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INTRODUÇÃO A CLÍNICA II Neurofisiologia e farmacologia dos anestésicos locais e vasoconstrictores Anestesia o AN = sem o AISTHESIS = sem sensação Propriedades desejáveis dos Anestésicos locais o A anestesia local foi definida como a perda da sensação em uma área circunscrita do corpo causada pela depressão da excitação nas terminações nervosas ou pela inibição do processo de condução nos nervos periféricos. o Uma característica importante da anestesia local é a produção da perda de sensibilidade sem indução da perda de consciência. Nessa área principal, a anestesia local difere drasticamente da anestesia geral. o Encontram-se a seguir as propriedades consideradas mais desejáveis em um anestésico local: 1. Não deve ser irritante para o tecido no qual é aplicado. 2. Não deve causar qualquer alteração permanente na estrutura dos nervos. 3. Sua toxicidade sistêmica deve ser baixa. 4. Deve ser eficaz, independentemente de ser infiltrado no tecido ou aplicado localmente nas membranas mucosas. 5. O tempo de início da anestesia deve ser o mais breve possível. 6. A duração de ação deve ser longa o suficiente para possibilitar que se complete o procedimento, porém não tão longa que exija uma recuperação prolongada 7. Deve ter potência suficiente para proporcionar anestesia completa sem o uso de soluções em concentrações nocivas. 8. Deve ser relativamente isento quanto à produção de reações alérgicas. 9. Deve ser estável em solução e prontamente submetido à biotransformação no corpo. 10. Deve ser estéril ou capaz de ser esterilizado pelo calor sem deterioração. o A toxicidade sistêmica é fundamental porque todos os anestésicos locais injetáveis e a maioria dos anestésicos tópicos são finalmente absorvidos de seu local de administração para o sistema cardiovascular. A toxicidade potencial de uma droga é um fator importante em sua consideração para uso como anestésico local. A toxicidade varia muito entre os anestésicos locais atualmente em uso. o Nenhum anestésico local em uso atualmente satisfaz todos esses critérios; entretanto, todos os anestésicos realmente satisfazem a maioria deles. As pesquisas continuam no sentido de produzir novas drogas que possuam um máximo de fatores desejáveis e um mínimo de fatores negativos Fundamentos da geração e da transmissão de impulsos o A descoberta, no final do século XIX, de um grupo de substâncias químicas com a capacidade de prevenir a dor sem induzir perda de consciência foi um dos principais passos no avanço da medicina e da odontologia. o O conceito por trás das ações dos anestésicos locais é simples: eles impedem a geração e a condução de um impulso nervoso. Na realidade, os anestésicos locais estabelecem um bloqueio da via química entre a origem do impulso (p. ex., a incisão do bisturi nos tecidos moles) e o cérebro. Portanto, o impulso abortado, impedido de chegar ao cérebro, não pode ser interpretado como dor pelo paciente. o Quando um anestésico local é colocado em algum ponto entre o estímulo doloroso (p. ex., a broca) e o cérebro, o impulso nervoso ainda é propagado e segue até o ponto de aplicação do anestésico local e então “morre”, jamais chegando ao cérebro, não ocorrendo dor. o O Neurônio • O neurônio, ou célula nervosa, é a unidade estrutural do sistema nervoso. Ele é capaz de transmitir mensagens entre o sistema nervoso central (SNC) e todas as partes do corpo. Há dois tipos básicos de neurônios: sensoriais (aferentes) e motores (eferentes). A estrutura básica desses dois tipos de neurônios difere significativamente. • Os neurônios sensoriais que são capazes de transmitir a sensação de dor consistem em três partes principais. O processo periférico (também conhecido como zona dendrítica) é o segmento mais distal do neurônio sensorial e é composto por uma arborização de terminações nervosas livres. Essas terminações nervosas livres respondem à estimulação produzida nos tecidos em que se encontram, provocando um impulso que é transmitido centralmente ao longo do axônio. O corpo celular do nervo sensorial, portanto, não está envolvido no processo de transmissão de impulsos, sendo sua função primária proporcionar suporte metabólico vital para o neurônio inteiro. • As células nervosas que conduzem impulsos do SNC para a periferia são chamadas de neurônios motores e são estruturalmente diferentes dos neurônios sensoriais descritos anteriormente, pois seu corpo celular fica interposto