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1 FARMACOLOGIA – JULIANA OLIVEIRA ANESTÉSICOS LOCAIS São substâncias químicas com estruturas químicas semelhantes, ou seja, há um padrão químico, de forma que todo anestésico local apresenta uma porção lipofílica, cadeia intermediária que pode ser do tipo éster ou amida e uma porção hidrofílica que sempre é representada por uma amina. São encontrados em uma variedade em suas formas farmacêuticas, podendo ser encontrados sob a forma de spray, injetável, pomada, pastilhas ou colírio, ampliando a sua utilização clínica. ➔ Ativação dos nociceptores: São terminações nervosas livres que compõem o neurônio sensorial, sendo responsável pela condução do estímulo doloroso. São neurônios periféricos, que conduzem o estímulo que pode ser térmico, mecânico, tátil ou ainda pode ser ativado por mediadores ou sensibilizadores como substâncias pró inflamatórias p.ex. bradicinina, serotonina e prostaglandinas, uma vez que esse estímulo é transduzido, tem-se a conversão desse estímulo químico, térmico ou mecânico, em estímulo elétrico e a partir daí esse estímulo elétrico é conduzido até o corno dorsal da medula espinhal e esse neurônio primário realiza a sinapse com o neurônio secundário e o estímulo sobe ascendente via o tálamo, onde realiza uma nova sinapse para que a informação alcance o córtex cerebral. ▪ Potencial de ação: Em repouso, o nociceptor se encontra a -70 mV, assim, qualquer estímulo que não atinja o limiar de ativação ou -55 mV, o potencial não é disparado, uma vez que o estímulo é forte o suficiente para atingir -55 mV tem-se a despolarização e a ativação desses nociceptores. Assim, nem todo estímulo é capaz de gerar um potencial de ação. ➔ Tipos de fibras nervosas periféricas: ▪ Primeira dor e segunda dor e as vias de transmissão: Tem-se no córtex, percepções de estímulos em velocidades diferentes, levando ao conceito de primeira dor e segunda dor, assim, por exemplo, tombar na porta, em um primeiro momento ele vai sentir uma dor mais intensa que vai cessar mais rapidamente, em um primeiro momento tem-se uma dor menos intensa mas que se mantem por mais tempo. A percepção dual da dor se dá pela transmissão via fibras a delta e pela transmissão via fibras C. Desse modo, quando se tem o bloqueio das fibras A delta a primeira dor desaparece, no entanto, quando ocorre o bloqueio seletivo das fibras C, o indivíduo sente apenas a primeira dor. 2 FARMACOLOGIA – JULIANA OLIVEIRA ➔ Alterações químicas nas moléculas dos anestésicos locais: A farmacologia dos anestésicos locais tem uma derivação muito grande para as alterações moleculares que foram projetadas em cada representante. Tem-se anestésicos locais com ligação éster e com cadeia intermediária amida, os anestésicos locais que possuem ligação éster na cadeia intermediária são menos estáveis, de forma que os anestésicos locais que apresentam ligação amida na cadeia intermediária são mais estáveis. Isso porquê as moléculas químicas do tipo éster sofrem a ação das esterases, as quais ficam circulando pelo sangue, ou seja, para que o anestésico local do tipo éster seja hidrolisado ele não precisa chegar ao fígado, pois, no mesmo local de administração ele já inicia o processo de hidrólise, portanto, os fármacos que apresentam ligação amida em sua fração intermediária são mais estáveis e possuem uma duração do efeito anestésico mais longa. Grupo aromático ou porção lipofílica: Um anestésico local quando ele é administrado ele precisa atravessar as bicamadas lipídicas para chegar nos neurônios e nas fibras nervosas e bloquear os canais de sódio, para que esse caminho seja facilitado o fornecimento de grupos aromáticos ou lipossolúveis contribui, assim, quando maior a porção aromática ou lipossolúvel desse anestésico, mais rápido vai ser o seu caminho até do local de administração até o seu local de ação. No entanto, um anestésico local efetivo deve distribuir-se e difundir-se na membrana e, por fim, dissociar-se dela, as substâncias que têm mais tendência a