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ABORDAGEM FAMILIAR NA APS CONSIDERAÇÕES INICIAIS - as organizações familiares refletem a sociedade ao mesmo tempo em que atuam em sua alteração - as mudanças sócio-político-culturais refletem nos padrões adotados para compreender a família, nos diferentes momentos da história da humanidade - família e “lar” são associados à situação de aconchego, segurança, acolhimento e proteção → contudo, também frequentemente, não são exatamente esses valores e práticas que podemos observar na realidade social contemporânea: 1. RELAÇÃO ENTRE CÔNJUGES pesquisas recentes revelam que quase 20% das mulheres brasileiras já sofreram algum tipo de violência (física, sexual, moral ou psicológica) por parte de algum homem, sendo que em 50 a 70% dos casos esse homem era o marido ou o parceiro (MINAYO; SILVA, 2005) 2. CUIDADO E EDUCAÇÃO DOS FILHOS aproximadamente 12% das crianças (até 14 anos) sofrem algum tipo de violência doméstica no Brasil → isso corresponde à média de 18 mil crianças por dia sofrendo algum tipo de abuso → além disso, por volta de 80% dos casos o agressor é algum parente próximo 3. SEGURANÇA NA VELHICE a maioria da violência praticada contra idosos (maus-tratos, abandono, abuso econômico, entre outros) é por parentes próximos, principalmente filhos, netos e cônjuges (MINAYO; SOUZA, 2005) negligência na administração de medicamentos, em relação à higiene (troca de fralda)... - para entender melhor tais transformações contemporâneas, é necessário levar em consideração que elas são fruto do cruzamento de pelo menos três fenômenos distintos: 1. A CONCEPÇÃO TRADICIONAL DE FAMÍLIA - herança do modelo patriarcal de família, dominante desde há muito tempo no Brasil 2. O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO E DE INDUSTRIALIZAÇÃO - intensos no Brasil a partir dos anos 1950, que geraram uma sociedade moderna, mas fortemente marcada pela desigualdade socioeconômica 3. A DISSEMINAÇÃO DE VALORES ASSOCIADOS À CULTURA DE INDIVIDUALISMO - típica das sociedades capitalistas - o Estado passou a atuar na proteção da família por meio da promulgação de legislações específicas, por exemplo: 1. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) - visa a reforçar a imagem de família e de lar como ambientes de cuidado e acolhimento para as crianças e adolescentes 2. LEI MARIA DA PENHA - tem por objetivo coibir a violência doméstica, principalmente a que atinge as mulheres 3. ESTATUTO DO IDOSO - destinado a promover a valorização e respeito às pessoas com mais idade O QUE É FAMÍLIA? - não se tem conhecimento de alguma sociedade em que não estivessem presentes modelos de organização familiar em sua estrutura social - contudo, há forte tendência a expressarmos nossa concepção de família a partir de um tipo ideal, de um modelo, de uma abstração que corresponda a um “padrão de normalidade” - esse padrão de “normalidade” é variável em decorrência do tempo, local, cultura e conjuntura → DEFINIÇÕES: - IBGE: conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica, ou normas de convivência, residente na mesma unidade domiciliar, ou pessoa só que reside em uma unidade domiciliar - JURÍDICA: compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa → CICLO DE VIDA FAMILIAR “NORMAL” - padrões atuais tornam difícil a definição de um ciclo de vida “normal” - a família pode ser, ainda, compreendida nas perspectivas: → BIOLÓGICA: constituindo-se de pai, mãe e filhos → SOCIOLÓGICA: uma das instituições sociais, que especificam os papéis sociais e os preceitos para o comportamento dos indivíduos (outras: instituições religiosas, de ensino, políticas, etc…) → ANTROPOLÓGICA: significando um agregado que partilha um universo de símbolos e valores, códigos e normas, relacionados aos processos de socialização do indivíduo → PSICOLÓGICA: considerada uma unidade emocional em que o funcionamento de um afeta o conjunto da família → PADRÕES E TIPOLOGIA - FAMÍLIA NUCLEAR - formada pelos familiares consanguíneos da pessoa referência, ou seja, um núcleo - ex. casal e seus filhos - FAMÍLIA EXTENSA - constituída por mais de uma geração, podendo ser também vínculos colaterais, como tios, primos e padrinhos → alguns autores utilizam 3 ou 4 gerações - FAMÍLIA UNITÁRIA - composta por uma só pessoa, como é o caso de uma viúva sem filhos - FAMÍLIA MONOPARENTAL - constituída por um dos pais biológicos e o(s) filho(s), independentemente de vínculos externos ao núcleo - FAMÍLIA RECONSTITUÍDA - composta por membros de uma família que em um dado momento teve outra configuração, sofreu uma ruptura e passou a ter um novo formato - ex. um casal que é constituído por dois pais separados - FAMÍLIA INSTITUCIONAL - tem a função de criar e desenvolver afetivamente a criança, o adolescente ou grupos afins - ex. convento, abrigo - FAMÍLIA HOMOSSEXUAL - constituída pela união de pessoas do mesmo sexo, que constituem um casal, podendo adotar filhos - FAMÍLIA FUNCIONAL - formada por pessoas que moram juntas e desempenham papéis parentais em relação a uma criança ou um adolescente - FAMÍLIA ADOTIVA ABORDAGEM FAMILIAR