entre o axônio e os dendritos. Nos neurônios motores, o corpo celular não somente é componente integrante do sistema de transmissão de impulsos, mas também proporciona suporte metabólico para a célula. INTRODUÇÃO A CLÍNICA II o O Axônio • Algumas fibras nervosas são cobertas por uma camada lipídica isolante de mielina. As fibras nervosas mielinizadas estão confinadas em camadas de bainhas lipoproteicas de mielina enroladas em forma de espiral, as quais na realidade constituem uma forma especializada de célula de Schwann. • Embora predominantemente lipídica (75%), a bainha de mielina contém alguma quantidade de proteínas (20%) e de carboidratos (5%). • Cada fibra nervosa mielinizada está envolvida por sua própria bainha de mielina. A camada mais externa de mielina consiste no citoplasma da célula de Schwann e em seu núcleo. Há constrições localizadas a intervalos regulares (aproximadamente a cada 0,5 a 3 mm) ao longo da fibra nervosa mielinizada. Essas constrições são os nodos de Ranvier e formam um intervalo entre duas células de Schwann adjacentes e suas espirais de mielina. 8 Nesses nodos, a membrana do nervo está diretamente exposta ao meio extracelular. • As fibras nervosas não mielinizadas também estão circundadas por uma bainha das células de Schwann. Grupos de fibras nervosas não mielinizadas compartilham a mesma bainha. As propriedades isolantes da bainha de mielina possibilitam que um nervo mielinizado conduza impulsos de maneira muito mais rápida que um nervo não mielinizado de tamanho igual. o Eletrofisiologia da Condução Nervosa • Eventos elétricos que ocorrem num nervo durante a condução de um impulso. • Um nervo possui um potencial em repouso. Este é um potencial elétrico negativo de –70mV que existe através da membrana nervosa, sendo produzido por diferentes concentrações de íons em cada lado da membrana. O interior do nervo é negativo em relação ao exterior. Etapa 1. Um estímulo excita o nervo, levando à sequência de eventos: A. Uma fase inicial de despolarização lenta. O potencial elétrico no interior do nervo torna-se discretamente menos negativo (Etapa 1A). B. Quando o potencial elétrico em declínio atinge um nível crítico, resulta em uma fase extremamente rápida de despolarização. Isso é denominado potencial de limiar ou potencial de descarga (Etapa 1B). C. Essa fase de despolarização rápida resulta em uma inversão do potencial elétrico através da membrana nervosa (Etapa 1C). O interior do nervo agora é eletricamente positivo em relação ao exterior. Existe um potencial elétrico de +40 mV no interior da célula nervosa. Etapa 2. Após essas etapas de despolarização, ocorre a repolarização (Etapa 2). O potencial elétrico gradualmente se torna mais negativo no interior da célula nervosa em relação ao exterior, até que o potencial em repouso original de –70mV seja atingido novamente. o Eletroquímica da Condução Nervosa • Excitação da membrana ✓ Despolarização. ▪ A excitação de um segmento do nervo provoca aumento na permeabilidade da membrana celular aos íons sódio. Isso é realizado por um alargamento transitório dos canais iônicos transmembrana, o suficiente para permitir a passagem sem obstáculosde íons sódio hidratados. ▪ O influxo rápido de íons sódio para o interior da célula nervosa causa despolarização da membrana nervosa de seu nível de repouso até seu limiar de descarga, de aproximadamente –50 a –60 mV. O limiar de descarga é na realidade a magnitude da diminuição do potencial transmembrana negativo necessário para desencadear um potencial de ação (impulso). ▪ A exposição do nervo a um anestésico local eleva seu limiar de descarga. A elevação do limiar de descarga significa que mais sódio precisará atravessar a membrana para diminuir o potencial transmembrana negativo até um nível em que ocorra a despolarização. Quando o limiar de descarga é alcançado, a permeabilidade da membrana ao sódio aumenta drasticamente e os íons sódio entram rapidamente no axoplasma. Ao final da despolarização (o pico do potencial de ação), há efetivamente uma inversão do potencial elétrico do nervo; passa a existir um potencial elétrico de +40 mV INTRODUÇÃO A CLÍNICA II ✓ Repolarização. ▪ O potencial de ação é encerrado quando a membrana se repolariza. Isso é causado pela extinção (inativação) do aumento de permeabilidade ao sódio. Em muitas células, a permeabilidade ao potássio também aumenta, ocasionando a saída de K+ e levando à repolarização mais rápida da membrana e ao