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ABDOME AGUDO INFLAMATóRIO • Conceito: dor abdominal decorrente de um processo inflamatório e/ou infeccioso na cavidade abdominal ou em tecidos e estruturas adjacentes. Causas + frequentes: apendicite aguda, colecistite aguda, diverticulite por doença diverticular dos colos. • Fisiopatologia: relacionada à reação do peritônio e às modificações do funcionamento no trânsito intestinal. O peritônio é dividido em visceral e parietal. O visceral é inervado pelo SN autônomo e o parietal pelo SN cerebroespinal, o mesmo da musculatura da parede abdominal. Quando o agente inflamatório/infeccioso atinge o periônio, irrita-o em intensidade diretamente proporcional ao estádio do processo etiológico. Segue a instalação progressiva de íleo paralítico, local ou geral. Lei de Stokes -> toda vez que a serosa que envolve um m liso sofre irritaçao, entra em paresia ou paralisia. A resposta da parte parietal exterioriza-se como dor melhor localizada e contratura dos músculos abdominais local ou geral, dependendo da evoluçao do processo. A contratura muscular pode ser voluntária ou determinada por doença extra-abdominal. A dor abdominal secundária à irritaçao do p.visceral (autonoma) é: mal localizada, originada pela distensao e contratura das vísceras; A dor pela irritaçao parietal (cerebroespinal) é contínua, progressiva e piora com movimento, tbm é melhor localizada. Pancreatite Aguda: Fisiopatologia ainda incerta. Sabe-se que o processo inflamatório inicia pela lesao das células acinares, que passamm a liberar enzimas pancreáticas ativas para o interstício. Um estímulo lesivo à célula acinar causa a fusao dos granulos contendo zimogenio com as vesículas lisossomais, que contem a enzima catepsina B. Esta hidrolase é capaz de converter o tripsinogenio dentro da célula acinar, ativando todos os zimogenios. As vesículas de fusao, ao invez de migrarem p/ a borda luminal da cél, migram p/ a intersticial, sendo liberadas no estado ativo no interstício pancreático, iniciando o processo autodigestivo. (“teoria da colocalizaçao lisossomal”). Causas + comuns: litíase biliar e álcool. QC: dor abdominal superior, contínua com náuseas e vomitos. A dor pode ser em mesogastro, QSD ou ser difusa e raro: à esquerda. Uma característica da dor que sugere origem pancreática é a irradiaçao p/ o dorso. Colecistite Aguda Acalculosa: Normalmente associada a traumas, doenças do colágeno e SIDA. Incide em pctes jovens e de faixa etária avançada e está relacionada à queimaduras, sepse, permanencia prolongada em UTI. Doença inflamatória aguda da v. biliar sem cálculos; menos frequente que a litiásica. Dor pode ser mais intensa em epigástro ou periumbilical, principalm no início dos sintomas. EF: sensibilidade dolorosa, com desconforto à percussao em hipocondrio D. Náuseas e vomitos podem estar presentes (75%), com icterícia em 20%. Diag dif: apendicite aguda, pacreatite, obstruçao/perfuraçao intestinal. Laboratório: pouco específico. Leucocitose com predomínio de cél polimorfonucleares com elevaçao dos níveis séricos de bilirrubinas e amilase. USG abominal é o o exame de > valor diagnóstico p/ a maioria das ocorrencias. Colelitíase Litiásica Cálculos biliares estao presentes em 95% dos pctes com colecistite aguda. A obstruçao do ducto císitco é evento incial no desenvolvimento da colecistite aguda. Duraçao e grau de obstruçao sao fatores que determinam a extensao da inflamaçao e a progressao da doença. Em 90% dos pctes a obstruçao se desfaz e o processo