sofrer esses processos possuem hidrofobicidade moderada. ▪ Grupo amina: A bupivacaína possui as mesmas regiões moleculares da lidocaína e da procaína. No momento em que o anestésico local acessa o citoplasma celular ele sofre protonação, assim, a amina que antes era neutra, e por isso teve a capacidade de atravessar a Esse tipo de anestésico vai ter dificuldade para atravessar a bicamada lipídica e vai ter dificuldade para se ligar no sítio de ação dele que é o canal de sódio. Assim, vai ter mais dificuldade para acessar os neurônios e o sítio intracelular dos canais de sódio. É o mais eficiente, pois, tem capacidade de acessar a camada lipídica e se dissociar dela para que de fato possa acessar o sítio de ligação do canal de sódio que é um sítio intracelular. Nesse caso, o fármaco vai acessar a camada lipídica e vai ficar preso dentro dela, ou seja, um anestésico muito hidrofóbico não é muito potente, pois, ele não vai conseguir se dissociar do lipídeo de membrana para acessar o local de ação. 3 FARMACOLOGIA – JULIANA OLIVEIRA camada lipídica, sofre protonação, a qual no meio intracelular não prejudica o acesso do fármaco no sítio de ação visto que ele já está no meio intracelular, mas aumenta a afinidade do anestésico local com o seu sítio ativo, ou seja, quando o fármaco está protonado dentro da célula nervosa ele possui uma maior afinidade pelo sítio ativo no canal de sódio, assim, quanto maior a capacidade de protonação intracelular dessa amina, menor é a sua dissociação do canal de sódio, portanto, a anestesia consegue durar por mais tempo. Quanto menor o pH, maior vai ser a quantidade de espécies protonadas e quanto maior a protonação, mais difícil vai ser para que essa amina acesse o sítio de ação. Em tecidos inflamados o anestésico local diminui sua efetividade devido a mudança de pH <7,4, assim, tem-se uma diminuição das espécies neutras no meio extracelular e tem-se um aumento de espécies ionizadas, as quais têm uma dificuldade para atravessar as membranas, com isso há uma redução da quantidade de anestésicos dentro da fibra nervosa. ➔ Mecanismo de ação dos anestésicos locais: Funcionam via receptor inotrópico e atuam bloqueando canais de sódio dependente de voltagem, assim, com esse bloqueio há uma diminuição do influxo de íons positivos e consequentemente o sódio, dificultando a despolarização dos neurônios, com isso, o estímulo doloroso não vai ser transmitido com a mesma intensidade que seria caso não houvesse a utilização do anestésico local. Bloqueio funcional diferencial: Uma vez que o anestésico local é administrado o bloqueio funcional diferencial ocorre sempre nessa ordem: 1. Bloqueio das fibras A delta. (primeira dor) 2. Bloqueio das fibras C. (segunda dor) 3. Fibras que conduzem temperatura, tato e pressão. 4. Perda do tônus muscular esquelético. Uma vez que o paciente não sente mais o estímulo tátil ou de pressão, significa que tanto as fibras A delta quanto as fibras C já estão bloqueadas, logo, o procedimento já pode iniciar, pois o paciente não sentirá mais nem a primeira nem a segunda dor. Alterações conformacionais diferentes nos canais podem expor ou esconder o sítio de ligação, assim, quando o canal de sódio está na conformação de repouso o sítio de ligação do anestésico local provavelmente está escondido na conformação tridimensional que esse canal adota nesse momentos, nos outros 3 momentos o sítio de ligação está exposto, de forma que o anestésico local consegue se ligar. 