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TRATAMENTO ENDODÔNTICO DE DENTES DECÍDUOS ENDODONTIC TREATMENT OF DECIDED TEETH Betânia Rodrigues Almeida Guimarães* Chilamara dos Santos Alves* Lídia Gonçalves Barbosa* Lidiane Damasceno Soares* Luanna Janaína Moreira Coelho* Rafaela Sthepane da Silva* Mylene Quintela Lucca** RESUMO A perda precoce de dentes decíduos pode levar a diversos problemas de saúde bucal em crianças, por isto, mesmo diante de situações de comprometimento pulpar o esforço para promover a manutenção destes dentes na cavidade oral é essencial. Em muitos casos é necessário realizar o tratamento endodôntico destes dentes, que visa remover infecções, controlar inflamação, e restabelecer a saúde. Neste contexto, o objetivo deste estudo foi apresentar uma revisão da literatura sobre o tratamento endodôntico em dentes decíduos, abordando diagnóstico clínico e radiográfico, preparo químico mecânico e materiais obturadores. Existe uma variedade de técnicas e materiais utilizados para a terapia pulpar em dentes decíduos. A escolha de procedimento adequado, bem como material a ser utilizado, dependerá do estágio de comprometimento pulpar que deve ser avaliado criteriosamente através de exame clínico, radiográfico e anamnese detalhada. Conclui-se que a pulpectomia é indicada em dentes com pulpite irreversível ou necrose pulpar; e para a obturação dos canais, devem ser utilizadas pastas reabsorvíveis, a fim de acompanhar a esfoliação dos dentes decíduos, sendo as mais comuns à base de hidróxido de cálcio e iodofórmio. Palavras-chave: Dentes decíduos. Tratamento endodôntico. Terapia pulpar. * Acadêmicos do 8º Período do Curso de Odontologia da UNIVALE **Doutora em Odontopediatria; Mestre em Saúde Coletiva; Especialista em Odontologia para pacientes especiais; professora de odontopediatria e estágio supervisionado do curso de Odontologia/UNIVALE. Endereço para correspondência: Betânia Rodrigues Almeida Guimarães Rua Serengueira, número 140, Bairro Santo Agostinho CEP 35065-018 Tel.: (33) 99987-6889 E-mail: beu.rodrigues@hotmail.com 2 ABSTRACT The early loss of deciduous teeth can lead to several oral health problems in children, so even in cases of pulp impairment the effort to promote the maintenance of these teeth in the oral cavity is essential. In many cases it is necessary to perform the endodontic treatment of these teeth, which aims to remove infections, control inflammation, and restore health. In this context, the objective of this study was to present a review of the literature on endodontic treatment in deciduous teeth, addressing clinical and radiographic diagnosis, mechanical chemical preparation and obturator materials. There are a variety of techniques and materials used for pulpal therapy in deciduous teeth. The choice of appropriate procedure, as well as material to be used, will depend on the stage of pulp involvement that should be carefully assessed through clinical examination, radiographic examination and detailed anamnesis. It is concluded that pulpectomy is indicated in teeth with irreversible pulpitis or pulp necrosis; and for the obturation of the channels, resorbable pulps must be used in order to accompany the exfoliation of the deciduous teeth, being the most common ones based on calcium hydroxide and iodoforn. Key-words: Primary teeth. Endodontic treatment. Pulpal therapy. INTRODUÇÃO Um dos objetivos mais relevantes da odontopediatria é a manutenção do dente decíduo em condições anátomo-funcionais até sua esfoliação fisiológica, já que a primeira dentição é a base fundamental para a oclusão correta, visto que a mesma serve como guia para posicionamento dos dentes permanentes sucessores (RIBEIRO; RAMOS; PEIXOTO, 2011). Desta forma, muitos métodos conservadores têm sido utilizados há mais de um século, mas foi principalmente na década de 1970 que as investigações científicas começaram a fornecer uma base experimental para a terapêutica pulpar. O tratamento endodôntico, que consiste na pulpectomia, no