inflamatório diminui, causando graus variáveis de fibrose da parede vesicular. Se a obstruçao nao se desfaz, a distensao e a inflamaçao da vesicula causam comprometimento vascular que causa isquemia e necrose da vesícula (menos de 5% dos casos). A necrose e a prefuraçao da parede vesicular apresentam mortalidade entre 20-70%. O processo patológico primário é a inflamaçao e nao a infeccçao. Colangite Esclerosante e Bacteriana Diagnóstico da esclerosante: identificaçao do espessamento das paredes dos ductos biliares intra e extra-hepáticos, que se apresentam hiperecogenicos ao USG. Em alguns pctes, nao sao detectadas tais alteraçoes, necessário associar ao QC A bacteriana aparece geralmente associada à obstruçao da via biliar (parcial ou total). Causas + comuns: cálculos das vias biliares, tu de cabeça de pancreas, de papila duodenal e das vias biliares. Coledocolítiase 3 principais cálculos: colesterol, pigmento preto e pigmento marrom. Os de colesterol tem > prevalencia. Formaçao do cálculos de colesterol: distúrbio na [sais biliares] em relaçao aos de colesterol e fosfolipídios (lecitina ex); pela capacidade da bile em promover ou inibir o processo de nucleaçao dos cristais monoidratos de colesterol e/ou pelas mudanças cinéticas vesiculares decorrentes de distúrbios do tonus e contratilidade da parede da vesícula biliar ou da resistencia do ducto cístico. Pigmento preto: constituídos de polímeros de bilirrubina + fosfato + carbonato de cálcio. 60% podem ser radiopacos. Associados à anemias hemol., com esferocitose hereditária ou anemia falciforme. Pigmento marrom: formados por bilirrubinato de Ca e de colesterol. Consistencia + friável que o anterior. Nao sao radiopacos e é raro estarem na vesícula biliar. Formam-se nos ductos biliares por estase biliar cronica, frequentemente associados a quadros infecciosos. Sua formaçao está relacionada com a desconjugaçao da bilirrubina diglicuronida, por açao da betaglicuronidase bacteriana, desencadeando sua precipitaçao. Tbm se formam em ductos biliares acima de estenoses, como na colangite esclerosante e nos segmentos dilatados na doença de Caroli. Raro: pode ocorrer sem doença biliar, como na compressao extrínseca por divertículo duodenal justapapilar. A [ác biliares] pode ser alterada por modif na circulaçao entero-hepática, como nas doenças ou ressecçoes ileais, fibrose cística ou insuf pancreática; pela reduçao na síntese hepática de ac biliares ou lecitina, resultando em aumento de sat de colesterol na bile. A bile litogenica é requisito p/ formar os cálculos biliares, mas isolada nao explica a patogenese. Uso de AAS e outros AINEs pode inibir a formaçao de cálculos, por reduçao da biossíntese de muco pela mucosa da vesícula biliar. O ácido ursodesoxicólico e a reduçao da sat de colesterol podem prevenir a recorrencia de cálculos biliares. A remoçao dos cálculos pode ser feita pela colangiografia endoscópica retrógrada associada à papilotomia. P/ litíase intra-hepática, usar técnicas de litotripsia, punçao percutanea ou cirurgia. As doenças dos ductos biliares, inflamatórias ou neoplásicas e obstruçoes por compressao extrínseca das vias biliares frequentemente acompanham de icterícia. A icterícia progressiva s/ quadro doloroso associado é sinal clássico de neoplasia de cabeça de pancreas. QC -> dor em QSD, com anorexia, náuseas, vomito e febre. Dor gradual e persistente. Pode ser mal localizada no início dos sintomas. Dor pode irradiar ao longo do gradil costal direito até as costas – ponta da escápula direita. Sinal de Murphy. 