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FISIOLOGIA DO SISTEMA CARDIOVASCULAR 1) Visão geral do sistema circulatório O sistema circulatório é composto pelo coração, vasos sanguíneos, células e plasma sanguíneo e exercem a função primária de transportar materiais para e de todas as partes do corpo. Os vasos sanguíneos são denominados de acordo com a direção do movimento do sangue em relação ao coração, as artérias levam o sangue a partir deste, enquanto as veias levam o sangue para este órgão que funciona semelhante à uma bomba, além disso, existem as arteríolas e as vênulas que são os respectivos vasos com diâmetros reduzidos. Os capilares também são vasos sanguíneos que funcionam como ponte entre as arteríolas e as vênulas a) O sistema circulatório transporta materiais por todo o corpo O movimento de sangue no interior dos vasos sanguíneos é fundamental para o corpo humano, haja vista que é por meio dele que são transportadas substâncias como: nutrientes, águas e gases que entram no corpo a partir do meio externo, materiais que se movem de célula para célula e resíduos que as células eliminam. Nutrientes e água são absorvidos através do epitélio intestinal, já o oxigênio entra no corpo na superfície de troca dos pulmões, diante disso, eles vão para o sangue e são distribuídos para outras partes do corpo pelo sistema circulatório. O cérebro é um órgão altamente sensível à falta de oxigênio, como prova disso, deve-se elencar que a cessação do fluxo sanguíneo cerebral por 5 a 10 segundos ocasiona perda de consciência. Dessa forma, controles homeostáticos fazem o possível para manter o fluxo sanguíneo para o cérebro, mesmo que para isso seja necessário privar a oxigenação de outras células. Além disso, o sangue transporta substâncias produzidas em uma célula que serão utilizadas em outras, como por exemplo a glicose hepática (fígado) ou ácidos graxos (tecido adiposo) que são carreados pelo sangue até as células metabolicamente ativas. Os hormônios produzidos pelas glândulas endócrinas também são transportados no interior dos vasos sanguíneos para as células-alvo, exemplificando a função de comunicação célula-célula do sistema circulatório. O sangue transporta também materiais eliminados pelas células para os órgãos a partir dos quais serão excretados, como por exemplo resíduos metabólicos e dióxido de carbono que serão destinados para os rins e pulmões. Um sistema de valvas no coração e nos vasos sanguíneos impedem que o sangue inverta seu fluxo. b) O sistema circulatório é constituído por coração, vasos sanguíneos e sangue O coração é dividido em metades direita e esquerda pelos septos, que formam uma espécie de parede central e, cada uma destas metades funcionam como uma bomba independente que consiste em átrio (superior) e ventrículo (inferior). Os átrios recebem sangue que retorna ao coração, enquanto os ventrículos bombeiam o sangue. Ao átrio direito chega o sangue dos tecidos que é passado para os ventrículos que o bombeia, via artérias pulmonares para o pulmão para ser oxigenado. O átrio esquerdo recebe sangue dos pulmões (altamente oxigenado) e o ventrículo esquerdo, por meio da artéria aorta e suas ramificações (artérias gradativamente menores, arteríolas e capilares), envia este sangue para os tecidos do corpo. Os vasos sanguíneos que vão do ventrículo direito para os pulmões e os que voltam para o átrio esquerdo são denominados coletivamente como circulação pulmonar. Ao sair dos capilares, o sangue está com baixa concentração de oxigênio, com isto, ele passa para o lado venoso da circulação, movendo-se em veias gradativamente maiores. As veias da parte superior do corpo se confluem e formam a veia cava superior, enquanto as veias da parte inferior, pelo mesmo processo, formam a veia cava inferior. Estas duas veias cavas desembocam no átrio direito. Os vasos sanguíneos que levam o sangue do lado esquerdo do coração para os tecidos e de volta para o lado direito do coração são conhecidos, coletivamente, como circulação sistêmica. 