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1 Projetos Conceituais: Abordagens de conceito pelo design conceitual, design emocional e design thinking Hanni Wilding Meili - hanniwilding@gmail.com Design de Interiores - Ambientação e Produção do Espaço Instituto de Pós-Graduação - IPOG Anápolis, GO, 9 de maio de 2020 Resumo O presente artigo analisa os conceitos de projeto nas áreas de design. Em um mercado saturado de produtos e repleto de profissionais, surge o interesse em explorar como são definidos os conceitos projetuais e suas pretenções de inovar. Cabe a hipótese de que, talvez, os designers busquem projetar com total originalidade. Para tanto, o presente artigo estuda as questões que envolvem abordagens de conceitos e processos projetuais, suas funções e intenções, através de três importantes vertentes contemporâneas do design: O Design Conceitual, Design Emocional e Design Thinking. Os resultados obtidos demonstam que existe um perigo em projetar com base em conceitos externos e alheios às questões que envolvem a problemática projetual, e que o design contemporâneo está cada vez mais focado compreender a sociedade e suprir suas necessidades. Conclui-se que, atualmente, as inovações não estão sendo baseadas em uma originalidade subjetiva e isolada do designer, mas em análises do usuário e do cotidiano. Palavras-chave: Conceitos. Processos de criação. Design conceitual. Design emocional. Design thinking 1. Introdução O “design” é um termo que imediatamente traz à mente a ideia de processos de criação. Uma das origens da palavra “design” está no latim designare, verbo que traz o sentido de designar e desenhar. Analisando etimologicamente, sua origem possui uma ambiguidade entre o abstrato e o concreto, ou seja, projetar e formar, além de atribuir formas à conceitos (DENIS, 2000). Segundo Franzato (2010), todas as disciplinas de projeto são influenciadas pela palavra “design” e os processos de criação abrangem todas as disciplinas que possuem a cultura do projeto, ou seja, é compartilhada entre arquitetura, engenharia e design. Quando se fala em projetar, uma ideia importante que vem à mente, é a de “conceito”. Lawson (2005), define “conceito projetual” como poucas ou apenas uma ideia principal que estrutura o processo de projeto e ao redor da qual as demais considerações são organizadas. Em uma sociedade repleta de profissionais e produtos como a atual, surge o interesse por investigar como os designers contemporâneos entendem os conceitos, processos de criação e problemáticas que são relevantes para o mercado. Segundo Maciel (2003), a ideia do conceito é de modo recorrente entendido com algo externo às premissas do processo de projeto, como uma metáfora ou discurso filosófico, que de alguma forma daria relevância ao projeto e serviria de ponto de partida. O autor ressalta o perigo dessa abordagem pois reduz questões já existentes do problema projetual e valoriza elementos que nem sequer são necessários para o processo de 2 criação. Ainda nesse sentido, Brandão (2000), aponta que existe um vício de separar o universo mental dos conceitos e o universo prático da habitação e dos hábitos. A respeito das demandas de mercado, Brown (2008) assimilou, que o entendimento majoritário dos líderes e emprededores do mundo dos negócios, é que as propostas inovadoras são as principais fontes de diferenciação e vantagem competitiva. Segundo o autor, as empresas estão pedindo aos designers, que criem produtos que atendam melhor as necessidades e desejos do consumidor. Justifica-se, já que a mercadoria contemporânea é carente de significado, e necessita deste entendimento para fazer sentido em um mercado saturado de produtos (CELASCHI, 2005, 2007 apud FRANZATO, 2012:232). Levando em consideração o que os autores citados anteriormente discorrem sobre as abordagens de conceito e demandas do mercado, poderiam as inovações do design e a criação de significados aos produtos, basear-se em conceitos que focam na própria problemática que envolve o projeto? Ou viriam de uma busca por total originalidade no projeto? O conceito está diretamente relacionado ao processo projetual? Para tanto, o objetivo do presente artigo é de explorar bibliograficamente como o design contemporâneo aborda as questões que envolvem os conceitos e processos projetuais, suas funções e intenções, através de três importantes vertentes contemporâneas do design: O Design Conceitual, Design Emocional e Design Thinking. 