retorno a seu potencial de repouso ( Etapa 2). ▪ O movimento de íons sódio para o interior da célula durante a despolarização e o movimento subsequente de íons potássio para fora da célula durante a repolarização são passivos (não exigem gasto de energia), porque cada íon se move ao longo de seu gradiente de concentração (mais alto → mais baixo) ✓ Canais de Membrana. o Propagação de Impulsos • Depois do início de um potencial de ação por um estímulo, o impulso precisa se mover ao longo da superfície do axônio. A energia para a propagação do impulso é derivada da membrana do nervo da seguinte maneira. • O estímulo rompe o equilíbrio de repouso da membrana do nervo; o potencial transmembrana é invertido momentaneamente, mudando o interior da célula de negativo para positivo, e o exterior, de positivo para negativo. Esse novo equilíbrio elétrico nesse segmento de nervo produz correntes locais que começam a fluir entre o segmento despolarizado e a área em repouso adjacente. Essas correntes locais fluem do positivo para o negativo, estendendo-se por vários milímetros ao longo da membrana do nervo. o Disseminação de Impulsos • O impulso propagado trafega ao longo da membrana do nervo em direção ao SNC. A propagação desse impulso difere, dependendo de ser um nervo é mielinizado ou não. Modo e local de ação dos anestésicos locais o É possível que os anestésicos locais interfiram no processo de excitação da membrana nervosa por uma ou mais das seguintes maneiras: 1. Alterando o potencial de repouso básico da membrana do nervo 2. Alterando o potencial de limiar (nível de descarga) 3. Diminuindo a taxa de despolarização 4. Prolongando a taxa de repolarização o Estabeleceu-se que os efeitos primários dos anestésicos locais ocorrem durante a fase de despolarização do potencial de ação. Esses efeitos incluem diminuição na taxa de des - polarização, particularmente na fase de despolarização lenta. Por causa disso, a despolarização celular não é suficiente para reduzir o potencial de membrana de uma fibra nervosa até seu nível de descarga, não se desenvolvendo um potencial de ação propagado. o Onde agem os anestésicos locais? • A membrana nervosa é o lugar em que os anestésicos locais exercem suas ações farmacológicas. Muitas teorias foram propostas ao longo dos anos para explicar o mecanismo de ação dos anestésicos locais, incluindo as teorias da acetilcolina, do deslocamento de cálcio e das cargas de superfície. • Evidências atuais indicam que o po - tencial de repouso da membrana nervosa não é alterado pelos anestésicos locais (eles não se tornam hiperpolarizados) e que os anestésicos locais convencionais agem dentro dos canais de membrana, e não na superfície desta. A teoria das cargas de superfície também não consegue explicar a atividade das moléculas anestésicas sem carga para bloquear impulsos nervosos (p. ex., a benzocaína). • Duas outras teorias, a da expansão da membrana e a do receptor específico, recebem um certo crédito atualmente. Dessas duas, a teoria do receptor específico é mais amplamente sustentada • A teoria do receptor específico, a mais aceita hoje em dia, propõe que os anestésicos locais agem ligando-se a receptores específicos nos canais de sódio. A ação da droga é direta, não mediada por alguma alteração nas propriedades gerais da membrana celular. Estudos bioquímicos e eletrofisiológicos têm indicado que existe um receptor específico para os anestésicos locais no canal de sódio em sua superfície externa ou na superfície axoplásmica interna. Assim que o anestésico local tem acesso aos receptores, a permeabilidade aos íons sódio é diminuída ou eliminada e a condução nervosa é interrompida. • Os anestésicos locais são classificados por sua capacidade de reagir com sítios receptores específicos no canal de sódio. Parece que as drogas podem alterar a condução nervosa em pelo menos quatro locais no canal de sódio 1. Dentro do canal de sódio (anestésicos locais que são aminas terciárias) 2. Na superfície externa do canal de sódio (tetrodotoxina, saxitoxina) 3 e 4. Em portões de ativação ou inativação (veneno de escorpião) • A Tabela 1-3 apresenta uma classificação biológica dos anestésicos locais com base em seu local de ação e na forma ativa do composto. As drogas da Classe C existem INTRODUÇÃO A CLÍNICA II somente na forma sem carga (RN), enquanto as drogas da Classe D existem nas formas com carga e sem carga. • Aproximadamente 90% dos efeitos de bloqueio das drogas da