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ANÁLISE DO ARTIGO: HIGH-PERFORMANCE ACTIVATED CARBON FROM POLYANILINE FOR CAPACITIVE DEIONIZATION
INTRODUÇÃO
A técnica de Espectroscopia de Impedância Eletroquímica (EIE) fornece uma visão detalhada da interface eletrodo/solução e informações de grande interesse na eletroquímica básica e aplicada. A resposta da aplicação de um pequeno sinal de corrente alternada, realizada em uma ampla faixa de frequências, possibilita diferenciar processos com tempos característicos distintos, que na maioria das técnicas eletroquímicas tradicionais seriam vistos como contribuições simultâneas à resposta total (CARVALHO et al., 2006).
Nos últimos anos, a EIE encontrou aplicações generalizadas no campo da caracterização de materiais e é atualmente utilizada em uma ampla gama de estudos, abrangendo por exemplo, o transporte eletrônico em dispositivos semicondutores, caracterizações de revestimentos, baterias, células de combustível e mecanismos e cinética de reações de corrosão ou eletrodeposição. 
Nos estudos sobre Deionização Capacitiva (DIC), esta técnica tem sido utilizada como ferramenta para caracterizar o sistema eletrodo/eletrólito através da determinação da capacitância e resistência à transferência de carga do material de carbono, permitindo assim investigar a eficiência do eletrodo na eletrossorção.
Neste contexto, o objetivo deste trabalho é realizar uma análise crítica sobre a utilização da técnica de Espectroscopia de Impedância Eletroquímica em um artigo sobre Deionização Capacitiva. As informações sobre o artigo utilizado são apresentadas a seguir:
Título: High-performance activated carbon from polyaniline for capacitive deionization
Autores: Rafael L. Zornitta, Francisco J. García-Mateos, Julio J. Lado, José Rodríguez-Mirasol, Tomás Cordero, Peter Hammer, Luis A. M. Ruotolo
Revista: Carbon 123 (2017), páginas 318 – 333
ANÁLISE CRÍTICA
O artigo High-performance activated carbon from polyaniline for capacitive deionization (Zornitta et al., 2017) analisa o emprego de diferentes carbonos ativados preparados com polianilina (PAni) na DIC e utiliza a EIE como uma importante ferramenta na determinação da eficiência do processo. De forma geral, o objetivo deste trabalho foi investigar o efeito dos ânions dopantes cloreto (Cl-), p-toluenossulfonato (PTS-), dodecilbenzeno-sulfonato (DBS-) e poliestirenossulfonato (PSS-) nas propriedades texturais e eletroquímicas do carbono ativado PAni (PAC) e avaliar o seu desempenho na dessalinização.
Para entender o efeito dos diferentes ânions no desempenho do eletrodo na dessalinização, os PACs foram caracterizados em relação à sua área superficial específica, distribuição de tamanho de poros, morfologia, grupos funcionais de superfície, capacitância eletroquímica e resistência à transferência de carga. O desempenho na dessalinização foi avaliado em termos da cinética de eletrossorção, capacidade de adsorção específica, eficiência de carga e consumo específico de energia. Dentre estas várias análises, uma maior ênfase aqui será dada a realização da EIE.
Conforme o artigo em anexo, a espectroscopia de impedância eletroquímica foi realizada em NaCl 0,2 mol L-1 com a utilização de uma célula de três eletrodos. Eletrodos de carbono foram empregados como eletrodo de trabalho (2,5 cm - 2,5 cm) e contra eletrodo (2,5 cm - 3,0 cm), e um eletrodo de Ag/AgCl em KCl saturado foi adotado como o de referência. Ademais, um potenciostato Autolab PGStat 204 foi utilizado nas medidas.
Alguns fatores importantes que devem ser observados ao se realizar o experimento de impedância e analisar os resultados dos espectros são destacados a seguir.
Parâmetros de operação
O grande destaque da EIE reside no fato de ser uma técnica de estado estacionário que permite o acesso a diversos fenômenos interfaciais caracterizados por diferentes constantes de tempo. Diante disto, a EIE possibilita, durante uma única varredura da frequência (normalmente no intervalo de 100 kHz a 1 mHz), a investigação simultânea de diversos fenômenos eletroquímicos. Acredita-se que este fato tenha sido relevante para a escolha deste intervalo no artigo em estudo. 
Ademais, como as taxas de reações elementares são exponencialmente dependentes do potencial, os processos eletroquímicos são intrinsecamente não-lineares. As teorias de corrente alternada mais desenvolvidas, no entanto, são todas teorias lineares, o que significa que, para usá-las, a amplitude do sinal de excitação deve ser mantida pequena o suficiente para que o sistema se torne aproximadamente linear. Neste contexto, pode-se destacar que os autores realizaram os experimetos de impedância aplicando um potencial de 0,0 V e uma amplitude ac pequena de 10 mV.
