de feridas 
 
Sistêmicos: (1) nutrição exerce profundos efeitos sobre a cicatrização. Por exemplo, a deficiência 
de proteína e, em particular, a deficiência de vitamina C inibem a síntese de colágeno e retardam 
a cicatrização. (2) O estado metabólico pode alterar a cura de feridas. Por exemplo, o diabetes 
melito está associado ao atraso da cicatrização, como consequência de microangiopatia, 
característica frequente desta doença; (3) o estado circulatório pode regular a cura de feridas. 
Geralmente, o suprimento sanguíneo inadequado, causado por arteriosclerose ou por 
anomalias venosas (p. ex., veias varicosas) que retardam a drenagem venosa, também 
compromete a cura. (4) Os hormônios, como os glicocorticoides, possuem efeitos anti-
inflamatórios bem documentados que influenciam vários componentes da inflamação. Esses 
agentes inibem a síntese de colágeno. 
 
Locais: (1) A infecção é a única causa mais importante de retardo da cura, porque resulta em 
lesão e inflamação persistentes. (2) Os fatores mecânicos, como o movimento precoce das 
feridas, podem retardar a cura, por compressão dos vasos sanguíneos e separação das margens 
da ferida. (3) Os corpos estranhos, como suturas desnecessárias ou fragmentos de aço, vidro, 
ou até mesmo osso, constituem impedimento para a cura. (4) O tamanho, a localização e o tipo 
de ferida. As feridas em áreas ricamente vascularizadas, como a face, cicatrizam mais 
rapidamente do que aquelas situadas em áreas mal vascularizadas, como o pé. As pequenas 
lesões incisionais cicatrizam mais rápido e com menor formação de cicatriz do que as grandes 
feridas excecionais ou feridas causadas por traumatismo penetrante. 
 
Aspectos patológicos do reparo 
As complicações na cura de feridas podem surgir de anormalidades em qualquer um dos 
componentes básicos do processo de reparo. Essas aberrações podem ser agrupadas em três 
categorias gerais: (1) formação deficiente da cicatriz, (2) formação excessiva dos componentes 
do reparo e (3) formação de contraturas. 
A formação inadequada do tecido de granulação ou a organização da cicatriz pode levar 
a dois tipos de complicações: deiscência da ferida e ulceração. A deiscência ou ruptura de uma 
ferida é mais comum após cirurgia de abdome, sendo devida a um aumento da pressão 
abdominal. Vômitos, tosse ou íleo podem produzir um estresse mecânico sobre a ferida 
abdominal. As feridas podem ulcerar em consequência de uma vascularização inadequada 
durante a cura. Por exemplo, as feridas nos membros inferiores de indivíduos com doença 
vascular periférica aterosclerótica tipicamente ulceram. Feridas que não cicatrizam também se 
formam em áreas destituídas de sensação. 
A formação excessiva dos componentes do processo de reparo pode originar cicatrizes 
hipertróficas e queloides. O acúmulo de quantidades excessivas de colágeno pode gerar uma 
cicatriz saliente conhecida como cicatriz hipertrófica; quando a cicatriz cresce além das margens 
da ferida original, sem regredir, é chamada de queloide. A formação de queloide parece ser uma 
predisposição individual e, por motivos desconhecidos, essa aberração é um pouco mais comum 
em negros. 
Outro desvio na cura de feridas consiste na formação de quantidades excessivas de 
tecido de granulação, que fazem protrusão acima do nível da pele circundante e bloqueiam a 
revitalização. Esse processo é denominado granulação exuberante (ou com mais fervor literário, 
carne esponjosa). A granulação excessiva deve ser removida por cauterização ou por excisão 
cirúrgica para permitir a restauração da continuidade do epitélio. 
A contração no tamanho de uma ferida constitui uma parte importante do processo 
normal de cicatrização. Um exagero desse processo origina a contratura e resulta em 
deformidades da ferida e dos tecidos circundantes. As contraturas são particularmente 
propensas a desenvolver-se nas palmas das mãos, plantas dos pés e face anterior do tórax. As 
contraturas são comumente observadas após queimaduras graves e podem comprometer o 
movimento das articulações 
Fibrose 
A deposição de colágeno é parte do processo normal de cura. Entretanto, o termo 
fibrose é usado mais amplamente para denotar a deposição excessiva de colágeno e outros 
componentes da MEC em um tecido. Os mecanismos básicos que ocorrem no desenvolvimento 
da fibrose associada a doenças inflamatórias crônicas são geralmente semelhantes aos 
mecanismos de cura de feridas cutâneas, 
O TGF-β é produzido pela maioria das células do tecido de granulação e induz a migração 
e proliferação de fibroblastos, aumenta a síntese de colágeno e fibronectina e diminui a 
degradação da MEC devido à inibição das metaloproteinases.

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