Classe D são causados pela forma catiônica da droga; somente 10% da ação bloqueadora são produzidos pela base. • A bainha de mielina isola o axônio elétrica e farmacologicamente. O único local em que as moléculas do anestésico local têm acesso à membrana nervosa é nos nodos de Ranvier, onde os canais de sódio são encontrados em abundância. As alterações iônicas que se desenvolvem durante a condução dos impulsos também se originam apenas nos nodos. o Como funcionam os anestésicos locais • A ação primária dos anestésicos locais na produção de bloqueio de condução consiste em diminuir a permeabilidade dos canais iônicos aos íons sódio (Na+ ) • A sequência a seguir é um mecanismo proposto de ação dos anestésicos locais: 1. Deslocamento de íons cálcio do sítio receptor dos canais de sódio, o que permite... 2. A ligação da molécula de anestésico local a esse sítio receptor, o que então produz... 3. O bloqueio do canal de sódio, e uma... 4. Diminuição na condutância de sódio, que leva à... 5. Depressão da taxa de despolarização elétrica, e a... 6. Falha em obter o nível do potencial de limiar, juntamente com uma... 7. Falta de desenvolvimento dos potenciais de ação propagados, o que é chamado... 8. Bloqueio de condução. • O bloqueio nervoso produzido por anestésicos locais é denominado bloqueio nervoso não despolarizante. Formas ativas de anestésicos locais o Moléculas dos anestésicos locais • Em sua maioria, os anestésicos locais injetáveis são aminas terciárias. Apenas alguns (p. ex., a prilocaína e a hexilcaína) são aminas secundárias. • A estrutura típica dos anestésicos locais é mostrada nas Figuras. A parte lipofílica é a maior porção da molécula. Aromática em estrutura, é derivada do ácido benzoico, da anilina ou do tiofeno (articaína). A, Anestésico local típico. B, Tipo éster.C, Tipo amida. • Todos os anestésicos locais são anfipáticos, ou seja, possuem tanto características lipofílicas quanto hidrofílicas, geralmente em extremidades opostas da molécula. A parte hidrófila é um amino derivado do álcool etílico ou do ácido acético. Anestésicos locais sem parte hidrofílica não são adequados para injeção, mas são bons anestésicos tópicos (p. ex., a benzocaína). A estrutura do anestésico se completa com uma cadeia intermediária de hidrocarboneto contendo uma ligação éster ou uma ligação amida. • Os anestésicos locais são classificados como aminoésteres ou aminoamidas, de acordo com suas ligações químicas. A natureza da ligação é importante para definir várias propriedades do anestésico local, inclusive a modalidade básica de biotransformação. Os anestésicos locais ligados a ésteres (p. ex., a procaína) são prontamente hidrolisados em solução aquosa. Os anestésicos locais ligados a amidas (p. ex., a lidocaína) são relativamente resistentes à hidrólise. • Preparados em laboratório, os anestésicos locais são compostos básicos pouco solúveis em água e instáveis à exposição ao ar. Seus valores de pKa variam de 7,5 a 10. Nessa forma, têm pouco ou nenhum valor clínico. Entretanto, por serem fracamente básicos, eles se combinam prontamente com ácidos para formar sais de anestésico local, forma em que são muito solúveis na água e comparativamente estáveis. Desse modo, os anestésicos locais usados para infiltração são dispensados INTRODUÇÃO A CLÍNICA II como sais ácidos, mais comumente o sal cloridrato (p. ex., HCl de lidocaína, HCl de articaína), dissolvidos em água destilada estéril ou em soro fisiológico • Sabe-se bem que o pH de uma solução de anestésico local (e o pH do tecido em que é infiltrado) influencia muito sua ação no bloqueio do nervo. A acidificação do tecido diminui a eficácia do anestésico local. Resulta em anestesia inadequada quando os anestésicos locais são infiltrados em áreas inflamadas ou infectadas. O processo inflamatório gera produtos ácidos: o pH do tecido normal é de 7,4; o pH de uma área inflamada é de 5 a 6. Os anestésicos locais contendo adrenalina ou outros vasopressores são acidificados pelo fabricante para inibir a oxidação do vasopressor. O pH das soluções sem adrenalina é aproximadamente 6,5; soluções contendo adrenalina têm pH em torno de 3,5. Clinicamente, esse pH mais baixo tem mais probabilidade de produzir sensação de ardência na infiltração, bem como início da anestesia um pouco mais lento. • A elevação do pH (alcalinização) de uma solução de anestésico local acelera o início de sua ação, aumenta sua eficácia clínica e torna sua infiltração mais