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Tutorial 5: Dor oncológica 1. Entender a dor oncológica. 1.1 Epidemiologia 1.2 Fisiopatologia 1.3 Localização 1.4 Avaliação CRITÉRIOS FUNDAMENTAIS • A dor causada pelo câncer é extremamente apavorante, mas na maioria dos casos pode ser facilmente controlada. • A dor causada pelo câncer comumente é atribuída aos efeitos diretos do tumor, ao tratamento da neoplasia maligna ou a outros distúrbios não-relacionados com a doença e seu tratamento. • Estudos mostraram que alguns grupos estão sob risco de receber avaliação e tratamento inadequados, inclusive minorias, crianças, idosos, indivíduos com história de dependência química e pacientes com déficits cognitivos. • As abordagens terapêuticas farmacológicas incluem analgésicos não-opioides, opioides e coadjuvantes, antineoplásicos e, em alguns casos, técnicas intervencionistas. • As intervenções terapêuticas não-farmacológicas podem dar suporte ao tratamento farmacológico e incluem abordagens cognitivo-comportamentais e procedimentos físicos como órtese, exercícios terapêuticos, aplicações de calor e frio e utilização de dispositivos auxiliares. • CONSIDERAÇÕES INICIAIS + EPIDEMIOLOGIA A dor é um sintoma relativamente comum nos pacientes com diagnóstico de câncer e sua prevalência estimada varia de 14 a 100%. Por ocasião do diagnóstico, cerca de 20 a 75% dos adultos referem dor, enquanto 23 a 100% dos pacientes com doença avançada sentem dor. Segundo a OMS, a dor oncológica é bem controlada em mais de 90% dos casos, sendo o restante considerado dor de difícil controle. Estimativa para 2020 pelo INCA traz a incidência para homens com a maior porcentagem para próstata (29,2%) e para mulheres, mama (29,7%); a maior mortalidade para homens pelo câncer de pulmão, traqueia e brônquios (14%) e para mulheres, mama (16,1%). • ETIOLOGIA + LOCALIZAÇÃO A dor pode ser de característica nociceptiva ou neuropática, e a maioria dos indivíduos apresenta mais de um tipo de dor (dor mista). E comum a dor relacionada ao câncer estar presente nos tumores sólidos, que geram efeito de massa sobre as estruturas vizinhas. Esses tumores podem comprimir estruturas nervosas ou vasculares e ocasionar infiltração óssea ou de vísceras ocas ou sólidas. Além disso, os nociceptores são estimulados por substâncias liberadas pelo tumor ou pelas células inflamatórias, que são algogênicas. O tratamento da doença também é uma causa de dor, geralmente aguda, mas que pode, eventualmente, se tornar crônica. As cirurgias que em geral podem deixar sequelas dolorosas são: mastectomias, toracotomias e amputações (dor fantasma). A quimioterapia e a radioterapia também podem ser seguidas de dor crônica: neuropatias actínicas ou periféricas, mucosites, queimaduras cutâneas, entre outras. As principais causas RELACIONADAS AO CÂNCER são: ➢ INFILTRAÇÃO ÓSSEA. É a causa mais comum de dor, podendo manifestar-se localmente ou à distância, pelo mecanismo de dor referida. As metástases ósseas mais comuns são as provenientes dos tumores de mama, próstata e pulmão. Ela ocorre por conta de estimulação nociva nos nociceptores no periósteo. O crescimento tumoral ou as fraturas secundárias podem ocasionar lesão, compressão, tração ou laceração das estruturas nervosas, ocasionando dor isquêmica, dor neuropática periférica ou dor mielopática (dor crônica após lesão medular). A dor óssea se manifesta com sensação de dor constante, profunda, às vezes contínua, e surge com os movimentos (dor incidental). ➢ COMPRESSÃO OU INFILTRAÇÃO DE NERVOS PERIFÉRICOS. A infiltração ou compressão de troncos, plexos e/ou raízes nervosas pelo tumor, linfonodos e/ou fraturas ósseas metastáticas pode determinar dor aguda de forte intensidade, resultando em plexopatia, radiculopatia ou neuropatia, ou seja, dor na distribuição da estrutura nervosa acometida, com apresentação de dor em queimação, contínua, hiperestesia, disestesia e perda progressiva da sensibilidade. Por exemplo, as neoplasias de cabeça e pescoço podem causar compressão dos plexos cervicais; os tumores de mama podem atingir o plexo braquial; as neoplasias de colo uterino e próstata podem atingir o plexo sacrolombar. Nesses casos, estão envolvidos mecanismos de dor por nocicepção, gerado por persistente estímulo nocivo (lesivo) mecânico de alta intensidade pela expansão tumoral e mecanismos de desaferentação pela lesão dos nervos e membranas nervosas. ➢ INFILTRAÇÃO DO