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Anemia Falciforme 1. Revisar a anatomofisiologia da hemoglobina e hemácias. → A anemia falciforme é uma doença hereditária monogênica, em que ocorre uma mutação pontual em sequência codificadora, na qual é uma substituição de uma base por outra + Decorre de uma mutação no gene que produz a hemoglobina → Determinada pela presença da hemoglobina S em homozigose, ou seja, a pessoa recebe de cada um dos pais um gene para hemoglobina S → Essas alterações genéticas ocasionam variações estruturais, alterando a capacidade de transportar oxigênio ou reduzindo sua estabilidade, ocasionando alteração morfológica nas hemácias, produzindo células em formato de foice, resultando sua retirada antecipada de circulação + As hemácias, quando assumem essa forma, apresentam maior rigidez e vivem na circulação sanguínea em média 10 dias, muito menos que o tempo médio usual de 120 dias, estando mais sujeitas à destruição (resultando em anemia crônica intensa) + Esse formato influencia intensamente no fluxo do sangue da microcirculação, pois a irregularidade da superfície de contato das hemácias alteradas permite reações químicas interativas entre estas e as células endoteliais, fazendo-as aderir à parede do vaso sanguíneo + As consequências da aderência são caracterizadas pela vaso-oclusão, com redução do fluxo do sangue nos capilares causando estases venosa e hipóxia, que acarretam crises agudas intensamente dolorosas e tecidual orgânica crônica e progressiva Vale ressaltar que, a alteração sequencial de aminoácidos do polipeptídio globina, alterando a capacidade de transportar oxigênio ou reduzindo sua estabilidade. Tal mutação torna a beta globina desoxigenada relativamente insolúvel, alterando a hemácia morfologicamente 2. Diferenciar anemia falciforme da anemia. • A anemia ferropriva é uma disfunção adquirida causada pela perda crônica de sangue ou deficiência na absorção de ferro. Nela ocorre alterações na produção e disponibilidade de glóbulos vermelhos (hemácias) levando a uma baixa concentração de hemoglobina no sangue causando também a diminuição de ferro no sangue • Já a anemia falciforme é hereditária, nessa é presenciado uma modificação estrutural da hemoglobina, comprometendo o funcionamento da mesma. A alteração da hemoglobina em formato de foice dificulta a circulação nos microvasos 3. Citar os agentes etológicos da anemia falciforme. Se uma pessoa receber somente um gene com a mutação, seja do pai ou da mãe, e o outro gene sem a mutação, ela nascerá somente com o traço falciforme. O portador de traço falciforme não tem doença e não precisa de tratamento especializado. Ele deve ser bem informado sobre isso e saber que, se tiver filhos com outro portador de traço falciforme, poderá gerar uma criança com anemia falciforme ou com traço ou sem nada. Vejamos, em cada gestação, o que pode acontecer: 4. Descrever a fisiopatológia da anemia falciforme. O fenômeno de afoiçamento das hemácias é responsável por todo o quadro fisiopatológico A anemia falciforme é caracterizada por anemia hemolítica crônica e presença de fenômenos vasoclusivos que levam a crises dolorosas agudas e à lesão tecidual e orgânica crônica e progressiva. A doença falciforme é causada pela substituição de adenina por timina (GAG ->GTG), codificando valina ao invés de ácido glutâmico, na posição 6 da cadeia da beta globina, com produção de Hb S Esta pequena modificação estrutural é responsável por profundas alterações nas propriedades físico-químicas da molécula de hemoglobina no estado desoxigenado O processo primário deste evento é a polimerização da desoxi-Hb S + A polimerização progride com adição de moléculas sucessivas de Hb S à medida que a porcentagem de saturação de oxigênio da hemoglobina diminui. A falcização dos eritrócitos ocorre pela polimerização reversível da Hb S dentro da célula em condição de desoxigenação + Quando em completa desoxigenação formam-se células em forma de foice, clássicas da doença falciforme + Este fenômeno é reversível com a oxigenação, desde que a membrana da célula não esteja definitivamente alterada + Quando isto ocorre formam-se os eritrócitos irreversivelmente falcizados, que permanecem deformados independentemente do estado da Hb S intracelular. Em geral, quanto maior a quantidade de Hb S, mais grave é a doença. Os pacientes homozigóticos para Hb S têm quadro clínico, em geral, mais grave que os