confortável. No entanto, por ser instável, a base do anestésico local precipita nas soluções alcalinizadas, tornando essas preparações pouco adequadas para uso clínico. O bicarbonato de sódio ou o dióxido de carbono acrescentados à solução anestésica imediatamente antes da infiltração proporcionam maior conforto e início de anestesia mais rápido. • Apesar da ampla variação do pH nos líquidos extracelulares, o pH no interior de um nervo permanece estável. No entanto, a capacidade de um anestésico local de bloquear impulsos nervosos é profundamente alterada por alterações no pH extracelular. • Um bloqueio adequado do nervo é mais difícil de ser obtido em tecidos inflamados ou infectados por causa do número relativamente pequeno de moléculas capazes de atravessar a bainha do nervo (RN) e do aumento da absorção das moléculas remanescentes de anestésico pelos vasos sanguíneos dilatados nessa região. o Implicações clínicas do ph e da atividade do anestésico local • A maioria das soluções de anestésicos locais preparadas comercialmente sem um vasoconstritor tem pH entre 5,5 e 7. Quando injetadas nos tecidos, a ampla capacidade de tamponamento dos líquidos teciduais rapidamente faz o pH retornar aos 7,4 normais no local de injeção. As soluções de anestésico local contendo vasopressor (p. ex., adrenalina) são acidificadas pelo fabricante pela adição de (meta)bissulfito de sódio para retardar a oxidação do vasoconstritor, prolongando assim o período de eficácia da droga. • Mesmo nessa situação, a enorme capacidade de tamponamento dos tecidos tende a manter o pH tecidual normal; entretanto, realmente é preciso um tempo maior para fazê-lo após a infiltração de uma solução com pH 4,2 do que com uma solução de pH 6,8. Durante esse tempo, o anestésico local não é capaz de ter seu efeito completo, resultando em início mais lento da ação clínica para anestésicos locais com vasoconstritores em comparação com seus correspondentes “simples”. • Os anestésicos locais são clinicamente eficazes nos axônios e nas terminações nervosas livres. As terminações nervosas livres situadas abaixo da pele intacta podem ser atingidas somente pela infiltração do anestésico abaixo da a pele. A pele intacta constitui uma barreira impenetrável à difusão dos anestésicos locais. A EMLA (mistura eutética dos anestésicos locais lidocaína e prilocaína) possibilita que os anestésicos locais penetrem na pele intacta, ainda que lentamente. • As membranas mucosas e a pele lesada (p. ex., queimaduras, abrasões) não dispõem da proteção proporcionada pela pele intacta, permitindo que anestésicos locais aplicados topicamente se difundam através delas e cheguem às terminações nervosas livres. Os anestésicos tópicos podem ser empregados efetivamente na pele que já não esteja mais intacta por causa de lesão, assim como em membranas mucosas (p. ex., córnea, gengiva, faringe, traqueia, laringe, esôfago, reto, vagina, bexiga). Cinética do início e da duração de ação dos anestésicos locais o Indução da anestesia local • Após a administração de um anestésico local nos tecidos moles próximos a um nervo, as moléculas do anestésico local atravessam a distância de um local a outro de acordo com seu gradiente de concentração. Durante a fase de indução da anestesia, o anestésico local se desloca de seu local de depósito extraneural para o nervo (bem como em todas as outras direções possíveis). Esse processo é denominado difusão. É a migração desimpedida de moléculas ou íons através de um meio líquido sob a influência do gradiente de concentração. A penetração de uma barreira anatômica ocorre quando uma droga atravessa um tecido que tende a restringir o movimento molecular livre. O perineuro é a maior barreira à penetração dos anestésicos locais. • Difusão. A taxa de difusão é governada por vários fatores, o mais significativo dos quais é o gradiente de concentração. Quanto maior a concentração inicial do anestésico local, mais rápida é a difusão de suas moléculas e mais rápido é seu início de ação. • Processo de Bloqueio. Após o depósito do anestésico local o mais próximo possível do nervo, a solução se difunde em todas as direções de acordo com os gradientes de concentração que prevalecem. Uma parte do anestésico local infiltrado se difunde em direção ao nervo e nele penetra. No entanto, uma parte significativa da droga infiltrada se difunde também para longe do nervo. Ocorrem então as seguintes reações: 1. Uma parte da droga é absorvida por tecidos não neurais (p. ex., músculo, gordura). 