preparo biomecânico e na obturação dos canais radiculares, tem indicação quando as alterações pulpares degenarativas estão avançadas ou levaram a polpa à necrose total (PORDEUS; PAIVA, 2014). Segundo Pinheiro et al. (2013) a exposição pulpar ocorre comumente por cárie dentária, mas também pode acontecer durante o preparo da cavidade a ser restaurada, ou mesmo por uma fratura coronária. Para que se conduza o tratamento, é preciso se utilizar de parâmetros clínicos e radiográficos na avaliação, o que facilitará o enfrentamento das dificuldades apresentadas pelos dentes decíduos para o debridamento mecânico realizado durante a instrumentação endodôntica como canais com curvaturas acentuadas, canais acessórios, assim como a reabsorção radicular fisiológica que dificulta a determinação de um limite apical. Além disto, o sucesso dessa terapia depende da desinfecção dos condutos radiculares por meio de soluções irrigadoras, assim como da capacidade antimicrobiana da pasta obturadora. A manutenção com sucesso de dentes decíduos após o tratamento endodôntico de dentes decíduos é um grande desafio em odontopediatria, dentre as características requeridas para um material de preenchimento radicular ideal, pode-se citar: bactericida, 3 bacteriostático, apresentar estabilidade de desinfecção, antiinflamatório inertes ao tecido periapical, reabsorvível biocompatível, radiopaco e possibilitar condições de reparo entre outras (GUEDES-PINTO, 2012). O objetivo deste trabalho é apresentar uma revisão da literatura sobre o tratamento endodôntico em dentes decíduos, abordando diagnóstico clínico e radiográfico, preparo químico mecânico e materiais obturadores. REVISÃO DA LITERATURA Tratamento endodôntico em dentes decíduos Araújo et al. (2010) afirmaram que a terapia pulpar em dentes decíduos tem o objetivo de restabelecer a hemostasia, diminuir ou eliminar o foco de infecção perirradicular e pode ser subdividida em terapia conservadora e tratamento radical. Na terapia conservadora, busca-se a manutenção da vitalidade pulpar total ou da parte radicular através de técnicas como capeamento pulpar direto ou indireto e pulpotomia. Na terapia radical, é realizada a pulpectomia, que consiste na retirada de todo o tecido vital, sendo indicada para dentes decíduos com diagnóstico de pulpite irreversível ou necrose pulpar. Segundo Azevedo; Barcelos e Primo (2009), para que a terapia endodôntica alcance êxito, é necessário que haja uma adequada sanificação dos canais radiculares, acompanhada de obturação satisfatória. Para a eliminação da parte orgânica e inorgânica dos canais, é necessário ser realizado o preparo químico-cirúrgico, utilizando instrumentos endodônticos, soluções químicas auxiliares eficazes, com o objetivo de potencializar a ação antibacteriana da medicação intracanal nas paredes dentinárias e nos canais acessórios, através da remoção de smearlayer, permitindo, assim, adequado selamento do material obturador. A descontaminação endodôntica é realizada por preparo mecânico, que tem objetivo de dar formato e promover profilaxia dos condutos principais, e também pelo processo químico através de soluções irrigadoras que atingem o conduto principal e suas ramificações, facilitando a instrumentação (SILVA; BRUM; SOARES, 2013). A morfologia interna dos canais radiculares dos molares decíduos altera-se com a continuidade da formação de dentina secundária com o aparecimento de variações relativas ao número, ao comprimento e a angulação de raízes, ao número de canais secundarios ou acessorios, as ramificações apicais e até a uma rede de intercanais. Entretanto essa complexidade topográfica, não contraindica os procedimentos endodônticos, estando mais subordinada a fatores como: reabsorção radicular superior a metade do comprimento da raiz, grande destruição coronária, lesão cariosadestruindo área de bifurcação ou trifurcação radicular, lesões periapicais ou interrradiculares extensas associadas a grande mobilidade dental, descontinuidade da lâmina dura do saco folicular do sucessor do permante, abcessos volumosos e alveólises (PORDEUS; PAIVA, 2014). 