2) Fisiologia do Músculo Cardíaco O coração é composto por três tipos principais de músculos, sendo eles: o músculo atrial, o músculo ventricular e as fibras especializadas excitatórias e condutoras. O músculo cardíaco é estriado e possui miofibrilas típicas, com filamentos de actina e miosina que deslizam durante as contrações. Os músculos atrial e ventricular se contraem com uma duração de contração muito grande, enquanto as fibras excitatórias e condutoras se contraem fracamente, porém apresentam descargas elétricas rítmicas automáticas. As fibras do Miocárdio são constituídas de células individuais conectadas em série e em paralelo umas com as outras pelos discos intercalados, nos quais as membranas celulares das células em paralelo se fundem entre si, formando as junções gap. Esta junção comunicante permite uma rápida difusão dos íons, garantindo que os potenciais de ação se propaguem facilmente de uma célula muscular cardíaca para outra. Dessa forma, o miocárdio forma sincício de muitas células musculares cardíacas. No coração há dois sincícios, sendo eles o atrial que forma as paredes dos átrios, e o ventricular formando as paredes dos ventrículos, esta divisão em dois sincícios permite que os átrios se contraiam pouco antes da contração ventricular, o que é importante para a eficiência do bombeamento cardíaco. Quando comparado com o músculo esquelético, o miocárdio apresenta o platô e um potencial de ação prolongado. Isto acontece pelo fato de que no músculo cardíaco, além da abertura de canais rápidos de sódio ativados por voltagem, que ocorre igualmente nos músculos esqueléticos, o potencial de ação é originado também pela abertura de canais de cálcio do tipo L (canais lentos de cálcio), também chamados de canais de cálcio-sódio. Este segundo tipo de canal continua aberto por vários décimos de segundo, enquanto o primeiro tipo se fecha de modo abrupto. Dessa forma, uma grande quantidade de íons cálcio e sódio penetra nas fibras miocárdicas por esses canais lentos de cálcio, com isso, mantém o prolongado período de despolarização, causando o platô do potencial de ação. Além disso, a diminuição da permeabilidade da membrana celular miocárdica aos íons potássio, fato que não ocorre nos músculos esqueléticos, diminui a saída de íons de potássio, impedindo o retorno rápido do potencial de ação para seu nível basal. Fase 0 (despolarização): os canais rápidos de sódio abrem. Quando a célula cardíaca é estimulada e se despolariza, o potencial de membrana fica mais positivo. Os canais de sódio ativados por voltagem (canais rápidos de sódio) abrem e permitem que o sódio flua rapidamente para dentro da célula e a despolarize. O potencial de membrana alcança cerca de +20 milivolts antes dos canais de sódio encerrarem. Fase 1 (despolarização inicial): os canais rápidos de sódio encerram. Os canais de sódio encerram, a célula começa a repolarizar e os íons potássio saem da célula através dos canais de potássio abertos. Fase 2 (platô): os canais de cálcio abrem e os canais rápidos de potássio encerram. Ocorre uma breve repolarização inicial e o potencial de ação alcança um platô em conse quência de (1) maior permeabilidade dos íons cálcio; e (2) diminuição da permeabilidade dos íons potássio. Os canais de íons cálcio, ativados por voltagem, abrem lentamente durante as fases 1 e 0, e o cálcio entra na célula. Depois, os canais de potássio encerram e a combinação da redução do efluxo de íons potássio e o aumento do influxo de íons cálcio conduz a que o potencial de ação alcance um platô. Fase 3 (polarização rápida): os canais de cálcio encerram e os canais lentos de potássio abrem. O fechamento dos canais de íons cálcio e o aumento da permeabilidade aos íons potássio, permitindo que os íons potássio saiam rapidamente da célula, põem fim ao platô e retornam o potencial de membrana da célula ao seu nível de repouso. Fase 4 (potencial de membrana de repouso): com valor médio aproximado de –90 milivolts. 3) O Ciclo Cardíaco Ciclo cardíaco é o conjunto de eventos cardíacos que ocorreentre o início de um batimento e o início do próximo. Cada ciclo é iniciado pela geração espontânea de potencial de ação de um nodo localizado na parede lateral superior do átrio direito, chamado de nodo sinusal. O potencial de ação gerado por este difunde rapidamente por ambos os átrios e, depois para os ventrículos por meio do feixe A-V. Como consequência, há retardo de mais de 0,1 segundo na passagem do impulso cardíaco dos átrios para os ventrículos, fazendo com que os átrios se contraiam antes dos ventrículos, bombeando sangue para o interior destes antes da contração ventricular. O ciclo cardíaco consiste em dois períodos, sendo um deles de relaxamento, denominado diástole, durante o qual o coração se enche de sangue, seguindo pelo período de contração, chamado sístole. A frequência cardíaca é recíproca à duração total do ciclo cardíaco. O aumento da frequência cardíaca reduz a duração do ciclo cardíaco e, com