NA APS - a família deve ser entendida de forma integral: → dinâmica familiar → funcionamento → funções → características sociais, culturais, demográficas e epidemiológicas - a família atual está em mudança, não mais organizada em torno da criação dos filhos, como ocorria em gerações anteriores - mudança do papel feminino na família e as implicações relacionadas - aumento da participação feminina no mercado de trabalho - aumento do índice de casamentos gays - divórcio e novos casamentos - outros fatores que podem afetar o ciclo de vida familiar “normal”: → morte precoce de um membro da família → membro da família cronicamente doente, deficiente ou alcoolista estudos sobre sobrecarga do cuidador → migração geralmente em buscas de condições socioeconômicas mais favoráveis na maioria das vezes isso só faz com que aumente a população das áreas suburbanas da cidade CICLO DE VIDA FAMILIAR - é possível reconhecer diferentes padrões na organização das famílias ao longo do tempo, assim como diversas formas de relacionamento entre seus membros - apesar das diferenças, há muitas características semelhantes ao longo do ciclo de vida das famílias - estas características semelhantes costumam ser chamadas de Fases do Ciclo de Vida das Famílias - conhecê-las nos permite compreender melhor o modo como as famílias enfrentam e superam cada fase, tornando visíveis as dificuldades encontradas obs. o ciclo de vida de uma pessoa acontece dentro do ciclo de vida familiar, que é o contexto primário do desenvolvimento humano → suas intersecções vão constituir a trama da vida familiar → O QUE É O CICLO DE VIDA FAMILIAR? - são etapas de evolução da vida que todos passamos - situações de vida com problemas previsíveis e que precisamos resolver para evoluirmos como pessoas - a resposta adequada a esses problemas resulta no bem-estar individual e familiar - uma vez que a família é composta por diversos membros, em diferentes fases do seu desenvolvimento individual, as fases não são vividas de forma isolada - há sobreposição de etapas, causando impactos significativos para a transição de uma fase para outra - ciclos de vida familiar: 1. saindo de casa/jovens solteiros 2. novo casal 3. família com filhos pequenos 4. famílias com adolescentes 5. “lançando” os filhos e seguindo em frente 6. famílias no estágio tardio da vida → CICLO DE VIDA FAMILIAR EM CONTEXTO DE VULNERABILIDADE SOCIAL - relacionamentos de curta duração - nascimentos sem planeamento familiar - morbimortalidade elevada - morte precoce de doenças incapacitantes- instabilidade e violência familiar - sofrimento psíquico - desemprego e despreparo para o mercado de trabalho - dependência de álcool e outras substâncias químicas - delinquência - dependência de estruturas governamentais - depressão (maior em mulheres - produz desesperança crônica, o que as torna mais vulneráveis à depressão frente a novas perdas) - consanguinidade é o laço mais importante - papéis são assumidos precocemente - sustento pelo trabalho, por ex. - famílias ampliadas chefiadas por uma avó geralmente → homens morrem mais cedo que mulheres, principalmente em casos de vulnerabilidade social → recebem “benefício” - o ciclo familiar é abreviado - disputa e conflito entre a mãe e a pessoa que tem direito de disciplinar a criança - problemas com a propriedade e habitação ASPECTOS IMPORTANTES PARA OBSERVAÇÃO - TRANSGERACIONALIDADE - padrões que se repetem, que estão enraizados em várias gerações → deve-se observar a família nuclear e a trigeracional (avós, pais e filhos), avaliando padrões de repetição, segredos e rituais que possam estar enraizados entre as gerações AS CRIANÇAS EM FAMÍLIAS COM BAIXA RENDA - insegurança e menos-valia (pouca valorização) fazem parte da sua representação simbólica - modelos parentais frequentemente estão fora da família - a criança é propriedade do adulto - o qual a coloca para trabalhar desde cedo - quebra precoce dos vínculos e troca de papéis sociais sem demarcação/rito de passagem - a responsabilidade pela criação frequentemente é da pessoa que tem mais condições - a escolaridade não constitui uma alternativa para a vida adulta - a ausência da figura marido/pai ocorre em grande parcela das famílias - relacionamentos homem-mulher instáveis, sem normas claras de convivência e comportamento - troca de parceiros - inadequada interação intra e extra familiar VARIAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO FAMILIAR → DIVÓRCIO - principais tarefas: aceitar a própria parte no fracasso do casamento, chorar a perda da relação conjugal e da família intacta atuar cooperativamente na custódia e visita dos filhos atuar cooperativamente em relação às finanças realinhar as relações com a família ampliada → NOVO CASAMENTO - principais tarefas: planejamento do novo casamento e da nova família manter a comunicação aberta e enfrentar os temores realinhar as relações com a família ampliada e com a inclusão de novos membros encorajar a relação saudável com os pais biológicos definição de papéis e limites conjuntamente → VARIAÇÕES CULTURAIS - diversidades culturais dentro de grupos étnicos