Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Administração da Qualidade e o Modelo Japonês APRESENTAÇÃO Você sabe o que é qualidade na administração? O conceito de qualidade está associado à satisfação das necessidades e o atingimento dos objetivos que se espera atingir com determinado produto ou serviço. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai ver como a gestão da qualidade se tornou a base daquilo que chamamos de administração japonesa. Para isso, inicialmente será identificado o que se entende por qualidade e gestão da qualidade. A partir daí, você vai ver o contexto que a originou, importante para entender as necessidades que a produzem. Com base nisso, serão trabalhadas algumas ferramentas de qualidade total e, ao final, será discutida como a qualidade total se integrou ao início da industrialização japonesa no pós-guerra. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer a evolução da busca pela qualidade nas organizações.• Identificar os princípios da qualidade total.• Relacionar a administração da qualidade com o modelo japonês de gestão.• DESAFIO Você possui uma empresa que produz um determinado eletrodoméstico. O produto final é composto por três peças e necessita de todas elas para funcionar corretamente. Duas dessas peças são produzidas na sua empresa e seguem um estrito e rigoroso controle de qualidade (6 Sigma). Isso significa que a cada 500 milhões de peças, uma terá defeito (na prática, defeito zero). A terceira peça é comprada de um fornecedor que, estima-se, tenha um controle de qualidade de cerca de 2 sigmas. Qual a chance aproximada, em porcentagem, de um dos seus produtos finais ter falha? Ainda, como poderíamos fazer para aumentar a qualidade do seu produto? Para resolver esse desafio, lembre-se de que um determinado produto necessita que todas suas partes funcionem perfeitamente. INFOGRÁFICO A busca pela qualidade não é algo novo e torna-se cada vez mais necessária uma vez que a produção artesanal dá espaço para a produção em massa. Para garantir a qualidade total algumas ferramentas podem ser utilizadas. A primeira ferramenta de qualidade amplamente utilizada foi o PDCA que, embora seja bastante simples, é geralmente entendida como um norteador inicial. No infográfico a seguir você saberá mais sobre três ferramentas centrais da qualidade: PDCA, Diagrama de Pareto e 6 Sigma. Acompenhe! CONTEÚDO DO LIVRO Qual a importância da qualidade na administração? Quais são as ferramentas que podem ser utilizadas para a obtenção de produtos e serviços de qualidade? Com a leitura do capítulo Administração da qualidade e o modelo Japonês, da obra Teoria Geral da Administração II, você vai ver o que é qualidade, como é possível garanti-la na produção e o porquê de fazer isso. Tambem vai entender o histórico da gestão da qualidade, como a mesma foi incoporada pela Administração, bem como sua relação com o modelo japonês. Por fim, serão abordadas as ferramentas mais conhecidas e consagradas para gantir a qualidade da produção, tais como 6 Sigmas e PDCA. Boa leitura! TEORIA GERAL DA ADMINISTRAÇÃO II Lucas Casagrande Administração da qualidade e o modelo japonês Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Reconhecer a evolução da busca pela qualidade nas organizações. Identificar os princípios da qualidade total. Relacionar a administração da qualidade com o modelo japonês de gestão. Introdução Neste capítulo, você vai trabalhar com a gestão da qualidade, que se tornou a base daquilo que chamamos de administração japonesa. Para isso, trataremos inicialmente do que se entende por qualidade e gestão da qualidade. A partir daí, trabalharemos o contexto que a originou. O contexto que originou a gestão da qualidade é importante para entender as necessidades que a produzem. Com base nisso, trabalhare- mos com algumas ferramentas de qualidade total e, ao final, discutiremos como a qualidade total se integrou ao início da industrialização japonesa no pós-guerra. O pós-guerra japonês criou, culturalmente, uma gestão da qualidade aliada à produção de antemão. O que é qualidade? Muito ouvimos falar a respeito de qualidade, mas, afi nal, o que isso signifi ca? Uma definição clássica de qualidade é a de que se trata do “[...] grau até o qual um conjunto de características inerentes satisfaz as necessidades” (PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE, 2008). O que isso quer dizer? A satisfação de necessidades (explícitas ou implícitas) de um produto ou serviço significa receber o que se espera por este. Dito de outro modo, qualidade é a característica de um produto ou serviço de resolver o problema ao qual se propõe. Há algo de implícito junto ao conceito de qualidade. Ele pressupõe uma subjetividade relacionada