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Bento. B. Corpos e Próteses: dos Limites Discursivos do Dimorfismo. Sexualidades, corporalidades e transgêneros: narrativas fora da ordem. UNB Helaine Borges i Berenice Bento adota a experiência transexual como recorte empírico, a fim de desenvolver uma reflexão sobre o significado do gênero e como ele se articula com o corpo. A autora argumenta que não existe um nível pré-discursivo, ou pré-social, fora das relações de poder-saber (bio-poder), na estruturação das performances de gênero. O gênero, portanto, não é pensado como um conjunto de formações discursivas que atuam sobre o corpo-sexual. Os corpos já nascem maculados pela cultura, já nascem cirurgiados por tecnologias discursivas precisas que irão determinar e validar as formas apropriadas e impróprias dos gêneros. Para Bento todos já nascemos cirurgiados, não existem corpos livres de investimentos e expectativas sociais. A autora explica esta proposição ao falar da mulher grávida que aguarda o resultado da ecografia para o sexo de seu bebê. Muitas mulheres saem do consultório e vão em direção as lojas para comprarem o enxoval da criança. Ou seja, quando este corpo vir a luz do dia, carregará um conjunto de expectativas sobre seus gostos, seu comportamento e sua sexualidade. Então, se pode afirmar que todos já nascemos operados, que somos todos pós-operados. Todos os corpos já nascem “maculados” pela cultura. A interpelação que “revela” o sexo do corpo tem efeitos protéticos: faz os corpos- sexuados. Analisar os corpos enquanto próteses significa livrar-se da dicotomia entre corpo-natureza versus corpo-cultura e afirmar que, nesta perspectiva as/os mulheres/homens biológicas/os e as/os mulheres/homens transexuais se igualam, pois, nossos desejos, sonhos, papéis não são determinados pela natureza. Todos nossos corpos são fabricados: corpo-homem, corpo-mulher. A fabricação dos corpos sexuais é algo que nunca é concluído, na infância os brinquedos e cores delicadas são direcionadas as meninas, enquanto brinquedos e cores fortes são para os meninos. Segundo a autora, é a preparação para a vida heterossexual, o projeto que articula a panóptica dos gêneros. Além da família, o Estado também naturaliza as relações heterossexuais mediante a normatização da vida, a medicina, a igreja, a escola. Observa-se como o sujeito caminha, gesticula, senta, fala, etc. Nesse sentido, a experiência transexual põe em funcionamento os valores que estruturam os gêneros na sociedade, uma vez que a sociedade afirma que o normal é a heterossexualidade. Os/as transexuais que reivindicam as cirurgias, em sua maioria, Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar buscam inteligibilidade social. A sociedade divide-se em corpos-homens e corpos- mulheres, sendo assim, aqueles que não apresentam essa correspondência fundante tendem a estar fora da categoria do humano. Segundo Butler, a experiência transexual revela a possibilidade de ressignificar o masculino/feminino, mostrando seu caráter performático, ou seja, as performatividades queer. Citações contextualizadas e descontextualizadas O sistema binário dos gêneros produz e reproduz a ideia de que o gênero reflete, espelha o sexo e que todas as outras esferas constitutivas dos sujeitos estão amarradas a essa determinação inicial: a natureza determina as sexualidades e posiciona os corpos de acordo com as supostas disposições naturais. No entanto, como aponta Butler (1999), quando a condição de gênero se formula como algo radicalmente independente do sexo, o gênero mesmo se torna vago e, talvez, neste momento, se tenha de pensar que o sexo sempre foi gênero e que não existe uma história anterior à própria prática cotidiana das reiterações. Reiterar significa que é através das práticas, de uma interpretação em ato das normas de gênero, que o gênero se faz, existe. O gênero adquire vida através das roupas que cobrem o corpo, dos gestos, dos olhares, de uma estilística corporal e estética definida como apropriada. São estes sinais exteriores, postos em ação, que estabilizam e dão visibilidade ao corpo, que é basicamente instável, flexível e plástico. Essas