2. O Conceito O Professor Doutor Carlos Antônio Leite Brandão (2000), analisa o “problema do conceito” de diversas formas. Nas premissas do autor: O conceito não é apenas uma elaboração mental prévia, destinada a ser substituída pelo projeto no qual ela seria totalmente absorvida, mas o medium histórico da linguagem através da qual nos constituímos e compreendemos o mundo em que vivemos. (BRANDÃO, 2000:1) Segundo Maciel (2003), basear-se em fatores externos, seria cometer o erro comum do passado, qual seja, entender os projetos como repertórios a serem reproduzidos, desconsiderando a importância dos condicionantes que surgem da vida cotidiana. Dessa forma, entende-se que um dos focos do conceito é de buscar compreender o mundo, ou seja, a importância da história, cultura e tradição também são analisadas. Como aponta o doutor, os conceitos promovem uma reflexão sobre as tradições existentes de forma, e de que como elas são internalizadas e lançadas ao mundo como uma nova tradição. Essas tradições, influenciam o repertório da cultura humana e os seus hábitos. (BRANDÃO, 2000). “Toda compreensão é histórica e emerge da situação existencial e da experiência vivida por aquele que se propõe à tarefa de compreender ou interpretar alguma coisa” (BRANDÃO, 2000:7). Essa compreensão da tradição pode aqui ser tomada como uma interpretação do repertório acumulado da cultura a fim de transformá-lo em proposições adequadas para o presente, ao invés de reproduzir padrões de espaço culturalmente desenvolvidos ao longo da história para esta ou aquela finalidade. (MACIEL, 2003) 3 Diante disso, compete analisar como são abordadas as questões de originalidade e inovações dentro do design contemporâneo. Ademais, como foi citado no início do estudo, a busca por ideias inovadoras tem norteado empresas que buscam diferenciação no mercado atual saturado. Segundo Brown (2010:54) “Dedicar tempo para entender uma cultura pode abrir novas oportunidades de inovação”. Por isso, a virtude de um conceito não é propriamente ser original, mas ser, ao mesmo tempo, colheita e semente, capaz de articular o passado e o futuro através do projeto que apresentamos, e palavra através da qual colocamos em órbita pública e objetiva a chave pela qual nós compreendemos o mundo e nos inserimos nele. (BRANDÃO, 2000:2) A respeito da originalidade, Lawson (1994a apud LAWSON, 2005:154) discorre sobre as opiniões de arquitetos e designers que foram expressas a ele. O arquiteto holandês Herman Hertzberger, o designer de produtos Richard Seymour e o famoso arquiteto Robert Venturi concordam que existe um perigo na recente tendência de criar um design que é completamente original sem considerar as demandas que existem em torno de sua problemática. Segundo Venturi para Lawson “É melhor ser bom do que ser original” (LAWSON, 1994a apud LAWSON, 2005:154, tradução do autor). Dentro da proposta de originalidade e inovações, existe a possibilidade de subjetividade do designer na busca por conceitos e nos processos de criação. Assim afirma Brandão (2000:6): O que está no conceito não é a intenção do arquiteto, presumivelmente escondido atrás da linguagem gráfica do projeto. O que está no conceito é o projeto de um mundo, não a genialidade do autor. Esse mundo público não é apenas aquele para o qual se destinará a obra mas também aquele que engendra e forma o conceito, do qual o arquiteto é apenas um intérprete precário. Sendo público, o conceito não éde ordem meramente subjetiva, mas disposição do mundo a ser de outra forma. [...] A apropriação requerida ao trabalho do arquiteto e à sedução do desenho, exige, portanto, que se despoje de todo narcisismo e se ponha à escuta deste mundo. Assim fazendo, talvez a ambição do estilo pessoal, o juízo de gosto e o mito da genialidade e da criação original não tivessem o espaço que ainda hoje têm como operadores da filosofia, da crítica e da pedagogia da arte e da arquitetura. O conceito e a linguagem são domínios públicos e seu poder e valor se encontram quando a obra desvela este mundo e acrescenta-lhe uma nova maneira de habitar. De acordo com Maciel (2003), a subjetividade e experiência daquele que projeta, deve ser direcionada a operar sobre a interpretação e compreensão de pré- existências do problema projetual. Sobre o tema, acrescenta Forty (2007:330): Nenhum design funciona, exceto se encarna ideias que são comuns às pessoas