isso, as fases de contração e relaxamento, são reduzidas. Além disso, o percentual de sístole e diástole também são alterados, haja vista que na frequência cardíaca normal (72bpm), a sístole compreende 40% de todo o ciclo cardíaco, enquanto em uma frequência três vezes maior que a normal, o período de contração corresponde a 65% deste ciclo. Dessa forma, o coração não permanece relaxado tempo suficiente para permitir o enchimento completo das câmaras cardíacas antes da próxima contração. Cerca de 80% do sangue vindo das grandes veias flui diretamente dos átrios para os ventrículos, antes mesmo da contração atrial, esta é responsável pelos 20% adicionais para preencher os ventrículos. Entretanto, como o coração bombeia de 300 a 400% a mais de sangue do que necessário para o corpo nas condições de repouso, quando os átrios deixam de funcionar dificilmente é notada diferença nessas condições, porém, em casos de exercício, o indivíduo pode apresentar sinais agudos de insuficiência cardíaca, como falta de ar. Durante a sístole ventricular, pressões moderadamente altas se desenvolvem nos átrios, estas forçam as valvas A-V a se abrirem e assim, ocasiona um aumento do volume ventricular esquerdo. O período no qual isto ocorre é denominado período de enchimento rápido ventricular que ocorre durante o primeiro terço da diástole. a) Ejeção de Sangue dos Ventrículos Durante a Sístole Período de contração Isovolumétrica: Apesar da contração dos ventrículos, não há esvaziamento, haja vista que neste período ocorre o fechamento das valvas A-V e a abertura das valvas semilunares (aórtica e pulmonar) em razão da alta pressão ventricular. Período de Ejeção: Imediatamente após a abertura das valvas semilunares o sangue começa a ser lançado para as artérias. Este período ejeta 60% do sangue do ventrículo e é subdividido em período de ejeção rápida, o qual ocorre no primeiro terço do período de ejeção e lança cerca de 70% daquela porção e, em período de ejeção lenta, que ocorre nos outros dois terços de tal período e é responsável por lançar os 30% restantes. Período de Relaxamento Isovolumétrico: Ocorre ao final da sístole e faz com que as pressões intraventriculares diminuam rapidamente. Além disso, as valvas aórtica e pulmonar são fechadas pelas altas pressões nas artérias que empurram o sangue de volta para os ventrículos. Volume Diastólico Final, Volume Sistólico Final e Débito Sistólico: O volume diastólico final (60% deste volume é ejetado no período de ejeção) é o enchimento normal dos ventrículos durante a diástole e é por volta de 110 ou 120 ml. Durante a sístole, os ventrículos se esvaziam e o volume diminui aproximadamente 70 ml, o que é chamado de débito sistólico. O volume sistólico final é a quantidade restante em cada ventrículo, ou seja, de 40 a 50 ml. Estes volumes podem variar, como por exemplo quando o coração se contrai fortemente fazendo com que o volume sistólico final chegue entre 10 e 20ml. De maneira análoga, o volume diastólico final pode chegar a 150 ou 180 ml quando grandes quantidades de coração chegam aos ventrículos de um coração saudável. b) As valvas cardíacas evitam o refluxo de sangue durante a sístole As valvas tricúspide e mitral são valvas atrioventriculares (A-V) e impede o refluxo dos ventrículos para os átrios durante a sístole, enquanto as valvas aórtica e pulmonar (semilunares) impedem o refluxo da aorta e das artérias pulmonares para os ventrículos durante a diástole Apesar de as valvas A-V e as semilunares exercerem papel importante para evitar o refluxo sanguíneo durante a sístole, elas possuem funcionamentos diferentes. Enquanto as A-V exercem um fechamento suave, as semilunares se fecham de modo repentino em razão das altas pressões nas artérias ao final da sístole. Ademais, as valvas aórtica e pulmonar, por terem aberturas menores, possuem uma velocidade de ejeção maior que as valvas tricúspide e mitral, pois essas possuem aberturas maiores. 