com as percepções e necessidades de cada um. Essa subjetividade é influenciada diretamente por diversos fatores, tais como a cultura do local onde se vive, a classe social, entre outros. Uma discussão comum ao conceito diz respeito a se a expectativa é formal ou tácita. Embora não seja unânime, em geral se entende que produtos de consumo geral devem atender às expectativas tácitas. Tomemos o seguinte exemplo: um smartphone anuncia, em suas especificações técnicas, que a faixa de temperatura em que opera é de 0 a 40 ºC. Um determinado usuário, dono de um desses telefones, teve o infortúnio de ter de caminhar sob o sol em um dia quente de verão. Em razão das temperaturas da rua em adição aos raios solares, seu bolso ultrapassou os 40 ºC e o celular parou de funcionar. Ao precisar fazer um telefonema, o consumidor se frustrou perante a qualidade do aparelho. Neste caso, o eletrônico operou dentro das margens estabelecidas, estando em acordância com seu projeto e suas especificações técnicas. No entanto, o usuário do telefone não esperava que um dia quente debaixo do sol danificasse seu aparelho. Sob seu ponto de vista, o produto, embora atenda às especificações técnicas e esteja dentro das normas de qualidade do projeto, é de baixa qualidade, pois frustrou suas expectativas tácitas. Mas cuidado: alta qualidade não pressupõe que um produto deva atender a inúmeras expectativas diferentes das iniciais. Um produto pode ser extre- mamente simples e, no entanto, ser de alta qualidade. O contrário também é verdadeiro: um produto que se preste a atender diversas expectativas de forma pouco satisfatória é um produto de baixa qualidade. Um erro comum é confundir qualidade e grau de funcionalidade. Qualidade é a característica de atender às expectativas; grau é a característica de incluir expectativas a serem atendidas. Seguindo o exemplo do smartphone, este é um aparelho de telefonia móvel que se propõe a atender muito mais expectativas do que um antigo aparelho celular. Ao considerarmos as funções básicas do celular, como se comunicar, um celular antigo, que seja menos frágil a quebras, defeitos e interrupções que um smartphone moderno, pode ser considerado de maior qualidade – mas com menos recursos, com menor grau de funcionalidades. Administração da qualidade e o modelo japonês2 Histórico da qualidade A preocupação com a qualidade não é uma questão nova. Historicamente, a preocupação de um comprador com a conformidade daquilo que estava com- prando sempre existiu. No entanto, a administração da qualidade só se torna uma ferramenta necessária à medida que a produção em massa toma o lugar da produção artesanal. Isso ocorre porque o artesanato, forma de produção predominante até poucos séculos atrás, não necessitava gerir a qualidade como processo. Como sua produção era individualizada, a qualidade era uma preocupação operacionalizada de acordo com cada caso específi co. Um automóvel, produzido antes do taylorismo e do fordismo, sem uma linha de montagem, era um produto único, feito sob medida para um abastado cliente com suas necessidades específicas. O controle da qualidadeera feito no próprio produto, testando este individualmente em todas as suas especificidades. A expectativa de qualidade se dava por meio de uma relação pessoalizada, em que a produção e o processo de comercialização se davam de acordo com expectativas específicas. É importante ressaltar que esse modo de produção tinha, sim, uma preocupação com a qualidade – mas essa preocupação se dava dentro do processo artesanal (ANTÓNIO; TEIXEIRA; ROSA, 2007). No começo do século XX a concorrência entre as fábricas de automóveis se focou, essencialmente, na corrida pela diminuição de custo. Porém, sendo o automóvel uma arma em potencial, a qualidade não poderia ser descartada: uma falha em alta velocidade, tal como uma roda que se solta, pode gerar consequências gravíssimas. Assim, como aliar uma qualidade confiável a um baixo custo? Com o ganho de escala e a padronização proporcionados pela administração científica, o controle de qualidade por produto se tornava um gasto dispen- dioso. Afinal, por que haveríamos de testar minuciosamente 10 mil carros supostamente idênticos um ao outro? Nasce, aí, um ferramental específico a uma função: a administração da qualidade. Como você já viu na administração científica, o começo do século XX foi marcado por uma mudança radical na forma de produção, especialmente nos EUA. Até então, a produção, eminentemente planejada e executada pelos próprios trabalhadores em um esquema que até hoje podemos visualizar em pequenas oficinas mecânicas de bairro, é esquematizada e ocorre uma divisão do trabalho, tanto vertical quanto horizontal. Essa divisão progressiva possi- bilita maior eficiência, mas com trabalhos mais repetitivos. A especificação das peças não era mais uma atribuição do operário, mas, sim, dos engenheiros. 