2. Uma parte é diluída pelo líquido intersticial. 3. Uma parte é removida por capilares e vasos linfáticos do local de infiltração. 4. Os anestésicos do tipo éster são hidrolisados. ▪ A soma total desses fatores incide para diminuir a concentração de anestésico local fora do nervo; entretanto, a concentração de anestésico local no interior do nervo continua a aumentar à medida que progride a difusão. Esses processos continuam até que resulte equilíbrio entre as INTRODUÇÃO A CLÍNICA II concentrações intra eextraneurais de solução anestésica. • Tempo de Indução. O tempo de indução é definido como o período da deposição da solução anestésica até o bloqueio completo da condução. Diversos fatores controlam o tempo de indução de determinada droga. Aqueles sob o controle do operador são a concentração da droga e o pH da solução de anestésico local. Os fatores que não estão sob o controle do clínico incluem a constante de difusão da droga anestésica e as barreiras anatômicas do nervo à difusão • Propriedades Físicas e Ações Clínicas. Outros fatores fisicoquímicos de um anestésico local podem influenciar suas características clínicas. o Readministração de anestésico local • Ocasionalmente um procedimento dentário ultrapassa a duração do controle da dor clinicamente eficaz, sendo necessário repetir a infiltração de anestésico local. Em geral, essa infiltração repetida acarreta imediatamente um retorno da anestesia profunda. Em algumas ocasiões, porém, o clínico pode encontrar maior dificuldade no restabelecimento do controle adequado da dor com infiltrações subsequentes. • Recorrência da Anestesia Profunda Imediata. No momento da reinfiltração, a concentração de anestésico local nas fibras centrais é menor do que aquela nas fibras do manto. As fibras centrais parcialmente recuperadas ainda contêm algum anestésico local, embora não o suficiente para proporcionar anestesia completa. Depois do depósito de nova concentração elevada de anestésico próximo ao nervo, as fibras do manto são novamente expostas a um gradiente de concentração dirigido ao interior do nervo; isso finalmente produz uma concentração aumentada nas fibras centrais. Essa combinação de anestésico local residual (no nervo) e do suprimento recém-depositado resulta em início rápido de anestesia profunda e com menor volume de anestésico local administrado. • Taquifilaxia. Nessa segunda situação clínica, ocorre um processo conhecido como taquifilaxia. A taquifilaxia é definida como aumento da tolerância a uma droga que é administrada repetidamente. É muito mais provável que se desenvolva se for permitido que a função do nervo retorne antes da reinfiltração (p. ex., se o paciente se queixa de dor). A duração, a intensidade e a disseminação da anestesia diminuem muito com a reinfiltração.41 ✓ Embora seja difícil explicar, a taquifilaxia provavelmente é ocasionada por algum ou todos os seguintes fatores: edema, hemorragia localizada, formação de coágulo, transudação, hipernatremia e diminuição do pH dos tecidos. Os quatro primeiros fatores isolam o nervo do contato com a solução de anestésico local. O quinto, a hipernatremia, eleva o gradiente iônico de sódio, assim se contrapondo à diminuição de condução do íon sódio ocasionada pelo anestésico local. O último fator, diminuição no pH dos tecidos, é ocasionado pela primeira infiltração de anestésico local ácido. O pH ambiente na área da infiltração pode ser um pouco mais baixo, de modo que menos moléculas do anestésico local são transformadas em base livre (RN) na reinfiltração. o Duração da anestesia • Anestésicos locais de ação mais longa (p. ex., bupivacaína, etidocaína, ropivacaína, tetracaína) ligam-se mais firmemente à membrana do nervo (aumento da ligação proteica) do que as drogas de ação mais curta (p. ex., procaína, lidocaína) e, portanto, são liberados mais lentamente dos sítios receptores nos canais de sódio. • Outros fatores que influenciam a taxa de remoção de uma droga do local de infiltração são a vascularidade do local de infiltração e a presença ou ausência de uma substância vasoativa. A duração da anestesia aumenta nas áreas de vascularidade diminuída (p. ex., bloqueio do nervo mandibular de Gow-Gates versus bloqueio do nervo alveolar inferior) e a adição de um vasopressor diminui a perfusão tecidual para uma área local, aumentando assim a duração do bloqueio
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