para as quais o objeto se destina. Representar o design como puro ato de criatividade de indivíduos [...] reaça temporariamente a importância dos designers, mas, em última análise, apenas degrada o design, ao separá-lo do funcionamento da sociedade. Considerando o fato de os autores ressaltarem a importância de se pensar conceitos capazes de propor novas formas de hábitos e tradições, cabe explorar as abordagens de projeto que levam o conta a ideia do “design no futuro”. Segundo Lawson (2005), o design é uma atividade de prescrição. O autor afirma que qualquer 4 produção do design apresentará, até certo ponto, uma afirmação sobre o futuro, e o que se espera dos designers, são ações que considerem o futuro. Existe, porém, um papel que os designers podem assumir para responder às incertezas do futuro, classificada por Lawson, como Throw-away design, ou seja, “design de jogar fora”. Esse design tem sido bastante utilizado em produtos de produção em massa, e já vem com a intenção de ser substituído por um design mais atual. Ainda segundo o autor, essa abordagem consumista não só desperdiça recursos, mas também tem trazido um design com vida útil curta e qualidade reduzidas, fazendo com que seja necessária a troca de produtos. Dentro dessa perspectiva, de como a utilização de recursos sem considerar o futuro pode acarretar problemas ambientais, Maciel (2003) afirma: Mesmo em situações em que a escassez não é condição para a realização da arquitetura, o dispêndio excessivo e supérfluo implica em última instância na inserção direta do trabalho do arquiteto no mundo do consumo desenfreado, a promover a não preservação dos recursos naturais disponíveis para o homem no planeta. Segundo Denis (2000), o designer deve analisar o ciclo de vida dos objetos, buscando soluções que considerem fatores como o uso de materiais sustentáveis, não poluentes e de baixo consumo de energia; praticidade na operação e manutenção do produto; além do seu potencial de reciclagem. Além disso, o autor destaca um produto com sistema de reaproveitamento de materiais que foi amplamente implantado no Brasil, mas que com o decorrer do tempo vem perdendo a força e está sendo substituído por outras matérias-primas, trata-se do casco “retornável”. A visão de planejamento de ciclo de vida é especialmente importante do ponto de vista do designer, por se tratar de uma atividade que só pode ser realizada como parte do processo de produção e que se encaixa portanto na busca de qualidade total intrínseca às filosofias mais recentes de gestão empresarial (DENIS, 2000:220) Almeida (2000:33) afirma que “O Projeto Conceitual pode ser visto como a conjunção de criatividade e desmetodização, envolvendo várias linhas de raciocínio e uma grande quantidade de informações interdisciplinares”. Ou seja, é um processo que exige o conhecimento de diversas disciplinas, como a de tecnologia, ciências, psicologia, estética, sociologia, história e planejamento (NADIN; NOVAK, 1987:149 apud ALMEIDA, 2000). 3. Design Conceitual O Design Conceitual é uma abordagem que vem sendo utilizada por diversos designers contemporâneos. É um método que explora os processos de criação do design em busca do pensar, discutir e refletir sobre os mais variados temas, através de formas que não visam produção em série ou uma lógica comercial. Sendo assim, o foco está na valorização da própria concepção e no processo de criação, tornando-se a atividade principal capaz de gerar questionamento e estudos sobre o projeto. Existe uma ambiguidade frequente no design conceitual, pois os seus resultados podem ser considerados tanto “conceitos projetuais”, ou seja, ideias em 5 seu estado inicial, como “produtos conceitos”, que se parecem com protótipos de produtos reais, mas com o objetivo de refletir, expressar e explorar ideias. Seja como for, esses resultados de processo projetual não são essencialmente voltados a se tornar produtos comerciais finais. Trabalhos de design conceitual são altamente expressivos, pois são utilizadas figuras retóricas com intuitos dialéticos (FRANZATO, 2011). Os projetos destes designers são de objetos discretos, normalmente de dimensões reduzidas e pouco vistosos, mas escondem, por trás dessas características singelas, uma ideia brilhante, um artifício semântico arguto, uma invenção engenhosa, uma nota irônica sutil. Estes objetos podem até não chamar a atenção de um observador desatento, mas despertam o