4 Diagnóstico clínico e radiográfico A terapia endodôntica em dentes decíduos pode ser conservadora ou radical, variando conforme a gravidade da lesão, seja ela traumática ou biológica. Devem ser levados em consideração uma anamnese bem executada e a partir de suspeita de comprometimento pulpar devem ser realizados exame clínico e radiográfico. O clínico tem como objetivo identificar abcessos, lesões cariosas profundas, alteração de cor, mobilidade e traumas na coroa. Enquanto o radiográfico pode identificar trauma na raiz, presença de lesões perirradiculares, fraturas na raiz e/ou infiltrações em restaurações. Os testes de sensibilidade pulpar não são recomendados em dentes decíduos, devido à dificuldade de feedback confiável da criança (MASSARA et al., 2012). As indicações, os objetivos e o tipo de terapia dependem do diagnóstico obtido de polpa saudável, pulpite reversível, pulpite irreversível ou necrose pulpar. Testes de sensibilidade pulpar (elétricos e térmicos) podem ser úteis em dentes permanentes, mas não são recomendados para dentes decíduos, em função de respostas não confiáveis. Dentes que apresentam sinais ou sintomas como história de dor espontânea, fístula, inflamação periodontal não resultante de gengivite ou periodontite, mobilidade não compatível com trauma ou período de rizólise, radiolucidez apical ou na região de furca, reabsorções interna ou externa são compatíveis com diagnóstico de pulpite irreversível ou necrose pulpar. Estas características indicam o tratamento endodôntico. Dentes que apresentarem dor provocada de curta duração ou por escovação, aliviada com a remoção do estímulo e uso de analgésicos, são compatíveis com o diagnóstico de pulpite reversível e candidatos à terapia para polpa vital que vão deste o capeamento pulpar indireto até a pulpotomia (ARAÚJO et al., 2010). De acordo com Massara et al. (2012) para a indicação de uma pulpectomia é preciso estabelecer o diagnóstico de um condição de irreversibilidade da inflamação pulpar, ou a necrose tecidual. Em uma pesquisa realizada por Pinheiro et al. (2013) com o objetivo de verificar a conduta de odontopediatras quando à escolha da terapia endodôntica em dentes decíduos, assim como os fatores que influenciam essa eleição e os materiais utilizados, os resultados evidenciaram que em caso de molar decíduo com cárie profunda sem exposição pulpar, 86,7% dos odontopediatras realizariam a proteção pulpar indireta (PPI). No caso de pequena exposição acidental da polpa, 50% fariam proteção pulpar direta (PPD) e 46,7%, a pulpotomia. Já em grande exposição pulpar com inflamação suave, 56,7% fariam a pulpotomia e 43,3% a PPD. Em polpa exposta, a pulpectomia foi o tratamento mais relatado em dentes com 1/3 de reabsorção radicular, presença de pólipo pulpar e presença de fístula. Nos casos de extensa lesão radicular e fístula, a maioria (93,3%) faria exodontia. Como medicação intracanal indicada, 36,7% escolheria a pasta Guedes Pinto em casos de pulpectomia. Em caso de pulpotomia, Hidróxido de cálcio (36,7%) e formocresol (33,3%) foram os materiais mais indicados. A pasta de hidróxido de cálcio é o material de escolha na PPD e na PPI para, respectivamente, 83,3% e 86,7% dos profissionais. Segundo Takahashi e Dezan Junior (2014) diferentes técnicas têm sido propostas para o tratamento endodôntico de dentes decíduos com necrose pulpar. Essas técnicas variam fundamentalmente quanto à solução empregada na desinfecção do canal e o material utilizado na obturação. 