3Administração da qualidade e o modelo japonês Da mesma forma, o controle de conformidade, isto é, se a peça está tal qual se projetou, foi delegado a trabalhadores específicos, os inspetores. É importante ressaltar que essa visão inicial de administração da qualidade está inserida na lógica da administração científica e do fordismo. Aqui, o fun- cionário se encontra em um ambiente de trabalho extremamente segmentado, no qual não tem a compreensão do todo. A divisão do trabalho, tão importante à eficiência, é também uma ferramenta de controle e dominação do funcionário: como ele não conhece o todo, seu poder de barganha é fragilizado. Uma primeira ideia de administrar a qualidade diz respeito ao controle e auferimento de conformidades. Ford, para viabilizar seu famoso carro popular Ford T, investiu massivamente em especificações, intercambialidade de peças e auferimento delas. Por exemplo, um rolamento deve ter uma dimensão e uma densidade específica. Rolamentos maiores gerarão folgas; rolamentos menores não encaixarão. Densidades menores significam menor resistência; densidades maiores significam maior custo. No entanto, testar todos os rolamentos de uma fábrica com um paquíme- tro é uma tarefa dispendiosa. Para resolver esse problema, em 1924, Walter Shewhart (1931) desenvolveu o controle estatístico de qualidade (CEQ). Por meio de seu método, se tornou possível controlar a qualidade de peças utilizando amostragem estatística. Ao invés de testar, digamos, 1 milhão de rolamentos, se tornou possível o controle por amostragem, o que reduziria esse 1 milhão de mensurações em menos de mil. A partir daí, critérios de conformidade se estabeleciam. Digamos que o rolamento hipotético deveria ter 10 cm de diâmetro com uma margem de erro aceitável de 2 mm. Tendo como base esse exemplo, as medições auferidas deveriam enquadrar à média mais ou menos de 2 mm (de 9,8 cm até 10,2 cm) em uma faixa de três desvios-padrão. Ou seja, utilizando sua metodologia, os gestores da qualidade deveriam esperar que mais de 99,73% dos rolamen- tos estivesse dentro da faixa aceitável. Caso isso não ocorresse, tornava-se necessária uma revisão do processo de produção, sendo necessário, muitas vezes, parar a linha de montagem. Administração da qualidade e o modelo japonês4 A fábrica na qual Walter Shewhart desenvolveu seu método de controle estatístico de qualidade foi a mesma que, alguns anos depois, sediaria os estudos fundadores da Escola de Relações Humanas. Trata-se da fábrica de Hawthorne Works, sediada na região metropolitana de Chicago, subsidiária da Western Electric (Figura 1). Essa gigantesca fábrica, que chegou a empregar 45 mil funcionários, operou entre 1905 e 1983. Eram produzidos equipamentos telefônicos de diversos tipos. A foto da Figura 1, de 1925, é do ano seguinte à implementação do controle de Shewhart e quatro anos anteriores ao famoso Estudo de Hawthorne. Figura 1. Fábrica Hawthorne Works, em 1925. Dessa forma, Shewhart instituiu uma metodologia até hoje muito utilizada: o PDCA (plan, do, check and act, ou planeje, faça, confira e aja). A ideia é relativamente simples: devemos planejar o que fazer (criar especificações, plan), produzir (do), posteriormente aferir a conformidade (check) e, caso algo não esteja dentro dos parâmetros aceitáveis, corrigir (act). Ao finalizar, o ciclo recomeça. Esse momento é tido historicamente como o início da qualidade total. Qualidade total A partir do trabalho de Shewhart, e posterior divulgação por parte de Williams Deming (1982), a busca pela qualidade se tornou, paulatinamente, uma questão cada vez mais cultural. A busca pela alta conformidade, já aceita no começo do século, se expandiu para uma concepção de qualidade mais abrangente, que inclui expectativas mais amplas e intangíveis. A partir da década de 1950, qualidade não mais signifi cava somente ‘conformidade técnica com o projeto’, 5Administração da qualidade e o modelo japonês passando a signifi car uma ideia, discutida na introdução, de uma conformidade com as expectativas do consumidor. Deming (1982) e Juran (1991) foram os autores mais signifi cativos para a nova abrangência do conceito. Neste contexto surge a ideia de gestão da qualidade total. Não mais uma qualidade que sirva unicamente para mensuração e conformidade com o projeto, mas uma preocupação com a qualidade em todos os momentos da produção, incluindo o fornecedor e estendendo a gestão até o cliente. Neste sentido, se adiciona uma tônica na fase de projeto, em que a qualidade é um valor intrínseco que objetiva o atendimento pleno das expectativas do