interesse e até suscitam um sorriso no observador mais cuidadoso (FRANZATO, 2011:229). No design conceitual, são formalizadas, através de conceitos, as reflexões dos designers sobre questões como o cotidiano e fenômenos socioculturais (FRANZATO, 2012). Essas abordagens de conceito são voltadas a debates em concursos, exposições e publicações sobre diversas questões do design, sendo eles: o papel do designer, a relação entre os consumidores e os produtos, como são utilizados e a função social das empresas (RABY, 2007 apud FRANZATO, 2011). Uma das principais características analisadas no design conceitual é a liberdade de expressão, portanto: Os designers conseguem resultados interessantes neste sentido, pois têm inusitada liberdade para se expressar. A criação de sentido nos meios em que os conceitos circulam é a única verdadeira restrição, a partir do fato de que as tradicionais restrições tecnológicas, produtivas, funcionais, simbólicas e comerciais não são impostas tão rigidamente. Aliás, uma das técnicas mais frequentemente usadas pelos designers para gerar sentido através dos seus conceitos é projetá-los para além dessas restrições, de maneira tal a criar nonsenses inesperados que coloquem em curto-circuito as nossas expectativas (FRANZATO, 2011 apud FRANZATO, 2011:4). Corroborando com o tema, Franzato (2011:8) diz que “Em outras palavras, os conceitos representam as formas que as ideias dos designers assumem”. Assim, o design conceitual é uma abordagem apresentada de forma paralela ao mercado e onde os conceitos são projetados em um momento que o designer se desvincula de sua atividade principal. É importante ressaltar, que esse exercício se torna essencial para complementar a atividade profissional do designer, pois são treinados aspectos que vão além dos processos de criação que são normalmente desenvolvidos (FRANZATO, 2011). Assim, percebe-se a importância do design conceitual enquanto exercício de estímulo à criatividade. Carlo Franzato (2011) apresenta em seu artigo “O processo de criação no design conceitual. Explorando o potencial reflexivo e dialético do projeto” exemplos de trabalhos realizados dentro do design conceitual. Primeiramente, o talher Din-Ink, projetado em 2008 pelo grupo ZO-loft para participar do concurso Macef Design Award, cujo tema Dining in 2015 buscava interpretações para as refeições do Futuro (Figura 1). “Pode ser interpretada como uma provocação sobre o estilo de vida contemporâneo, que mistura e confunde tempos e lugares dasatividades cotidianas” (FRANZATO, 2011:5). Um segundo exemplo, o biscoito de dedo Finger Biscuit, projetado em 2004 por Paolo Ulian, para a exposição Papillan organizada pela 6 designer Giorgia Graziadei, cujo objetivo era o projeto de um novo biscoito (Figura 2). Segundo o autor, Ulian decidiu criar o “Finger Biscuit” para os fãs de creme de chocolate, como forma de incentivar o hábito comum destes de colocar os dedos dentro do pote. Um terceiro exemplo, a fôrma de gelo Lingotto, projetada em 2004 por Giulio Iacchetti, para a exposição Acqua, cujo objetivo era a reflexão sobre a água, seu uso e sua distribuição geográfica. Segundo Franzato, Iacchetti explorou a ideia da preciosidade da água como o ouro. Figura 1 - Talher Din-Ink projetado em 2008 pelo grupo ZO-loft Fonte: FRANZATO (2011:5) Figura 2 - Biscoito de dedo Finger Biscuit projetado em 2004 por Paolo Ulian Fonte: FRANZATO (2011:6) 7 Figura 3 - Fôrma de gelo Lingotto projetada em 2004 por Giulio Iacchetti Fonte: FRANZATO (2011:7) 2. Design Emocional Conforme Silva e Cavalcanti (2014:2) “A escolha do produto depende da ocasião, do contexto e, principalmente, do estado de espírito onde, em muitos casos, as emoções suplantam os aspectos racionais”. Norman (2008), argumenta que muitas pessoas não percebem que existem um forte componente emocional que influencia como os produtos são projetados e postos em uso. O autor defende que o lado emocional do design pode influenciar muito mais o sucesso de um produto que suas funções práticas. As emoções fazem parte e são inseparáveis da cognição. As emoções, em boa parte de forma subconsciente, influenciam tudo o que fazemos e pensamos. “[...] as emoções desempenham papel fundamental em nossa vida quotidiana, ajudando a avaliar situações como sendo boas ou más, seguras ou perigosas [...] as emoções auxiliam na tomada de decisão” (NORMAN, 2008:38). Assim, na prática da metodologia do design, não