5 O diagnóstico da condição pulpar é o principal fator a ser considerado para a escolha do tratamento. Esse diagnóstico é obtido por meio de um acurado exame clínico associado ao exame radiográfico, este último, composto por radiografias interproximal e oclusal modificada para os dentes anteriores, e complementar com radiografia periapical permite a visualização do dente decíduo e do seu sucessor (SILVA et al., 2015). A pulpectomia deve ser executada em dentes decíduos que apresentam características clínicas e radiográficas de pulpite irreversível, necrose e em dentes que foi iniciada a pulpotomia, no entanto o remanecente não correspondeu bem ao tratamento, apresentando necrose ou hemorragia excessiva. Os sinais radiográficos encontrados, nesses casos, são reabsorções fisiológicas e patológicas, como a periapical ou interradicular e os sinais clínicos são exposições pulpar por trauma ou por cárie e presença de fístula em dentes com restaurações extensas (ARAÚJO et al., 2010). Preparo químico-mecânico de canais radiculares de dentes decíduos De acordo com Leonardo (2005), o canal dentinário corresponde à área histologicamente ocupada por tecido pulpar, restrita em seu extremo apical ao limite cemento-dentina-canal, onde inicia-se o canal cementário, que deve permanecer livre de qualquer intervenção. Assim, a constrição apical, que ocorre aproximadamente 2mm aquém do ápice, e não o ápice radicular, constitui-se no ponto para o estabelecimento do limite apical de instrumentação, o qual identifica a profundidade que o preenchimento do canal, na obturação, poderá atingir. Na pulpectomia, os canais radiculares são debridados, ampliados edesinfectados através da instrumentação, irrigação e preenchimento radicular com um material reabsorvível. Existe uma tendência à realização de pulpectomia em dentes decíduos em sessão única, no entanto, a utilização de um medicamento intracanal em casos de infecção com exsudatos deve ser considerada. E a pulpectomia de duas sessões deve ser planejada, pois há várias cepas bacterianas diferentes em canais radiculares de dentes decíduos, seja com pulpite irreversível ou com polpa necrosadas (BARCELOS et al., 2011). Conforme Soares e Goldberg (2011), o tratamento endodôntico é composto por várias etapas operatórias, dentre elas encontra-se, a medicação intracanal. A fase da medicação introduzida no interior do canal é reconhecida por várias nomenclaturas, como: curativo de demora, medicação local, curativo entre sessões e medicação intracanal. A medicação intracanal tem a função de impedir e eliminar o máximo de microorganismos, atuar como barreira físico-química, tem ação de reduzir o processo inflamatório, prevenir a reinfecção periapical, neutralizar produtos tóxicos, reduzir a sintomatologia periapical e proporcionar o reparo dos tecidos envolvidos. Cunha; Barcelos e Primo (2005) afirmaram que as soluções irrigadoras em dentes decíduos devem ser utilizadas com abundância, considerando que a instrumentação tem sido preconizada com o objetivo de promover debridamento mecânico, e portanto, as soluções irrigadoras atingiriam ramificações dos condutos radiculares onde a instrumentação não consegue alcançar. Dentre as substâncias irrigadoras podem ser citados: peróxido de hidrogênio; hipoclorito de sódio; EDTA e ácido cítrico. 6 Tannure et al. (2011) salientaram que o hipoclorito de sódio (NaOCl) é considerado a solução irrigadora mais empregada no tratamento endodôntico de dentes decíduos. A utilização de soluções irrigadoras que são quelantes de cálcio, como o ácido etileno diamino tetracético (EDTA) e o ácido cítrico (AC), em combinação com o hipoclorito de sódio, apresentam efetividade na remoção da Smear Layer (SL). Fidalgo et al. (2011) descreveram que o NaOCl tem sido amplamente utilizado, tanto no tratamento endodôntico de dentes decíduos como nos permanentes na etapa de limpeza dos canais. Dentre as ações desta substância, destacam-se sua capacidade de diferir matéria orgânica, ser bactericida, favorecer a remoção de smear layer e os detritos, remover gorduras através do processode saponificação e reatividade a cálcio. Esta última propriedade promove desmineralização, facilitando a abertura dos túbulos dentinários, clareamento do substrato dental e neutralização dos metabólitos bacterianos. Silva; Brum e Soares (2013) realizaram um estudo com o objetivo de avaliar in vitro o potencial antimicrobiano de quatro medicamentos