4 FARMACOLOGIA – JULIANA OLIVEIRA Quando o anestésico local bloqueia um canal de sódio em repouso e fechado, com afinidades diferentes, o efeito no canal é impedir a sua abertura, quando o anestésico local interage com o canal aberto o efeito é bloquear o poro e quandointerage na forma inativa, o efeito é estender o período refratário, mas independente de qual o efeito, a consequência é sempre a redução do influxo de sódio, de forma que há a diminuição da possibilidade de despolarização das fibras sensoriais. ➔ Farmacocinética: Absorção sistêmica: Os anestésicos locais têm uma situação ideal para sua atividade que é a eliminação da absorção sistêmica, assim, quanto mais absorvidos eles forem, menor será sua potência como anestésico e maior a sua probabilidade de toxicidade sistêmica. Existem alguns fatores que influenciam na velocidade e na extensão da absorção sistêmica como: ▪ Capilaridade do local: Quanto maior a vascularização, mais difícil o aparecimento do efeito anestésico, porquê quanto maior a vascularização, maior a absorção, de forma que ele vai sair do tecido e cair na corrente sanguínea. ▪ Concentração: Quanto maior a dose administrada, maior a concentração desse anestésico no local a ser anestesiado. ▪ Presença da adrenalina; ▪ Viscosidade da formulação: Quanto mais viscosa a formulação, mais difícil a sua absorção e consequentemente mais localizado o fármaco. A associação entre anestésicos locais e vasoconstrictores como a adrenalina é útil clinicamente pois diminui a taxa de remoção do anestésico local, aumenta a concentração do anestésico no sítio de ação, aumentando a duração do seu efeito e diminuindo a toxicidade sistêmica. No entanto, essa associação não é recomendada em anestesias de extremidades, porquê são locais que não são muito vascularizados, onde não cabe reduzir ainda mais a vasoconstrição, pois, pode-se ter um favorecimento à necrose. ▪ Metabolismo e excreção: Anestésicos locais com ligação éster são metabolizados por esterases teciduais e plasmáticas e são eliminados pelo rim. Anestésicos locais com ligação amida são metabolizados por enzimas hepáticas com excreção majoritariamente renal. ➔ Agentes individuais: Anestésicos locais com ligação éster: Procaína: Fármaco de ação curta e fraca ligação aos sítios ativos, além disso, é um fármaco com baixa hidrofobicidade, ou seja, tem dificuldade em atravessar a membrana lipídica e se ligar no sítio ativo do canal de sódio. É um fármaco de baixa potência, que é rapidamente removido e metabolizado pelas pseudocolinesterases. É comumente utilizado em procedimentos dentários. Cocaína: Foi o protótipo de todos os anestésicos locais conhecidos, foi o primeiro anestésico local utilizado e o único natural. Possui uma estrutura incomum comparado com os demais anestésicos locais. Possui uma acentuada ação vasoconstrictora e um apresenta potencial cardiotóxico. Obs: Seu uso é restrito à anestesias oftálmicas e ao anestésico tópico TAC (tetracaína, adrenalina e cocaína). 5 FARMACOLOGIA – JULIANA OLIVEIRA Tetracaína: É um fármaco de ação longa e altamente potente, possui alta hidrofobicidade e por conta disso vai sendo liberada dos tecidos para a corrente sanguínea de forma lenta, atravessa a membrana lipídica e consegue se ligar ao sítio ativo do canal de sódio. Anestésicos locais com ligação amida: Lidocaína: É o anestésico local mais utilizado, possui uma ação rápida e duração média que fica em torno de 1 a 2h. Possui alterações estruturais importantes como dupla metila no anel aromático, conferindo a lidocaína uma rápida ação devido a rápida perpassagem pela membrana lipídica. Além disso, possui um baixo valor de pKa, possuindo em tecido inflamado, a redução do pH provocado pela condição do ambiente não influencia muito no efeito da lidocaína, pois, já tem um baixo pKa, possuindo assim uma quantidade suficiente de lidocaína neutra. Bupivacaína: Fármaco altamente hidrofóbico e altamente potente. É racêmico, ou seja, se tem uma mistura entre dois enantiômeros, (R e S) possuindo um carbono quiral que realiza quatro ligações diferentes. O enantiômero da bupivacaína é tóxico, sendo assim o enantiômero S ou levobupivacaína, é menos cardiotóxico do que o enantiômero R. Normalmente é administrada como anestesia epidural, possuindo mais efeitos sobre a nocicepção, devido a uma maior preferência por se ligar aos canais de sódio dos nociceptores, do que sobre a atividade locomotora, isso se faz importante pois durante um parto p.ex é importante que a mãe não sinta dor, mas que tenha capacidade de manter as concentrações para auxiliar no parto.