infindáveis repetições funcionam como citações e cada ato é uma citação daquelas verdades estabelecidas para os gêneros, tendo como fundamento para sua existência a crença de que são determinados pela natureza. Butler apoia-se na tese da citacionalidade de Derrida (1991) para afirmar que é a repetição que possibilita a eficácia dos atos performativos que sustentam e reforçam as identidades hegemônicas; mas, também são as repetições descontextualizadas do “contexto natural” dos sexos, consideradas pela autora enquanto “performatividades queer" (Butler, 1999, 1998, 2002) que possibilitam a emergência de práticas que interrompam a reprodução das normas de gênero e abre espaço para produção de contra- discursos à naturalização das identidades. As performances de gênero seriam ficções sociais prevalentes, coactivas, sedimentadas, gerando um conjunto de estilos corporais que aparecem como uma organização natural (e daí deriva seu carácter ficcional) dos corpos em sexos, em uma relação binária e complementar. A performatividade não é um “ato” único, singular, são as reiterações das normas ou conjunto de normas. O fato de adquirir o status de um ato no presente gera o ocultamento das convenções das quais ela deriva. Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Retângulo A repetição estilizada formará o cimento das identidades dos gêneros, mas essas repetições em atos não são originalmente inventadas pelo indivíduo. Nas diferentes maneiras possíveis de repetição, na ruptura ou na repetição subversiva desse estilo, é que se encontrarão possibilidades para subverter as normas de gênero. As performances de gênero seriam ficções sociais prevalentes, coactivas, sedimentadas, gerando um conjunto de estilos corporais que aparecem como uma organização natural (e daí deriva seu carácter ficcional) dos corpos em sexos, em uma relação binária e complementar. A performatividade não é um “ato” único, singular, são as reiterações das normas ou conjunto de normas. O fato de adquirir o status de um ato no presente gera o ocultamento das convenções das quais ela deriva. A repetição estilizada formará o cimento das identidades dos gêneros, mas essas repetições em atos não são originalmente inventadas pelo indivíduo. Nas diferentes maneiras possíveis de repetição, na ruptura ou na repetição subversiva desse estilo, é que se encontrarão possibilidades para subverter as normas de gênero. Os discursos das/os transexuais revelam, entre outros aspectos, a eficácia do processo de interiorização de um discurso assumido enquanto verdade, o que lhes provoca sofrimentos uma vez que interpretam suas dores como problema individual. No entanto, e contraditoriamente, esses sentimentos também revelam os limites discursivos do modelo dimórfico, uma vez que aqui o gênero significará o corpo, revertendo assim um dos pilares de sustentação das normas de gênero. Para os/as transexuais, estes conflitos são inexplicáveis e muitos/as dizem que alimentam a esperança de que algum dia se descobrirá uma causa biológica para explicar suas condutas. Os corpos dos transexuais e dos não transexuais são fabricados por tecnologias precisas e sofisticadas que têm como um dos mais poderosos resultados, nas subjetividades, a crença de que a determinação das identidades está inscrita em alguma parte dos corpos. A experiência transexual realça que a primeira cirurgia que nos constituiu em corpos-sexuados não conseguiu garantir sentidos identitários, apontando os limites discursivos dessas tecnologias e a possibilidade rizomática de se criar fissurasnas normas de gênero. Referência Complementar: Bento, B. (2003) Transexuais, corpos e próteses. Labrys. Estudos feministas. Número 4. Recuperado em: http://www.labrys.net.br/labrys4/textos/berenice1.htm, acessado em 06, setembro, 2018) i Síntese apresentada a Professora Drª Isabela Saraiva de Queiroz na disciplina de Gênero e Direitos Humanos, como parte das avaliações do 2º semestre letivo do ano de 2018. http://www.labrys.net.br/labrys4/textos/berenice1.htm Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar Helaine Borges Destacar
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