4) Regulação do Bombeamento Cardíaco A quantidade de sangue bombeada pelo coração a cada minuto em geral é determinada pelo volume de sangue que chega ao coração pelas veias, o chamado retorno venoso. Cada tecido periférico do corpo controla seu fluxo local de sangue, e todos os fluxos locais se combinam e retornam pelas veias para o átrio direito, compondo o retorno venoso. O coração, por sua vez automaticamente bombeia esse sangue que chegou até ele para as artérias, para que volte a circular ao longo do circuito. Essa capacidade intrínseca do coração de se adaptar a volumes crescentes de afluxo sanguíneo é conhecida como mecanismo cardíaco de Frank-Starling, em homenagem a Otto Frank e Ernest Starling, dois grandes fisio- logistas do século passado. Basicamente, o mecanismo de Frank-Starling afirma que quanto mais o miocárdio for distendido durante o enchimento, maior será a força da contração e maior será a quantidade de sangue bombeada para a aorta. Ou, em outras palavras: Dentro de limites fisiológicos, o coração bombeia todo o sangue que a ele retorna pelas veias Quando a quantidade adicional de sangue chega aos ventrículos, o músculo cardíaco é mais distendido. Isso por sua vez leva o músculo a se contrair com força aumentada, pois os filamentos de miosina e actina ficam dispostos em ponto mais próximo do grau ideal de superposição para a geração de força. Assim, o ventrículo em função de seu enchimento otimizado automaticamente bombeia mais sangue para as artérias. Controle do Coração pela Inervação Simpática e Parassimpática: A eficácia do bombeamento cardíaco é também controlada pelos nervos simpáticos e parassimpáticos (vagos) que inervam de forma abundante o coração. Para determinados níveis de pressão atrial, a quantidade de sangue bombeada a cada minuto (o débito cardíaco) com frequência pode ser aumentada por mais de 100% pelo estímulo simpático. E, por outro lado, o débito pode ser diminuído até zero, ou quase zero, por estímulo vagal (parassimpático). a) Efeito dos íons potássio: O excesso de potássio nos líquidos extracelulares pode fazer com que o coração se dilate e fique flácido, além de diminuir a frequência dos batimentos. Grandes quantidades podem vir a bloquear a condução do impulso cardíaco dos átrios para os ventrículos pelo feixe A-V. Isto é, a alta concentração de potássio, no fluido extracelular, despolariza parcialmente a membrana celular, deixando o potencial de membrana menos negativo. À medida que o potencial de membrana diminui, a intensidade do potencial de ação também diminui, o que faz as contrações do coração serem progressivamente mais fracas. b) Efeito do cálcio: O excesso de íons cálcio causa efeitos quase opostos aos dos íons potássio, induzindo o coração a produzir contrações espásticas. A causa disso é o efeito direto dos íons cálcio na deflagração do processo contrátil cardíaco. c) Temperatura e funcionamento cardíaco: A temperatura corporal aumentada, como ocorre quando alguém tem febre, provoca aumento muito importante da frequência cardíaca às vezes até ao dobro do valor normal. Provavelmente, isso é decorrente do fato de o calor aumentara permeabilidade das membranas do músculo cardíaco aos íons que controlam a frequência cardíaca, com consequente aceleração do processo de auto estimulação. 5) Excitação Rítmica do Coração O coração é dotado de sistema especial para (1) gerar impulsos elétricos rítmicos que causam contrações rítmicas do miocárdio e (2) conduzir esses impulsos rapidamente por todo o coração. Quando esse sistema funciona normalmente, os átrios se contraem aproximadamente um sexto de segundo antes da contração ventricular, o que permite o enchimento dos ventrículos, antes de bombearem o sangue para os pulmões e para a circulação periférica. Outra característica especial desse sistema é que ele faz com que as diferentes porções do ventrículo se contraiam quase simultaneamente, o que é essencial para gerar pressão, com o máximo de eficiência, nas câmaras ventriculares. Esse sistema rítmico e condutor do coração é suscetível a danos por doenças cardíacas, especialmente à isquemia dos tecidos cardíacos, por causa de circulação coronária deficiente. O resultado com frequência é ritmo cardíaco bizarro ou sequências anormais e contrações das câmaras cardíacas, podendo muitas vezes afetar gravemente a eficiência do bombeamento cardíaco, chegando até a causar morte. 