devemos priorizar apenas os aspectos funcionais do produto em detrimento dos aspectos culturais e emocionais, uma vez que está cientificamente provado que estes últimos aspectos detém um poder de influência maior no processo de aquisição de produtos, sendo cada vez mais valorizados pela sociedade atual (SILVA; CAVALCANTI, 2014:3). Continua Norman (2008) e associa às emoções outros pontos que considera importante para o design: A estética, atratividade e beleza. “Objetos atraentes fazem as pessoas se sentirem bem, o que por sua vez faz com que pensem de maneira mais criativa” (NORMAN, 2008:39). O autor apresenta a história de três bules de chá como forma de ilustrar aspectos do design emocional: “Um bule de chá impossível (Figura 1), o bule de chá Nanna (Figura 2) e o bule de chá inclinado Ronnefeldt (Figura 3)” (NORMAN, 2008). 8 Eu tenho uma coleção de bules de chá. Um deles é completamente impossível de ser usado - a alça fica do mesmo lado que o bico. Foi inventado pelo artista francês Jacques Carelman, que o chamou de cafeteira: uma "cafeteira para masoquistas". [...] A segunda peça de minha coleção é um bule de chá chamado Nanna, cuja singular natureza gorducha, de formas arredondadas, bem roliças, é surpreendentemente atraente. O terceiro é um bule de chá complicado, mas prático, inclinado, feito pela empresa alemã Ronnefeldt. [...] A história dos bules de chá ilustra vários aspectos do design de produto, usabilidade (ou sua falta), estética e praticidade. [...] Os bules de chá também ilustram três diferentes aspectos do design: o visceral, o comportamental e o reflexivo. O design visceral diz respeito às aparências. Nesse aspecto é que o bule Nanna se destaca - gosto muito de sua aparência, especialmente quando está cheio com as tonalidades âmbares do chá, iluminado por baixo pela chama de sua vela. O design comportamental diz respeito ao prazer e à efetividade no uso. Nesse aspecto tanto o bule inclinado quanto minha bolinha de metal são vencedores. Finalmente, o design reflexivo considera a racionalização e a intelectualização de um produto [...] E, é claro, o “bule de chá para masoquistas” é inteiramente reflexivo [...] (NORMAN, 2008:23-25). Figura 1 - Um bule de chá impossível Fonte: NORMAN (2008) Figura 2 – O bule de chá Nanna Fonte: NORMAN (2008) 9 Figura 1 - Bule de chá inclinado Ronnefeldt Fonte: NORMAN (2008) Consoante os ensinamentos de Tonetto e Costa (2011), o design emocional surgiu no cenário internacional no final da década de 1990, com a intenção despertar ou evitar emoções pretendidas. Um dos fatores que contribuíram para a baixa profissionalização da área no passado, foi a subjetividade do que causa uma determinada emoção. Isso porque, o designer projetar com base em suas crenças e experiências pessoais provavelmente despertaria ou evitaria emoções distintas das pretendidas nos usuários finais de sua produção, porém, através do casamento entre a Psicologia e o Design, foi possível desenvolver métodos que pudessem certificar que os projetos são capazes de provocar as emoções desejadas. Provavelmente o design emocional, ao contrário do que o nome pode sugerir, é uma das áreas do design mais facilmente caracterizáveis como científicas, na medida em que trabalha com teoria, método e resultados de pesquisa que permitem a elaboração de afirmações sobre a experiência. O que caracteriza esse carácter científico é a sequência projeto/pesquisa, que permite ao designer a observação, na realidade, da efetividade da aplicação de suas teorias (de base psicológica) e de insights, aplicados em forma de projeto (TONETTO; COSTA, 2011:133). Desmet (2009 apud TONETTO; COSTA, 2011), discorre que existem quatro formas de focar nas emoções através do design: Foco no usuário e suas emoções, foco no designer enquanto autor de novidades que desafiam os consumidores, foco em pesquisas para serem testadas em usuários, e o foco em teoria através de análises de impacto emocional e insights teóricos. Em todas essas formas existe uma busca por compreender como produtos podem gerar emoções. Assim, o design emocional pode ser considerado uma abordagem das necessidades e desejos do usuário, através de pesquisas que buscam entender as experiências emocionais desejadas e os elementos projetuais necessários para proporcioná-las com eficácia. A psicóloga Angelita Scardua (2009) define a união entre a psicologia e especificamente o design de interiores, como