pacientes com hemoglobinopatia SC, SD, etc. A associação com persistência hereditária de hemoglobina fetal confere melhor prognóstico à doença. A desidratação celular aumenta a concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM), facilitando a falcização, por aumentar a possibilidade de contato entre as moléculas de Hb S + A associação entre Hb S e talassemia, tende a reduzir a CHCM e pode associar-se a quadros clínicos menos graves, em alguns casos A presença de outras hemoglobinas dentro da célula influencia a falcização porque exerce um efeito de diluição, diminuindo a oportunidade de contato entre as moléculas de desoxi-Hb S + A influência sobre a polimerização da Hb S varia com o tipo de hemoglobina não-S, que está presente dentro da célula + A hemoglobina que menos participa do polímero é a hemoglobina fetal. Quanto maior é a porcentagem de hemoglobina fetal, menor é a polimerização da Hb S Clinicamente, níveis elevados de hemoglobina fetal associam- se à menor gravidade da doença. + A diminuição do pH reduz a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio, aumentando a polimerização, através do aumento da quantidade de desoxi-Hb S dentro da célula Como resultado da polimerização da Hb S, do aumento da CHCM e das alterações de membrana, os eritrócitos são sequestrados e prematuramente destruídos pelo sistema monocítico fagocitário A destruição aumentada de eritrócitos, levando à anemia hemolítica crônica, é uma manifestação clínica importante da doença falciforme + A ausência de anemia ao nascimento e seu início, acompanhando a queda de hemoglobina fetal pós- natal e a síntese de Hb S, indicam que a falcização é necessária para a indução das anormalidades celulares responsáveis pela destruição dos eritrócitos + A hemólise ocorre por destruição extravascular e intravascular dos eritrócitos 5. Citar as principais manifestações clínicas da anemia falciforme. As crises vaso oclusivas são as manifestações mais comumente observadas e geralmente desencadeiam dor nas costas, tórax e extremidades + O diagnóstico é eminentemente clínico Outras manifestações observadas são a anemia hemolítica e lesão em órgãos-alvo (baço, ossos, cérebro, rins, pulmões, pele, coração). Nos recém-nascidos, a presença de Hb fetal (Hb F) nos primeiros meses de vida retarda o aparecimento dos sintomas da doença (primeiras 8-20 semanas). Entretanto, à medida que a Hb F vai sendo substituída pela Hb S, os sintomas iniciam dores musculares, articulares e ósseas causadas por oclusão na microcirculação. Podem ser desencadeadas por diversos estímulos, dentre eles infecções, desidratação, menstruação, uso excessivo de bebidas alcóolicas, variações de temperatura. Na infância, podem evoluir com dactilite (crianças < 6 anos); bacterianas e virais secundárias ao estado de hipoesplenismo funcional. Risco elevado de sepse por pneumococo; moderada a grave. Os pacientes geralmente já estão adaptados a algum grau de anemia, com episódios de descompensação causados, por exemplo, por uma infecção; síndrome torácica aguda é a principal. Ocorre com maior frequência em crianças, mas é mais grave em adultos. Manifesta-se com dor torácica (pleurítica), dispneia e febre. Pode mimetizar um processo infeccioso, embolia ou infarto. É considerada uma emergência médica; é uma complicação aguda decorrente da retenção das hemácias no interior do baço, causando queda abrupta da hemoglobina eda volemia, podendo resultar em choque. Mais frequente em crianças (< 6 anos). Manifesta-se com dor abdominal, hipotensão e pode ser desencadeado após uma infecção. Também é considerado uma emergência médica; É a presença de cálculos na vesícula biliar (as chamadas "pedras na vesícula"). Secundária à hemólise crônica; infartos encefálicos silenciosos secundários a vasculopatia de pequenos vasos. Há risco aumentado para acidentes vasculares cerebrais isquêmicos. As crianças devem ser avaliadas com ecodoppler transcraniano a partir dos 2 anos para rastreamento dos pacientes com maior risco de envolvimento neurológico. Essa investigação complementar é realizada nos serviços de referência. Pacientes suspeitos de estarem em vigência de acidente vascular cerebral (AVC) devem ser encaminhados para avaliação de emergência; retinopatia proliferativa, diminuição de acuidade visual, oclusão de artéria retiniana e descolamento de retina; ematúria é comum, secundária ao processo de falcização na medula renal. Há risco