devem ser consideradas casamento: diferente em diferentes culturas (ex.: arranjado, união estável, etc…) filhos: em algumas culturas são fundamentais para o sistema familiar família ampliada: tem papel central na tomada de decisão em algumas culturas (ex.: italianos) divórcio: na comunidade judia é visto como uma violação da união familiar FUNCIONAMENTO FAMILIAR - avaliar se as famílias se mostram como funcionais ou disfuncionais → comunicação funcional: clara, direta, aberta, franca, com congruência entre a verbal e a não-verbal disfuncional: indireta, vaga, controlada, com mensagens de duplo sentido → reforço do conceito de si mesmo funcional: de apoio, amor, elogio, aprovação disfuncional: sem apoio, culpa, recusa em permitir a responsabilidade pessoal → expectativas dos membros da família funcional: flexíveis, realistas, individualizados disfuncional: críticas, rígidas, controladoras, ignorando a individualidade → manejo das diferenças/padrão de interação familiar funcional: tolerante, dinâmico, negociador disfuncional: agressivo, evitando conflitos → padrões de interação familiar funcional: operacionais, construtivos, flexíveis e promovendo as necessidades de todos os membros disfuncional: contraditórios, rígidos, autodestrutivos e destruidores → clima familiar funcional: de confiança, promotor de crescimento, de carinho, sentimento geral de bem-estar disfuncional: de desconfiança, emocionalmente doloroso, sem esperanças de melhora FERRAMENTAS DE ABORDAGEM FAMILIAR - utilizam a representação gráfica da estrutura familiar e a abordagem diagnóstica - servem para propor estratégias de atuação com a família a partir dos dados levantados com as ferramentas → FIRO (Fundamental Interpersonal Relations Orientations - Orientações Fundamentais nas Relações Interpessoais) procura avaliar os sentimento de membros da família, na vivência das relações do cotidiano 1. inclusão: permite conhecer a dinâmica de relacionamento na família, como ela se organiza para enfrentar situações de estresse, o papel de cada membro e como são a interação e a participação de cada um dos membros da família 2. controle: mostra como é exercido o poder na família ele pode ser: dominante - um exerce o poder sobre toda a família; reativo - ocorre reação contrária a alguém que deseja exercer o papel da dominância; colaborativo - compartilhamento de poder entre os membros da família 3. intimidade: como os membros da família se unem para compartilhar entre si os sentimentos → PRACTICE: coleta de informações para entendimento do problema → A.P.G.A.R. FAMILIAR (Adaptation, Partnership, Growth, Affection, Resolve - Adaptação, Participação, Crescimento, Afeição, Resolução) → GENOGRAMA: representação gráfica é um instrumento de avaliação familiar, que consiste na coleta e registro de dados e que integra a história biomédica e psicossocial do paciente e sua família baseado na teoria sistêmica familiar - família como um sistema onde tudo e todos estão conectados e inter-relacionados idealizado por Murray Bowen em 1954 é um modo de representar múltiplas gerações conveniência de múltiplas informações em um espaço pequeno pode ser utilizado como recurso de ensino com a própria família demonstra: sexo, casamento e separação, relacionamento, filhos, aborto e morte → itens do genograma: nome das pessoas - pode ser só as iniciais idades estado conjugal casamentos prévios filhos doenças significantes datas de eventos traumáticos ocupações emoções de proximidade (três riscos), distância (traço riscado/falhado e não contínuo) ou conflito (zigue-zague) entre os membros da família relações significantes com outros profissionais ou outros recursos da comunidade outras informações relevantes que venham a aparecer obs. heredograma considera apenas aspectos biológicos → ECOMAPA: relações da família/indivíduo com outras questões sociais é um diagrama das relações existentes ou não entre a família e a comunidade permite avaliar as redes e apoios sociais disponíveis e a utilização destes pela família é dinâmico, pois demonstra o fluxo ou a falta de recursos sociais, culturais e econômicos em um determinado momento do ciclo vital da família ferramenta inicialmente utilizada pela área do serviço social para estabelecer o sistema social de apoio adequado para as famílias trata-se de uma representação gráfica que identifica todos os sistemas envolvidos e relacionados com a pessoa e com a família, relacionando essa pessoa e sua família com o meio em que vivem o objetivo é estabelecer de uma maneira mais clara e visualizável as relações do indivíduo com o seu meio, com a sua comunidade e com os seus recursos de rede, a fim de ajudar a estabelecer soluções para as dificuldades no manejo do cuidado ESCALA DE RISCO FAMILIAR (DE COELHO E SAVASSI) - é um instrumento que auxilia na avaliação do risco de vulnerabilidade familiar, principalmente social, e se baseia em sentinelas de risco que devem ser avaliadas pela equipe de saúde - pode ser muito útil para a priorização de famílias - aquelas que merecem maior atenção da equipe
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