passíveis de ser utilizados como soluções irrigadoras em endodontia de dentes decíduos: própolis alcoólico, própolis aquoso, hipoclorito de sódio e solução fisiológica. Os microorganismos utilizados no experimento foram encubados em anaerobiose. A solução de hipoclorito de sódio mostrou-se superior, seguida do própolis alcoólico. As demais soluções não apresentaram potencial algum de inibição. Concluiu-se que dentre as substâncias avaliadas apenas o hipoclorito de sódio poderá ser utilizado com os objetivos antimicrobianos. Azevedo; Barcelos e Primo (2009) relataram que é desejável que a irrigação do canal remova a SL, decorrente do preparo mecânico, promova desinfecção satisfatória e aumente a permeabilidade dentinária, permitindo, assim, maior difusão dos medicamentos intracanais, e melhor adaptação da pasta obturadora. Apesar do NaOCl ser uma das substâncias irrigadoras mais utilizadas na endodontia por causa de sua ação antimicrobiana e capacidade de dissolver tecido orgânico, a sequência de ácido cítrico com NaOCl tem sido estudada como opção viável para o saneamento eficaz do sistema de canais radiculares de dentes decíduos, removendo SL e desinfectando os condutos. Para Botton (2014) apesar do hipoclorito de sódio 1% e 2,5% e o Digluconato de Clorexidina (CHX) 2% serem irrigantes amplamente utilizados, com eficácia demonstrada na capacidade antimicrobiana, e propriedades específicas como a dissolução de tecidos no NaOCl e a substantividade na CHX, estas substâncias são incapazes de remover SL, essencial para a difusão dos agentes desinfetantes nos túbulos dentinários. Assim, para suprir essa necessidade são fundamentais associação com soluções auxiliares, quelantes, como EDTA 17% e ácido cítrico 6%. O ácido cítrico é um sal orgânico, cristalino, sólido, facilmente solúvel em água e que atua sobre os tecidos mineralizados do dente. Após instrumentação do canal, este ácido pode ser utilizado na remoção de SL. Ele caracteriza-se por ter um baixo pH, o que promove seu efeito antimicrobiano e atua como quelante sobre a dentina. Pode ser combinado com hipoclorito de sódio, enquanto este tem um grande poder bactericida e é eficaz na remoção de restos orgânicos, o ácido cítrico consegue de forma eficaz remover SL (PORTELA, 2016). 7 Materiais obturadores empregados no tratamento endodôntico de dentes decíduos O material de obturação dos canais radiculares ideal para a manutenção de dentes decíduos após o tratamento endodôntico deve requerer as seguintes características: ser bactericida, bacteriostático, ser reabsorvível em sincronia com asraízes, ser biocompatível, radiopaco, apresentar estabilidade, ser antiinflamatório, inertes ao tecido periapical e possibilitar condição de reparo ósseo. Dentre os materiais obturadores usualmente citados para a utilização em endodontia de dentes decíduos estão: pastas iodoformadas, pastas a base de hidróxido de cálcio e pastas de óxido de zinco e eugenol (GUEDES-PINTO, 2010). Guedes-Pinto et al. (1981) indicaram uma técnica para tratamento endodôntico de dentes decíduos onde é realizada a obturação dos canais, com uma pasta à base de iodofórmio, paramonoclorofenol canforado e Rifocort. A pasta CTZ é composta por dois antibióticos (tetraciclina e cloranfenicol) e pelo óxido de zinco e eugenol que também apresenta ação antimicrobiana, e tem sido preconizada como material obturador dos canais radiculares de dentes decíduos por. No entanto, os autores acreditaram que no uso clínico desta pasta é preciso que sejam realizadas pesquisas no intuito de identificar outras propriedades essenciais para uma pasta obturadora de canais radiculares de dentes decíduos tais como biocompatibilidade aos tecidos periapicais e a proporção ideal de seus componentes para tornar a pasta menos citotóxica possível sem perder sua capacidade antimicrobiana (PIVA et al., 2009). Massara et al. (2012) avaliaram os resultados clínicos e radiográficos da utilização do hidróxido de cálcio no tratamento endodôntico em 33 dentes