Estes dois parâmetros escolhidos pelos autores (faixa de frequência e amplitude da corrente alternada) demostram que os mesmos se preocuparam em atender exigências da técnica EIE e assegurar a linearidade entre o potencial e a corrente.
Detalhes experimentais para a aquisição de dados de impedância eletroquímica
O artigo poderia ter discutido mais sobre os cuidades necessários para a realização dos experimentos de impedância, visto que as técnicas são notoriamente propensas a erros por efeitos espúrios nos circuitos de medição. O bom design da célula pode evitar alguns destes problemas. O eletrodo de trabalho e o contra-eletrodo, por exemplo, devem estar dispostos simetricamente de modo a proporcionar uma distribuição de corrente uniforme. Além disso, o capilar Luggin deve ser colocado próximo ao eletrodo de trabalho, a fim de minimizar a resistência ôhmica não compensada.
Apresentação dos dados
Dentre as principais maneiras gráficas de representação da impedância, os diagramas de Nyquist e de Bode, somente o primeiro foi utilizado no artigo. 
Foi destacado pelos autores a forma das curvas obtidas, a qual é típica de supercapacitores eletroquímicos. Duas regiões principais foram identificadas: 
· semicírculo em altas frequências: corresponde a região de transferência de carga que é atribuída à capacitância da dupla camada e limitada pela condutividade do material e cinética de eletrossorção;
· reta em frequências baixas: controlada pela transferência de massa.
Com relação a apresentação dos diagramas de Nyquist no artigo, chama-se a atenção para o fato de que os valores das frequências, correspondentes a cada ponto do gráfico, não foram especificados. Mas por outro lado, os eixos de impedância real e imaginária possuem o mesmo intervalo de medida (escala), característica importante dos espectros de impedância.
Os diagramas de Nyquist possuem como principal vantagem a fácil visualização dos efeitos das resistências, porém a dependência com a frequência não é mostrada explicitamente. Neste caso, os diagramas de Bode poderiam ser utilizados no artigo com o intuito de permitir uma visualização melhor de cada processo, uma vez que algumas características difíceis de serem identificadas no gráfico de Nyquist são prontamente vistas no de Bode.
Circuitos elétricos equivalentes 
A interpretação dos gráficos de impedância geralmente é feita com base em circuitos elétricos equivalentes. Frente isto, é importante entender como a interface eletrodo/solução do sistema eletroquímico se comporta, para que os elementos presentes no circuito e suas posições apresentem um significado físico coerente. 
Dentre os circuitos elétrico equivalentes, destaca-se como um dos mais utilizados o de Randles, que combina a resistência da solução, resistência à transferência de carga, impedância de Warburg e a capacitância da dupla camada elétrica. Este circuito, entretanto, não consegue representar adequadamente todas as regiões do diagrama obtido para eletrodos porosos, material utilizado no artigo. Neste caso, a análise é mais complexa e a interpretação física da capacitância geralmente não pode ser descrita como uma capacitância pura, sendo representada por um elemento de fase constante (CPE). 
Diante disto, os autores utilizaram um circuito modificado de Randles, o qual está representado na Figura 1. Este circuito apresenta osseguintes elementos: 
· resistência ôhmica (RΩ)
· resistência à transferência de carga (RCT)
· impedância de Warburg (W)
· capacitor (C) 
· elemento de fase constante (CPE).
Figura 1: Circuito equivalente de Randles modificado.
Fonte: Zornitta et al., 2017
Dentre os elementos presentes no circuito equivalente, a capacitância é importante para analisar a eficiência do processo de DIC. Este parâmetro determina a capacidade de um eletrodo armazenar carga quando certo valor de potencial elétrico é aplicado ao sistema. Desta maneira, trata-se de uma forma simples de fazer uma caracterização inicial do material de eletrodo a fim de verificar se o mesmo pode apresentar um bom desempenho para remover íons em uma célula de DIC.
Para o sistema em estudo, dois valores de capacitância foram obtidos: a capacitância na interface do eletrólito/eletrodo em altas frequências (CC) e a capacitância desenvolvida dentro dos microporos do eletrodo de carbono (Cd).
O elemento de fase constante (CPE) foi usado no cálculo de CC porque um semicírculo perfeito, atribuído a um capacitor ideal, não foi observado nas regiões de alta frequência. Esta não-idealidade do capacitor está relacionada à não uniformidade da espessura do eletrodo, variação da taxa de transferência de carga microscópica, processos de adsorção ou rugosidade da superfície, como especificado pelos autores. Assim, com o objetivo de considerar estes efeitos no modelo, o artigo utilizou um elemento de fase constante em paralelo com a resistência a transferência de carga e o elemento de Warburg.
As regiões de baixa frequência de um capacitor ideal são representadas por uma linha vertical. Por outro lado, o capacitor eletroquímico começa com uma linha de impedância de 45° e se aproxima de uma linha quase vertical somente em baixas frequências. Neste caso, a resistência à transferência de carga dentro dos poros aumenta de forma distinta e a estrutura porosa não homogênea (em tamanhos, formas e profundidades) leva à dispersão da frequência, de modo que o capacitor também pode ser substituído por um CPE.