uma área de estudo interdisciplinares que visa entender o comportamento e a percepção humana em relação aos ambientes construídos, sendo fundamental na tentativa de criar ambientes que priorizem emoções positivas. A partir de estudos que associam a produtividade e criatividade dos trabalhadores ao seu bem-estar, corporações vem buscando criar espaços que de alguma forma tragam satisfação a seus colaboradores. Por fim, a 10 autora também analisa a importância das emoções e percepções cognitivas ao abordar a casa como um espaço que reflete a “alma” de seu habitante: Dito isso, entendo que uma casa com alma se caracteriza pelo fato de que nela os moradores sentem que podem se mover livremente. Não falo apenas do movimento físico, mas também da fluidez de emoções e pensamentos. Uma casa com alma, portanto, é o espaço no qual os moradores exercem sem restrições os movimentos que lhes são confortáveis, no qual se sentem confortáveis para expressar suas características mais íntimas e particulares. A casa com alma é feita da mesma substância da qual são feitos seus habitantes, ela não somente reflete a personalidade dos moradores, mas nutre o universo mental deles (SCARDUA, 2012). 4. Design Thinking Segundo Brown (2008), o design thinking é uma disciplina que utiliza a sensibilidade do designer e métodos visando atender as necessidades das pessoas através do que é tecnologicamente viável e que pode ser pensado estrategicamente a fim de gerar oportunidade de mercadoe valor de consumo. O autor cita a abordagem de Thomas Edison, como um exemplo antecipado do que pode ser chamado de design thinking – uma metodologia que associa o espectro completo das tecnologias inovadoras e um design que é centrado no ser humano. Segundo Brown, o inventor, que é aclamado por criar a lâmpada elétrica, entendia a necessidade de criar um sistema de distribuição elétrica, pois sem este, seu produto não seria pleno, e assim o fez. Portanto, Edison criou um mercado completo. A disposição e até a aceitação empolgada das restrições constituem o fundamento do design thinking. O primeiro estágio do processo de design costuma referir à identificação das restrições mais importantes e à definição de critérios para sua avaliação. As restrições podem ser mais bem visualizadas em função de três critérios sobrepostos para boas ideias: praticabilidade (o que é funcionalmente possível num futuro próximo); viabilidade (o que provavelmente se tornará parte deum modelo de negócios sustentável); e desejabilidade (o que faz sentido para as pessoas) (BROWN, 2010:18). Ainda explorando as definições do design thinking, Vedana e Pansonato (2017) afirmam: O design thinking é um conjunto de métodos e processos para abordar problemas relacionados à aquisição de informações, análise de conhecimento e propostas de soluções. É uma abordagem focada no ser humano que vê na multidisciplinariedade, colaboração e tangibilização de pensamentos e processos, caminhos que levam a soluções inovadoras para negócios. O termo design thinking foi criado por Tim Brown, CEO da IDEO. Isso ocorreu a partir de observações e conversas diárias com um amigo. Ele percebeu a inclusão da palavra thinking, quando era questionado sobre design. [...] A metodologia de design thinking pode ser uma ferramenta de grande benefício para o profissional que deseja montar sua própria empresa, auxilia a analisar informações e identificadas oportunidades (VEDANA; PANSONATO, 2017:15). Para Brown (2008), muitas pessoas que não são da área do design podem ter uma capacidade natural de praticar o design thinking. O autor destaca cinco características da personalidade dos design thinkers: 11 • Empatia: Design thinkers conseguem imaginar o mundo de múltiplas perspectivas e colocam as pessoas em primeiro lugar. São detalhistas e procuram, através da observação do mundo, meios de suprir necessidades da sociedade; • Pensamento integrativo: São capazes de ver todos os aspectos de um problema e criar soluções inovadoras; • Otimismo: Não importam quantas restrições são impostas ao problema, encaram uma solução potencial como melhor que as alternativas existentes; • Experimentalismo: Colocam questionamentos e exploram todas as limitações de maneira tão criativa que levam a diversas direções diferentes; • Colaboração: O mito do gênio criativo trabalhando sozinho foi substituído pela realidade do colaborador interdisciplinar entusiástico. Design thinkers