6) O Sistema Excitatório e Condutor Especializado do Coração O sistema intrínseco do coração, responsável por gerar impulsos elétricos rítmicos e conduzi-los rapidamente por todo o órgão, causando as contrações também ritmadas do miocárdio, é chamado Sist. Excitatório e Condutor Especializado do Coração. Ele é composto pelo nodo sinoatrial (ou sinusal); pelas vias internodais; pelo nodo atrioventricular; pelos feixes atrioventriculares; ramos direito e esquerdo e fibras de Purkinje. O Nodo Sinoatrial é um músculo cardíaco especializado, auto excitável, situado na parede posterolateral superior do átrio direito; especificamente logo abaixo e pouco lateral à abertura da veia cava superior. Por possuir frequência de descargas rítmicas mais alta que a de qualquer outra porção do coração, é ele quem controla a nossa frequência cardíaca, sendo, praticamente sempre, o marca-passo do coração normal. As fibras sinusais estão conectadas às musculares atriais, fazendo com que qualquer potencial de ação que tenha início no nodo siga para o miocárdio atrial. Ou seja, é ele quem vai disparar o potencial de ação que promove a contração de todo o coração. Outra importante função do nodo sinoatrial é fazer o “link” entre o sistema nervoso autônomo (SNA) e o sistema estimulante do coração. a) Ritmicidade Elétrica Automática das Fibras Sinusais A concentração de íons sódio no meio extracelular, combinada com o fato de que a célula nodal possui número significativo de canais de sódio já abertos, faz com que exista a tendência do vazamento desses íons para dentro da célula, o que ativa o potencial de ação e estimula a contração muscular. É a capacidade de auto excitação dessas células que causa o potencial de ação, a recuperação do potencial de ação, a elevação do potencial “de repouso” até o disparo que reinicia o processo. É essa capacidade, então, a responsável pelo ritmo cardíaco, permitindo que o nodo sinoatrial gere o impulso elétrico, que irá passar para as vias internodais e chegar ao nodo atrioventricular. b) O Nodo Atrioventricular e o Retardo da Condução do Impulso dos Átrios para os Ventrículos Os átrios se contraem antes, enchendo os ventrículos com o seu conteúdo, para depois a contração ventricular bombear o sangue para as artérias. O responsável por esse retardo da transmissão para os ventrículos é, principalmente, o nodo atrioventricular. O nodo A.V. está localizado, como o próprio nome diz, entre o átrio e o ventrículo, especificamente na parede posterior do átrio direito, atrás da valva tricúspide. O impulso elétrico, após percorrer as vias internodais, atinge o nodo atrioventricular cerca de 0,03 segundo após sua origem sinoatrial. Então, por carência de junções comunicantes do tipo GAP, ele sofre retardo de aproximadamente 0,09 segundo, no próprio nodo atrioventricular, antes de alcançar o feixe atrioventricular. Este feixe desce através do septo interventricular e bifurca, formando os ramos direito e esquerdo. Seguindo até o ápice do coração, o impulso encontra as fibras de Purkinge, as quais se ramificam e estimulam a contração simultânea do miocárdio ventricular. A eficácia do bombeamento do sangue de ambos os ventrículos depende da sístole sincrônica, que ocorre devido às fibras e também à presença de muitas junções comunicantes no tecido, as quais rapidamente transmitem a informação entre as células. O tempo total de transmissão do impulso cardíaco, desde o início dos ramos ventriculares até a última fibra miocárdica no coração normal é de, aproximadamente, 0,06 segundo. 7) Visão Geral da Circulação; Biofísica da Pressão, Fluxo e Resistência A circulação sanguínea exerce a função de atender as necessidades dos tecidos corporais e é essencial para manter a homeostase corporal, proporcionando um ambiente com melhores condições de sobrevivência e funcionamento para as células. Anatomicamente, é dividida em circulação sistêmica e circulação pulmonar. A primeira, também chamada de grande circulação ou circulação periférica, tem origem no ventrículo esquerdo, sai pela aorta e suas ramificações, transportando sangue em condições apropriadas para todos os órgãos e tecidos, até retornar para o átrio direito através das veias cavas (superior e inferior). Cerca de 84% do sangue de toda a circulação está neste processo. Os outros 16% estão na pequena circulação, a pulmonar. Esta tem início no ventrículo direito, de onde o sangue sai pelo tronco pulmonar, chega aos pulmões, onde passa pelo processo de hematose, e retorna, por meio das veias pulmonares, para o átrio esquerdo. Apesar da particularidade dos vasos sanguíneos de cada tecido, existem princípios que são aplicados a todas as partes da circulação. As artérias saem sempre de um ventrículo e possuem paredes resistentes que suportam a alta pressão do transporte sanguíneo para os tecidos. Elas se ramificam e seus ramos finais são chamados de arteríolas, as quais se arranjam formando os capilares. A arteríola é capaz de contrair e dilatar, atuando como válvulas controladoras, graças à força da sua musculatura lisa. Assim, atuam controlando o fluxo sanguíneo de acordo com a necessidade dos tecidos. Já os capilares, são