NEUROEIXO (SNC). Pode ocorrer dor por invasão tumoral na medula espinal, no encéfalo e em suas meninges. A dor radicular surge por compressão ou infiltração da medula espinal (considerada urgência médica), com alteração motora, sensitiva e autonômica distais ao local da lesão. Podem os observar, além da dor radicular, a primeira manifestação do comprometimento raquimedular, a dor mielopática localizada e a dor fantasma. A cefaleia insidiosa e progressiva, sonolência, confusão mental, convulsões e coma surge como manifestação das metástases encefálicas. ➢ INFILTRAÇÃO E OCLUSÃO DOS VASOS SANGUÍNEOS E LINFÁTICOS. Ocasionando vasoespasmo, linfangite e possível irritação nos nervos aferentes perivasculares. O crescimento tumoral pode levar à oclusão desses vasos parcial ou totalmente, produzindo estase venosa ou isquemia arterial, ou ambos, causando dor e claudicação, edema, hipóxia e destruição celular. Esses mecanismos causam dor normalmente difusa, cuja intensidade aumenta com a progressão do processo. ➢ INFILTRAÇÃO DE VÍSCERAS OCAS OU INVASÃO DE SISTEMAS DUCTAIS DE VÍSCERAS SÓLIDAS. A oclusão de órgãos dos sistemas digestório, urinário e reprodutivo produz obstrução do esvaziamento visceral, dor visceral difusa (tipo cólica) constante. Órgãos como linfonodos, fígado, pâncreas e suprarrenais podem vir a apresentar dor devido à isquemia ou distensão de suas cápsulas. Nos tumores de fígado, baço, rim e ósseos, o edema e a venocongestão ocasionam distensão das estruturas de revestimento e estruturas nociceptivas. Nos tumores de cabeça e pescoço, tumores do trato gastrintestinal e geniturinário, podem ocorrer ulceração das membranas mucosas, infecção e necrose, e ulceração determinando dor intensa. As principais causas RELACIONDAS AO TRATAMENTO são: ➢ DOR PÓS-CIRÚRGICA. Na fase aguda, a dor decorre do processo inflamatório traumático de cirurgias, como toracotomias, esternotomias, amputações e mastectomias. Na fase crônica, a dor ocorre devido ao câncer recidivado localmente. O trauma ocasionado em estruturas nervosas, durante o procedimento cirúrgico, resulta, comumente, em dor persistente além do normal, chamada neuralgia pós-cirúrgica; as dores incisionais e cicatriciais são frequentes após toracotomias, laparotomias, esvaziamento cervicais e amputações de membros, de reto e de mama. A dor-fantasma surgindo em menos de 5% dos casos de amputação, tem como característica a presença da imagem do órgão amputado, com dor em queimação e sensação de formigamento e latejamento. ➢ DOR PÓS-RADIOTERAPIA. A dor pós-radioterapia apresenta-se como exacerbação aguda de dor crônica relacionada ao posicionamento para a terapia, queimaduras cutâneas, mucosite bucal, esofagite, obstrução intestinal parcial e infarto ou isquemia intestinal. Após a radioterapia, pode ocorrer fibrose de forma lenta e progressiva, ocasionando lesão nas adjacências dos nervos, com dor em queimação e disfunção do sistema somatossensorial. ➢ DOR PÓS-QUIMIOTERAPIA. A dor pode ocorrer por polineuropatias periféricas, causadas por drogas imunossupressoras, podendo ser de caráter transitório ou definitivo. Existem as mucosites induzidas por leucopenia ou irradiação junto com a monilíase do sistema digestório e a esofagogastroduodenite. Também podem ocorrer espasmos vesicais e a necrose asséptica da cabeça do fêmur, causados por corticoides. Entre outros. Dor NÃO RELACIONADA AO CÂNCER ou ao seu tratamento representam 3% do total e podem ser causadas por:osteomielite, cefaleia tensional, osteoartrite, osteoporose, neuropatia diabética, entre outras. • TIPOS DE DOR A s síndromes dolorosas podem ser agudas ou crônicas, nociceptivas, neuropáticas, psicogênicas e/ou mistas. A natureza da dor nociceptiva somática é descrita como dolorosa, latejante, pulsátil ou opressiva; é a mais comum no câncer e causada por estímulos aferentes de grande intensidade. A dor visceral é do tipo cãibra ou cólica, aperto ou latejante. A dor é neuropática se a avaliação sugerir que é mantida por processos somatossensoriais anormais no sistema nervoso periférico (SNP) ou central (SNC); ela surge quando há disfunção do SNP e/ou do SNC, por invasão tumoral ou pelo tratamento do câncer, e o que ocorre é uma disfunção das vias que transmitem dor, levando a uma transmissão crônica dos sinais dolorosos. A dor pode ser definida como psicogênica se houver evidência positiva de que os fatores psicológicos predominam na manutenção