não apenas trabalham com outras disciplinas, mas também possuem uma significante experiência em alguma delas; Conforme Norman (2013), o design centrado no ser humano (Human-centerd design - HCD) é uma filosofia do desing thinking que significa começar o design com um bom entendimento das pessoas e das necessidades que devem ser supridas. Esse entendimento deve vir de observação, pois muitas a sociedade desconhece suas verdadeiras carências e dificuldades. O autor afirma que existem quatro atividades no processo do HCD: Observação, geração de ideias, prototipagem e teste. Essas quatro atividades devem ser repetidas quantas vezes for preciso até que se chegue na solução desejada. No processo de observação, o designer pesquisador observará as atividades dos seus consumidores em potencial, a fim de entender seus interesses, motivações e verdadeiras necessidades. A observação não pode ser uma experiência isolada, portanto, é necessário acompanhar os futuros usuários em seu ambiente natural, em seu cotidiano, casa, trabalho e na escola, além de suas interações sociais e formas de se relacionar com os outros. Não existe substituto para observação e interação com o público alvo. No processo de geração de ideias, a criatividade se torna essencial. O objetivo é gerar inúmeras ideias, ser criativo sem restrições e trazer questionamentos sem medo de que possam ser considerados “estúpidos”, pois boas soluções podem surgir do questionamento de coisas que são consideradas óbvias. No processo de prototipagem são construídos rápidos protótipos das soluções possíveis, que podem ser croquis, imagens feitas com ferramentas de desenho ou modelos, pois testar as ideias são a única maneira de analisar se são plausíveis e sensatas. No processo de teste, um pequeno grupo de pessoas que correspondem o mais próximo possível ao público alvo são reunidas. Os testes são feitos de acordo com o uso do produto, ou seja, se é individual, deve ser testado uma pessoa de cada vez, se é utilizado por um grupo, o produto é testado coletivamente. Esses testes serão repetidos a cada vez que são elaborados novos protótipos, como um ciclo, até que se atinja os objetivos. (NORMAN, 2013) Vedana e Pansonato (2017) destacam quatro metodologias de geração de ideias e projetos: 12 • Brainstorm: Criado em 1939 por Alex Osborn, cujo objetivo é estimular, em um curto espaço de tempo, a geração de muitas ideias; • Mapa Mental: Criado em 1974 por Tony Buyan, é a representação de palavras e ideias ligadas a um conceito, através de um diagrama sistematizado; • Mapa de Empatia: Uma ferramenta de síntese de informações que permite compreender os usuários e visualizar o que eles fazem, sentem, pensam e dizem; • Canvas: Inicialmente proposto em 2010 por Alexander Osterwalder, é uma ferramenta de gerenciamento e desenvolvimento estratégico de negócios; Como foi citado anteriormente, um dos princípios do design thinking é a multidisciplinaridade e interdisciplinaridade, considerando isso, Brown (2010:25) afirma: [...] atualmente é comum ver designers trabalhando com psicólogos e etnográficos, engenheiros e cientistas, especialistas em marketing e administração, escritores e cineastas. Todas essas áreas, e muitas outras, têm contribuído há muito tempo para o desenvolvimento de novos produtos e serviços, mas atualmente são reunidas na mesma equipe, no mesmo espaço, utilizando os mesmos processos. Continua Brown (2010:27) “Em uma equipe interdisciplinar, todos se sentem donos das ideias e assumem responsabilidade por elas”. A realidade do dia a dia da prática do design é muito mais um trabalho em equipe (LAWSON, 2005). 5. Conclusões O conceito está ligado a questões intrínsecas ao projeto e se desenvolve com o processo de criação. As ideias que norteiam o processo de criação não são externas à sua problemática e não são definidas previamente, mas devem estar voltadas à compreensão do mundo e do cotidiano. Essa busca por entendimento, por sua vez, considera a importância de associar a cultura existente, a história, o contexto e as tradições ligadas ao problema, a fim de estabelecer uma conexão entre o passado, presente e o futuro. O design que não levam em conta o futuro, resulta no chamado throw-away design, resultando em projetos e produtos com vida útil curta e de baixa qualidade, que intensificam o desperdício de recursos naturais. A necessidade de diferenciais e vantagem no mercado atual saturado, tem