responsáveis por todas as trocas metabólicas dos tecidos (a troca de líquidos, nutrientes, eletrólitos, hormônios e outras substâncias, entre o sangue e o líquido intersticial). Para que isso seja possível, diferentemente das artérias, as paredes desses vasos são finas e possuem poros capilares. Eles se conectam com as chamadas vênulas, as quais coletam o sangue dos capilares e unem-se e formam as veias. As veias são os canais que transportam o sangue das vênulas de volta ao coração. Ademais, atuam reservatórios de sangue extra. Devido à menor pressão, as veias possuem paredes mais frágeis quando comparadas com as arteriais, mas suas três túnicas também permitem contração e dilatação. As áreas de secção transversa muito maiores das veias em relação às artérias, explicam a grande capacidade de armazenamento de sangue no sistema venoso e sua função reservatória. A velocidade do fluxo sanguíneo é inversamente proporcional à área de secção transversa vascular: ● Vm na aorta: 33 cm/s ● Vm nos capilares: 0,3 mm/s A pressão arterial alterna entre 120 mmHg (sistólica) e 80 mmHg (diastólica), tendo uma média elevada de 100 mmHg. À medida que o sangue flui pelo sistema, a pressão tende a cair. Nos capilares os valores variam entre 35 mmHg (próximos à extremidade arteriolar) e 10 mmHg (próximos à extremidade venosa). Ao atingir as veias cavas, a pressão média cai até 0 mmHg. 8) Princípios Básicos da Função Circulatória Existem três princípios básicos subjacentes a todas as funções da circulação: ● O fluxo sanguíneo na maioria dos tecidos é controlado segundo a sua necessidade.Os tecidos quando ativados necessitam de um aumento de adições de nutrientes e consequentemente um fluxo sanguíneo maior. O coração em condições normais não pode aumentar seu débito cardíaco mais que 7 vezes em relação ao seu valor em repouso, então ele não pode simplesmente aumentar o fluxo sanguíneo nos tecidos quando é demandado. Os microvasos atuam nesse segmento onde, monitoram as necessidades teciduais e atuam sobre os vasos sanguíneos locais, dilatando os ou contraindo os conforme a necessidade de ativação do tecido. ● O débito cardíaco é a soma de todos os fluxos locais dos tecidos. O sangue que fluiu pelos tecidos é retornado pelas veias ao coração, que responde bombeando de volta para as artérias, respondendo às demandas dos tecidos. No entanto, o coração carece de sinais nervosos que controlam o bombeamento necessário de fluxo sanguíneo. ● A regulação da pressão arterial é geralmente independente do fluxo sanguíneo local ou do débito cardíaco. O sistema circulatório possui o seu próprio controle de pressão arterial. Se porventura a pressão abaixar ao valor normal de 100 mmHg, reflexos nervosos agem aumentando a força do batimento cardíaco, causando a constrição de veias e arteríolas para que haja uma maior concentração de sangue nas grandes artérias, elevando o nível da pressão. Os rins também podem executar a função de controle pressórico, secretando hormônios que controlam a pressão e regulando o volume sanguíneo. 9) Inter-relações entre pressão, fluxo e Resistência O fluxo sanguíneo em um vaso é determinado pela diferença de pressão entre as extremidades dos vasos, que impulsiona o sangue e a resistência vascular, que é o impedimento do fluxo do sangue no vaso. O fluxo no vaso pode ser calculado pela lei de Ohm: Onde F é o fluxo sanguíneo, ∆P a diferença de pressão entre as duas extremidades e R a resistência que ocorre do atrito entre o sangue em movimento e o endotélio intravascular. Essa fórmula define que o fluxo ocorre em proporção direta à diferença de pressão, mas inversamente proporcional à resistência. A diferença de pressão entre as extremidades determina a intensidade e velocidade do fluxo. Se não houver diferença entre essas extremidades não haverá fluxo apesar de existir a pressão necessária. 