aumentado para perda de função renal e nefropatia falciforme. O priapismo pode ocorrer em aproximadamente 40% dos homens e é uma emergência médica; acomete principalmente as crianças e pode ser acompanhada de retardo de maturação sexual; úlceras crônicas são frequentes, causadas por isquemia; depressão e isolamento social por dor crônica, assim como a adição a opioides. Além das manifestações clínicas, como em outras doenças, os sinais e sintomas da DF causam repercussão em vários aspectos da vida das pessoas, como a interação social, as relações conjugais e familiares, a educação e o emprego 6. Descrever o diagnóstico e tratamento da anemia falciforme. → Nas hemoglobinopatias, os exames laboratoriais são utilizados para: • Detecção de Hb S nos eritrócitos Técnicas: Teste de falcização dos eritrócitos e teste de solubilidade Finalidade: Avaliação qualitativa para determinar a presença ou ausência de Hb S nos eritrócitos • Genotipagem de Hb Técnicas: Eletroforese de Hb em meio alcalino em acetato de celulose, Eletroforese de Hb em meio ácido em agarose, Isoeletrofocalização, Cromatografia líquida de alta pressão (HPLC) e Dosagem de Hb fetal Finalidade: Qualificação dos principais genótipos de doença falciforme + Dosagem de Hb fetal: auxilia no entendimento da evolução clínica. + HPLC: diagnóstico pré-natal e neonatal de hemoglobinopatias • Determinante de haplótipos Técnicas: Reação em cadeia da polimerase (PCR) Finalidade: Diferenciação da Hb S de outras hemoglobinas variantes, e estabelecer associação entre haplótipos e diversidade clínica nos pacientes com doença falciforme • Monitoração Técnicas: Hemograma, Contagem de reticulócitos, Morfologia eritrocitária, Dosagens de ferritina, Bilirrubinas, Ácido úrico, Fosfatase alcalina, Desidrogenase láctica (LDH), Metaemoglobina , Pesquisas intracelulares de corpos de Heinz, Pesquisa de Hb H e Hb fetal. Finalidade: Avaliar qualitativa e quantitativamente os componentes celulares do sangue para monitoramento hematológico. Diagnóstico diferencial entre a doença falciforme e a interação Hb S/talassemia O exame conhecido como o teste do pezinho deve ser realizado na primeira semana de vida da criança, na unidade de saúde mais próxima de sua residência Trata-se de uma estratégia que visa implementar uma rede de cuidados para assegurar às mulheres o direito ao planejamento reprodutivo e a atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como garantir às crianças o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e desenvolvimento saudáveis Em 2011 foi instituída a inclusão do diagnóstico da doença falciforme na rotina do pré-natal para todas as gestantes. Essa ação visa identificar gestantes com doença falciforme para assegurar o pré-natal de alto risco em ambulatório adequado e, desse modo, contribuir para a redução da morbimortalidade materna → Não há tratamento específico: medidas gerais e preventivas como, boa nutrição, hidratação constante e tratamento precoce das infecções é papel importante no processo terapêutico + Além disso, acompanhamento ambulatorial 2 a 4 vezes ao ano e educação da família e paciente sobre a doença são auxiliares na obtenção de bem-estar social e menta + Assim, o paciente deve identificar o médico e centro de atendimento onde será feito o acompanhamento da doença e visitas a mútiplos centros devem ser desencorajadas Exames de rotina como, urina I, protoparasitológico, R-X de tórax, eletrocardiograma e se possível ecocardiograma, creatinina e clearance, eletrólitos, ultra-som de abdome, proteinúria, provas de função hepática e visita ao oftalmologista com pesquisa de retinopatia devem ser realizados anualmente e repetidos sempre que necessário + Hemograma deve ser realizado pelo menos duas vezes ao ano, pois redução nos níveis basais de hemoglobina podem indicar insuficiência renal crônica ou crise aplástica Atualmente, um novo fármaco, hidroxiureia, introduzido ao tratamento convencional tem trazido resultados animadores, tanto em crianças como em adultos, atenuando a freqüência das crises, diminuindo a necessidade de internações, conseqüentemente ofertando melhor qualidade de vida 7. Citar formas de prevenção. Penicilina Profilática Penicilina profilática previne 80% das septicemias por S. pneumoniae (Pneumococo) em crianças com anemia falciforme até 3 anos de idade (2). O impacto da profilaxia é enorme e deve ser iniciado aos 3 meses de idade para todas as crianças com