futuro cliente. Além disso, dado que a produção, em geral, se descentralizou, se terceirizando e criando grandes redes de fornecimento, a qualidade tornou-se um valor culturalmente arraigado. Para entender a importância da qualidade como valor, para além da ins- peção, tenha em mente a grande mudança das fábricas do começo do século XX até a atualidade. Se no começo do século a Ford produzia automóveis com fornecimento de minério de ferro, látex, petróleo e algodão, as montadoras de veículos atuais se restringem cada vez mais ao seu negócio central, ou seu core business. A fundição não é mais, necessariamente, tarefa de quem produz carros, nem a estofaria, nem os pneus, nem os óleos, tampouco os plásticos. A maioria dos itens é comprada de outras empresas, fornecedoras ou terceirizadas, que devem responder ao mesmo nível de qualidade que a montadora de automóveis tem. Normas de qualidade Para que fosse possível que as empresas se descentralizassem e se tornassem mais dependentes de seus fornecedores, porém de forma confi ável, tornou-se paulatinamente necessário elaborar novas formas de padronização do que entendemos por qualidade. O conjunto mais famoso e utilizado de normas de qualidade é composto pela ISO (International Organization for Standardiza- tion), sendo a ISO 9000 e suas variantes as mais utilizadas. Administração da qualidade e o modelo japonês6 Alguns setores específicos têm suas normas de qualidade específicas e, para isso, organizações que tratam disso de forma diferenciada. Um caso típico são as vinícolas: garantir que um determinado vinho estejadentro de uma conformidade de qualidade não é uma tarefa tão banal quanto mensurar con- formidades metalúrgicas. Nesses casos específicos, organizações, geralmente criadas em associação pelas próprias empresas interessadas, criam normas de qualidade e atestam as empresas que as cumprem. No caso das vinícolas, comprovações de origem, terroir, tipo de uva, dentre outros, dão a segurança ao comprador de que o produto é o que se espera dele. Outro exemplo disso é o café brasileiro, o qual. a partir da década de 1990, começou a exibir selos de pureza e qualidade emitidos por uma associação da indústria do café. O objetivo das normas de qualidade criadas e inspecionadas por terceiros é assegurar que as empresas estão vendendo o que se espera. Para obter a ISO 9000 ou suas variantes, é necessário adaptar a forma de produção da empresa, de organização interna e, após isso, passar por uma série de auditorias peri- ódicas. Com isso, o comprador sabe que está comprando o que o vendedor diz estar vendendo. Ferramentas de qualidade Não existe uma forma única e garantida de atingir a qualidade total. Algumas ferramentas se destacaram a partir do fi m da Segunda Guerra Mundial para a criação de um ambiente voltado à qualidade total, dentre elas: PDCA Conforme dito anteriormente, o PDCA (Figura 2) foi a primeira ferramenta de qualidade amplamente utilizada. Embora seja bastante simples, ela é geralmente entendida como um norteador inicial. 7Administração da qualidade e o modelo japonês Figura 2. Ciclo PDCA. Identi�car problemas Analisar opções Planejar açõesAction Agir Plan Planejar Check Checar Do Fazer Implementação Operacionalização Corrigir erros Registrar boas práticas Veri�car conformidade Veri�car expectativas Ciclo PDCA A ideia por trás do PDCA é que a empresa esteja em uma constante busca pela melhoria contínua de seus produtos e serviços. O planejamento não é único, e sim passível de constantes revisões, conforme a experiência nos mostra acertos e erros. Conforme Aguiar (2002), em maior detalhe, o PDCA é: a) Planejamento (plan): planejar o que produzir e como, com base no planejamento estratégico da organização. Deve conter um plano de ação em detalhe, no qual cada possível problema já previsto tenha uma solução prévia. b) Fazer (do): num segundo momento, deve-se pôr em prática o planeja- mento. Para isso, é necessário implementar primeiramente as mudanças, caso necessárias, para, após isso, começar efetivamente a produzir. c) Verificar (check): num terceiro momento, deve-se verificar se há con- formidade entre o que foi planejado e o que está sendo feito. Deve-se, também, verificar externalidades e efeitos não esperados. Um relatório finaliza essa fase. Administração da qualidade e o modelo japonês8 d) Agir (act): há erros fora da margem de tolerância? Se sim, deve-se pausar a produção até serem solucionados, dando continuidade ao ciclo novamente na etapa de planejamento. Há erros pequenos que podem ser corrigidos enquanto a produção ocorre? Sim, porém se mantém o registro. Há melhorias feitas pelos próprios funcionários? Se sim, é preciso incluir isso no plano e tornar qualquer prática benéfica como