incentivado empresas e negócios a propor inovações. A originalidade, porém, pode ser perigosa se considerar os conceitos e processos projetuais apenas como uma genialidade do designer, pois o design não é de seu autor, o design é público e voltado ao seu usuário. Portanto, a subjetividade e as experiências pessoais do designer devem trabalhar em função das questões que envolvem o projeto. O design conceitual é um exercício que propõe reflexões do cotidiano e aspectos socioculturais atravésdos próprios conceitos e processos de criação. É uma abordagem do design que está direcionada principalmente a debates sobre os mais diversos assuntos, em concursos e exposições, resultando em uma aproximação entre o design e público de outras áreas. O design conceitual é considerado uma 13 atividade paralela ao exercício da profissão, pois não visa propor um produto final que possa ser reproduzido em massa, mas expor ideias com liberdade, retórica e dialética, sem as restrições dos produtos que estão destinados ao mercado. É um meio de estimular a criatividade, “treinar” o designer e complementar o seu exercício profissional. O design emocional é uma área do design que, associada à psicologia, busca evitar ou despertar certas emoções. Entende-se que as emoções e o sistema cognitivo influenciam de forma subconsciente a decisão e escolha de produtos, ou seja, os sentimentos associados a um projeto ou objeto podem determinar o seu sucesso. Portanto, é importante avaliar as emoções que o público deseja. O design emocional pode ser considerado um exercício científico, pois busca compreender a relação entre os sentimentos e os produtos, através de pesquisas e testes com seus usuários. Existe uma conexão entre a atratividade do design e o bem-estar humano, que resulta em criatividade e produtividade, fato que tem chamado a atenção de grandes corporações ao tema. O design thinking aborda um conjunto de métodos centrados no ser humano e em suprir suas necessidades através de soluções inovadoras. É uma abordagem que valoriza a multidisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a colaboração na proposta de soluções projetuais, e incentiva o contato direto com o público alvo de seus produtos, durante os processos de criação. O design thinking vê as restrições de projeto não como problemas, mas como meios de propor inovações e adquirir boas ideias. Portanto, através da análise dos pontos de convergência entre os temas explorados, Conclui-se que: • As ideias centrais do projeto devem emergir da problemática projetual, e não de um fator qualquer externo, ou da subjetividade do designer; • O design deve estar focado na compreensão do mundo e da sociedade; • O design tem entendido a importância de projetar considerando os hábitos do usuário, seu cotidiano e suas emoções; • O design tem buscado uma aproximação e um diálogo com o público; • As inovações são o diferencial do mercado; • Inovar não significa criar um design puramente original, onde são negligenciados os condicionantes projetuais; • Inovações estão surgindo do foco em suprir as necessidades do consumidor; • O design vem buscando multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e colaboração na proposta de soluções projetuais; • O design está trabalhando através da empatia; • O design deve considerar o futuro e os recursos naturais, a fim de projetar produtos duradouros e de alta qualidade; Referências ALMEIDA, Francisco José de. Estudo e Escolha de Metodologia para o Projeto Conceitual. In: Revista de Ciência & Tecnologia. V. 8, Nº 16 – pp. 31-42, s.d. 14 BRANDÃO, Carlos Antônio Leite. "Linguagem e arquitetura: o problema do conceito". Revista de Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo. vol.1, n.1, novembro de 2000. Belo Horizonte: Grupo de Pesquisa "Hermenêutica e Arquitetura" da Escola de Arquitetura da UFMG. Disponível em: < https://arquitechne.com/linguagem-e-arquitetura-o-problema-do-conceito/>. Acesso em: abr. 2020. BROWN, Tim. Design Thinking. Harvard Business Review, n. 86, 2008. p. 84-92. BROWN, Tim. Design Thinking: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Rio de Janeiro. Elsevier, 2010. DENIS, Rafael C. Uma Introdução à História do Design. 2ª Ed. São Paulo: Blucher, 2004. FORTY, Adrian. Objetos de desejo: design e sociedade desde 1750. Soares, Pedro Maia (tradução). São Paulo: Cosac Naify, 2007. FRANZATO, Carlo. 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