decíduos, realizando-se o acompanhamento radiográfico por até 72 meses, até a esfoliação do dente decíduo em questão e a erupção do dente permanente sucessor. Os resultados foram satisfatórios em 32 dos 33 dentes avaliados, onde não houve sinais clínicos e radiográficos de lesões periapicais e interradiculares. Os autores concluíram que o hidróxido de cálcio foi efetivo no tratamento endodôntico de dentes decíduos, não necessitando que seja associado a outros agentes antimicrobianos. De acordo com Joaquim (2014) para se obter melhores resultados, quanto ao processo de reabsorção fisiológica da raiz dos dentes decíduos, podem ser associados para a obturação, materiais a base de hidróxido de cálcio ao óxido de zinco ou ao iodofórmio. O iodofórmio é um agente bacteriostático e demonstra ausência de efeitos tóxicos e deletérios ao sucessor permanente, reabsorção semelhante ao dente decíduo e radiopacidade adequada. Com relação à pulpectomia ou tratamento endodôntico de dentes decíduos sem vitalidade não há um protocolo bem estabelecido e diversos materiais, tais como cimento de óxido de zinco e eugenol, materiais à base de hidróxido de cálcio e/ou pastas iodoformadas têm sido preconizados para a obturação de dentes decíduos (STRINGHINI JUNIOR et al., 2014). Desde a introdução do hidróxido de cálcio na Odontologia por Hermann em 1920, este medicamento vem sendo utilizado para promover o reparo em várias situações clínicas. O emprego do hidróxido de cálcio na obturação de canais radiculares tem demonstrado produzir bons resultados (TAKAHASHI; DEZAN, 2014). Reis et al. (2016) sugeriram as pastas contendo antibióticos como de grande relevância clínica na terapia endodôntica de dentes decíduos. A pasta CTZ 8 (cloranfenicol, tetraciclina e óxido de zinco e eugenol) foi analisada in vitro por estes autores quanto a sua atividade antimicrobiana demonstrando eficácia na inibição de microorganismos gram-positivos. DISCUSSÃO A terapia pulpar em dentes decíduos, segundo Araújo et al. (2010) pode ser conservadora, quando prioriza-se a vitalidade pulpar de todo o dente, ou da parte radicular; e pode ser radical, quando toda a polpa é retirada. Neste contexto, quando optar-se pela pulpectomia, Azevedo; Barcelos e Primo (2009) destacaram ser importante a realização de uma adequada sanificação dos canais radiculares, acompanhada de obturação satisfatória para o sucesso do tratamento. Para isto, estes autores, juntamente com Silva; Brum; Soares (2016) corroboraram que se deve realizar o preparo mecânico e químico dos canais radiculares. Na literatura revisada, em polpa exposta, a pulpectomia foi o tratamento mais relatado, e para Pinheiro et al. (2013), indicada em dentes com 1/3 de reabsorção radicular, presença de pólipo pulpar e presença de fístula. Em contrapartida, Pordeus; Paiva (2014) citaram como contra-indicações da terapia endodôntica em dentes decíduos reabsorção radicular superior a metade do comprimento da raiz, grande destruição coronária, lesão cariosa destruindo área de bifurcação ou trifurcação radicular, lesões periapicais ou interrradiculares extensas associadas a grande mobilidade dental, descontinuidade da lâmina dura do saco folicular do sucessor do permante, abcessos volumosos e alveólises. Em relação ao diagnóstico, Massara et al. (2012) e Silva et al. (2015) conrroboraram em indicar a realização de anamnese, exame clínico e radiográfico. Sobre os exames radiográficos, Silva et al. (2015) indicaram que as radiografias podem ser interproximal ouoclusal, além da radiografia periapical que permite vizualizar o dente sucessor. Sobre os testes de sensibilidade pulpar, alguns autores como Araújo et al. (2010) e Massara et al. (2012) enfatizaram que não devem ser realizados em crianças. Araújo et al. (2010) justificaram que estes testes possuem grande utilidade em dentes permanentes mas não possuem respostas confiáveis quando realizados em crianças. Ainda sobre o diagnóstico, salientaram, que o seu maior objetivo é estabelecer a condição pulpar, fator