8) Débito Cardíaco, retorno venoso e suas regulações O débito cardíaco é a quantidade de sangue bombeado para a aorta a cada minuto pelo coração. Também é a quantidade de sangue que flui pela circulação. O débito cardíaco é um dos fatores mais importantes que temos de considerar em relação à circulação, pois é a soma do fluxo sanguíneo para todos os tecidos do corpo. O retorno venoso é a quantidade de sangue que flui das veias para o átrio direito a cada minuto. Outro conceito importante é o índice cardíaco: experimentos têm mostrado que o débito cardíaco aumenta, em termos aproximados, em proporção à área da superfície corporal. Portanto, o débito cardíaco é expresso com frequência em função do índice cardíaco, que é o débito cardíaco por metro quadrado da área da superfície corporal. O sistema cardiovascular é um sistema fechado, não deve haver perdas, portanto em um coração eficiente, o débito cardíaco deve ser igual ao retorno venoso (volume de sangue que chega ao átrio direito a cada minuto). Nos homens saudáveis e jovens, o débito cardíaco em repouso fica em torno de 5,6 L/min, e nas mulheres, esse valor é de cerca de 4,9 L/min, e essa mesma quantidade deve retornar ao átrio direito pelo retorno venoso (RV). Porém, como tudo na vida, o Débito cardíaco também não é imutável, está passível de alterações a todo momento. E essas alterações vão depender de alguns parâmetros, que serão detalhados abaixo, como: (1) o nível basal do metabolismo corporal, (2) se a pessoa está se exercitando, (3) a idade da pessoa e (4) as dimensões do corpo. De acordo com a Lei de Frank Starling, o DC é controlado pelo retorno venoso, e não pelo próprio coração. O coração possui um mecanismo intrínseco que lhe permite bombear automaticamente qualquer quantidade de sangue que flua das veias para o AD. Essa lei justifica esse mecanismo cardíaco por 2 motivos principais: aumento da força de contração, devido à evolução do estiramento, chamada tensão passiva; e elevação da sensibilidade das células musculares aos íons de cálcio (Ca++) à medida que o músculo é estirado pelo conteúdo ventricular; como o cálcio é essencial no processo de contração muscular, o aumento da sua concentração proporciona maior força de contração, em especial quando se chega à saturação celular. Outro fator importante, é que a distensão do coração faz com que seu bombeamento seja mais rápido — com frequência cardíaca maior, isto é, a distensão do nodo sinusal na parede do átrio direito tem efeito direto sobre a ritmicidade do próprio nodo, aumentando por até 10% a 15% a frequência cardíaca. Além disso, o átrio direito distendido desencadeia reflexo nervoso, designado como reflexo de Bainbridge, que passa primeiro pelo centro vasomotor do encéfalo e a seguir, de volta ao coração, pela via nervosa simpática e vagal, acelerando também a frequência cardíaca. Na maioria das condições não estressantes usuais, o débito cardíaco é controlado de forma quase total pelos fatores periféricos que determinam o retorno venoso. Outro fator regulador do DC, pode ser encontrado pela função: DC = PA/Resistência periférica total. Quando a RPT aumenta, o DC diminui. O aumento súbito do volume sanguíneo, por aproximadamente 20%, aumenta o débito cardíaco por cerca de 2,5 a três vezes o normal. A estimulação simpática também afeta o coração e a circulação sistêmica: faz o coração ser bomba mais potente e aumenta a pressão média de enchimento sistêmico, em virtude da contração dos vasos periféricos, aumenta a resistência ao retorno venoso. O SN simpático pode ser bloqueado pela indução de anestesia espinhal total ou utilização de algum fármaco que bloqueia a transmissão dos sinais nervosos pelos gânglios autonômicos. Efeito da estimulação simpática sobre o débito cardíaco: A estimulação simpática afeta o coração e a circulação sistêmica: faz o coração ser bomba mais potente e aumenta a pressão média de enchimento sistêmico, em virtude da contração dos vasos periféricos, aumenta a resistência ao retorno venoso. Efeito da inibição simpática sobre o débito cardíaco: O SN simpático pode ser bloqueado pela indução de anestesia espinhal total ou utilização de algum fármaco que bloqueia a transmissão dos sinais nervosos pelos gânglios autonômicos. O DC é limitado, pois o coração possui limites para a quantidade de sangue que pode bombear (portanto, podemos definir que, quando o retorno venoso é maior do que o coração consegue bombear, ele se torna um fator limitante para a determinação do dc). O coração normal, funcionando sem qualquer estimulação nervosa excessiva, pode bombear um retorno venoso de até duas vezes e meia o normal (até 13 l/min): ● Coração Hiper Efetivo: Pode bombear maior quantidade que o normal. Pode ser causado por estimulação nervosa simpática (aumenta força de contração e frequência cardíaca) ou hipertrofia do músculo cardíaco (aumento da força contrátil). ● Coração Hipo Efetivo: Bombeiam em níveis abaixo do normal. Pode ser causado por inibição do SNS, fatores patológicos, valvulopatia cardíaca, HAS, cardiopatia congênita, miocardite, anóxia cardíaca, lesão ou toxicidade do miocárdio por difteria etc. O DC é