30% dos pctes: possível palpar massa no HD que normalmente representa bloqueio do omento e alças intestinais em resposta ao processo inflamatório da vesícula. Colecistite Cronica Processo inflamatório recorrente na vesícula biliar, associado à litíase vesicular. Os cálculos na vesícula biliar sao responsáveis pelo desenvolvimento de irritaçao cronica da mucosa, que causa seu mau funcionamento. Tbm sao responsáveis por episódios de obstruçao parcial da drenagem vesicular, desen-cadeando os surtos de cólica biliar. QC -> dor recorrente no HD, com irradiaçao pro mesogastro, mtas x associada a nauseas e vomitos. Início súbito, associada à ingesta de dieta rica em gordura, com melhora progressiva em até 24h. A associacao da dor com a alimentaçao ocorre em apenas 50%. Durante a cólica biliar, pode ter dor à palpaçao do HD e aumento datensao da parede abdominal na regiao. Nao há relaçao entre a intensidade da dor e a gravidade da inflamaçao. Colecistite Aguda Diagnóstico: USG confirma presença de cálculos com falhas de encimento na luz da vesícula com sombra acústica posterior. + Achados: halos hipoecogenicos ao redor da vesícula biliar, espessamento da parede, aumento do diametro da vesícula (nao sao específicos) • Quadro Clínico: Apendicite: dor abdominal em cólica, mal localizada em regiao periumbilical. Anorex ia→Sintoma precoce encontrado; ü Na ́useas e vo ̂mitos; Febre baixa a moderada (38 °C)→Pode estar ausente nas fases iniciais; ü Migrac ̧a ̃o da dor para fossa ili ́aca direita (ponto de Mc Burney); ü Pode haver sinais de irritac ̧a ̃o peritoneal, com contratura da musculatura abdominal e/ou defesa volunta ́ria a ̀ palpac ̧a ̃o, ale ́m de dor a ̀ descompressa ̃o brusca (sinal de Blumberg); ü Habitualmente encontra-se o indivi ́duo em posic ̧a ̃o anta ́lgica e com um bom estado geral. Colecistite Aguda: 1. Dor em co ́l i ca , sobretudo apo ́s ingesta ̃o de a l imentos que estimulam a secrec ̧a ̃o de colecistocinina, ocasionando a contrac ̧a ̃o da vesi ́cula biliar; ✓ Inicialmente a dor manifesta-se em hipoco ̂ndrio direito, irradiando posteriormente para epiga ́strio e dorso. Pode assumir cara ́ter conti ́nuo na evoluc ̧a ̃o do quadro; ✓ Na ́useas e vo ̂mitos frequentemente sa ̃o observados; ✓ O estado geral costuma estar preservado, podendo apresentar comprometimento na depende ̂ncia da intensidade do processo inflamato ́rio; ✓ Febre superior a 38°C pode estar presente; ✓ Posic ̧a ̃o anta ́lgica; ✓ Hipersensibilidade em hipoco ̂ndrio direito com presenc ̧a do sinal de Murphy – interrupc ̧a ̃o brusca da inspirac ̧a ̃o profunda a ̀ palpac ̧a ̃o nessa topografia→ Sinais semiolo ́gico de grande importa ̂ncia. ✓ Pode-se palpar a vesi ́cula em 25% dos pacientes, habitualmente dolorosa. ✓ Irritac ̧a ̃o peritoneal pode estar presente. Pode haver icteri ́cia quando ha ́ impactac ̧a ̃o de ca ́lculo no infundi ́bulo ocasionando edema, obstruc ̧a ̃o do ducto hepa ́tico comum (Si ́ndrome de Mirizzi) e, consequentemente, colestase. • Formaçao dos cálculos: cálculos de colesterol -> o colesterol é insolúvel nas soluçoes aquosas e sua solubilizaçao biliar depende de sua interaçao com lecitina e sais biliares. Os sais biliares agem como detergentes biológicos e formam micelas com grupos hidrofóbicos removidos do contato com a água e grupos hidrofílicos em contato com as moléculas de água. A lecitina, tbm inscolúvel em água, incorpora-se nessas micelas dos sais biliares. Essas micelas compostas de lecitina e sais biliares podem solubilizar o colesterol e permitir sua