algo a ser encorajado. Carta de controle A carta de controle (ou diagrama de controle) é uma ferramenta útil para verifi car se um determinado produto produzido está dentro dos limiares pre- viamente estabelecidos (PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE, 2008). No diagrama a seguir (Figura 3), temos uma determinada peça produzida, a qual 20 amostras foram mensuradas. Cada vez que a peça é medida com o auxílio de uma ferramenta como o paquímetro, o inspetor registra na carta o seu tamanho. Assim, a primeira mensuração foi 50, a segunda foi 40, a terceira foi 43, a quarta foi 49, e assim por diante. Idealmente, as peças devem convergir para a média previamente estabelecida, que, no caso, é 50. Mas elas têm uma tolerância de especificação, ou seja, não acarretarão problemas maiores para o cliente caso estejam entre 20 e 80. Figura 3. Carta ou diagrama de controle. 90 Diagrama de controle 80 70 60 50 40 30 20 10 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Peça Média LSE LSC LIC LIE 9Administração da qualidade e o modelo japonês Os elementos do gráfico anterior são: a) LSE e LIE (limite superior de especificação e limite inferior de espe- cificação): tratam-se do máximo e do mínimo aceitável. Fora dessa banda, o produto é, efetivamente, defeituoso. Via de regra, uma linha de produção pode ser parada caso essas linhas sejam ultrapassadas. b) LIC e LIE (limite superior de controle e limite inferior de controle): são os limites de tolerância, máximo e mínimo, entendidos como normais. Fora dessa banda, a produção pode ser considerada fora de controle (embora não defeituosa). A delimitação dessas linhas é resultante da política de qualidade da empresa – geralmente entre três e seis sigmas, ou seja, entre três e seis desvios-padrão para mais ou para menos. A política de qualidade da empresa é que direcionará o que fazer a partir do diagrama. Além dos casos específicos, é importante notar a tendência do que é registrado. Mesmo que todas as amostras estejam dentro dos limites de controle, se todas as amostras estiverem do mesmo lado da média (superior ou inferior), há uma clara demonstração de que a produção está fora de controle. Dependendo das regras estipuladas no processo de aferição de qualidade, o controle corretivo deve se dar a partir de seis amostras, sete, oito, 10 ou 12 amostragens consecutivas do mesmo lado da banda. Da mesma forma, embora uma amostra solitária entre as linhas de controle e especificação raramente seja motivo justificado para parar e corrigir a produção, dois ou três postos subsequentes podem ser. Dessa forma, a carta de controle se consolida como uma ferramenta de qualidade de monitoração contínua. Diagrama de Pareto (regra 80-20) Ainda no fi nal do século XIX, o economista italiano Wilfredo Pareto percebeu que a distribuição de muitas coisas seguia uma lógica peculiar. As vagens de seu jardim, dizia, eram irregularmente produtivas: cerca de 20% das vagens tinham 80% das ervilhas. Isso, é claro, não se restringia a vagens: o economista queria entender como se dava a distribuição da riqueza e das terras no mundo. Nesta lógica, percebia que 20% das pessoas tinham 80% das riquezas, 20% dos clientes de uma empresa geram 80% do faturamento, e assim por diante. Administração da qualidade e o modelo japonês10 Quando esse princípio foi importado pela administração da qualidade, se percebeu que, frequentemente, 80% dos problemas de um dado produto eram decorrências de 20% das causas. Essa afirmação possibilita notar quais são os “nós”, os problemas centrais a serem resolvidos para diminuir signi- ficativamente os problemas de qualidade. No exemplo a seguir (Figura 4), um smartphone apresenta uma lista de reclamações dos clientes – de bateria insuficiente à escolha estética da cor do aparelho: Figura 4. Diagrama de Pareto em exemplo de um produto hipotético. acumulado porcentagem Reclamações de um Smartphone 120,00% 100,00% 80,00% 60,00% 40,00% 20,00% 0,00% Ba ter ia Câ me ra Te xtu ra Ta ma nh o Te la Co r Pre ço Ve loc ida de As sis tên cia Du rab ilid ad e Essa ferramenta tem como objetivo visualizar qual problema devemos encarar inicialmente. No exemplo anterior, o smartphone hipotético se tornaria muito mais interessante para os consumidores caso as reclamações de bateria e câmera fossem sanadas. Na verdade, resolvendo esses dois problemas, se resol- veria praticamente 80% de todas as reclamações relacionadas ao smartphone. Dessa forma, o diagrama de Pareto possibilita uma rápida visualização de quais problemas devem ser enfrentados para a busca sequencial da qualidade. 