do sintoma sem nenhuma evidência de causa orgânica. • AVALIAÇÃO Como o risco de desenvolver dor associada ao câncer é elevado, sempre se deve fazer uma triagem em todos os pacientes que têm neoplasias malignas e que buscam atendimento em uma clínica, ou quando são internados nos hospitais. Qualquer queixa de dor deve justificar uma avaliação abrangente. A dor física e a dor psíquica (sofrimento) estão intimamente relacionadas, o que demonstra a importância da interdisciplinaridade na abordagem do paciente com dor oncológica. A dor associada ao câncer pode ser classificada de várias maneiras, inclusive com base na duração (aguda versus crônica), na intensidade (leve, moderada ou intensa), na qualidade da dor (neuropática, nociceptiva ou mista) e no seu padrão temporal (contínua, exacerbação ou ambas). 1. Utilização de instrumentos válidos nessa população, levando-se em consideração a idade e as dificuldades de comunicação do paciente. 2. Obtenção da história dos fármacos utilizados atualmente e no passado e também a eficácia e quaisquer efeitos adversos desses fármacos. 3. Consideração das síndromes dolorosas associadas mais comumente ao câncer, durante a obtenção da história e a realização do exame físico. 4. Avaliação da limitação funcional e da necessidade de se implementarem medidas de segurança. 5. Inclusão do componente psicossocial na avaliação, inclusive a definição das metas de assistência do paciente e da sua família. 6. Elaboração de um diário da dor para se avaliarem a eficácia dos tratamentos e as alterações do padrão da dor. 7. Solicitação de exames diagnósticos (p. ex., ressonância magnética, tomografia computadorizada, exames laboratoriais) indicados e apenas quando eles puderem contribuir para o planejamento do tratamento. 8. Avaliação dos pacientes quanto à existência de outros sinais e sintomas, porque a dor está frequentemente associada a queixas de fadiga, prisão de ventre e transtornos de humor. 2. Compreender os cuidados paliativos (farmacológicos e não farmacológicos). É importante ressaltar que o melhor tratamento para a dor é aquele que trata sua causa. Mas quando isso não é possível, o alívio adequado e eficaz da dor oncológica pode ser obtido com uma boa relação médico-paciente, após avaliação do estadiamento da doença e do tempo de sobrevida do paciente, além de seus aspectos psicológicos e sociais. O tratamento inicia-se com uma explicação ao paciente sobre as causas das dores oncológicas. Muitas delas são tratadas com a combinação de medicamentos e métodos não medicamentosos. O tratamento antiblástico e o controle álgico devem ser aplicados simultaneamente. Os princípios da farmacoterapia propostos pela OMS podem ser resumidos em cinco tópicos: escada, via oral, intervalos fixos (pelo relógio), individualização e atenção aos detalhes. ➢ ESCADA Em 1986, a OMS propôs um método para alívio das dores oncológicas: a ''ESCADA ANALGÉSICA'': • o primeiro degrau recomenda o uso de medicamentos não opioides (dipirona, paracetamol, aine) + adjuvantes (antidepressivos, anticonvulsivantes, neurolépticos, bifosfonados, corticosteroides, etc.) para dores fracas; Suas desvantagens estão relacionadas, em especial, aos seus efeitos colaterais, como doença péptica, insuficiência renal, disfunção plaquetária e interação medicamentosa. Possuem como vantagens mecanismo de ação e toxicidade diferentes dos opioides e, portanto, podem ser associados a eles. Não há desenvolvimento de tolerância. • o segundo degrau sugere opioides fracos (codeína, tramadol), que podem ser associados a analgésicos simples do primeiro degrau ou adjuvantes, para dores moderadas; Recomendam-se utilizar analgésicos opioides agonistas puros como primeira opção terapêutica. • o terceiro degrau consta de opioides fortes (morfina, fentanil, oxicodona), associados ou não aos não opioides ou adjuvantes, para dores fortes. ➢ VIA ORAL Sempre que possível, os analgésicos devem ser administrados pela via oral. Vias de adm alternativas, como retal, transdérmica ou parenteral, podem ser úteis em pacientes com disfagia, vômitos incoercíveis ou obstrução intestinal. ➢ INTERVALOS FIXOS Os analgésicos devem ser administrados em intervalos regulares. A dose subsequente precisa ser administrada antes que o efeito da dose anterior tenha terminado. A dose do analgésico precisa ser condicionada à dor do paciente, ou seja, inicia-se com doses pequenas, sendo progressivamente aumentada