O artigo em análise não substituiu o segundo capacitor do circuito (Figura 1) por um outro elemento de fase constante. Assim, sugere-se que a substituição seja feita para verificar a proximidade do coeficiente n da unidade e consequentemente, averiguar o quão próximo este elemento está de um capacitor ideal. 
O elemento de Warburg (W) também foi utilizado para descrever o efeito da migração iônica no interior dos poros do filme de carbono. Este elemento foi associado em série com a RCT porque a região de Warburg está localizada entre o semicírculo e o pico no diagrama de Nyquist. 
Vale destacar que outros circuitos são utilizados na literatura para interpretar os diagramas de Nyquist obtidos para materiais de eletrodos porosos de carbono (HUANG; TENG, 2008; XU et al., 2011). Ao comparar estes trabalhos, verifica-se que a substituição do capacitor por um elemento de fase constante não é sempre necessária.
Parâmetros obtidos e discussão dos resultados
Usando o diagrama de Nyquist, foi possível determinar a resistência ôhmica (característica da célula eletroquímica) e a resistência à transferência de carga (propriedade intrínseca do material de eletrodo). Os valores destas resistências foram obtidos a partir da primeira e segunda interseção do semicírculo com a abscissa do gráfico. 
Os valores de resistência ôhmica para os diferentes materiais de carbono foram similares. Este resultado já era esperado pelos autores, uma vez que a mesma célula de três eletrodos foi utilizada em todas as medidas de EIE. Neste contexto, destaca-se o fato desta resistência depender da concentração iônica, do tipo de íons, da temperatura e da geometria da área em que a corrente é transportada. 
Por outro lado, os valores de resistência à transferência de carga foram significativamente diferentes. Este fato foi atribuído corretamente pelos autores às diferenças nas propriedades texturais e eletroquímicas dos materiais de eletrodo, como distribuição do tamanho de poros, condutividade e área superficial específica.
Os demais parâmetros (CC, A0 e Cd) foram obtidos através do software Metrohm Autolab NOVA v1.11. Um ajuste satisfatório dos dados experimentais com o circuito equivalente Randle modificado foi obtido, conforme material suplementar em anexo. 
De forma geral, os autores promoveram discussões pertinentes dos resultados e conseguiram relacionar os valores dos parâmetros (RΩ, RCT, A0, CC e Cd) às características da célula utilizada e às propriedades eletroquímicas e texturais dos diferentes materiais de carbono. 
Sugestão
Os autores poderiam ter discutido sobre a possível utilização das relações de Kronig-Kramers para verificar se os dados medidos estão de acordo com os seguintes pressupostos:
· causalidade: a resposta é apenas relacionada ao sinal de excitação;
· linearidade: a resposta é linear e a perturbação é pequena;
· estabilidade: o sistema não muda com o tempo;
· o sistema é finito para todos os valores de frequência, incluindo zero e infinito.
Estes são pré-requisitos para a utilização de circuitos equivalentes. Se o sistema muda no tempo, por exemplo, devido ao envelhecimento ou mudança de temperatura, os dados medidos no início do experimento não concordam com os medidos no final e neste caso, o teste falha. Assim, segundo o Tutorial NOVA Impedance Spectroscopy, a falha no teste K-K geralmente significa que nenhum ajuste bom pode ser obtido usando o método do circuito equivalente. 
REFERÊNCIAS
CARVALHO, L. A.; ANDRADE, A. R.; BUENO, P. R. Espectroscopia de impedância eletroquímica aplicada ao estudo das reações heterogêneas em ânodos dimensionalmente estáveis. Química Nova. v. 29, p. 796 – 804, 2006.
HUANG, C. W.; TENG, H. Influence of carbon nanotube grafting on the impedance behavior of activated carbon capacitors. Journal of The Electrochemical Society. v. 155, p. A739 - A744, 2008.
NOVA IMPEDANCE SPECTROSCOPY TUTORIAL. Disponível em:< http://www.ecochemie.nl/download/NovaTutorials/Impedance_measurements_tutorial.pdf > Acesso em: 16 dez. 2017.
XU, G.; ZHENG, C.; ZHANG, Q.; HUANG, J.; ZHAO, M.; NIE, J.; WANG, X.; WEI, F. Binder-free activated carbon/carbon nanotube paper electrodes for use in supercapacitors. Nano Research. v. 4, p. 870 - 881, 2011.
ZORNITTA, R. L.; GARCÍA-MATEOS, F. J.; LADO, J. J.; RODRÍGUEZ-MIRASOL, J.; CORDERO, T.; HAMMER, P.; RUOTOLO, L. A. M. High-performance activated carbon from polyaniline for capacitive deionization. Carbon. v. 123, p. 318 – 333, 2017.

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