regulado por toda a vida quase diretamente proporcional à atividade metabólica corporal total. Portanto, o índice cardíaco diminuído é indicativo do declínio da atividade ou da massa muscular com a idade. Para ilustrar esse mecanismo, podemos observar no gráfico abaixo o nível acima de 4 L/min/m2 aos 10 anos de idade, o índice cardíaco diminui para cerca de 2,4 L/min/m2 aos 80 anos de idade: Como já vimos, a regulação do DC está diretamente relacionada com a regulação do retorno venoso, portanto, é importante compreender alguns mecanismos que podem causar alterações neste retorno: (1) pressão atrial direita:força retrógrada sobre as veias para impedir RV, (2) pressão média de enchimento sistêmico: força o sangue sistêmico em direção ao coração, (3) resistência ao fluxo sanguíneo entre os vasos periféricos e o átrio direito. Curva normal de RV: Sobre o gráfico: O platô na Curva de RV resulta da ausência de ΔRV quando pressão atrial < 0 mmHg, devido ao colapso das veias que entram no tórax (pressão negativa no AD suga as paredes das veias) e impede fluxo adicional de sangue das veias periféricas. Uma redução da capacidade de bombeamento do coração , leva a um aumento da pressão atrial direita e consequente redução do RV. Isso ocorre pois a circulação sistêmica é uma bolsa distensível, de modo que qualquer aumento da pressão retrógrada cause acúmulo de sangue nessa bolsa. Com isso, há uma consequente queda do DC. Pressão média de enchimento sistêmico (PES), é a pressão medida em qualquer parte da circulação sistêmica após pinçamento dos grandes vasos do coração (medida independente da circulação pulmonar). O valor normal da PES é por volta de 7 mmHg. Quando ocorre um aumento da PES (aumento no enchimento do sistema), temos um deslocamento da curva de RV para cima e para a direita (fluxo de sangue para o coração é facilitado). Quando PAD = PES, não há Δ de pressão entre os vasos periféricos e o AD e não há RV. Quando PAD < PES , ocorre um aumento do RV. Quanto maior o gradiente de pressão, maior o retorno venoso A resistência venosa é a principal responsável pela resistência ao RV. Devemos nos lembrar que as veias possuem uma capacidade de se distender que é 30x maior que a das artérias. Quando a resistência nas veias aumenta, o sangue começa a se acumular nas veias. Porém, a pressão venosa aumenta muito pouco pois as veias são muito distensíveis. Assim, esse aumento de pressão não é eficaz na superação da resistência, e o fluxo de sangue no AD diminui drasticamente. Já as artérias, por serem pouco distensíveis, um aumento em sua resistência gera uma elevação da PA, mas não atrapalham tanto o RV. Quando a resistência das arteríolas e pequenas artérias aumenta, o sangue se acumula nas artérias, o que eleva muito a pressão e essa pressão elevada sobrepuja a resistência aumentada Cálculo do Retorno Venoso: RV= PES - PAD / RRV RV: Retorno venoso (5 L/min) Pes: Pressão de enchimento sistêmico (7 mmHg) PAD: Pressão atrial direita (0 mmHg) RRV: Resistência ao retorno venoso (1,4 mmHg/L de fluxo e sanguíneo) Na figura 20-12 mostra que ao diminuir a metade da resistência ao retorno venoso, permite duas vezes mais fluxo de sangue e gira a curva para cima, e vice-versa. Por maior que possa ser o nível atingido pela pressão atrial direita, ele será igual a pressão média de enchimento sistêmico. Na circulação completa, o coração e a circulação sistêmica devem atuar em conjunto. Isso significa que o retorno venoso da circulação sistêmica deve ser igual ao débito cardíaco do coração e a pressão atrial direita é a mesma para o coração e para a circulação sistêmica. 9) A importância da fisiologia cardiovascular nas diferentes áreas da saúde O sistema cardiovascular é um dos responsáveis pelo funcionamento do organismo humano. Afinal, é ele que faz o bombeamento do sangue em fluxo contínuo, levando oxigênio a todas as células do corpo. Entender a fisiologia cardiovascular, portanto, é indispensável para qualquer profissional engajado na área da saúde e que deseja proporcionar longevidade e qualidade de vida aos pacientes. Estima-se que a maior causa de morte no mundo seja oriunda de doenças cardiovasculares. Essa informação oferece um bom indício, não apenas da importância do estudo, mas sobre o que é indispensável conhecer em fisiologia cardiovascular. Referência: Editora Guanabara Koogan, 2002. -GUYTON, A.C. e Hall J.E.– Tratado de Fisiologia Médica. Editora Elsevier. 13ª ed., 2017.
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