excreçao. Quando a [colesterol] excede a sua solubilizaçao máxima na bile, ele pode cristaliar, iniciando uma cascata de formaçao dos cálculos biliares. Cálculos pigmentares -> compostos por alta [bilirrubina] e baixa [colesterol].. A síntese dos cálculos pigm é normalmente resultado da solubilizaçao alterada da bilirrubina nao-conjugada, o que resulta na precipitaçao de bilirrubinato de Ca. Esses cálculos sao normalmente de formato de pequenas framboesas. Sao de 2 tipos: marrons e negros. Na formaçao de ambos, a fraçao insolúvel da bilirrubina nao conjugada combina-se com o Ca e forma o bilirrubinato de Ca, que é a matriz predominante dos cálculos pigmentares. • Complicaçoes: Empiema vesicular -> representa estágio avançado da colecistite aguda, em que ocorre um crescimento bacteriano na bile e a vesícula sofre um processo supurativo. Caracterizado por dor no QSD, febre com calafrios e leucocitose >15.000 cél/mm3. Tto com antibioticos e colecistectomia ou colecistostomia. Gangrena vesicular -> achado cirúrgico qdo do tto da colecistite aguda. Indica doença mto avançada, em que há isquemia e necrose da parede da vesícula biliar. Febre alta e leucocitose >20.000. Perfuraçao -> é a mais comum. Ocorre em pctes que apresentam piora clínica c/ aumento da dor, peritonismo, febre, aumento da leucocitose, calafrios e hipotensao. A intervençao cirúrgica de emergencia é recomendada smp que houver a suspeita. A perfuraçao localizada com a formaçao de abscesso subhepático é o tipo mais comum na colecistite aguda. Existe um bloqueio inflamatório do omento e os achados clínicos consistem em: dor QSD, descompressao brusca positiva e algumas vezes dor referida. Normalmente é possível palpar uma massa na regiao subcostal direita. A perfuraçao com peritonite difusa nao é frequente e ocorre em menos de 1% dos pacientes. Ela se desenvolve qdo a inflamaçao nao conseque ser bloqueada pelas estruturas intraabdominais. Esses pctes apresentam uma dor que inicialmente era localizada no HD e passa a ser generalizada. Fístula colecisto-entérica e íleo biliar -> vesícula perfurando um órgao adjacente (1/2% dos pctes com colecistite aguda). Fato associado à passagem de grandes cálculos p/ outras visceras abdominais. O duodeno é o local + comum de fístula colecisto- entérica (80%), pela proximidade com a vesícula. A flexura hepática do cólon tb é outro local (17%). Se ocorrer a perfuraçao, a crise de colecistite aguda entrará em resoluçao. Porém, caso os cálculos passem p/ a luz intestinal, pode ocorrer sua obstruçao. Caso os cálculos sejam grandes e atinja, o int delgado, podem causar uma obstruçao intestinal mecanica (íleo biliar), que ocorre em 13% dos pctes com fistula colecisto- enterica. Recomendada a colecistectomia, fechamento da fístula e remoçao do cálculo migrado. Conduta: O tratamento do AAI baseia-se em tratamento de suporte e especi ́fico: • Analgesia; Reposic ̧a ̃o vole ̂mica; Correc ̧a ̃o de distu ́rbios eletroli ́ticos; • Tratamento do i ́leo adina ̂mico → jejum, sonda nasoga ́strica nos casos de distensa ̃o ga ́strica e intestino delgado considera ́vel ou vo ̂mitos incoerci ́veis; • Antibioticoterapia/antibioticoprofilaxia; • Tratamento de fale ̂ncia orga ̂nica se houver → internamento em UTI (mais comumente observado na pancreatite aguda grave). Referencias: - Cli ́nica ciru ́rgica. Va ́rios autores. Hospital das cli ́nicas FMUSP. Barueri, SP: Manole, 2008. - Abdome agudo: clínica e imagem. Antonio Carlos Lopes, Samuel Reibshed, Jacob Szjefeld. Sao Paulo: Editora Atheneu, 2006.