doenças falciformes (SS, SC, S_). A terapêutica deve continuar até 5 anos de idade Imunização A imunização deve ser realizada como em qualquer outra criança, contra agentes virais e bacterianos Entretanto, particular ênfase deve ser dada à vacinação contra Pneumococo, Haemophilus influenzae e Hepatite B + Desde que septicemia por Pneumococo e H. influenzae tipo B são freqüentes na doença falciforme, a imunização deve ser precoce Entretanto, a vacina contra Pneumococo atualmente no mercado não é imunogênica antes de dois anos de idade. Já a vacina contra hepatite B pode ser realizada ao nascimento. Assim, para estes agentes, recomenda-se o seguinte esquema de vacinação: Hepatite B Deve ser administrada em 3 doses de 1 ml (20μg/dose), ao nascimento, 1 mês e 6 meses de vida. Os reforços podem ser feitos a cada 5 anos após término do esquema ou quando os títulos estiverem abaixo do nível de proteção. A vacinação pode ser iniciada em qualquer idade, nos intervalos acima citados. Em adultos, administrar apenas nos indivíduos com anticorpos negativos para o vírus da hepatite B Haemophilus A idade mínima para administração é de 2 meses. - Até 6 meses de idade: devem ser administradas 3 doses em intervalos de 2 meses. - 7 meses a 1ano de idade: administrar 2 doses com intervalos de 2 meses. Em ambos os casos, o reforço deve ser administrado com 1ano e 3 meses de idade - A partir de 1 ano até 18 anos de idade: administrar em dose única. Pneumococos A idade mínima para administração é de 2 anos com reforço a cada 5 anos. Não realizar reforços em intervalos menores do que 5 anos pois os efeitos adversos da vacina podem ser exacerbados. Nutrição Assim como outros pacientes com hemólise crônica, indivíduos com doenças falciformes estão particularmente sujeitos à superposição de anemia megaloblástica, principalmente quando a dieta é pobre em folato, durante a gestação ou em períodos de crescimento rápido. + Além disso, a carência de folato pode estar relacionada a um maior risco de trombose e mal- formação de tubo neural no primeiro bimestre da gestação. Assim, para prevenção da deficiência de ácido fólico, recomenda-se a suplementação com 1a 2 mg de folato ao dia (1,4,5,7,8) + Embora a deficiência de zinco possa ocorrer nesta doença, a suplementaçãocom zinco é assunto controvertido, mas pode auxiliar no tratamento das úlceras de perna + A suplementação regular com ferro deve ser evitada, exceto na presença de perda de sangue ou deficiência deste metal (7) Educação e Higiene Medidas de higiene e cuidado com a cavidade oral são fundamentais na prevenção de complicações como recorrência de úlceras de perna e infecções que podem precipitar crises vasooclusivas Transfusão Terapia transfusional deve ser evitada no tratamento rotineiro de pacientes com doenças falciformes e está contra-indicada na anemia assintomática, crises dolorosas não complicadas, infecções que não comprometam a sobrevida ou instalação de necroses assépticas, porque está demonstrada a ausência de eficácia (9,10). + Dentre os efeitos adversos das transfusões podemos citar a hiperviscosidade, sobrecarga de volume, reações hemolíticas, reações febris nãohemolíticas, reações alérgicas, reações hemolíticas retardadas, sobrecarga de ferro, hepatite B e C, HIV ou infecção por outros agentes. Como qualquer outro paciente, indivíduos com anemia falciforme podem requerer transfusão para repor o volume sangüíneo por hemorragia ou seqüestro esplênico ou aumentar a capacidade de carrear oxigênio, como nas exacerbações da anemia. + Em condições crônicas com anemia compensada como nas hemoglobinopatias, níveis de hemoglobina de 5g/dl são bem tolerados e pode- se indicar transfusão apenas quando há falência cardíaca, dispnéia e disfunção do sistema nervoso central. As transfusões devem ser realizadas com hemácias fenotipadas (para se evitar aloimunização), e depletadas de leucócitos, na forma de hemácias ou filtradas. Terapia Não-convencional Até o momento, duas formas de terapia podem ser utilizadas alternativamente ao tratamento convencional das doenças falciformes, como o transplante de medula óssea e a administração oral de hidroxiuréia, um agente indutor da síntese de hemoglobina fetal. A experiência com o uso de hidroxiuréia nestes casos é muito maior do que com o transplante de medula óssea. Ambos podem ser indicados em grupos selecionados de pacientes.
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