11Administração da qualidade e o modelo japonês Seis Sigma Conforme Aguiar (2002), o Seis Sigma é uma ferramenta estatística de controle de qualidade. Em sua essência,é a evolução do controle estatístico de qualidade. A principal ideia por trás do Seis Sigma é a busca da melhoria de processos por meio de técnicas estatísticas. O nome Seis Sigma diz respeito a uma busca ideal pelo “zero defeito”, ou seja, ter um controle de qualidade tão efi ciente e um processo tão estável que praticamente reduziria a zero a variabilidade do processo. Um sigma, aqui, signifi ca um desvio-padrão para cima ou para baixo em relação à média. Seis sigmas signifi cam seis desvios-padrão para cima ou para baixo. Assumindo que a diferença de qualidade dos produtos se dá em uma distribuição normal, o impacto da política de qualidade do controle estatístico se dá da seguinte forma (Figura 5): Figura 5. Curva normal e desvios-padrão. Fonte: Sondagens e Estudos de Opinião ([2013?]). 0,130,13 2,142,14 13,5913,59 34,13 68,26% 95,44% 99,74% 34,13 +3–3z +2–2 +1–1 0 Veja o Quadro 1. Administração da qualidade e o modelo japonês12 Um sigma 317.300 erros a cada milhão de peças produzidas. Dois sigmas 45.500 erros a cada milhão de peças produzidas. Três sigmas 2.700 erros a cada milhão de peças produzidas. Seis sigmas Zero erro a cada milhão de peças produzidas (um erro a cada 506 milhões). Quadro 1. Sigmas. Dessa forma, a ferramenta Seis Sigma se dá por meio da aplicação de uma política estrita de controle de qualidade. Isso, evidentemente, tem custos altos e não é replicável a qualquer tipo de produto. Eletrodomésticos e microcom- ponentes são costumeiramente áreas de aplicação dos Seis Sigma. Não que o objetivo final seja ter um processo que atenda a variabilidade da ferramenta de fato (na maioria dos processos produtivos isso nem é possível, ou se tornaria tão caro que não valeria a pena o investimento na melhoria do processo), mas, sim, com o objetivo de buscar sempre a melhoria da qualidade e a ideia de “defeito zero”. Metalurgia e indústria automobilística já são áreas de alto custo para a implementação, embora ainda seja possível. Setores ligados à indústria alimentícia não são passíveis de implementação da ferramenta, salvo casos raros e específicos. De toda forma, a ferramenta se tornou sinônimo de excelência em quali- dade – nem sempre alcançada, em razão dos seus altos custos, mas objetivada pelas empresas. Gestão da qualidade e modelo japonês Após a Segunda Guerra Mundial, o Japão encontrava-se ocupado pelas forças aliadas. William Deming, contratado como estatístico pelo governo americano, foi enviado ao Japão para auxiliar o censo demográfi co. A esta altura, ele já havia publicado algumas obras sobre controle de qualidade nos EUA. Após seu contrato com o governo americano, a associação de engenheiros e cientistas japoneses o contratou como consultor da fl orescente indústria japonesa que se recuperava da guerra. 13Administração da qualidade e o modelo japonês De certa forma, a industrialização japonesa se deu ao mesmo tempo em que a implementação da administração da qualidade – ao passo que nos EUA (e na China, mais recentemente) a industrialização precedeu a gestão da qualidade, sendo esta uma resposta a problemas práticos da primeira. Dessa forma, a industrialização moderna japonesa já nasceu diretamente atrelada à gestão da qualidade, sendo suas formas de administração pensadas desde o início para atender às expectativas de qualidade total. O toyotismo, também conhecido como produção enxuta ou lean manu- facturing, como forma de administrar típica da expansão industrial japonesa, implementou uma gestão de qualidade conectada diretamente com a gestão de estoques, suprimentos, controle e de gestão de equipes. Neste âmbito, a qualidade também deixou de ser função e responsabilidade dos aferidores e inspetores e se tornou um traço cultural introjetado em todos os funcionários. Tornava-se mister que os trabalhadores fossem, eles mesmos, gestores da qualidade. Para isso, o controle se tornou mais horizontalizado, com menor escala hierárquica e maior responsabilização do funcionário. Os círculos de qualidade são um bom exemplo disso. Com a intenção de propor alterações naquilo que precisa ser melhorado, um grupo de pessoal do nível operacional se reúne e propõe melhorias. A qualidade não dizia mais respeito apenas ao atendimento das necessidades do cliente, estava também relacionada ao menor desperdício e custo. Dessa forma, surgiram ferramentas que possibilitaram que a produção se tornasse enxuta, na medida em que grandes estoques poderiam significar altos custos. Kaizen ou melhoria contínua Um dos conceitos desenvolvidos no modelo japonês, em especial no sistema de produção toyotista, é o Kaizen, que pode ser traduzido como “modifi car para melhor” ou como melhoria contínua. A ideia por trás desse conceito é de que