até que receba alívio completo. Alguns pacientes que utilizam opioides necessitam de doses de resgate além das doses regulares. ➢ INDIVIDUALIZAÇÃO Não existem doses padronizadas para os opioides. A dose correta é a que causa alívio da dor com o mínimo de efeitos colaterais. ➢ ATENÇÃO AOS DETALHES Deve-se enfatizar a necessidade da administração regular dos medicamentos analgésicos. Os horários dos medicamentos devem ser detalhadamente explicados e possíveis complicações e efeitos colaterais devem ser antecipados, sendo tratados profilaticamente. Apesar do alto índice de efetividade da analgesia para pacientes oncológicos com a prescrição segundo a escada, existe falha em 10 a 30%. Uma porção significativa dos pacientes com câncer necessita receber outras estratégias, como vias alternativas de administração de fármacos, bloqueios anestésicos e procedimentos neuroablativos, como exemplo, neoplasia pancreática submetidos a bloqueio neurolítico de plexo celíaco. Os tratamentos não farmacológicos como as técnicas cognitivo-comportamentais (inclui estratégias que promovem a capacidade de enfrentamento e acentuam o relaxamento, por exemplo, imaginação dirigida, musicoterapia, orações e recomposição) e as modalidades físicas (como massagem, reflexologia, calor, quiropatia e outras técnicas), podem funcionar como coadjuvantes aos analgésicos. Essas abordagens terapêuticas são particularmente úteis para controlar os períodos de aumento da intensidade da dor, enquanto se aguarda o início da ação dos analgésicos de liberação imediata. 3. Conhecer as respostas comportamentais desencadeadas pela dor. O não controle da dor no câncer está associado com o significativo aumento dos níveis de depressão, ansiedade, hostilidade e somatização (sintomas físicos, mas que possuem a origem psicológica). O sofrimento desses pacientes é resultado da interação da percepção dolorosa associada à incapacidade física, ao isolamento social e familiar, às preocupações financeiras, ao medo da mutilação e da morte, definindo o quadro de dor total descrito por Cecily Saunders: Física, Emocional, Espiritual e Social. Em muitos pacientes e seus familiares, o diagnóstico de uma doença potencialmente fatal gera angústia existencial significativa. Embora alguns pacientes e seus familiares descubram que esse é um período de grande crescimento pessoal, outros costumam se sentir frustrados, desesperançosos e ansiosos. As questões espirituais e a sensação de perda designificado podem aflorar. Esses aspectos se mesclam à mágoa e ao sofrimento psíquico experimentados pelos entes queridos e pelos outros cuidadores. A psiquiatra Elisabeth Kubler-Ross conseguiu identificar a reação psíquica de cada paciente em estado terminal e elaborou as cinco fases do luto: Fase 1) Negação: Seria uma defesa psíquica que faz com que o indivíduo acaba negando o problema, tenta encontrar algum jeito de não entrar em contato com a realidade seja da morte de um ente querido ou da perda de emprego. É comum a pessoa também não querer falar sobre o assunto. Fase 2) Raiva: Nessa fase o indivíduo se revolta com o mundo, se sente injustiçada e não se conforma por estar passando por isso. Fase 3) Barganha: Essa é fase que o indivíduo começa a negociar, começando com si mesmo, acaba querendo dizer que será uma pessoa melhor se sair daquela situação, faz promessas a Deus. É como o discurso “Vou ser uma pessoa melhor, serei mais gentil e simpático com as pessoas, irei ter uma vida saudável.” Fase 4) Depressão: Já nessa fase a pessoa se retira para seu mundo interno, se isolando, melancólica e se sentindo impotente diante da situação. Fase 5) Aceitação: É o estágio em que o indivíduo não tem desespero e consegue enxergar a realidade como realmente é, ficando pronto pra enfrentar a perda ou a morte. O sofrimento geralmente leva a comportamentos dolorosos. Fazer caretas, gemer, mancar, deixar-se ficar deitado, buscar continuamente auxílio médico e sentir-se incapaz de trabalhar são comportamentos dolorosos comuns que ocorrem com frequência quando a pessoa sofre. Os exemplos de comportamentos que podem ser um reflexo da dor incluem alterações do apetite, como anorexia; distúrbios do sono, como movimentação e despertares frequentes; agitação ou agressividade; essas manifestações desencadeadas pelo toque ou por alterações da posição; e redução da socialização e isolamento.
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