que será determinante para a condução do tratamento. Desta forma, para Araújo et al. (2010) e Massara et al. (2012) a irreversibilidade da inflamação pulpar condiciona o dente à uma pulpectomia. Procedimento este, que foi descrito por Takahashi e Dezan Junior (2014) como realizado por diferentes técnicas que variam de acordo com a solução empregada para desinfecção do canal e o material obturador. No que diz respeito à técnica utilizada no tratamento endodôntico de dentes decíduos, o limite do preparo químico-mecânico, foi descrito por Leonardo (2005) como na constrição apical do elemento dentário. Outros autores como Barcelos et al. (2011) e Soares e Goldberg (2011) se preocuparam com a quantidade de sessões para a realização deste tratamento, no que Barcelos et al. (2011) consideraram que em situações de infecções com exsudato, o ideal é a realização de medicação intracanal e a realização de pulpectomia em duas sessões, ou mais. Em consonância com esta premissa, Soares e Goldberg (2011) também indicaram a medicação intracanal como de 9 grande vantagem no tratamento endodôntico na eliminação de microorganismos, para evitar reinfecção e proporcionar reparo dos tecidos adjacentes. O processo de irrigação intracanal foi considerado por diversos autores como Fidalgo et al. (2011); Tannure et al. (2011); Silva; Brum e Soares (2013) e Botton (2014) de grande importância, principalmente no que tange a eleição de uma substância irrigadora que não cause danos aos tecidos e elimine os microorganismos dos canais radiculares. Para tanto, Tannure et al. (2011) e Fidalgo et al. (2011) ressaltaram que o hipoclorito é a substância irrigadora mais empregada no tratamento endodôntico de dentes decíduos. Esta afirmação está de acordo com os resultados obtidos em estudo in vitro realizado por Silva; Brum e Soares (2013) com diversas substâncias irrigadoras, em que o hipoclorito de sódio foi a melhor substância a ser utilizada quando considerado o efeito antimicrobiano. Já Azevedo; Barcelos e Primo (2009) sugeriram a associação do ácido cítrico com NaOCl para otimizar a desinfecção. Botton (2014) também indicou o uso de substâncias quelantes em associação a esta substância irrigadora, entretanto sugeriu além do ácido cítrico, o uso do EDTA a 17%. Diversas pastas utilizadas com finalidade obturadora foram citadas nesta revisão da literatura, onde Guedes Pinto (2010) citou dentre estes materiais pastas iodoformadas, pastas a base de hidróxido de cálcio e pastas de óxido de zinco e eugenol. Já Massara et al. (2012); Stringhini Junior et al. (2014); Takahashi; Dezan (2014) salientaram que o hidróxido de cálcio tem excelentes propriedades biológicas e tem demonstrado ótimos resultados. No entanto, outras foram citadas como o uso das pastas CTZ, sugeridas por Piva et al. (2009) e Reis et al. (2016). Ainda neste contexto, autores como Joaquim (2014) e Stringhini Junior et al., (2014) indicaram o uso do iodorfórmio na obturação de canais de dentes decíduos. CONCLUSÃO Por meio desta revisão da literatura foi possível concluir que: ● A pulpectomia é indicada em casos de pulpite irreversível ou de necrose pulpar; ● A substância mais utilizada para a irrigação e desinfecção dos canais radiculares tem sido o hipoclorito de sódio que pode ser associado a outras substâncias quelantes como ácido cítrico e EDTA a 17%; ● Os materiais obturadores em dentes decíduos devem ser reabsorvíveis e podem ser pastas CTZ; pastas iodoformadas; pastas a base de hidróxido de cálcio e pastas de óxido de zinco e eugenol; ● A pasta obturadora mais indicada na obturação dos canais radiculares de dentes decíduos é à base de hidróxido de cálcio e iodofórmio. 10 REFERÊNCIAS ARAÚJO, F. B. et al. Terapia pulpar em dentes decíduos e permanentes jovens. Manual de referência abo-odontopediatria, 2010. p. 194-210. AZEVEDO, C. P.; BARCELOS, R.; PRIMO, L. Variabilidade de técnicas de tratamento endodôntico em dentes decíduos: uma revisão de literatura. 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