podemos sempre fazer melhor de forma contínua, em um processo ininterrupto e infi nito. Não se trata, portanto, de uma ferramenta estatística ou de um método analítico, mas, sim, de um conceito cultural. Para que a melhoria contínua ocorra, é necessário um envolvimento pleno de todos os funcionários, uma Administração da qualidade e o modelo japonês14 doação do indivíduo à organização, uma subordinação da subjetividade indi- vidual à objetividade produtiva coletiva. Kaizen pressupõe também que a vida pessoal pode melhorar por meio da doação ao trabalho, ao perfeccionismo e, à constante melhoria. Embora o Kaizen traga resultados práticos e aumente a qualidade e a eficiên- cia da organização, os trabalhadores acabam por entregar suas subjetividades, seus valores e sua vida pessoal em prol da empresa. A equivalência entre produzir com qualidade e ser um indivíduo, em nível pessoal, de qualidade se tornou uma ideia comum aos trabalhadores sob o sistema toyotista. Alguns autores, como Faria (2007), chamam isso de sequestro da subjetividade do trabalhador. Diagrama de causa-efeito (espinha de peixe ou 6 M’s) Outra ferramenta de origem oriental que se popularizou no ocidente foi o diagrama de Ishikawa (1993). A ideia dessa ferramenta é a de que, dado um erro ou problema percebido – comumente chamado de modo de falha –, é possível reunir a equipe responsável pela produção e, a partir disso, fazer um brainstorm dividido em seis prováveis eixos que poderiam interferir causando a falha, como podemos ver a seguir (Figura 6). Figura 6. Espinha de peixe. Fonte: Diagrama... (2015). Mão de obra causa causa causa causa causa causa Material Método Máquina Medida Meio Ambiente PROBLEMA 15Administração da qualidade e o modelo japonês AGUIAR, S. Integração das ferramentas da qualidade ao PDCA e ao programa Seis Sigma. Belo Horizonte: Editora de Desenvolvimento Gerencial, 2002. ANTÓNIO, N. S.; TEIXEIRA, A.; ROSA, Á. Gestão da qualidade: de Deming ao modelo de excelência da EFQM. Lisboa: Edições Sílabo, 2007. DEMING, W. E. Quality, productivity, and competitive position. Cambridge, MA: Mas- sachusetts Institute of Technology, Center for advanced engineering study, 1982. DIAGRAMA de espinha de peixe, ou Ishikawa. 2015. Disponível em: <http://blog. qualidadesimples.com.br/2015/07/14/o-que-e-o-diagrama-de-espinha-de-peixe- -ishikawa-ou-causa-e-efeito/>. Acesso em: 09 abr. 2018. FARIA, J. H. de. Análise crítica das teorias e práticas organizacionais. São Paulo: Atlas, 2007. ISHIKAWA, K. Controle de qualidade total à maneira japonesa. Rio de Janeiro: Campus, 1993. JURAN, J. M. Controle da qualidade. New York: Makron Books; McGraw-Hill, 1991. PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE. Um guia do conhecimento em gerenciamento de projetos: (guia PMBOK). Porto Alegre: Bookman, 2008. O método se popularizou pela sua forma sutil, embora eficiente, de lembrar que os erros têm diversas causas: a) Método: a forma como é executado o trabalho. b) Material: todo e qualquer material utilizado. c) Máquina: ajustes, operacionalização e tecnologia do maquinário uti- lizados no trabalho. d) Meio ambiente: tudo que é externo às organizações tais como questões políticas, econômicas, fornecedores, etc.e) Medição: formas de aferir a qualidade. f) Mão de obra: tudo que envolve o trabalhador (de erros humanos até sabotagem deliberada). Uma vez elencadas todas as possibilidades com base nesses seis eixos, torna-se mais fácil checar cada um deles e, assim, descobrir onde reside o erro. Com frequência, são encontrados erros que ainda não geraram problemas e que podem ser utilizados para prevenir problemas futuros. Administração da qualidade e o modelo japonês16 SHEWHART, W. A. Economic control of quality of manufactured product. New York: ASQ Quality Press, 1931. SONDAGENS E ESTUDOS DE OPINIÃO. Estatística descritiva. [2013?]. Disponível em: <ht- tps://sondagenseestudosdeopiniao.wordpress.com/estatistica/estatistica-descritiva/>. Acesso em: 09 abr. 2018. Leituras recomendadas CAMPOS, V. F. TQC: controle da qualidade total no estilo japonês. 9. ed. Nova Lima, MG: Falconi Editora, 2014. IMAI, M. Kaizen: a estratégia para o sucesso competitivo. 5. ed. [s.l.]: Imam, 1994. PANDE, P. S.; NEUMAN, R. P.; CAVANAGH, R. R. The six sigma way. New York: McGraw- -Hill, 2000. 17Administração da qualidade e o modelo japonês DICA DO PROFESSOR As ferramentas da gestão da qualidade tem um objetivo comum: garantir que os produtos estejam de acordo com o esperado pelo cliente. Na Dica do Professor, a seguir, você conhecerá o modelo japonês de gestão da qualidade. Vamos lá? Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) Imagine que você trabalha numa empresa que fabrica ônibus e é responsável por comprar peças diversas de fornecedores. Sua empresa, você sabe, possui um rígido controle de qualidade. Afinal, as consequências de um ônibus lotado falhar em alta velocidade podem ser trágicas. Tendo ciência disso, você decide que é necessário exigir de seus fornecedores o mesmo comprometimento com a qualidade dos produtos. No entanto, evidentemente, seus recursos (tempo e funcionários) são escassos. Qual das alternativas abaixo apresenta certificação internacional que poderá ajudá-lo a garantir a gestão da qualidade em toda a cadeia produtiva? A) Kaizen. B) ISO 9000. C) Modelo japonês de administração. D) PDCA. E) Controle Estatístico de Qualidade. 2) Relativo ao conceito de qualidade, qual das alternativas abaixo demonstra uma melhoria de qualidade? A) Incorporação de funções a um aparelho. B) Adição de software a um computador. C) Criação de especificações de produto menos ambiciosas. D) Diminuição da taxa de falha de um produto. E) Adição de uma embalagem mais bonita e elegante. 3) Após uma semana de muitas dificuldades e reveses, você se encontra com um amigo que trabalha com administração da qualidade. Ao relatar as inúmeras frustrações da semana e os problemas que te preocupam, este amigo sugere que você lembre do diagrama de Pareto e o utilize para resolver seus problemas pessoais. O que podemos depreender dessa sugestão? A) Que a menos que você faça parte dos 20% mais rico da população, você não tem chance de resolver seus problemas. B) Que utilize ferramentas estatísticas para solucionar seus problemas. C) Que você se foque nos pouco problemas que geram as consequências mais graves e que deixe, pelo menos em um primeiro momento, os problemas secundários de lado. D) Que dê preferência às questões econômicas sobre as de relacionamento pessoal. E) Que você procure ajuda profissional. 4) Algumas empresas, como ocorre de forma mais conhecida com a indústria chinesa, optam por não incorporar a administração da qualidade de forma plena. Há motivos para isso? A) Não, a administração da qualidade não possui pontos negativos. B) Sim, a administração da qualidade é dependente exclusivamente de determinadas culturas nacionais. C) Sim, a administração da qualidade gera custos que nem sempre são ressarcidos pelo aumento da confiabilidade da marca. D) Não, a administração da qualidade sempre vale a pena. E) Sim, a administração da qualidade necessita de um sistema econômico específico. 5) Dado que a administração da qualidade, tal como conhecemos, possui menos de um século de existência, sua inexistência anterior se deve à: A) A falta de necessidade de criar uma sistematização profissional da qualidade, pois esta só se tornou necessária a partir da linha de montagem trazida à tona pela administração científica. B) Falta de qualidade intrínseca de produtos artesanais. C) Presença de uma qualidade intrínseca nos produtos artesanais que antecederam à administração taylorista. D) A uma revolução industrial anterior que estava ligado a uma qualidade intrínseca a qual não necessitava de gestão da qualidade. E) Ao desconhecimento de técnicas estatísticas anteriores. NA PRÁTICA O problema da gestão da qualidade não é somente da indústria. O comércio também tem de ter seu controle. Afinal, mesmo que os produtos vendidos tenham passado por um controle de qualidade prévio, na fábrica, há ocorrências entre a fabricação e a venda. O mais comum dessas ocorrências é na embalagem: caixas amassadas, riscos, etc. Dessa forma, grandes varejistas como a B2W (Dona da Americanas.com, Submarino e Shoptime) tem seu próprio controle de qualidade. Alguns produtos são retornados ao produtor. Mas retornar qualquer pequena falha aos produtores é oneroso e tornaria a empresa menos competitiva. Por outro lado, vender produtos reembalados poderia macular a imagem da gigante varejistas. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: PDCA Gestão de Processos Que tal ampliar seus saberes o PDCA? No vídeo a seguir, você terá uma abordagem bem humorada sobre essa ferramenta tão útil para a administração de qualidade. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Estudo comparativo das formas de apropriação dos modelos da Qualidade Total e Lean Production nos serviços de saúde Na dica de leitura a seguir, você vai saber mais sobre como a qualidade total pode ser incorporada em serviços de saúde. Acesse o link seguinte e saiba mais! Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Prêmio nacional da qualidade: excelência ou controle? Com a leitura indicada a seguir, você vai ter uma análise do modelo de gestão proposto em oito critérios de avaliação do Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ). Boa leitura! Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Compartilhar